ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA DA UNIÃO ESPECIALIZADA VIRTUAL DE PATRIMÔNIO
NÚCLEO JURÍDICO
PARECER n. 00911/2022/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU
NUP: 10154.144725/2022-22
INTERESSADOS: ADVOCACIA GERAL DA UNIAO - AGU E OUTROS
ASSUNTOS: LOCAÇÃO / PERMISSÃO / CONCESSÃO / AUTORIZAÇÃO / CESSÃO DE USO
EMENTA: CONSULTA JURÍDICA. FISCALIZAÇÃO DE DISPOSITIVOS FLUTUANTES INSTALADOS EM BEM DE PATRIMÔNIO DA UNIÃO. PODER/DEVER DA SPU. LEI Nº 9.636/1998 (ARTS. 1º, 10 E 11). APLICAÇÃO DO ART. 6º DO DECRETO-LEI Nº 2.398/1987. PORTARIA SPU Nº 5.692, DE 23 DE JUNHO DE 2022. INSTRUÇÃO NORMATIVA SPU/ME Nº 23, DE 18 DE MARÇO DE 2020. RECOMENDAÇÕES.
Trata-se de consulta formulada pela Superintendência do Patrimônio da União em São Paulo – SPU/SP, quanto à competência da SPU para cumprimento de comando judicial que condenou a União na "obrigação de fazer consistente em fiscalizar a instalação de dispositivos flutuantes ao longo do Rio Grande e nos Reservatórios de Água Vermelha e Marimbondo, sobretudo entre os Municípios de Cardoso/SP e Guaraci/SP".
Do inteiro teor do processo epigrafado disponível no SEI (https://sei.economia.gov.br/sei/processo_acesso_externo_consulta.php?id_acesso_externo=2410113&infra_hash=524965eefdd0ef65878f6286513ec574), dignos de referência os seguintes documentos:
- SEI 26874253: Ofício nº 00021/2022/COREPAMNS/PRU3R/PGU/AGU, que faz referência ao NUP 00414.084721/2021-35 (REF. 5003766-39.2018.4.03.6106), de cujo inteiro teor se colhe:
Senhor Superintendente,
1. Trata-se de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal em face da União, objetivando a condenação na obrigação de fazer consistente em fiscalizar a instalação de dispositivos flutuantes ao longo do Rio Grande e nos Reservatórios de Água Vermelha e Marimbondo, sobretudo entre os Municípios de Cardoso/SP e Guaraci/SP.
2. O MM. Juiz a quo, ao final, julgou procedente o pedido para condenar a ré, por meio da Secretaria de Patrimônio da União, à obrigação de i) promover a efetiva fiscalização dos dispositivos flutuantes e demais estruturas instaladas no Rio Grande e reservatórios de Água Vermelha e Marimbondo, entre os Municípios de Guaraci e Cardoso; ii) remover, em caso de indeferimento de requerimento de instalação ou omissão do proprietário autuado em regularizar a situação, dispositivos flutuantes e quaisquer outras estruturas náuticas, nos termos do artigo 17, § 3º, da Portaria SPU nº 404/2012, no prazo de 180 (cento e oitenta dias); iii) efetuar a análise dos requerimentos de regularização que lhe sejam apresentados (ID 8099030 - Pág. 453-462).
3. A União apelou, sustentando, em síntese, que:
a) é parte ilegítima para figurar no polo passivo da lide, pois a gestão do patrimônio público nas áreas em
questão é de responsabilidade das concessionárias Furnas Centrais Elétricas S/A e Companhia de Geração de Energia Elétrica – AES Tietê, a quem compete a fiscalização e a adoção de medidas para coibir as plataformas flutuantes em sua represa, bem como quem deve responder por eventuais danos ambientais ou operacionais decorrentes de sua ação ou omissão;
b) a fiscalização dos dispositivos flutuantes tem sido realizada pela Marinha do Brasil, através da Capitania Fluvial do Tietê-Paraná, sendo que a SPU – Secretaria de Patrimônio da União em São Paulo não dispõe de estrutura e de recursos financeiros para viabilizar tal fiscalização, como embarcações e pessoal especializado, e necessita da colaboração de outros entes que já atuam no local, como a polícia ambiental, municipalidades, Estados e concessionárias, além da Marinha.
