ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA DA UNIÃO ESPECIALIZADA VIRTUAL DE PATRIMÔNIO
NÚCLEO JURÍDICO
PARECER n. 00929/2022/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU
NUP: 19739.149591/2022-30
INTERESSADO: SUPERINTENDÊNCIA REGIONAL DO PATRIMÔNIO DA UNIÃO NO PIAUÍ - SPU/PI
ASSUNTO: CONSULTA E ORIENTAÇÃO DE ATUAÇÃO
EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO E OUTRAS MATÉRIAS DE DIREITO PÚBLICO. BENS PÚBLICOS. GESTÃO E GOVERNANÇA DO PATRIMÔNIO IMOBILIÁRIO DA UNIÃO. REGULARIZAÇÃO DE UTILIZAÇÃO DE IMÓVEL DA UNIÃO PARA FINS PRIVADOS. PROCEDIMENTOS ADMINISTRATIVOS PARA A INSCRIÇÃO DE OCUPAÇÃO E SEU CANCELAMENTO.
I - Consulta e orientação de atuação acerca dos procedimentos administrativos para a inscrição de ocupação.
II - Requerimentos de regularização de ocupação de imóvel da União.
III - Dúvida jurídica quanto aos requisitos para inscrição de ocupação e seu cancelamento.
IV - Fundamentação legal: Lei nº 9.636, de 15 de maio de 1998, Decreto-Lei nº 9.760, de 5 de setembro de 1946, Decreto nº 3.725, de 10 de janeiro de 2001 e Instrução Normativa nº 4, de 14 de agosto de 2018 (IN 04/2018).
V - Comprovação do tempo de ocupação para fins de inscrição de acordo com o art. 11 da Instrução Normativa nº 4, de 14 de agosto de 2018.
VI - Considerado efetivo aproveitamento, para efeitos de inscrição de ocupação, a utilização de área pública como residência ou local de atividades comerciais, industriais ou de prestação de serviços, e o exercício de posse nas áreas contíguas ao terreno ocupado pelas construções correspondentes, até o limite de duas vezes a área de projeção das edificações de caráter permanente, observada a legislação vigente sobre o parcelamento do solo, e nos termos do art. 2º, inc. I, "a" do Decreto nº 3.725, de 2001.
VII - Cancelamento de inscrição de ocupação, verificada a ocorrência do inciso VIII do art. 31 da Instrução Normativa nº 4, de 14 de agosto de 2018 (abandono), condicionado à notificação do ocupante regularmente inscrito, conferindo prazo de manifestação seguido de decisão administrativa motivada.
I - RELATÓRIO
1. A Superintendência do Patrimônio da União no Piauí - SPU/PI, encaminha o presente processo, para análise e manifestação, nos termos do artigo 11, inciso VI, alínea “b”, da Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993, que instituiu a Lei Orgânica da Advocacia-Geral da União e do artigo 19, incisos I e VI, do Ato Regimental nº 5, de 27 de setembro de 2007, do Advogado-Geral da União, combinados com o art. 38 da Lei nº 8.666.
2. O processo veio instruído com os documentos disponibilizados no link de acesso ao SEI que consta do DESPACHO n. 00142/2022/CJU-PI/CGU/AGU (Seq. 3):
28502367 Nota Informativa 36163
28578835 Ofício 264643
28647538 E-mail
3. Cuida-se de consulta e orientação de atuação acerca do alcance e aplicabilidade de dispositivos da INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 4, DE 14 DE AGOSTO DE 2018, que estabelece os procedimentos administrativos para a inscrição de ocupação em terrenos e imóveis da União, define procedimentos para a outorga, transferência, revogação e cancelamento, e estabelece a definição de efetivo aproveitamento.
4. As dúvidas jurídicas do órgão assessorado foram delimitadas através da Nota Informativa SEI nº 36163/2022/ME (SEI nº 28502367):
"QUESTÃO RELEVANTE:
Em procedimentos de análises referentes ao Instrumento de destinação na modalidade Inscrição de Ocupação, há, na Superintendência, algumas situações que emanam entendimentos diferentes por parte dos servidores. Em vista disso, optou-se por levar essas situações ao conhecimento da Consultoria Jurídica, a fim de consolidar e unificar o entendimento sobre esses pontos. Segue, abaixo, os itens objeto de controvérsia de entendimento, sobre processos que tramitam nesta Superintendência.
