ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
DEPARTAMENTO DE COORDENAÇÃO E ORIENTAÇÃO DE ÓRGÃOS JURÍDICOS


 

PARECER-PLENÁRIO Nº 03/2016/CNU-DECOR/CGU/AGU (17/08/2016)

 

NUP: 05100.200059/2015-86

INTERESSADOS: CONSULTORIA JURÍDICA JUNTO AO MINISTÉRIO DO PLANEJAMENTO, ORÇAMENTO E GESTÃO - CONJUR/MPOG E SECRETARIA DE GESTÃO PÚBLICA - SEGEP/MPOG.   

ASSUNTOS: REVISÃO DE ENTENDIMENTO. SUSPENSÃO DO ESTÁGIO PROBATÓRIO ENQUANTO O SERVIDOR ESTIVER EM GOZO DE LICENÇA. 

 

 

ORIENTAÇÃO NORMATIVA CNU/CGU/AGU nº  03, de 17 de agosto de 2016

 

O gozo da licença gestante, da licença adotante e da licença paternidade não implica a suspensão da contagem do prazo do estágio probatório previsto no art. 41, § 4º, da Constituição.

 

Referências: Art. 6º, art. 7º, incisos XVIII e XIX, art. 41, § 4º, art. 203, inciso I, arts. 226 a 230, da Constituição; art. 10, ADCT; art. 20, §§ 4º e 5º, art. 102, arts. 207 a 210, da Lei nº 8.112/90.

 

EMENTA:

 

CONSTITUCIONAL. DIREITOS FUNDAMENTAIS. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. ESTÁGIO PROBATÓRIO (ART. 41, CAPUT, E § 4º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL) – HIPÓTESES DE SUSPENSÃO (ART. 20, § 4º E 5º, DA LEI nº 8.112/90). LICENÇA-GESTANTE, ADOTANTE E LICENÇA PATERNIDADE (ART. 207 A 210, LEI nº 8.112/90). EFETIVO EXERCÍCIO (ART. 102, VII, “A”, LEI nº 8.112/90). LEGALIDADE ADMINISTRATIVA. FUNDAMENTOS PARA A REFORMA DO ATUAL ENTENDIMENTO ADOTADO PELA CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO NOS PARECERES nº 79/2011/DECOR/CGU/AGU, nº 18/2011/CGU/AGU, e nº 10/2011/MCA/CGU/AGU.

 

I. O legislador especificou, no art. 20, § 5º, da Lei n.º 8.112/90, as hipóteses que suspendem a contagem do prazo dos 3 (três) anos do estágio probatório, onde não constam as licenças à gestante, ao (à) adotante e à paternidade. A mera existência desse rol, no art. 20, § 5º, da Lei n.º 8.112/90, demonstra de forma suficiente que a premissa defendida pelos Pareceres que se pretende revisar (a de que apenas os servidores em atividade de fato podem ser alvo de avaliação durante o estágio probatório, sob pena de suspensão do prazo) está equivocada.

 

II. Não estando expressamente previstas no art. 20, § 5º, da Lei nº 8.112/90, as licenças à gestante, ao (à) adotante e à paternidade não devem ser consideradas causas suspensivas do prazo examinado, razão porque, sendo o afastamento o exercício regular de um direito, há que se considerar período justificado de forma suficiente nas avaliações feitas pela Comissão constituída para essa finalidade. Além disso, as licenças à gestante, ao (à) adotante e à paternidade foram prescritas como efetivo exercício para todos os efeitos (art. 102, VII, “a”, Lei n.º 8.112/90).

 

 

III. A Administração Pública está submetida ao princípio da legalidade e, portanto, a suspensão do estágio probatório, por se tratar de medida restritiva de direito, não pode ser interpretada ampliativamente pelo administrador, a fim de se estender a hipóteses não previstas em lei que sejam capazes de gerar a suspensão do período de avaliação e, consequentemente, postergar a aquisição de direitos pelo servidor.

 

IV. As licenças à gestante, à(ao) adotante e a licença paternidade são direitos fundamentais assegurados pela Constituição. Dessa forma, a interpretação da legislação infraconstitucional (da Lei n. 8.112/90) deve ser sempre no sentido de dar a máxima efetividade às licenças em questão, afastando qualquer entendimento que signifique que o seu pleno usufruto possa trazer prejuízos (pessoais, funcionais, etc.) ao seu titular (mãe, pai ou adotante). Na qualidade de direitos fundamentais, também obrigam os Poderes Públicos a criar, executar e manter uma série de normas, órgãos e procedimentos para a sua efetiva realização, de modo que é dever da Administração Pública criar todas as condições para que os atos e procedimentos de avaliação de estágio probatório sejam efetivados sem que isso implique restrições ao pleno desfrute das licenças à gestante, ao (à) adotante e à licença paternidade.

 

V. O Estado brasileiro está inserido em um sistema supranacional de proteção dos direitos das mulheres, especialmente contra todo tipo de discriminação, e que dão específica importância às questões relacionadas ao ambiente de trabalho. É justamente dentro desse contexto, nacional e supranacional, que o Estado brasileiro deve atuar com vistas à proteção, garantia e efetivação do direito fundamental à licença maternidade, em sua leitura constitucional mais ampla, como expressão da dignidade da mulher, da proteção da família e da criança e da efetiva igualdade de gênero. Compete, assim, à Administração Pública envidar todos os esforços para interpretar e aplicar as normas pertinentes (especialmente a Lei 8.112/90) de modo a apreender o correto entendimento do significado normativo do direito fundamental à licença à gestante, e, sendo necessário, modificar e aperfeiçoar normas e procedimentos para tornar possível o seu mais amplo usufruto e impedir que esse exercício represente algum obstáculo ao gozo da licença e, portanto, ao livre desenvolvimento da personalidade feminina e à efetiva proteção da criança e de sua família.

 

VI. O Supremo Tribunal Federal, no RE n.º 658.312/SC, afirmou que a igualdade entre os gêneros é um direito fundamental, cláusula pétrea de nosso ordenamento. A licença à gestante é uma licença gozada apenas pelas mulheres e, de fato, são inúmeras são as carreiras do serviço público cuja legislação prevê progressão ou benefícios apenas após a confirmação no estágio probatório. Suspender o prazo do estágio probatório e adiar a aquisição da estabilidade para as mulheres significa a imposição de tratamento discriminatório às mulheres (artigo 5º, CF/88) e intromissão indevida no planejamento familiar (§ 7º, art. 226, CF/88).

 

VII. Revogação dos Pareceres nº 79/2011/DECOR/CGU/AGU, nº 18/2011/CGU/AGU e n.º 10/2011/MCA/CGU/AGU, no que referem à licença à gestante, à licença ao (à) adotante e à licença paternidade, passando a vigorar o entendimento de que a licença gestante, a licença adotante e a licença paternidade (art. 207 a 210 da Lei n.º 8.112/90) não suspendem a contagem do prazo do estágio probatório previsto no art. 41 da Constituição de 1988.