4. Apesar dos argumentos da União, o TRF da 3ª Região negou provimento à apelação, pois entendeu que:
(…)
5. Sendo assim, em que pese ainda não ter havido o trânsito em julgado da r. decisão, entendo prudente encaminhá-la para conhecimento da Superintendência do Patrimônio da União em São Paulo para providências e, eventualmente, prestação de informações sobre o caso em tela a esta PRU3. Segue anexa cópia do mencionado acórdão.
- SEI 26874976: Cópia dos autos físicos da Ação Civil Pública nº 0001026-33.2017.4036106, cujo último ato corresponde a certidão datada de 17/10/2018, acerca da conversão do processo em eletrônico e inclusão no PJE;
- SEI 28925541: Nota Técnica SEI nº 47844/2022/ME, em que formulada a consulta nos seguintes termos:
SUMÁRIO EXECUTIVO
1. Trata-se de condenação da União na "obrigação de fazer consistente em fiscalizar a instalação de dispositivos flutuantes ao longo do Rio Grande e nos Reservatórios de Água Vermelha e Marimbondo, sobretudo entre os Municípios de Cardoso/SP e Guaraci/SP", conforme apresentado no Ofício nº 00021/2022/COREPAMNS/PRU3R/PGU/AGU (doc. SEI-ME nº 26874253).
2. Antes os elementos do presente Processo, e havendo dúvidas quanto à atuação e competência da SPU na demanda apresentada, solicita-se consulta à CJU.
ANÁLISE
3. A SPU São Paulo fora comunicada, conforme apresentado no Ofício nº 00021/2022/COREPAMNS/PRU3R/PGU/AGU (doc. SEI-ME nº 26874253), quanto a condenação da União na "obrigação de fazer consistente em fiscalizar a instalação de dispositivos flutuantes ao longo do Rio Grande e nos Reservatórios de Água Vermelha e Marimbondo, sobretudo entre os Municípios de Cardoso/SP e Guaraci/SP".
4. Tendo em vista os elementos presentes no Processo em tela este Núcleo de Destinação Patrimonial se deparou com uma situação bastante peculiar que suscita dúvidas quanto a competência da SPU no cumprimento da demanda presente no Ofício nº 00021/2022/COREPAMNS/PRU3R/PGU/AGU.
5. A Lei nº 9.537/1997 determina, conforme Art.4º, que é atribuição da Autoridade Marítima elaborar normas para:
-"tráfego e permanência das embarcações nas águas sob jurisdição nacional, bem como sua entrada e saída de portos, atracadouros, fundeadouros e marinas."
-" inscrição das embarcações e fiscalização do Registro de Propriedade".
-"execução de obras, dragagens, pesquisa e lavra de minerais sob, sobre e às margens das águas sob jurisdição nacional, no que concerne ao ordenamento do espaço aquaviário e à segurança da navegação, sem prejuízo das obrigações frente aos demais órgãos competentes".
6. A citada Lei traz ainda a definição de Embarcação, como sendo "(...) qualquer construção, inclusive as plataformas flutuantes e, quando rebocadas, as fixas, sujeita a inscrição na autoridade marítima e suscetível de se locomover na água, por meios próprios ou não, transportando pessoas ou cargas;
7. A Marinha do Brasil, conforme Norma NORMAM-11/DPC (disponível no sítio https://www.marinha.mil.br/dpc/sites/www.marinha.mil.br.dpc/files/NORMAM%2011%20-%20Rev2%20-%20Mod2.pdf), regulamenta procedimentos para a realização de obras "(...) sob, sobre e às margens das Águas Jurisdicionais Brasileiras (AJB), no que concerne ao ordenamento do espaço aquaviário e à segurança da navegação". Na referida normativa as casas flutuantes são classificadas "estruturas flutuantes", ou seja, "(...) embarcações sem propulsão que operam em local fixo e determinado".