1. Há processos de pedido de Regularização de Imóveis sob a modalidade de Inscrição de Ocupação que chegam a esta Superintendência em que o requerente comprova estar na posse da área em data anterior a 10 de junho de 2014, comprova o efetivo aproveitamento da área, e também, não está inserida em uma das vedações previstas no 9º da lei 9636, de 1998, e do art. 12 da Instrução Normativa nº 04, de 14 de agosto de 2018, possuindo, dessa maneira, os requisitos para efetivação de sua Inscrição de Ocupação, porém a área em questão já está destinada (possui RIP).
O Art. 31 da Instrução Normativa supramencionada, trás o seguinte entendimento:
"Art. 31. São ainda causas para a revogação ou o cancelamento da inscrição de ocupação, a depender do caso:
I - solicitação do ocupante;
II - declaração de interesse do serviço público de área sob regime de inscrição de ocupação;
III - inadimplemento do pagamento das taxas de ocupação por 3 (três) anos consecutivos;
IV - ocorrência de dano ambiental decorrente da utilização da área inscrita;
V - ocorrência de dano ao patrimônio da União;
VI - uso contrário às posturas, zoneamento e legislação locais;
VII - impedimento do acesso às praias, às áreas de uso comum do povo, aos terrenos da União ou de terceiros; ou
VIII - abandono do imóvel.
§ 1º A revogação da inscrição de ocupação aplica-se aos casos dos incisos I e II do caput, e o cancelamento aplica-se aos casos em que a motivação ampare-se nos incisos III a VIII.
§ 2º Para fins do inciso VIII do caput, constitui-se abandono do imóvel a descontinuidade do efetivo aproveitamento nos termos especificados nesta IN, pelo período de 3 (três) anos consecutivos."
Tendo em vista o caso concreto acima exposto, em que o atual ocupante invadiu uma área já destinada a outro possuidor devidamente cadastrado. Nessa área, ele construiu um imóvel e lá já está a mais de três anos. Configuraria o abandono do imóvel e seria possível esta Superintendência proceder o cancelamento do ocupante antigo e cadastrar o novo, com fundamento no inciso VIII, do art. 31, da IN 04/2018?
2. Outro ponto em que há divergência de entendimento, seria quanto ao teor do inciso I, do art. 7º , da IN 04/2018, que está assim descrito:
Art. 7º Considera-se efetivo aproveitamento, para efeitos de inscrição de ocupação no caso de imóveis urbanos:
I - a utilização de área pública como residência ou local de atividades comerciais, industriais ou de prestação de serviços, e o exercício de posse nas áreas contíguas ao terreno ocupado pelas construções correspondentes, até o limite de duas vezes a área de projeção das edificações de caráter permanente, observada a legislação vigente sobre o parcelamento do solo, e nos termos do art. 2º, inc. I, "a" do Decreto nº 3.725, de 2001;
Com base no acima exposto, há servidores que entendem que a área ser concedida só seria de 2 vezes a área construída, outros entendem que a projeção de 2 vezes a área de construção, seria de áreas contíguas a todo o terreno, nesse caso, as áreas contíguas a todo o terreno em que também a construção está inserida é que seria de 2 vezes o tamanho da construção. Dessa maneira, submeto a interpretação desse artigo a esta Consultoria.
3. Há, também, entendimento diverso, no que se refere a comprovação do tempo de ocupação. Nesse ponto, há servidores que entendem que a comprovação do tempo de ocupação deve ser feita única e exclusivamente em nome do requerente, devendo o documento que ele usou para comprovar tal fato esteja em seu nome. Já, há outros servidores, que entendem que o requerente pode mesmo sem o documento estar em seu nome, comprovar a cadeia sucessória de posse do imóvel. De forma que comprove que o imóvel que está na sua posse atualmente é derivado de um possuidor que tem o documento que comprove a antiguidade requerida pela lei. Dessa maneira, peço, a essa Consultoria, manifestação quanto a este quesito.
Para efeito do lapso temporal para concessão de Inscrição de Ocupação, é considerado o teor do inciso I, art. 9º, da lei 9636, de 15 de maio de 1988, abaixo descrito:
"Art. 9º É vedada a inscrição de ocupações que:
I - ocorreram após 10 de junho de 2014;".
É o relatório.