 

 

I – RELATÓRIO:

 

Tratam os autos de pedido formulado pela Secretaria de Gestão Pública – SEGEP/MP (‘Nota Técnica n.º 07/2015/CGNOR/DENOP/SEGEP/MP’) e pela Consultoria Jurídica junto ao Ministério do Planejamento (Parecer nº 00249/2015/TLC/CGJRH/CONJUR-MP/CGU/AGU), para que seja revisado o entendimento adotado pela Consultoria-Geral da União nos Pareceres nº 79/2011/DECOR/CGU/AGU, nº 18/2011/CGU/AGU e nº 10/2011/MCA/CGU/AGU- acerca da suspensão do estágio probatório a que está submetido o servidor público, por força do art. 20 da Lei nº 8.112, de 1990, quando estiver usufruindo das licenças à gestante, à adotante e à paternidade (art. 207 a 210, Lei n.º 8.112/90). 

 

Nesses Pareceres (‘PARECERES nº 79/2011/DECOR/CGU/AGU’, ‘nº 18/2011/CGU/AGU’ e ‘n.º10/2011/MCA/CGU/AGU’), fixou-se o entendimento no sentido de que as licenças e o afastamentos do(a) servidor(a) previstos na Lei n.º 8.112/90 implicam a suspensão da contagem do prazo do estágio probatório, independentemente dessas licenças ou afastamentos serem considerados como de efetivo exercício nos termos da legislação, pois eles impediriam a real avaliação de desempenho do servidor.

 

A matéria foi submetida à análise da Câmara Nacional de Uniformização de Entendimentos Consultivos (CNU/CGU) pelo Despacho nº 00095/2016/DECOR/CGU/AGU do Diretor do DECOR.

 

Sobre o objeto dos autos, mediante a Nota Técnica n.º 07/2015/CGNOR/DENOP/SEGEP/MP, datada de 11 de fevereiro de 2015, a Secretaria de Gestão Pública – SEGEP/MP, “a fim de garantir a plenitude da proteção à infância e à maternidade”, manifestou-se como sendo “necessário e justificável, a reanálise do comando interpretativo contido no Parecer n.º 79/2011/DECOR/CGU/AGU”, pelas seguintes razões:

 

1. A Secretaria de Gestão Pública – SEGEP/MP, no desempenho de seu papel de órgão central do Sistema de Pessoal Civil da Administração Federal – SIPEC tem como uma de suas premissas para as políticas de gestão de pessoas que propõe a máxima eficácia dos direitos cujo integral exercício projete efeitos na proteção à maternidade e à infância.

 

2.  Com esse foco a SEGEP, sem fragilizar os institutos legais e gerenciais em matéria de pessoal, que garantem a eficiência do serviço público, vem implementando (por meio da atividade interpretativa da legislação de pessoal aplicável aos servidores públicos federais e no uso de sua competência normativa) medidas protetivas que coadunam com a Política Nacional de Atenção à Mulher e a Política de Atenção Integral à Saúde da Criança.

 

3. Assim, para garantir a plenitude da proteção à infância e à maternidade, entende esta Secretaria de Gestão Pública como necessário e justificável a reanálise do comando interpretativo contido no Parecer n.º 79/2011/DECOR/CGU/AGU, segundo o qual o estágio probatório deve ficar suspenso no período em que a(o) servidora(o) estiver no usufruto de licença à gestante e sua prorrogação, licença paternidade ou ao adotante, previstos nos art. 207 a 210 da Lei n.º 8.112, de 1990.

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13.    Como se vê, a SEGEP tem se esforçado para interpretar os institutos de gestão de pessoas que dizem respeito aos direitos da criança e da mulher, relativamente à maternidade, de forma a garantir seus desideratos constitucionais, o que tem levado a efeito, já que não lhe compete fixar interpretação à Constituição Federal, também se calcando nos entendimentos da Advocacia-Geral da União, a exemplo da linha interpretativa adotada no Parecer n.º 07/2009/DECOR/CGU/AGU, cuja ementa se transcreve:

 

Direito Constitucional. Direito Administrativo. Direito social de proteção à maternidade e à infância. Licença à gestante prevista no inciso XVIII do art. 7º da Constituição da República. Licença maternidade. Prorrogação da licença-maternidade autorizada pela Lei nº 11.770/2008. Programa de Prorrogação da Licença à Gestante e à Adotante instituído pelo Decreto n.º 6.690/2008. Extensão do benefício a servidoras públicas federais temporárias contratadas na forma da Lei n.º 8.745/93. Sugestão de revisão do item “d” das conclusões firmadas na Nota Técnica n.º 035-2009/DENOR/CGU/AGU, aprovada nos termos do Despacho do Consultor-Geral da União n.º717/2009, pelo Exmo. Sr. Advogado-Geral da União em 22/07/2009.

 

14.  Firme nisso, ainda que gerencialmente justificável, já que é premente a necessidade de a Administração fortalecer o estágio probatório,  a sua suspensão durante as licenças e afastamentos que tenham como sustentáculo a proteção à criança e à maternidade, quais sejam, a licença à gestante, paternidade e ao adotante, nos parece merecer discriminação positiva, já que numa visão ampliativa acaba por ensejar discriminação à condição da mulher que se torna mãe, do pai que se afasta para a convivência com o filho recém-nascido e à pessoa que se propõe ao louvável ato de adoção. (....) 

 

16.  Ademais, como salientado, as licenças de que se trata visam resguardar os direitos relativos à maternidade, especialmente porque a preservação desses direitos implicam a plena efetividade dos direitos da criança, bens que isolada ou conjuntamente considerados se sobrelevam aos da Administração, na questão específica da avaliação do estágio probatório da servidora afastada em razão de licença à gestante e, igualmente, ao pai na licença paternidade e ao adotante, homem ou mulher, na licença ao adotante.

 

A Consultoria Jurídica junto ao Ministério do Planejamento, em Parecer nº 00249/2015/TLC/CGJRH/CONJUR-MP/CGU/AGU, datado de 05/03/2015, também se manifestou pela necessidade da reanálise do comando interpretativo contido no Parecer n.º 79/2011/DECOR/CGU/AGU e encaminhou o processo à análise da Consultoria-Geral da União. Para tanto, apresentou os seguintes fundamentos:

 

2. Essa Consultoria Jurídica já se manifestou em algumas ocasiões sobre a matéria, posicionando-se no sentido de que a suspensão do estágio probatório não pode ser vista como regra, mas sim como exceção, tendo em vista que o legislador especificou, no art. 20, parágrafo 5°, da Lei n° 8.112/90 quais seriam as hipóteses que teriam o condão de suspender o período avaliativo.

 

3. Tal interpretação tem fundamento no fato de que a suspensão do estágio probatório é uma medida prejudicial ao servidor, uma vez que, somente após o fim do período avaliativo, poderá ser adquirida a estabilidade no serviço público com o consequente gozo das prerrogativas constitucionais e legais dela decorrentes.

 

4. O art. 20, parágrafo 5°, da Lei nº8.112/90 foi incluído pela Lei nº 9.527/97, ou seja, quando já estava em vigor as normas instituidoras da licença gestante, paternidade e adotante (Capítulo lI, Seção V, da Lei n. 8.112/90), as quais não foram relacionadas no referido dispositivo legal, tendo sido consideradas, na verdade, como efetivo exercício (art. 102, inciso VIII, alínea "a", da Lei nº 8.112/90), depreendendo-se, portanto, que o legislador não pretendia que tais afastamentos suspendessem o estágio probatório.