8. Conforme a citada Norma, para a regulamentação e ordenamento do espaço aquaviário, a Autoridade Marítima emite Parecer para a realização de obras em águas brasileiras somente após cumpridas uma série de exigências e etapas.
9. No entanto, ainda que exista regulamentação específica para ordenamento e execução de obras sobre e sob águas jurisdicionais brasileiras, observamos que a situação do Rio Grande se difere um pouco da normativa mencionada anteriormente.
10. Conforme "Mapa de Caracterização" produzido pelo NUGEO (SEI 28808310 e 28808966), que identifica por meio de imagem de satélite cinco distintas áreas do Rio Grande nos anos de 2018/2019 e 2021, é possível observar que todas ou a maior parte destas casas flutuantes são bens móveis, ou seja, são casas flutuantes deslocadas por seus proprietários/usuários sobre o Rio Grande, comportando-se por tanto como uma espécie de "embarcação".
11. Assim, ainda que seja necessária análise mais detalhada do caso, bem como melhor caracterização, parece nos fazer necessária a realização de consulta à CJU quanto a atribuição e forma de atuação da SPU em casos de fiscalização e regularização de casas flutuantes móveis, como o caso em tela.
12. Observamos ainda que conforme Art. 1º da Lei nº 9.636/1998, o Poder Executivo, por intermédio da SPU, é autorizado a executar "(...) ações de identificação, de demarcação, de cadastramento, de registro e de fiscalização dos bens imóveis da União e a regularizar as ocupações desses imóveis.". No entanto, não nos parece claro o papel a ser exercido pela SPU no caso em tela, tendo em vista a regulamentação e responsabilidade de atuação da Marinha do Brasil no ordenamento do espaço aquaviário relativo a embarcações (casas flutuantes), e ainda em situação em que estas "casas flutuantes" se deslocam pelo Rio, não estando fixas a determinada localidade.
CONCLUSÃO
13. Pelo exposto conclui-se ser necessária a consulta ao órgão jurídico de apoio desta Superintendência do Patrimônio da União para dirimir dúvida relativa à atuação da SPU na fiscalização de embarcações (casas flutuantes) sobre curso de água que banha os estados de Minas Gerais e São Paulo.
É o relatório.
Da leitura da Nota Técnica SEI nº 47844/2022/ME, extrai-se entendimeno da SPU/SP no sentido de que as casas flutuantes seriam bens móveis, equiparando-se às “embarcações” reguladas pela Lei nº 9.537/1997, que “dispõe sobre a segurança do tráfego aquaviário em águas sob jurisdição nacional”.
Ocorre que o conceito de embarcação dado pelo art. 2º, V da Lei nº 9.537/1997[1] tem sua aplicação expressamente limitada a aludido ato normativo, e, salvo disposição em contrário, não se aplica quando do exercício da ficalização dos bens imóveis da União pela Secretaria de Coordenação e Governança do Patrimônio da União, regulada pela Lei nº 9.636/1998, segundo a qual:
Art. 1º É o Poder Executivo autorizado, por intermédio da Secretaria de Coordenação e Governança do Patrimônio da União da Secretaria Especial de Desestatização, Desinvestimento e Mercados do Ministério da Economia, a executar ações de identificação, de demarcação, de cadastramento, de registro e de fiscalização dos bens imóveis da União e a regularizar as ocupações desses imóveis, inclusive de assentamentos informais de baixa renda, e poderá, para tanto, firmar convênios com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios em cujos territórios se localizem e, observados os procedimentos licitatórios previstos em lei, celebrar contratos com a iniciativa privada. (Redação dada pela Lei nº 14.011, de 2020)
(…)
Art. 10. Constatada a existência de posses ou ocupações em desacordo com o disposto nesta Lei, a União deverá imitir-se sumariamente na posse do imóvel, cancelando-se as inscrições eventualmente realizadas.