II - FINALIDADE E ABRANGÊNCIA DO PARECER
5. Esta manifestação jurídica tem a finalidade de assistir a autoridade assessorada no controle interno da legalidade administrativa. A função do órgão de consultoria é apontar possíveis riscos do ponto de vista jurídico e recomendar providências para salvaguardar o Gestor Público, a quem compete avaliar a real dimensão do risco e a necessidade de se adotar ou não a precaução recomendada.
6. Importante salientar que o exame dos autos restringe-se aos seus aspectos jurídicos, excluídos, portanto, aqueles de natureza técnica e/ou financeira. Em relação a estes, partiremos da premissa de que a autoridade assessorada municiou-se dos conhecimentos específicos imprescindíveis para a sua adequação às necessidades da Administração, observando os requisitos legalmente impostos.
7. De outro lado, cabe esclarecer que não é papel do órgão de assessoramento jurídico exercer a auditoria quanto à competência de cada agente público para a prática de atos administrativos. Incumbe, isto sim, a cada um destes, observar se os seus atos estão dentro do seu limite de competências.
8. Destaque-se que determinadas observações são feitas sem caráter vinculativo, mas em prol da segurança da própria autoridade assessorada, a quem compete, dentro da margem de discricionariedade que lhe é conferida pela lei, avaliar e acatar, ou não, tais ponderações. Não obstante, as questões relacionadas à legalidade serão apontadas para fins de sua correção. O seguimento do processo sem a observância destes apontamentos será de responsabilidade exclusiva do(s) agente(s) público(s) envolvido(s).
9. Assim, caberá tão somente a esta Consultoria, à luz do art. 131 da Constituição Federal de 1988 e do art. 11 da Lei Complementar nº 73, de 1993, prestar assessoramento sob o enfoque estritamente jurídico, não sendo competência deste órgão consultivo o exame da matéria em razão das motivações técnicas, nem da oportunidade e conveniência, tampouco fazer juízo crítico sobre cálculos e avaliações, ou mesmo invadir o campo relacionado à necessidade material no âmbito do órgão assessorado.
10. Portanto, esta manifestação limita-se às dúvidas jurídicas quanto ao alcance e aplicabilidade de dispositivos da Instrução Normativa nº 4, de 14 de agosto de 2018 consignadas na Nota Informativa SEI nº 36163/2022/ME (SEI nº 28502367), salvaguardando, sobretudo, no que refere à esfera discricionária do Administrador e à matéria eminentemente técnica (não jurídica), o que orienta o Enunciado nº 7 do Manual de Boas Práticas Consultivas da Advocacia-Geral da União, no sentido de que:
"O Órgão Consultivo não deve emitir manifestações conclusivas sobre temas não jurídicos, tais como os técnicos, administrativos ou de conveniência ou oportunidade, sem prejuízo da possibilidade de emitir opinião ou fazer recomendações sobre tais questões, apontando tratar-se de juízo discricionário, se aplicável. Ademais, caso adentre em questão jurídica que possa ter reflexo significativo em aspecto técnico deve apontar e esclarecer qual a situação jurídica existente que autoriza sua manifestação naquele ponto".