 

5. As licenças maternidade, paternidade e adotante, além de serem garantias constitucionais do servidor público, destinadas à proteção dos direitos sociais à maternidade e à infância (art. 6° da Constituição Federal), consagram, efetivam e concretizam a doutrina da proteção integral, que reconhece o valor intrínseco da criança e do adolescente na condição peculiar de pessoas em desenvolvimento, exigindo-se, portanto, uma atenção e proteção especial e diferenciadas por parte do Estado, da família e da sociedade (art. 227 da Constituição Federal).

 

6. Justamente por constituírem garantias constitucionais do servidor, e por servirem como verdadeiros instrumentos de efetivação da doutrina da proteção integral da criança e do adolescente, o gozo das licenças maternidade, paternidade e adotante não poderão causar qualquer prejuízo ao beneficiário, razão pela qual não podem implicar a suspensão do estágio probatório.

 

Por meio do Aviso Ministerial n.º 060/2015/SPM/PR, a Ministra de Estado Chefe da Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República também se manifestou pela revisão do Parecer n.º 79/2011/DECOR/CGU/AGU, destacando, especialmente, que “a licença maternidade é desdobramento da dignidade da pessoa humana; fruto do direito de proteção à família, à gestante e à criança”. E continua:

 

(...) em que pese na legislação não estar prevista a licença maternidade dentre as hipóteses de suspensão do estágio probatório, na Administração Pública Federal passou-se a adotar o entendimento no sentido de que o estágio probatório deverá ser prorrogado pelo mesmo período em que o servidor encontra-se licenciado ou afastado das atribuições do seu cargo efetivo, independentemente destas licenças ou afastamentos serem considerados como de efetivo exercício, inclusive para a licença maternidade.

8. Ocorre que, adotar tal entendimento prejudica sobremaneira os direitos das mulheres já conquistados. A medida penaliza as mulheres que gozam da licença gestação durante o prazo do estágio probatório, usurpando o seu direito de licença. Além disso desestimula as mulheres a engravidar quando bem entenderem, segundo o planejamento familiar, o que significa interferência injustificada do Estado sobre as suas escolhas.

 

9. O posicionamento ora combatido é discriminatório e desrespeita a igualdade de gênero prevista na Constituição Federal e em Tratados Internacionais, e que tanto defendo. A CRFB/88, art. 7°, inc. XVIII, XX e XXX, Art. 20, §5°, da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, mulher, apenas após extinta a licença maternidade, cumprirá o prazo do estágio probatório, enquanto os demais, que ingressaram pelo mesmo concurso público, já poderão ter adquirido' estabilidade e os direitos e benefícios dela decorrentes; além disso, é claro, tal "sanção" recai apenas sobre a mulher, já que homens não gozam desta licença. 10. Alerta-se que diversas são as carreiras de servidores públicos federais que possuem regulamentação no sentido de que, somente após a confirmação no estágio probatório, garantias, promoções e benefícios são concedidos.

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12. Organismos internacionais estão atentos aos problemas da discriminação de gênero, e consagram em vários tratados e convenções internacionais o princípio da não discriminação, como, por exemplo, na Declaração sobre a eliminação da discriminação contra a mulher (1967) da ONU e a Convenção sobre a eliminação de todas as formas de discriminação contra a mulher (1979) da OIT.

 

13. Nossa Constituição da República não deixa dúvidas sobre a igualdade de gênero ao prescrever que "homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição".

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15. Contudo, o entendimento que ora se rechaça, suprime direitos fundamentais sociais da mulher e a discrimina de forma manifestamente contrária à legislação e à política que o Estado brasileiro desenvolve.

 

16 Em suma, não se protege as mulheres com a suspensão do período do estágio probatório durante à licença maternidade, na verdade, impõe-lhes uma sanção/ônus, em prejuízo de direitos constitucionalmente garantidos, quando do retomo à atividade laboral. Pois, suspender o estágio probatório significa contrariar direitos sociais previstos no art. 6°, caput, e inc. XVIII, XX e XXX, todos da CRFB/88, e impor inaceitável tratamento discriminatório às mulheres, art. 5°, inc. I, também da CRFB/88.

 

17. Posiciono-me contrária ao diferimento do prazo do estágio probatório em razão da licença maternidade pois não coaduna-se à Política Nacional de Atenção à Mulher.

 

Também foi juntado aos autos, pela Assessoria Jurídica junto à Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República, o Parecer nº 00005/2016/ASJUR-SPM/CGU/AGU, datado de 12/02/2016, em que igualmente se manifestou pela necessidade de revisão do entendimento da AGU sobre o tema, em razão de que:

 

10. A legislação pátria é expressa e clara ao elencar as hipóteses de suspensão do estágio probatório no art. 20, parágrafo 5º, da Lei nº 8.112/90: (a) licença para tratamento de saúde do cônjuge do companheiro e outros familiares - art. 83, lei 8112; (b) licença para acompanhamento do cônjuge - art. 84, §1º; (c) licença para atividade política - art. 86; (d) afastamento para servir em organismo internacional da qual a República Federativa do Brasil seja parte - art. 96; e (e) na hipótese de afastamento para participação em curso de formação. Observe:

 

Art. 20 .....................................................................................

 

§5º O estágio probatório ficará suspenso durante as licenças e os afastamentos previstos nos arts. 83, 84, § 1º, 86 e 96, bem assim na hipótese de participação em curso de formação, e será retomado a partir do término do impedimento.”

 

11. A contrario sensu, afastamentos não previstos no rol do art. 20, parágrafo 5º, da Lei nº 8.112/90 não podem suspender a contagem do prazo do estágio probatório. Caso se pretendesse que outros afastamentos também suspendessem o estágio probatório, o legislador os teria inserido no rol do art. 20, parágrafo 5º, da Lei nº 8.112/90, o que exprime a incontestável intenção de que apenas aqueles ali mencionados terem o condão de suspender o período probatório e postergar aquisição da estabilidade e dos direitos e vantagens dela decorrentes.

 

12. Ademais, a suspensão do estágio probatório, por se tratar de medida restritiva de direito, não pode ser interpretada ampliativamente pelo administrador, a fim de estender a hipóteses não previstas em lei que sejam capazes de gerar a suspensão do período de avaliação e, consequentemente, postergar a aquisição de direitos pelo servidor.

 

13. Assim sendo, sobre o tema, data máxima venia, não há outra interpretação juridicamente possível a não ser no sentido de que o estágio probatório ficará suspenso durante APENAS as licenças e os afastamentos previstos nos arts. 83, 84, § 1º, 86 e 96, bem assim na hipótese de participação em curso de formação, e será retomado a partir do término do impedimento, conforme expressa e clara a disposição do §5º do art. 20 da Lei n.º 8.112/90. 

 

14. No que se refere à licença maternidade, além de não estar inserida dentre as hipóteses de suspensão do prazo do estágio probatório no rol do §5º do art. 20 da Lei n.º 8.112/90, o prazo de seu gozo é considerado tempo de efetivo exercício para todos os efeitos, conforme art. 102, inc. VIII, da Lei nº 8.112/905. 