Parágrafo único. Até a efetiva desocupação, será devida à União indenização pela posse ou ocupação ilícita, correspondente a 10% (dez por cento) do valor atualizado do domínio pleno do terreno, por ano ou fração de ano em que a União tenha ficado privada da posse ou ocupação do imóvel, sem prejuízo das demais sanções cabíveis.
Art. 11. Caberá à SPU a incumbência de fiscalizar e zelar para que sejam mantidas a destinação e o interesse público, o uso e a integridade física dos imóveis pertencentes ao patrimônio da União, podendo, para tanto, por intermédio de seus técnicos credenciados, embargar serviços e obras, aplicar multas e demais sanções previstas em lei e, ainda, requisitar força policial federal e solicitar o necessário auxílio de força pública estadual.
§ 1º Para fins do disposto neste artigo, quando necessário, a SPU poderá, na forma do regulamento, solicitar a cooperação de força militar federal.
§ 2º A incumbência de que trata o presente artigo não implicará prejuízo para:
I - as obrigações e responsabilidades previstas nos arts. 70 e 79, § 2º, do Decreto-Lei no 9.760, de 1946;
II - as atribuições dos demais órgãos federais, com área de atuação direta ou indiretamente relacionada, nos termos da legislação vigente, com o patrimônio da União.
§ 3º As obrigações e prerrogativas previstas neste artigo poderão ser repassadas, no que couber, às entidades conveniadas ou contratadas na forma dos arts. 1º e 4º.
§ 4º Constitui obrigação do Poder Público federal, estadual e municipal, observada a legislação específica vigente, zelar pela manutenção das áreas de preservação ambiental, das necessárias à proteção dos ecossistemas naturais e de uso comum do povo, independentemente da celebração de convênio para esse fim.
(…)
Art. 18. A critério do Poder Executivo poderão ser cedidos, gratuitamente ou em condições especiais, sob qualquer dos regimes previstos no Decreto-Lei no 9.760, de 1946, imóveis da União a:
(…)
I - Estados, Distrito Federal, Municípios e entidades sem fins lucrativos das áreas de educação, cultura, assistência social ou saúde; (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007)
II - pessoas físicas ou jurídicas, em se tratando de interesse público ou social ou de aproveitamento econômico de interesse nacional. (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007)
§ 1º A cessão de que trata este artigo poderá ser realizada, ainda, sob o regime de concessão de direito real de uso resolúvel, previsto no art. 7º do Decreto-Lei nº 271, de 28 de fevereiro de 1967, aplicando-se, inclusive, em terrenos de marinha e acrescidos, dispensando-se o procedimento licitatório para associações e cooperativas que se enquadrem no inciso II do caput deste artigo. (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007)
§ 2º O espaço aéreo sobre bens públicos, o espaço físico em águas públicas, as áreas de álveo de lagos, rios e quaisquer correntes d’água, de vazantes, da plataforma continental e de outros bens de domínio da União, insusceptíveis de transferência de direitos reais a terceiros, poderão ser objeto de cessão de uso, nos termos deste artigo, observadas as prescrições legais vigentes.
(…)
Ora, ainda que se verifique que todas as “casas flutuantes” existentes se deslocam sobre o Rio Grande – o que, da análise dos autos não nos parece o caso (vide petição inicial da Ação Civil Pública e respectiva contestação – SEI 26874976, p. 05/18) –, tal fato não afastaria a competência da SPU de fiscalizar eventual ocupação irregular ao longo de bem da União (art. 20, III, da Constituição), de uso comum do povo, competência essa que obviamente não se confunde com a atribuída à autoridade marítima pela Lei nº 9.537/1997.