III – FUNDAMENTAÇÃO
11. A LEI Nº 9.636, DE 15 DE MAIO DE 1998, que dispõe sobre a regularização, administração, aforamento e alienação de bens imóveis de domínio da União, altera dispositivos dos Decretos-Leis nos 9.760, de 5 de setembro de 1946, e 2.398, de 21 de dezembro de 1987, regulamenta o § 2º do art. 49 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, e dá outras providências, disciplina a inscrição da ocupação do seguinte modo:
“Da Inscrição da Ocupação
(Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007)
Art. 7º A inscrição de ocupação, a cargo da Secretaria do Patrimônio da União, é ato administrativo precário, resolúvel a qualquer tempo, que pressupõe o efetivo aproveitamento do terreno pelo ocupante, nos termos do regulamento, outorgada pela administração depois de analisada a conveniência e oportunidade, e gera obrigação de pagamento anual da taxa de ocupação. (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007)
§ 1º É vedada a inscrição de ocupação sem a comprovação do efetivo aproveitamento de que trata o caput deste artigo. (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)
§ 2º A comprovação do efetivo aproveitamento será dispensada nos casos de assentamentos informais definidos pelo Município como área ou zona especial de interesse social, nos termos do seu plano diretor ou outro instrumento legal que garanta a função social da área, exceto na faixa de fronteira ou quando se tratar de imóveis que estejam sob a administração do Ministério da Defesa e dos Comandos da Marinha, do Exército e da Aeronáutica. (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)
§ 3º A inscrição de ocupação de imóvel dominial da União, a pedido ou de ofício, será formalizada por meio de ato da autoridade local da Secretaria do Patrimônio da União em processo administrativo específico. (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)
§ 4º Será inscrito o ocupante do imóvel, tornando-se este o responsável no cadastro dos bens dominiais da União, para efeito de administração e cobrança de receitas patrimoniais. (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)
§ 5º As ocupações anteriores à inscrição, sempre que identificadas, serão anotadas no cadastro a que se refere o § 4º. (Redação dada pela Lei nº 13.139, de 2015)
§ 6º Os créditos originados em receitas patrimoniais decorrentes da ocupação de imóvel da União serão lançados após concluído o processo administrativo correspondente, observadas a decadência e a inexigibilidade previstas no art. 47 desta Lei. (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)
§ 7º Para fins de regularização nos registros cadastrais da Secretaria do Patrimônio da União do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão das ocupações ocorridas até 10 de junho de 2014, as transferências de posse na cadeia sucessória do imóvel serão anotadas no cadastro dos bens dominiais da União para o fim de cobrança de receitas patrimoniais dos responsáveis, independentemente do prévio recolhimento do laudêmio. (Redação dada pela Lei nº 13.813, de 2019)
Art. 8º Na realização do cadastramento ou recadastramento de ocupantes, serão observados os procedimentos previstos no art. 128 do Decreto-Lei no 9.760, de 5 de setembro de 1946, com as alterações desta Lei.
Art. 9° É vedada a inscrição de ocupações que:
I - ocorreram após 10 de junho de 2014; (Redação dada pela Lei nº 13.139, de 2015)
II - estejam concorrendo ou tenham concorrido para comprometer a integridade das áreas de uso comum do povo, de segurança nacional, de preservação ambiental ou necessárias à preservação dos ecossistemas naturais e de implantação de programas ou ações de regularização fundiária de interesse social ou habitacionais das reservas indígenas, das áreas ocupadas por comunidades remanescentes de quilombos, das vias federais de comunicação e das áreas reservadas para construção de hidrelétricas ou congêneres, ressalvados os casos especiais autorizados na forma da lei. (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007)
Art. 10. Constatada a existência de posses ou ocupações em desacordo com o disposto nesta Lei, a União deverá imitir-se sumariamente na posse do imóvel, cancelando-se as inscrições eventualmente realizadas.
Parágrafo único. Até a efetiva desocupação, será devida à União indenização pela posse ou ocupação ilícita, correspondente a 10% (dez por cento) do valor atualizado do domínio pleno do terreno, por ano ou fração de ano em que a União tenha ficado privada da posse ou ocupação do imóvel, sem prejuízo das demais sanções cabíveis.” (grifado e destacado)
12. Ao estabelecer os procedimentos administrativos para a inscrição de ocupação em terrenos e imóveis da União, definir procedimentos para a outorga, transferência, revogação e cancelamento, e estabelecer a definição de efetivo aproveitamento, a INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 4, DE 14 DE AGOSTO DE 2018 (IN 04/2018), com vigência restaurada pela Portaria SPU/ME nº 9.220, de 2 de agosto de 2021, publicada no DOU nº 145, de 03/08/2021, assim dispõe:
“CAPÍTULO I
DAS DEFINIÇÕES E OBJETIVOS
Art. 1º. ....
Art. 2º Para efeito dessa IN, considera-se:
I - inscrição de ocupação: ato administrativo precário, resolúvel a qualquer tempo, por meio do qual a União reconhece a utilização de áreas de seu domínio, desde que comprovado o efetivo aproveitamento do terreno pelo ocupante e o preenchimento dos demais requisitos legais, não gerando para o inscrito qualquer direito inerente à propriedade.
II - taxa de ocupação: prestação pecuniária anual que o ocupante do bem imóvel da União deve pagar pelo uso do terreno de domínio da União, correspondente a 2% do valor do domínio pleno do terreno, excluídas as benfeitorias, anualmente atualizado pela Secretaria do Patrimônio da União - SPU; e
....