 

15. Convém destacar, ainda, que a Constituição Federal, em diversas passagens, consagra especial proteção ao direito à maternidade (CF/1988, arts. 6°, 7°, XVIII, 201, II, e 203, I), elevando-a, expressamente, à condição de direito social fundamental (CF/1988, art. 6°).

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16. Lembra-se que a licença maternidade é uma licença gozada apenas pelas mulheres. A Constituição da República não deixa dúvidas sobre a igualdade de gênero ao prescrever que “homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição”.

 

17. Ocorre que, posicionamento adotado pela AGU pode ser considerado discriminatório e contrário a igualdade de gênero prescrito na Lei superior, na medida em que a mulher, apenas após extinta a licença maternidade, cumprirá o prazo do estágio probatório, enquanto os demais, que ingressaram pelo mesmo concurso público, já poderão ter adquirido estabilidade e os direitos e benefícios dela decorrentes.                 ...............................................................................................................

19. Inúmeras são as carreiras do serviço público cuja legislação prevê progressão ou benefícios após a confirmação no estágio probatório. Desse modo, entender de forma contrária ao aqui defendido, inegavelmente pode impor à mulher redução de seus direitos de forma a contrariar a igualdade de gênero prescrita pela Constituição da República. 

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24. Desse modo, inegável que a licença maternidade deve ser considerada como de efetivo exercício para todos os efeitos e o seu gozo não pode gerar quaisquer prejuízos à servidora, como no caso da suspensão da contagem do prazo do estágio probatório.

 

É o relatório. Passa-se a opinar.

 

II – FUNDAMENTAÇÃO:

 

II.1. DELIMITAÇÃO DO OBJETO

 

Preliminarmente, cumpre esclarecer que este Parecer tem por objeto apenas a análise da juridicidade da suspensão do estágio probatório em razão do gozo das licenças à gestante, à adotante e à paternidade (art. 207 a 210, Lei n.º 8.112/90).

 

Quanto aos Pareceres que se pretende revisar, deve-se destacar que no Parecer nº 79/2011/DECOR/CGU/AGU foi apreciada consulta formulada pelo Conselho Superior da Advocacia-Geral da União – CSAGU a respeito da avaliação para fins de estágio probatório de Advogado da União que se encontrava cedido para outro órgão. Nele firmou-se o entendimento de que estando "o servidor afastado das funções próprias do seu cargo, o estágio probatório deve ser suspenso pelo tempo em que perdurar tal afastamento". Assentando ainda “que o mesmo raciocínio que se busca aplicar aos servidores cedidos vale para aqueles que fazem jus à licença médica. Deveras, enquanto convalesce, o servidor não poderá, obviamente, exercer as suas funções, o que torna prejudicada a sua avaliação para confirmação no cargo e acarreta a suspensão do período de estágio”.

 

No mesmo sentido, foi o Parecer nº 18/2011/CGU/AGU, elaborado pelo Consultor-Geral da União, e aprovado pelo Advogado-Geral da União, ao analisar dúvida jurídica formulada pela Corregedoria-Geral da União sobre a necessidade (ou não) da suspensão da contagem do estágio probatório, quando o avaliado se encontre em licença saúde:

 

22. Afirma-se que corre o risco de que o estágio probatório se transforme em instância imaginária, abstrata, na hipótese de não suspender o andamento do prazo, ou no caso de licença do servidor, para tratamento de saúde. A assertiva é também válida para licença-gestante, por razões de convergência conceitual, bem como para outras eventuais circunstâncias que se possam apresentar.

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25. Assim, Senhor Advogado-Geral da União, opina-se pela possibilidade do reconhecimento de suspensão de prazo de estágio probatório, na hipótese de servidor em licença para tratamento de saúde, respeitando-se eventuais entendimentos anteriores da Administração, em tema semelhante, com situações já consolidadas. Isto é, o período no qual o servidor se afasta das suas funções, em decorrência de licença para tratamento da própria saúde, não pode ser considerado como de efetivo exercício para o fim de aprovação em estágio confirmatório.

 

Também, com a mesma orientação, foi o Parecer nº 10/2011/MCA/CGU/AGU, ao analisar consulta formulada pelo Corregedor-Geral da União sobre a suspensão do prazo do estágio probatório em caso de ausência ao serviço decorrente de casamento e de falecimento do cônjuge, companheiro, pais, madrasta ou padrasto, filhos, enteados, menor sob guarda ou tutela e irmãos, bem como outros eventuais afastamentos permitidos:

 

40. Diante do exposto, opina-se pela possibilidade do reconhecimento de efetivo exercício do cargo pelo servidor que se ausenta ao serviço em decorrência de casamento e de falecimento do cônjuge, companheiro, pais, madrasta ou padrasto, filhos, enteados, menor sob guarda ou tutela e irmãos.

 

41. Ademais, considerando-se que o estágio probatório destina-se a avaliar, de forma concreta, a adaptação ao serviço e as qualidades do agente aprovado em concurso público, conclui-se que as licenças e os afastamentos que impedem a real e concreta avaliação de desempenho do servidor devem ser considerados como períodos em que o servidor não está, para fins de estágio probatório, em efetivo exercício.

 

Como se observa, nenhum dos 3 (três) Pareceres supra referidos se deteve na análise das especificidades da licença à gestante, ao (à) adotante e licença-paternidade. Todos eles, ao analisar determinadas licenças ou afastamentos, mencionaram as licenças à gestante, ao (à) adotante e à paternidade como se estas se enquadrassem numa regra geral aplicável a todas as licenças e afastamentos previstos na Lei n.º 8.112/90-. Contudo, esse raciocínio jurídico não parece ser o melhor, pelas razões que se passará a expor.

 

II.2. O EQUÍVOCO DA PREMISSA-BASE DOS PARECERES AGU

 

Em primeiro lugar, é importante começar colocando em discussão a premissa da qual partiram os três Pareceres que estão agora submetidos à revisão: a de que a avaliação do servidor público apenas é legítima se realizada de fato, isto é, com a presença do servidor. Tal premissa fundamentaria logicamente a conclusão de que as licenças à gestante, ao adotante e à paternidade suspendem o estágio probatório.

 

Cumpre verificar o que dispõe o art. 20, § 4º, da Lei nº 8.112/90, que prevê as situações em que o servidor em estágio probatório pode se afastar do serviço:

 

a) por motivo de doença em pessoa da família;

b) por motivo de afastamento do cônjuge ou companheiro;

c) para o serviço militar;

d) para atividade política;

e) para exercício de mandato eletivo;

f) para estudo ou missão no exterior;

g) para participação em Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu no País;

h) para participar de curso de formação decorrente de aprovação em concurso para outro cargo na Administração Pública Federal.

 

 

Levada à literalidade, a interpretação do artigo impediria a própria concessão das licenças à gestante, à adotante e à paternidade, uma vez que estas não se encontram no rol de afastamentos admissíveis ao agente público em estágio probatório. Segundo esse raciocínio, apenas servidores(as) estáveis poderiam gozar dos referidos licenciamentos e a discussão em torno da suspensão do prazo de avaliação em face da licença passaria a não fazer nenhum sentido, porque prejudicada.