Este, inclusive, o entendimento constante do Ofício nº 27314/2017- MP (SEI 26874976, p. 83), que serviu de subsídio para a elaboração de contestação da União nos autos da Ação Civil Pública nº 0001026-33.2017.4036106, na qual consignado que (v. SEI 26874976, p. 61/68):
No que toca à regularização dos referidos dispositos não há lide, sendo certo que cabe à Secretaria do Patrimônio da União em São Paulo proceder à análise dos processos de regularização com base nos procedimentos previstos na Portaria SPU nº 404, de 28/11/2012, o que, diga-se de passagem, já é feito, conforme informações postas pela SPU-SP, através do Ofício nº 27314/2017- MP, de 12/04/2017 (doc. Anexo).
(…)
A atribuição fiscalizatória da Capitania Fluvial Tietê-Paranpa, quanto aos Dispositivos Flutuantes (DF) está adstrita à legislação de regência, senão vejamos.
(…)
Nesse ponto, vale ressaltar que a Capitania Fluvial, analisando o processo de instalação de um Dispositivo Flutuante (DF), tendo o requerente cumprido todas as exigências formais, não pode indeferir seu processo pelo simples fato de um DF causar poluição visual, mas sim por estar localizado num canal de navegação, o que não é o caso da região, cujos DF estão localizados às margens dos rios.
Destaque-se, ainda, que os DF são dispositivos desprovidos de propulsão e somente operam em local fixo e determinado, ou sejam, não se destinam a navegação. Portanto, se antenderem os requisitos formais e estiverem fora do canal, eles não geram risco à navegação.
A remoção ou destruição é feita em relação aos DF que prejudicam a segurança da navegação. (…).
(…)
Realce-se, por oportuno, que as dificuldades da SPU/SP para o exercício de sua competência fiscalizatória, expressamente consignadas na contestação apresentada pela União, não foram suficientes para convencimento do juízo, que expressamente se manifestou contrariamente ao pedido da União para determinação de que as medidas fiscalizatórias em relação ao objeto da demanda envolvesse mútua colaboração. Cita-se (SEI 26874976, p. 461):
Vale ressalatar, ainda, que ré/União insurge-se quanto à efetividade da fiscalização, argumentando que não dispõe de estrutura adequada que viabilize a fiscalização pleiteada.
A esse respeito, no entanto, entendo que não incumbe a este juízo determinar a participação e a colaboração de outros entes interessados, cabendo à ré/União, seja por meio de ato normativo infralegal, seja por acordo de cooperação ou convênio, propiciar meios para o cumprimento da efetiva fiscalização das plataformas fulutantes ao longo do Rio Grande e dos reservatórios de Água Vermelha e Marimbondo.
Afinal, a própria Lei nº 9.636/98, em seus art. 11, prevê que a Secretaria do Patrimônio da União – SPU, na incumbência de fiscalização do Patrimônio da União, poderá requisitar força policial federal e solicitar o necessário auxílio de força pública estadual.
Quanto a essa última ponderação, tem-se que, de fato, o art. 11 da Lei nº 9.636/1998 prevê essas prerrogativas, complementadas pela regra do § 1º, que cuida da possibilidade de solicitação de cooperação de força militar federal.
Visto isso, em resposta à consulta formulada, acerca “forma de atuação da SPU em casos de fiscalização e regularização de casas flutuantes móveis”, tem-se que deve ela se dar tal qual prevista na Lei nº 9.636/1998, atualmente regulamentada pela Portaria SPU nº 5.692, de 23 de junho de 2022, segundo a qual:
Art. 2º São enquadradas nesta portaria as estruturas náuticas edificadas sobre espaço físico de águas públicas de domínio da União, tais como lagos, rios, correntes d'água e mar territorial, até o limite de 12 milhas marítimas a partir da costa.