CAPÍTULO II
DA INSCRIÇÃO DE OCUPAÇÃO
Art. 3º A inscrição de ocupação é um instrumento de destinação transitória de imóvel da União, devendo ser prioritariamente utilizados os demais instrumentos de destinação previstos na legislação patrimonial, visando à consolidação do uso destas áreas.
....
Art. 5º O processo de inscrição de ocupação será iniciado:
I - de ofício pela SPU, nos termos do art. 7º, § 3º da Lei nº 9.636, de 1998;
II - a pedido do interessado, nos termos do art. 7º, § 3º da Lei nº 9.636, de 1998; ou
III - por determinação judicial.
Parágrafo único. No caso do inc. II do caput, a solicitação será feita mediante o requerimento eletrônico "Regularizar Utilização de Imóvel da União para Fins Privados", disponível no Portal de Serviços da SPU (patrimoniodetodos.planejamento.gov.br), no qual deverá ser anexada a documentação obrigatória e complementar necessária para prosseguimento do processo.
CAPÍTULO III
DOS REQUISITOS PARA INSCRIÇÃO DE OCUPAÇÃO
Seção I
Dos Requisitos
Art. 6º A inscrição de ocupação somente ocorrerá quando forem preenchidos os seguintes requisitos legais e normativos:
I - comprovação do efetivo aproveitamento;
II - interessado comprovar que a ocupação do imóvel ocorreu até a data prevista no inc. I do art. 9º da Lei nº 9.636, de 1998; e
III - que o imóvel não esteja inserido nas vedações do art. 9º da Lei nº 9.636, de 1998, e do art. 12 desta IN.
Seção II
Da Caracterização do Efetivo Aproveitamento
Art. 7º Considera-se efetivo aproveitamento, para efeitos de inscrição de ocupação no caso de imóveis urbanos:
I - a utilização de área pública como residência ou local de atividades comerciais, industriais ou de prestação de serviços, e o exercício de posse nas áreas contíguas ao terreno ocupado pelas construções correspondentes, até o limite de duas vezes a área de projeção das edificações de caráter permanente, observada a legislação vigente sobre o parcelamento do solo, e nos termos do art. 2º, inc. I, "a" do Decreto nº 3.725, de 2001;
II - as faixas de terrenos de marinha e de terrenos marginais que não possam constituir unidades autônomas utilizadas pelos proprietários de imóveis lindeiros, excluídas aquelas áreas ocupadas por comunidades tradicionais;
III - a detenção de imóvel da União fundada em título de propriedade registrado no Cartório de Registro de Imóveis sob a suposição de se tratar de bem particular; ou
IV - a detenção de imóvel que, embora não edificado, esteja na posse de particular com base em título registrado em Cartório outorgado pelo Estado ou Município na suposição de que se tratassem de terrenos alodiais.
Parágrafo único. Na hipótese do inciso I do caput, poderão ser inscritas as áreas de acesso necessárias e indispensáveis ao terreno que se encontre totalmente encravado, bem como as áreas remanescentes que não puderem constituir unidades autônomas, incorporando-se à inscrição principal.” (grifos e destaques)
Questão 1 da consulta - cancelamento de inscrição por abandono
13. Indicados os normativos que regem a inscrição de ocupação, a primeira dúvida pontual da SPU/PI refere-se especificamente à hipótese de cancelamento da ocupação (SEI nº 28502367).
14. O DECRETO-LEI Nº 9.760, DE 5 DE SETEMBRO DE 1946, que dispõe sobre os bens imóveis da União e dá outras providências, quanto a transferência do direito de ocupação, estabelece:
"Art. 132-A. Efetuada a transferência do direito de ocupação, o antigo ocupante, exibindo os documentos comprobatórios, deverá comunicar a transferência à Superintendência do Patrimônio da União, no prazo de até sessenta dias, sob pena de permanecer responsável pelos débitos que vierem a incidir sobre o imóvel até a data da comunicação. (Incluído pela Lei nº 13.465, de 2017)”
15. No caso desta consulta, não se trata de transferência do direito de ocupação, mas sim de possibilidade de proceder nova inscrição, em favor do atual detentor do imóvel, tendo em vista a sua perda pelo ocupante anteriormente inscrito.