 

Entretanto, à toda evidência, não se trata da melhor compreensão desse texto, uma vez que não há dúvida quanto à possibilidade de servidores(as) em estágio probatório poderem ser beneficiados(as) por estas licenças. Com efeito, a Constituição prevê a proteção em tela à ocupante de cargo público – e aqui não distingue se o servidor está ou não em estágio probatório – ao dispor o seguinte:

 

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
...................................................................................................................
XVIII - licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de cento e vinte dias;
 
Art. 39. .....................................................................................................
 
§ 3º Aplica-se aos servidores ocupantes de cargo público o disposto no art. 7º, IV, VII, VIII, IX, XII, XIII, XV, XVI, XVII, XVIII, XIX, XX, XXII e XXX, podendo a lei estabelecer requisitos diferenciados de admissão quando a natureza do cargo o exigir.
 
 

Assim, inegável que se revela legítima a concessão das licenças à gestante, ao adotante e à paternidade ao(à) servidor(a) em estágio probatório, ainda que a literalidade da disposição da Lei nº 8.112/90 possa, supostamente, conduzir à interpretação contrária.

 

Avançando no que interessa ao tema, observa-se que o problema discutido não se soluciona, todavia, apenas com a leitura da norma acima, uma vez que a possibilidade de concessão de licença não significa, de forma automática, que o estágio probatório teve seu fluxo temporal suspenso. Para resolver o tema, é necessária a verificação do que dispõe o art. 20, § 5º, da Lei nº 8.112/90:

 

§ 5º O estágio probatório ficará suspenso durante as licenças e os afastamentos previstos nos arts. 83, 84, § 1º, 86 e 96, bem assim na hipótese de participação em curso de formação, e será retomado a partir do término do impedimento.

 

De acordo com este dispositivo, o estágio probatório ficará suspenso nos seguintes casos de afastamento:

 

a) por motivo de doença em pessoa da família;

b) por motivo de afastamento do cônjuge ou companheiro;

c) para atividade política;

d) para estudo ou missão no exterior;

e) para participação em curso de formação.

 

Estariam excluídos, portanto, da regra de suspensão (§ 5º) os seguintes afastamentos (§ 4º):

 

a) para exercício de mandato eletivo;

b) para o serviço militar;

c) para participação em Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu no País.

 

As razões que levaram o legislador a excepcionar cada um desses 3 (três) afastamentos podem ser as mais diversas, mas, independentemente dos motivos, o fato é que a simples existência desse rol demonstra de forma suficiente que a premissa defendida, a de que apenas servidores em atividade de fato podem ser alvo de avaliação durante o estágio probatório, sob pena de suspensão do prazo, está visivelmente equivocada.

 

Note-se que nas três situações, o afastamento pode ser igual ou maior que a licença de 120 (cento e vinte) dias concedida à gestante e a licença-paternidade, de apenas 5 (cinco) dias - a licença-gestante pode ser estendida por 180 (cento e oitenta dias) e a licença-paternidade por 20 (vinte dias), observados os respectivos requisitos legais. Os mandatos eletivos duram 4 (quatro) anos, o serviço militar obrigatório demanda 1 (um) ano e a participação em cursos de pós-gradução dificilmente consome menos de 1 (um) ano.

 

São afastamentos longos – e até maiores que a licença à gestante – e que, nem por isso, suspenderam o curso do estágio probatório, o que faz cair por terra a premissa da necessidade imprescindível de efetiva atividade do servidor para a realização da avaliação trienal-.

 

Outro problema da tese em análise refere-se ao fato de que, se por um lado inclui nesse rol a licença à gestante, ao (à) adotante e a licença paternidade como causas suspensivas do estágio probatório, por outro, acaba tornando inconstitucional os três afastamentos acima. Isso porque os defensores daquele entendimento interpretam a expressão “efetivo exercício” do art. 41 da CF/88 como sendo uma situação de fato, in concreto, o que não permitiria exceções de direito. Confira-se:

 

Art. 41. São estáveis após três anos de efetivo exercício os servidores nomeados para cargo de provimento efetivo em virtude de concurso público.

 

Vê-se, portanto, que tal entendimento não pode estar correto, sob pena de não somente incluir hipótese de suspensão não prevista legalmente, mas também tornar inconstitucionais os três casos especificados no art. 20, § 5º, da Lei nº 8.112/90.

 

Constatado o equívoco na premissa sobre a qual se fundamentou o pensamento até então em vigor, surge a pergunta: mas, então, o que fazer com a licença à gestante, ao (à) adotante e a licença paternidade, isto é, em qual dos grupos ela se encaixa: ao lado da regra ou das exceções à suspensão?

 

Neste momento, é oportuno registrar o que reza o art. 102, VIII, a, da Lei nº 8.112/90:

 

Art. 102.  Além das ausências ao serviço previstas no art. 97, são considerados como de efetivo exercício os afastamentos em virtude de:

 

...................................................................................................................

 

VIII - licença:

 

a) à gestante, à adotante e à paternidade;

 

 

Não estando expressamente prevista no art. 20, § 5º, da Lei nº 8.112/90, a licença à gestante, ao (à) adotante e a licença-paternidade não devem ser consideradas causa suspensiva do prazo examinado, razão porque, sendo o afastamento o exercício regular de um direito pelo servidor, há que se considerar período justificado de forma suficiente nas avaliações feitas pela Comissão constituída para essa finalidade.

 

II.3. SUBMISSÃO DA ADMINISTRAÇÃO AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE

 

Desse modo, com fulcro no princípio constitucional da legalidade, ressalte-se que ao Administrador Público é imposto atuar conforme a legislação. Lembre-se que, se, porventura, considerar uma lei inadequada, omissa ou inconveniente, o ordenamento jurídico constitucional confere-lhe a possibilidade da elaboração de projetos de lei a serem encaminhados à análise e votação do Congresso Nacional (CR/88, art. 84, III). E, acaso considere a lei inconstitucional, a Lei Maior abre-lhe a via da ação direta de inconstitucionalidade (CRFB, artigo 103, I).

 

A legislação pátria é expressa e clara ao especificar as hipóteses de suspensão do estágio probatório no art. 20, parágrafo 5º, da Lei nº 8.112/90: (a) licença para tratamento de saúde do cônjuge do companheiro e outros familiares - art. 83, lei 8112; (b) licença para acompanhamento do cônjuge - art. 84, §1º; (c) licença para atividade política - art. 86; (d) afastamento para servir em organismo internacional da qual a República Federativa do Brasil seja parte - art. 96; e (e) na hipótese de afastamento para participação em curso de formação. Observe-se:

 

Art.20 ............................................................................................................

 

§ 5º O estágio probatório ficará suspenso durante as licenças e os afastamentos previstos nos arts. 831, 84, § 1º, 863 e 964, bem assim na hipótese de participação em curso de formação, e será retomado a partir do término do impedimento.

 

A contrario sensu, com base no princípio da legalidade da Administração Pública, afastamentos não previstos no rol do art. 20, § 5º, da Lei nº 8.112/90, não podem suspender a contagem do prazo do estágio probatório. Caso se pretendesse que outros afastamentos também suspendessem o estágio probatório, o legislador os teria inserido no rol do art. 20, § 5º, da Lei nº 8.112/90, o que exprime a incontestável intenção de que apenas aqueles ali mencionados tenham o condão de suspender o período probatório e postergar a aquisição da estabilidade e dos direitos e vantagens dela decorrentes.