(…)
Art. 5º A cessão de uso a particulares de espaços físicos em águas públicas depende da demonstração de interesse público, social ou de aproveitamento econômico de interesse nacional e da manutenção do meio ambiente ecologicamente equilibrado.
§ 1º O interesse público das estruturas náuticas é caracterizado por funções de suporte a diversas atividades dentre elas:
I - transporte público de passageiros;
II - transporte regular de cargas para abastecimento de alimentos, medicamentos, material hospitalar, combustíveis e outros bens considerados essenciais;
III - proteção de fauna ou flora e educação ambiental; e
IV - prestação de serviços públicos.
§ 2º O aproveitamento econômico de interesse nacional é caracterizado por funções de suporte às seguintes atividades de geração de trabalho, emprego e renda, quando de acordo com políticas, planos e programas nacionais, tais como:
I - desenvolvimento da pesca;
II - desenvolvimento do turismo;
III - desenvolvimento urbano;
IV - exploração mineral; e
V - transporte de cargas ou passageiros.
(…)
Art. 18. As estruturas náuticas irregulares, existentes ou em instalação, deverão requerer sua regularização, sob pena de aplicação das penalidades previstas em lei.
§ 1º As obras de estruturas náuticas embargadas deverão permanecer paralisadas até sua regularização.
§ 2º As estruturas náuticas cujo requerimento de regularização for indeferido serão autuadas, multadas e deverão ter suas instalações removidas, à conta de quem as houver efetuado, nos termos do art. 6º, do Decreto-Lei nº 2.398, de 1987.
(…)
Assim é que, em consonância inclusive com o quanto decidido nos autos da Ação Civil Pública nº 0001026-33.2017.4036106, deve a SPU/SP analisar os requerimentos de regularização submetidos à sua apreciação, e, no caso de infederimento, autuar, multar e remover as instalações, nos termos do art. 6º do Decreto-Lei nº 2.398/1987, verbis:
Art. 6º Considera-se infração administrativa contra o patrimônio da União toda ação ou omissão que viole o adequado uso, gozo, disposição, proteção, manutenção e conservação dos imóveis da União.
I - (Revogado);
II - (Revogado).
§ 1º Incorre em infração administrativa aquele que realizar aterro, construção, obra, cercas ou outras benfeitorias, desmatar ou instalar equipamentos, sem prévia autorização ou em desacordo com aquela concedida, em bens de uso comum do povo, especiais ou dominiais, com destinação específica fixada por lei ou ato administrativo.
§ 2º O responsável pelo imóvel deverá zelar pelo seu uso em conformidade com o ato que autorizou sua utilização ou com a natureza do bem, sob pena de incorrer em infração administrativa.
§ 3º Será considerado infrator aquele que, diretamente ou por interposta pessoa, incorrer na prática das hipóteses previstas no caput.
§ 4º Sem prejuízo da responsabilidade civil, as infrações previstas neste artigo serão punidas com as seguintes sanções:
I - embargo de obra, serviço ou atividade, até a manifestação da União quanto à regularidade de ocupação;
II - aplicação de multa;
III - desocupação do imóvel;
IV - demolição e/ou remoção do aterro, construção, obra, cercas ou demais benfeitorias, bem como dos equipamentos instalados, à conta de quem os houver efetuado, caso não sejam passíveis de regularização.
§ 5º A multa será no valor de R$ 73,94 (setenta e três reais e noventa e quatro centavos) para cada metro quadrado das áreas aterradas ou construídas ou em que forem realizadas obras, cercas ou instalados equipamentos.
§ 6º O valor de que trata o § 5º será atualizado em 1º de janeiro de cada ano com base no Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), apurado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), e os novos valores serão divulgados em ato do Secretário de Patrimônio da União do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão.
§ 7º Verificada a ocorrência de infração, a Secretaria do Patrimônio da União do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão aplicará multa e notificará o embargo da obra, quando cabível, intimando o responsável para, no prazo de 30 (trinta) dias, comprovar a regularidade da obra ou promover sua regularização.