16. Adquire-se a posse, reza o art. 1.204 do Código Civil, "desde o momento em que se torna possível o exercício, em nome próprio, de qualquer dos poderes inerentes à propriedade".
17. No que diz respeito à perda da posse, assim foi definido adiante:
"Art. 1.223. Perde-se a posse quando cessa, embora contra a vontade do possuidor, o poder sobre o bem, ao qual se refere o art. 1.196.
Art. 1.224. Só se considera perdida a posse para quem não presenciou o esbulho, quando, tendo notícia dele, se abstém de retornar a coisa, ou, tentando recuperá-la, é violentamente repelido." (grifado e destacado).
18. Vê-se, então, que a perda da posse pode se dar de maneira involuntária, na ocorrência do esbulho (invasão), ou mesmo de modo voluntário quando do abandono da coisa.
19. Portanto, a detenção irregular do imóvel da União não significa, necessariamente, que a área encontra-se sendo utilizada por terceiro em decorrência de renúncia inequívoca do ocupante (aquele que exerce a posse em nome da União), razão pela qual não é possível automaticamente, pela simples presença do terceiro em situação irregular, embasar o cancelamento da inscrição sob o argumento de "abandono do imóvel", hipótese prevista no inciso VIII do art. 31 da IN 04/2018) ou, ainda, supor que houve desistência de reaver a utilização da coisa.
20. No entanto, o abandono do imóvel poderá restar configurado, após regular procedimento fiscalizatório, possibilitando dessa forma o cancelamento da inscrição da ocupação e formalização de nova inscrição, desde que atendidos os pressupostos legais e normativos para o seu deferimento.
21. Nesse sentido, observe-se os procedimentos para revogação e cancelamento da inscrição de ocupação estabelecidos na IN 04/2018, verbis:
"CAPÍTULO VIII
DA REVOGAÇÃO E DO CANCELAMENTO
DA INSCRIÇÃO DE OCUPAÇÃO
Seção I
Dos Procedimentos
Art. 28. À União não são oponíveis direitos possessórios decorrentes do exercício de ocupação regularmente inscrita, podendo a inscrição de ocupação ser revogada ou cancelada mediante decisão fundamentada do Superintendente do Patrimônio da União, observadas a conveniência e a oportunidade administrativas.
Art. 29. O Secretário do Patrimônio da União pode, a qualquer tempo, por motivos relevantes devidamente justificados, avocar a revogação ou o cancelamento de qualquer inscrição de ocupação que contrarie o interesse público ou a legislação patrimonial.
Art. 30. Os imóveis passíveis de cancelamento ou revogação de inscrição de ocupação, devem ser identificados por intermédio de relatórios, circunstâncias relatadas em processos administrativos, requerimento de terceiros ou do ocupante, ou ato de ofício dos servidores da SPU/UF.
Art. 31. São ainda causas para a revogação ou o cancelamento da inscrição de ocupação, a depender do caso:
I - solicitação do ocupante;
II - declaração de interesse do serviço público de área sob regime de inscrição de ocupação;
III - inadimplemento do pagamento das taxas de ocupação por 3 (três) anos consecutivos;
IV - ocorrência de dano ambiental decorrente da utilização da área inscrita;
V - ocorrência de dano ao patrimônio da União;
VI - uso contrário às posturas, zoneamento e legislação locais;
VII - impedimento do acesso às praias, às áreas de uso comum do povo, aos terrenos da União ou de terceiros; ou
VIII - abandono do imóvel.
§ 1º A revogação da inscrição de ocupação aplica-se aos casos dos incisos I e II do caput, e o cancelamento aplica-se aos casos em que a motivação ampare-se nos incisos III a VIII.
§ 2º Para fins do inciso VIII do caput, constitui-se abandono do imóvel a descontinuidade do efetivo aproveitamento nos termos especificados nesta IN, pelo período de 3 (três) anos consecutivos.
Art. 32. No caso do inc. III do art. 31, a SPU/UF deverá notificar o responsável do inadimplemento de seus débitos conforme os procedimentos previstos na Instrução Normativa SPU nº 001, de 2015.
§ 1º o débito, ou comunicada idêntica ocorrência pela Procuradoria da Fazenda Nacional (de ofício, pelo Procurador da Fazenda Nacional, ou a requerimento da SPU/UF), quando existente Executivo Fiscal, poderá ser apreciado requerimento do interessado no restabelecimento da inscrição de ocupação, desde que ausente interesse público em sentido contrário, ouvindo-se previamente a Procuradoria Regional da União quanto à viabilidade de extinção da Ação eventualmente proposta.