 

A suspensão do estágio probatório, por se tratar de medida restritiva de direito, não pode ser interpretada ampliativamente pelo administrador, a fim de estender a hipóteses não previstas em lei que sejam capazes de gerar a suspensão do período de avaliação e, consequentemente, postergar a aquisição de direitos pelo servidor.

 

Assim sendo, sobre o tema, não há outra interpretação juridicamente possível a não ser no sentido de que o estágio probatório ficará suspenso apenas durante as licenças e os afastamentos previstos nos arts. 83, 84, § 1º, 86 e 96, bem assim na hipótese de participação em curso de formação, e será retomado a partir do término do impedimento, conforme expressa e clara disposição do § 5º do art. 20 da Lei n.º 8.112/90.

 

II.4. DA PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL À MATERNIDADE, À INFÂNCIA E À FAMÍLIA

 

A análise do objeto deste Parecer passa necessariamente pelo exame de diversos dispositivos Constitucionais, pois a Carta Maior consagra especial proteção à maternidade e à infância (CF/1988, arts. 6°, 7°, XVIII, 201, II, e 203, I)-, elevando-as, expressamente, à condição de direito social fundamental (CF/1988, art. 6°)-; e protege a família, ao estabelecê-la como a base da sociedade (à família é dedicado um capítulo específico na CR/88 - Capítulo VII, arts. 226 a 230) - e garantir-lhe, por exemplo, o salário mínimo (capaz de atender as suas necessidades com a moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social) e a assistência social (CF/1988, arts. 7º, inc. IV; 203, inc. I).

 

A licença-paternidade, da mesma forma, está abraçada por proteções Constitucionais, na medida em que também está prevista no rol dos direitos fundamentais sociais, além de prevista no Capítulo dedicado à família e no ADCT (arts. 7º, inc. XIX e 226, e art. 10, §1º, ADCT)-. E, ao (à) adotante e aos filhos adotados, como não poderia ser diferente, a Constituição assegura os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação (art. 227, §6º).

 

Desse modo, tendo em vista esse conjunto normativo constitucional, inegável revela-se que a garantia e proteção da licença à gestante, ao (à) adotante e a licença-paternidade são direitos fundamentais dos cidadãos decorrentes do desdobramento da dignidade da pessoa humana, princípio basilar do Estado de Direito Brasileiro.

 

Por isso, a resposta à questão levantada nestes autos deve também partir da interpretação da Constituição, especificamente dos direitos fundamentais à licença à gestante, ao (à) adotante e licença-paternidade, e de seu significado no âmbito dos princípios e diretrizes constitucionais que funcionam como mandamentos de proteção à mulher, à família e aos filhos e seus respectivos papeis desempenhados na sociedade, para então se chegar à interpretação constitucionalmente adequada do art. 41, § 4º, da CF/88 c/c art. 20 e art. 102, VIII, “a”, ambos da Lei n.º 8.112/90.

 

Sendo a licença à gestante, ao (à) adotante e a licença-paternidade asseguradas e protegidas pela Constituição como genuínos direitos fundamentais, algumas consequências importantes devem ser retiradas para a interpretação dos dispositivos constitucionais que os garantem (art. 7º, inc. XVIII e XIX), assim como das leis que visam regulamentá-los, como é o caso da Lei 8.112/90 (com base no art. 41, §§ 4º, da Constituição).

 

Em primeiro lugar, na qualidade de direito fundamental, deve ser a licença à gestante, ao (à) adotante e a licença-paternidade objeto de interpretação que amplie o seu âmbito de proteção e confira ao seu conteúdo normativo a máxima eficácia. Direitos fundamentais devem ser encarados como tendo, prima facie, um âmbito de proteção alargado ou ampliado, como vem defendendo a doutrina majoritária sobre o tema, especialmente alguns teóricos importantes, como Robert Alexy. Apesar da existência de alguma controvérsia entre as denominadas teorias ampla e estrita do âmbito de proteção ou do suporte fático dos direitos, é preciso reconhecer que há uma prevalência daquele entendimento, que atualmente é também albergado pela jurisprudência da maioria das Cortes e Tribunais Constitucionais.

 

A compreensão ampliativa e que empreste a máxima eficácia à licença à gestante, ao (à) adotante e paternidade deve partir do pressuposto – o qual também decorre do regime específico dos direitos fundamentais, especialmente da sistemática de suas restrições e das colisões com outros direitos, bens e valores – de que o seu efetivo exercício deve ser sempre encarado, prima facie, como não restritivo ou limitativo do próprio direito ao usufruto da licença, mas, ao contrário, como parte integrante do âmbito de autonomia e de livre desenvolvimento da personalidade do titular do direito. Nesse sentido, a leitura ampliativa está conectada à proteção do núcleo familiar e, especialmente, à esfera de liberdade da mulher, gestante ou adotante, para decidir sobre o exercício de seus próprios direitos no seio familiar.

 

Isso decorre, inclusive, do art. 226, §7º, CF/88, o qual prescreve que “fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privada”.

 

Em segundo lugar, como todo direito fundamental, a licença à gestante, ao (à) adotante e a licença-paternidade possuem, além de sua intrínseca dimensão subjetiva – que traduz a perspectiva individual ou de direito subjetivo –, uma dimensão objetiva, que ressalta a sua qualidade de princípio que orienta toda a ordem jurídica e que vincula o Estado e seus Poderes. Dessa dimensão objetiva do direito fundamental podem ser extraídos alguns efeitos jurídicos importantes. O primeiro deles é o efeito de irradiação da norma de direito fundamental para todos os âmbitos do ordenamento jurídico, que faz transparecer a exigência de que toda e qualquer norma dos diversos sistemas ou subsistemas (Direito Administrativo, Direito Tributário, Direito Civil etc.), ao ser interpretada e aplicada, seja submetida a um processo de filtragem constitucional a partir do conteúdo deontológico e axiológico da norma jusfundamental. O segundo pode ser identificado como um dever de proteção imposto ao Estado e seus diferentes ramos (Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário), que devem envidar todos os esforços para criar, implementar e manter sistemas normativos, órgãos e procedimentos que visem precipuamente garantir e dar efetividade ao direito fundamental em questão.

 

Nesse sentido, quanto ao primeiro aspecto dessa dimensão objetiva (eficácia irradiante), o conteúdo do direito às licenças ora tratadas – umbilicalmente conectado, como acima exposto, à autonomia e à dignidade do titular do direito, entendidos em toda sua amplitude – deve lastrear toda a atividade de interpretação e aplicação das normas infraconstitucionais que tratam do tema e/ou que visem a regulamentá-lo (conformá-lo ou limitá-lo). É nessa perspectiva, portanto, que deve ser realizada a interpretação e a aplicação do art. art. 41, § 4º, da CF/88 c/c art. 20 e art. 102, VIII, “a”, ambos da Lei n.º 8.112/90, o que leva ao sentido normativo segundo o qual o exercício efetivo das licenças à gestante, ao (à) adotante e a licença paternidade não devem implicar a suspensão do prazo do estágio probatório.

 

Em suma, a interpretação da legislação infraconstitucional deve ser sempre no sentido de dar a máxima efetividade às licenças em questão, afastando qualquer entendimento que signifique que o seu pleno usufruto possa trazer prejuízos (pessoais, funcionais, etc.) ao seu titular (mãe, pai ou adotante).