§ 8º (VETADO).
§ 9º A multa de que trata o inciso II do § 4º deste artigo será mensal, sendo automaticamente aplicada pela Superintendência do Patrimônio da União sempre que o cometimento da infração persistir.
§ 10. A multa será cominada cumulativamente com o disposto no parágrafo único do art. 10 da Lei no 9.636, de 15 de maio de 1998.
§ 11. Após a notificação para desocupar o imóvel, a Superintendência do Patrimônio da União verificará o atendimento da notificação e, em caso de desatendimento, ingressará com pedido judicial de reintegração de posse no prazo de 60 (sessenta) dias.
§ 12. Os custos em decorrência de demolição e remoção, bem como os respectivos encargos de qualquer natureza, serão suportados integralmente pelo infrator ou cobrados dele a posteriori, quando efetuados pela União.
§ 13. Ato do Secretário do Patrimônio da União do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão disciplinará a aplicação do disposto neste artigo, sendo a tramitação de eventual recurso administrativo limitada a 2 (duas) instâncias.
Quanto às casas flutuantes não objeto de requerimento de regularização, deve-se proceder na forma da Instrução Normativa SPU/ME nº 23, de 18 de março de 2020 (ou ato normativo em vigor), que “estabelece as diretrizes e procedimentos das atividades de fiscalização dos imóveis da União”, de cujo inteiro teor se destaca:
Art. 2º Entende-se por fiscalização a atividade desenvolvida pela SPU no exercício de seu poder de polícia, voltada à apuração de infrações administrativas contra o patrimônio imobiliário da União.
§ 1º No exercício do poder de polícia de que trata o caput, a SPU poderá valer-se de vistoria, requisitar força policial federal, solicitar o auxílio de força pública estadual ou a cooperação de força militar federal para os casos que envolvam segurança nacional ou relevante ofensa a valores, instituições ou patrimônio públicos.
§ 2º A fiscalização dar-se-á de ofício ou a pedido de qualquer interessado e terá caráter preventivo ou coercitivo, podendo ser feita em conjunto com outros órgãos ou entidades estaduais, municipais ou federais, conforme o interesse a ser protegido.
§ 3º Entende-se por caráter preventivo as ações proativas, que visem manter a integridade e uso adequado dos bens imóveis da União e por caráter coercitivo as ações que visam restaurar a integridade e a correta utilização dos bens imóveis da União.
§ 4º A fiscalização, quando exercida diretamente pela SPU, deverá ser efetuada, preferencialmente, por meio de equipe composta por pelo menos um servidor da SPU.
§ 5º Será considerado fiscal o servidor designado em Portaria assinado pelo Secretário de Coordenação e Governança do Patrimônio da União.
§ 6º A indicação dos servidores será feita pelo Superintende do Patrimônio da União nos Estados e Distrito Federal.
(…)
Seção IV
DA REMOÇÃO E DEMOLIÇÃO
Art. 14. A efetiva demolição e/ou remoção do aterro, construção, obra, cercas ou demais benfeitorias, bem como dos equipamentos instalados de que trata o inciso IV do art. 11 desta IN, poderá ser realizada em conjunto com órgão municipal ou estadual.
§ 1º A Superintendência do Patrimônio da União intimará o infrator para, no prazo máximo de 30 (trinta) dias, promover a demolição e/ou remoção do aterro, construção, obra, cercas ou demais benfeitorias, bem como dos equipamentos instalados.
§ 2º Se o infrator não implementar a demolição e/ou remoção, caberá a Superintendência tais medidas, observado o disposto no § 12 do art. 6º do Decreto-Lei nº 2.398, de 1987.
§ 3º A remoção deve ser aplicada concomitantemente com a aplicação da multa do art. 6º do Decreto-lei nº 2.398, de 1987.