§ 2º Cancelada a inscrição de ocupação e ainda não adotada a providência administrativa da SPU/UF necessária à propositura de medida judicial de reintegração de posse, a SPU/UF poderá, a requerimento do interessado, restabelecer a inscrição de ocupação, mediante prévia regularização das receitas inadimplidas, diretamente na SPU/UF ou, quando for o caso, perante a Procuradoria da Fazenda Nacional.
Art. 33. Verificadas as ocorrências dos incisos IV a VIII do art. 31, a SPU/UF notificará o ocupante, para, no prazo de 30 (trinta) dias contados do recebimento do AR, ou da publicação de edital, comprovar a reversão dos danos ou a adequação devida.
Parágrafo único. Nos casos do caput a SPU/UF deve verificar a possibilidade de celebração de termo de compromisso nos moldes dos art. 19 da Instrução Normativa SPU nº 01, de 2017 que disciplina a atividade de fiscalização dos imóveis da União.
Art. 34. Para fins da indenização por ocupação irregular e desocupação dos imóveis da União aplicar-se-á o disposto nos arts. 11 e 12 da Instrução Normativa SPU nº 01, de 2017.
Art. 35. Os procedimentos de notificação, contagem de prazos, defesa, instrução e julgamento, recurso, entre outros que se façam necessários, devem seguir a Instrução Normativa SPU nº 01, de 2017, no que couber."
22. Sendo assim, comprovada a descontinuidade do efetivo aproveitamento nos termos especificados na IN, pelo período de 3 (três) anos consecutivos, restará configurado o abandono e a inscrição da ocupação poderá ser cancelada com fulcro no inciso VIII do art. 31, mas desde que observado o procedimento dos arts. 33 e 35, com a notificação do ocupante para apresentar manifestação ou defesa antes da decisão fundamentada do Superintendente do Patrimônio da União de Piauí.
Questão 2 da consulta - efetivo aproveitamento e área de projeção de ocupação:
23. A dúvida quanto à demonstração do efetivo aproveitamento, para efeitos de inscrição de ocupação, refere-se ao parâmetro estabelecido no inciso I do art. 7º da IN/2018, que disciplina os procedimentos administrativos para a constituição, cancelamento e revogação de inscrição de ocupação em imóveis da União, administrados pela Secretaria do Patrimônio da União - SPU, verbis:
“Art. 7º Considera-se efetivo aproveitamento, para efeitos de inscrição de ocupação no caso de imóveis urbanos:
I - a utilização de área pública como residência ou local de atividades comerciais, industriais ou de prestação de serviços, e o exercício de posse nas áreas contíguas ao terreno ocupado pelas construções correspondentes, até o limite de duas vezes a área de projeção das edificações de caráter permanente, observada a legislação vigente sobre o parcelamento do solo, e nos termos do art. 2º, inc. I, "a" do Decreto nº 3.725, de 2001;” (grifos e destaques)
24. Vê-se que a IN reproduziu o que dispõe a alínea "a" do inciso I do art. 2º do DECRETO Nº 3.725, DE 10 DE JANEIRO DE 2001, que regulamenta a Lei nº 9.636, de 15 de maio de 1998, que dispõe sobre a regularização, administração, aforamento e alienação de bens imóveis de domínio da União. Leia-se:
“Art. 2º Considera-se para a finalidade de que trata o art. 6º da Lei nº 9.636, de 1998:
I - efetivo aproveitamento:
a) a utilização de área pública como residência ou local de atividades comerciais, industriais ou de prestação de serviços, ou rurais de qualquer natureza, e o exercício de posse nas áreas contíguas ao terreno ocupado pelas construções correspondentes, até o limite de duas vezes a área de projeção das edificações de caráter permanente; e” (grifado e destacado)
25. Considerou-se, pois, efetivo aproveitamento a utilização, além da área construída (residência ou atividades comerciais, industriais ou outras), as áreas contíguas ao terreno ocupado por essas construções, até o limite de duas vezes a área de projeção das edificações.