 

Nesse cenário, cumpre transcrever trecho da Nota Técnica nº 07/2015/CGNOR/DENOP/SEGEP/MP que, ao pugnar pela revisão dos ‘Pareceres nº 79/2011/DECOR/CGU/AGU’, ‘nº 18/2011/CGU/AGU’ e ‘n.º10/2011/MCA/CGU/AGU’, esclarece que “as licenças de que se trata visam resguardar os direitos relativos à maternidade, especialmente porque a preservação desses direitos implicam a plena efetividade dos direitos da criança, bens que isolada ou conjuntamente considerados se sobrelevam aos da Administração, na questão específica da avaliação do estágio probatório”:

 

Firme nisso, ainda que gerencialmente justificável, já que é premente a necessidade de a Administração fortalecer o estágio probatório,  a sua suspensão durante as licenças e afastamentos que tenham como sustentáculo a proteção à criança e à maternidade, quais sejam, a licença à gestante, paternidade e ao adotante, nos parece merecer discriminação positiva, já que numa visão ampliativa acaba por ensejar discriminação à condição da mulher que se torna mãe, do pai que se afasta para a convivência com o filho recém-nascido e à pessoa que se propõe ao louvável ato de adoção. (....) 

 

Ademais, como salientado, as licenças de que se trata visam resguardar os direitos relativos à maternidade, especialmente porque a preservação desses direitos implicam a plena efetividade dos direitos da criança, bens que isolada ou conjuntamente considerados se sobrelevam aos da Administração, na questão específica da avaliação do estágio probatório da servidora afastada em razão de licença à gestante e, igualmente, ao pai na licença paternidade e ao adotante, homem ou mulher, na licença ao adotante.

 

Nesta mesma perspectiva, a Conjur/MP:

 

5. As licenças maternidade, paternidade e adotante, além de serem garantias constitucionais do servidor público, destinadas à proteção dos direitos sociais à maternidade e à infância (art. 6° da Constituição Federal), consagram, efetivam e concretizam a doutrina da proteção integral, que reconhece o valor intrínseco da criança e do adolescente na condição peculiar de pessoas em desenvolvimento, exigindo-se, portanto, uma atenção e proteção especial e diferenciadas por parte do Estado, da família e da sociedade (art. 227 da Constituição Federal).

 

6. Justamente por constituírem garantias constitucionais do servidor, e por servirem como verdadeiros instrumentos de efetivação da doutrina da proteção integral da criança e do adolescente, o gozo das licenças maternidade, paternidade e adotante não poderão causar qualquer prejuízo ao beneficiário, razão pela qual não podem implicar a suspensão do estágio probatório. (grifo nosso) - (Parecer nº 00249/2015/TLC/CGJRH/Conjur-MP/CGU/AGU)

 

Em relação à outra perspectiva da dimensão objetiva, a qual encara os deveres de proteção impostos ao Estado, é importante ressaltar que os direitos à licença gestante, adotante e à licença paternidade, obrigam os Poderes Públicos a criar, executar e manter uma série de normas, órgãos e procedimentos para a sua efetiva realização.

 

Portanto, é dever da Administração Pública criar todas as condições para que os atos e procedimentos de avaliação de estágio probatório sejam efetivados sem que isso implique restrições ao pleno desfrute das licenças à gestante, ao (à) adotante e à licença paternidade.

 

A própria Secretaria de Gestão Pública do Ministério do Planejamento, ao solicitar a revisão dos Pareceres AGU, deixa claro que é plenamente possível aos órgãos da Administração envidarem esforços para que todos os procedimentos atinentes ao estágio probatório sejam cumpridos sem que isso traga qualquer prejuízo aos servidores que estejam no pleno exercício dos direitos fundamentais à gestante, ao (à) adotante e a licença paternidade.

 

II.5. O COMPROMETIMENTO DO ESTADO BRASILEIRO NO PLANO INTERNACIONAL

 

Ainda no âmbito dos deveres de proteção impostos ao Estado, não se pode deixar de considerar, igualmente, que o Estado brasileiro está inserido em um sistema supranacional de proteção dos direitos das mulheres, especialmente contra todo tipo de discriminação, e que dão específica importância às questões relacionadas ao ambiente de trabalho.

                                                                                                                       

Nesse aspecto, é preciso levar em conta que o Estado brasileiro, como Estado constitucional, constitui-se também como Estado cooperativo (Peter Häberle), que se insere na ordem internacional de convenção e cooperação para a garantia e proteção dos direitos humanos e que, em razão dos deveres primordiais que lhe são impostos por esse sistema, deve atuar internamente para efetivar todas as políticas e demais atos e procedimentos necessários à efetivação dos direitos.

 

No plano do Direito Internacional, a Convenção nº 111 da Organização Internacional do Trabalho sobre Discriminação em Matéria de Emprego e Ocupação, Promulgada pelo Decreto n.º 62.150/1968, prevê que os Estados-membros devem “revogar todas as disposições legislativas e modificar todas as disposições ou práticas administrativas que sejam incompatíveis com a referida política de promoção da igualdade de oportunidades em matéria de emprego e profissão (art. 3º, “c”).

 

Da mesma forma, a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher - CEDAW, Promulgada pelo Decreto n.º 89.460/1984, determina que os Estados Partes devem “abster-se de incorrer em todo ato ou prática de discriminação contra a mulher e zelar para que as autoridades e instituições públicas atuem em conformidade com essa obrigação” (art. 2º, “d”), bem como "adotar todas as medidas adequadas, inclusive de caráter legislativo, para modificar ou derrogar leis, regulamentos, usos e práticas que constituam discriminação contra a mulher” (art. 2º, “f”). Para isso, precisam assegurar entre outros aspectos, “o direito à proteção da saúde e à segurança nas condições de trabalho, inclusive a salvaguarda da função da reprodução” (art. 11, §1º, “f”), e “implantar a licença maternidade, com salário pago ou benefícios sociais comparáveis, sem perda do emprego anterior, antiguidade ou benefícios sociais” (art. 11, §2º, “b”).

 

Importante mencionar, ainda, que em setembro de 2015 foram aprovados, por ocasião da Cúpula das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável, os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), os quais deverão orientar as políticas nacionais e as atividades de cooperação internacional nos próximos quinze anos, sucedendo e atualizando os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM). Entre os dezessete objetivos gerais, consta expressamente, como importante meta vinculante para todos os países, o Objetivo nº 5, de “alcançar a igualdade de gênero e empoderar todas as mulheres e meninas”.

 

O empoderamento das mulheres (women empowerment) constitui hoje, portanto, um objetivo a ser alcançado pelos Estados constitucionais, os quais devem criar e implementar todas as estruturas, organismos, normas e procedimentos necessários para dar efetividade aos direitos das mulheres, especialmente sua proteção contra a discriminação de qualquer tipo.

 

É justamente dentro desse contexto, nacional e supranacional, que o Estado brasileiro deve atuar com vistas à proteção, garantia e efetivação do direito fundamental à licença maternidade, em sua leitura constitucional mais ampla, como expressão da dignidade da mulher, da proteção da família e da criança e da efetiva igualdade de gênero.