Art. 15. As despesas decorrentes do procedimento de demolição e/ou remoção, efetuadas pela Superintendência do Patrimônio da União, serão encaminhadas ao infrator por meio de notificação para efetuar o pagamento, observado o disposto no § 3º do art. 11 desta IN.
§ 1º A notificação observará o disposto na Seção IV, do Capítulo IV, desta IN.
§ 2º Não se verificando o pagamento, a Superintendência do Patrimônio da União adotará as providências previstas no art. 48.
Art. 16.A demolição e/ou remoção será considerada como efetiva somente após vistoria realizada pela Superintendência do Patrimônio da União constatando o integral cumprimento da determinação administrativa.
Parágrafo único. Dispensa-se a vistoria de que trata o caput quando o agente responsável pela fiscalização acompanhar, in loco, a demolição e/ou remoção, atestando seu integral cumprimento.
(…)
Art. 48. Após 30 (trinta) dias da emissão do auto de infração, sem que o infrator tenha apresentado defesa, a Superintendência do Patrimônio da União efetuará vistoria no local da irregularidade, para verificar se foi removido ou demolido o aterro, construção, obra e/ou equipamentos instalados, procedendo, em caso negativo, à adoção das providências necessárias para tanto, no prazo de 30 (trinta) dias.
§ 1º A Superintendência do Patrimônio da União deverá providenciar a consolidação do débito, bem como sua inclusão no Cadastro Informativo de Créditos não Quitados do Setor Público Federal - CADIN.
§ 2º No prazo de 30 (trinta) dias após a inclusão do débito no CADIN e inexistindo comprovação de ter sido regularizada a situação que deu causa àquela inclusão, a SPU encaminhará os débitos à Procuradoria da Fazenda da Nacional para inscrição na Dívida Ativa da União - DAU.
§ 3º Certificar a ausência de defesa no processo, conforme § 3º do art. 34, e fazer o julgamento.
§ 4º Promover a remessa dos autos para reintegração de posse, e efetuar as demolições, se necessário.
Art. 49. A Superintendência do Patrimônio da União, sempre que necessário, deverá requerer à Advocacia Geral da União o ajuizamento de ações voltadas ao saneamento das infrações e à reparação dos prejuízos de que trata esta IN, observando inclusive os prazos estabelecidos no art. 34.
(…)
A fim de subsidiar a atuação da SPU/SP, digna de referência a atuação da SPU/MG em casos análogos (vide, v.g., NUP 10154.138389/2019-83, objeto do PARECER n. 00221/2020/CJU-MG/CGU/AGU).
III – Conclusão
Ante o exposto, claro está que a competência da autoridade marítima fixada na Lei nº 9.537/1997 não interfere no poder/dever de fiscalização imposto à SPU pela Lei nº 9.636/1998, devendo a SPU/SP proceder no caso em tela de acordo com as orientações constantes dos parágrafos 10 a 13 supra, e informar as suas ações à PRU3, em atenção ao Ofício nº 00021/2022/COREPAMNS/PRU3R/PGU/AGU (SEI 26874253).
É o parecer.
Belo Horizonte, 04 de novembro de 2022.
ANA LUIZA MENDONÇA SOARES
ADVOGADA DA UNIÃO
OAB/MG 96.194 - SIAPE 1507513
[1] Art. 2° Para os efeitos desta Lei, ficam estabelecidos os seguintes conceitos e definições:
(…)
V - Embarcação - qualquer construção, inclusive as plataformas flutuantes e, quando rebocadas, as fixas, sujeita a inscrição na autoridade marítima e suscetível de se locomover na água, por meios próprios ou não, transportando pessoas ou cargas;
Atenção, a consulta ao processo eletrônico está disponível em https://supersapiens.agu.gov.br mediante o fornecimento do Número Único de Protocolo (NUP) 10154144725202222 e da chave de acesso 8049ff1f