26. A projeção da edificação, sem rigores técnicos, relaciona-se à área ocupada pela construção sobre a área total do terreno. Assim, as construções ocupam parcela do terreno, considerando-se, então, efetivo aproveitamento, tanto a área ocupada pela construção quanto as áreas do terreno contíguas à área ocupado pela edificação, até o limite de duas vezes a área de projeção.
27. Portanto, o limite de área refere-se ao mesmo terreno em que se projeta a edificação, não parecendo autorizar, a legislação, considerar efetivo aproveitamento toda a área de um terreno em que se encontrar uma edificação, ainda conferindo, por interpretação, um "direito" a outros terrenos contíguos no limite de duas vezes a projeção da edificação do terreno construído.
28. O intuito, aqui, não é garantir a presunção de efetivo aproveitamento de toda e qualquer área de um terreno que contenha uma edificação, acrescido ainda de áreas de terrenos contíguos. Logo, limita-se a área do mesmo terreno a ser considerada como de efetivo aproveitamento a apenas duas vezes a área da projeção da edificação. Mesmo porque, a projeção de uma edificação ocorre em relação ao terreno em que esta se encontra, e não aos terrenos contíguos.
Questão 3 - Comprovação do Tempo de Ocupação pelo interessado
29. Rememorando as transcrições dos dispositivos da IN 4/2018, considere-se que seu art. 2º, ao definir a inscrição de ocupação como ato ato administrativo precário e resolúvel, condicionou o reconhecimento da utilização de áreas do domínio da União à comprovação do efetivo aproveitamento do terreno pelo ocupante.
30. Além da comprovação do efetivo aproveitamento, o art. 6º da mesma IN exige do do interessado
" comprovar que a ocupação do imóvel ocorreu até a data prevista no inc. I do art. 9º da Lei nº 9.636, de 1998; e"
31. O inciso II desse art. 6º remete ao inciso I do art. 9º da Lei nº 9.636/1998, que veda a inscrição de ocupação que ocorreram a partir de 10 de junho de 2014. Veja-se:
“Art. 9º É vedada a inscrição de ocupações que:
I - ocorreram após 10 de junho de 2014; (Redação dada pela Lei nº 13.139, de 2015)” (grifado)
32. Da leitura acima, é possível compreender, então, que a exigência legal é no sentido da comprovação de que o imóvel já se encontrava ocupado em 10 de junho de 2014, não estabelecendo a necessidade de que o próprio interessado requerente estivesse na detenção da área durante todo o período pretérito da ocupação.
33. Inclusive, ao exemplificar os meios de prova do tempo da ocupação, o art. 11 da IN 4/2018 em nenhum momento exige que o interessado na inscrição faça prova de que ele mesmo se encontrava na titularidade da detenção da área durante todo o período em que o imóvel restou ocupado. Ou seja, exigiu-se a comprovação do tempo de ocupação, e não a titularidade da detenção exclusivamente na pessoa do requerente da inscrição. Leia-se:
“Da Comprovação do Tempo de Ocupação
Art. 11. Para fins de comprovação do tempo da ocupação, para imóveis urbanos e rurais, o interessado deverá apresentar, sem prejuízo de outros meios admitidos em direito:
I - "habite-se", alvarás, declaração de entidades e órgãos públicos atestando a idade da edificação do imóvel ou do uso do terreno;
II - lançamento da edificação em carnê de Imposto Predial e Territorial Urbano - IPTU;
III - carnê de Imposto sobre Propriedade Territorial Rural - ITR;
IV - relatório de acompanhamento de entidade de assessoramento agrícola e extensão rural; ou
V - laudo firmado por profissional habilitado pelo CREA ou CAU.”
IV – CONCLUSÃO
34. Ante o exposto, nos limites da consulta formulada, considerando que a orientação promovida por este consultivo especializado é quanto ao controle de legalidade da Administração, não implicando conferência de documentos, matérias de cálculo, técnicas ou financeiras, ou mesmo deliberação, que é prerrogativa do gestor público, recomenda-se o encaminhamento da presente manifestação jurídica ao órgão consulente, para prosseguimento do feito, uma vez respondidas as indagações contidas na Nota Informativa SEI nº 36163/2022/ME (SEI nº 28502367).
Brasília, 16 de novembro de 2022.
LEANDRA MARIA ROCHA MOULAZ
ADVOGADA DA UNIÃO - OAB/ES 7.792
Matrícula 13326678
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