 

Compete, assim, à Administração Pública envidar todos os esforços para interpretar e aplicar as normas pertinentes (especialmente a Lei 8.112/90) de modo a apreender o correto entendimento do significado normativo do direito fundamental à licença à gestante, e, sendo necessário, modificar e aperfeiçoar normas e procedimentos para tornar possível o seu mais amplo usufruto e impedir que esse exercício represente algum obstáculo ao gozo da licença e, portanto, ao livre desenvolvimento da personalidade feminina e à efetiva proteção da criança e de sua família.

 

A revisão do entendimento jurídico fixado nos ‘Pareceres nº 79/2011/DECOR/CGU/AGU’, ‘nº 18/2011/CGU/AGU’ e ‘nº 10/2011/MCA/CGU/AGU’ no que referem à licença à gestante, e também à licença ao (à) adotante e à licença paternidade, pode representar uma dessas ações estatais que vão ao encontro do que se preconiza no plano supranacional.

 

II.6. A (DES)IGUALDADE DE GÊNERO E A PROTEÇÃO DOS DIREITOS DA MULHER NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL

 

Seguindo nessa linha de raciocínio, vale ser ressaltado, ainda, que a Constituição da República garante às trabalhadoras urbanas e rurais, onde se incluem as servidoras públicas, que a licença à gestante será concedida sem prejuízo do emprego e do salário, que haverá a proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos previstos em lei, bem como a proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critérios de admissão por motivo de sexo. (CF/88, art. 7º, incs. XVIII, XX, XXX).

 

Lembre-se que a licença à gestante é uma licença gozada apenas pelas mulheres. A Constituição da República não deixa dúvidas sobre a igualdade de gênero ao prescrever que “homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição” (art. 5º, inc. I).

 

Neste ponto, o entendimento adotado pela AGU pode ser considerado discriminatório e contrário à igualdade de gênero prescrita na Lei superior, na medida em que a mulher, apenas após extinta a licença-gestante, cumprirá o prazo do estágio probatório, enquanto os demais, que ingressaram pelo mesmo concurso público, já poderão ter adquirido estabilidade e os direitos e benefícios dela decorrentes.

 

O Supremo Tribunal Federal, no RE n.º 658.312/SC, afirmou que a igualdade entre os gêneros é um direito fundamental, cláusula pétrea de nosso ordenamento. Ressaltou, ainda, que a lei pode desigualar os gêneros, para ampliar (e não para reduzir) os direitos fundamentais sociais da mulher, quando a realidade fática se mostrar desigual, pelas seguintes razões:

 

2. O princípio da igualdade não é absoluto, sendo mister a verificação da correlação lógica entre a situação de discriminação apresentada e a razão do tratamento desigual.
 
3. A Constituição Federal de 1988 utilizou-se alguns critérios para um tratamento diferenciado entre homens e mulheres: i) em primeiro lugar, levou em consideração a história de exclusão da mulher do mercado regular de trabalho e impôs ao Estado a obrigação de implantar políticas públicas, administrativa e/ou legislativas de natureza protetora no âmbito do direito do trabalho; ii) considerou existir um componente orgânico a justificar o tratamento diferenciado, em virtude do menor resistência física da mulher; e iii) observou um componente social, pelo fato de ser comum o acúmulo pela mulher de atividades no lar e no ambiente de trabalho – o que é uma realidade e, portanto, deve ser levado em consideração na interpretação da norma
 
4. Esses parâmetros constitucionais são legitimadores de um tratamento diferenciado desde que sirva, como na hipótese, para ampliar os direitos fundamentais sociais e que se observa a proporcionalidade na compensação das diferenças.

 

Desse modo, parece evidente que os Pareceres AGU não consideraram que o sistema constitucional no qual está inserida a norma do estágio probatório também protege especialmente a maternidade, a família e criança. E não se protege a maternidade, a criança e a família sujeitando as mulheres gestantes, quando do retorno à atividade, a alguma sanção, ônus ou prejuízo funcional. Suspender o prazo do estágio probatório e adiar a aquisição da estabilidade para as mulheres significa contrariar o art. 6º da Constituição. Significa, portanto, a imposição de tratamento discriminatório às mulheres (artigo 5º, CF/88) e intromissão indevida no planejamento familiar (§ 7º, art. 226, CF/88).

 

Inúmeras são as carreiras do serviço público cuja legislação prevê progressão ou benefícios apenas após a confirmação no estágio probatório. Citem-se, como exemplo, as seguintes carreiras da Administração Pública Federal: 1. Advogado da União e Procurador da Fazenda Nacional (Art. 5º, da Resolução n. º 11 do CSAGU, Publicado pela Portaria n.º 96, de 04 de abril de 2013); 2. Procurador Federal (art. 2º da Portaria PGF nº 1.432/2008); 3. Especialistas em Políticas Públicas e Gestão Governamental (Decreto n.º 5.176/2004 e Portarias) e 4. Analista Técnico de Política Social (art. 17, §1º, inc. I, “a”, e inc. II, “a”, da Lei n.º 12.094/2009 c/c art. 23 do Decreto n.º 8.435/2015). Desse modo, entender de forma contrária ao defendido neste Parecer, inegavelmente, pode impor à mulher redução de seus direitos de forma a contrariar tutelas conferidas a direitos fundamentais.

 

Vale lembrar que o Governo Federal vem implementando diversas políticas para a concretização da autonomia econômica da mulher, bem como a sua igualdade de gênero no mercado de trabalho. Na 3ª Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres, foi "reafirmada a importância da continuidade das políticas de autonomia das mulheres como princípio gerador de políticas e ações do poder público que são propostas para a sociedade". Nesse cenário, a garantia da licença maternidade e da ausência de prejuízos à mulher, decorrentes do gozo desta, devem ser observadas pela Administração Pública, pois esta licença busca viabilizar a proteção à maternidade e à infância, direitos de segunda geração, que exigem por parte do Estado prestações positivas, a fim de garantir o bem-estar social dos cidadãos.

 

Diante de todo o exposto neste Parecer, cotejados dispositivos constitucionais e legais que permeiam a matéria, inegável revela-se que a interpretação constitucionalmente adequada do art. 41, § 4º, da CF/88 c/c art. 20 e art. 102, VIII, “a”, ambos da Lei n.º 8.112/90, é no sentido de que a Constituição Federal traz especial proteção à maternidade, à família e à criança, resguardando todos os seus direitos de forma a impedir qualquer interpretação que reduza o seu espectro de conformação, seja por parte de particulares, seja pelo Estado, de modo que, com fundamento também no princípio da legalidade administrativa (art. 37, caput, CF/88), a licença à gestante, ao (à) adotante e a licença paternidade, uma vez não dispostas no rol do art. 20, § 5º, da Lei n. º 8.112/90, e estando previstas como efetivo tempo de serviço para todos os efeitos (art. 102, VII, “a”, Lei n.º 8.112/90), não suspendem a contagem do prazo do estágio probatório de 3 (três) anos previsto no art. 41, CF/88.

 

III – CONCLUSÃO:

 

Em conclusão, recomenda-se seja adotado este Parecer, para que se fixe como orientação da Câmara Nacional de Uniformização de Entendimentos Consultivos o entendimento aqui sustentado, e, em consequência, estabeleçam-se como seus efeitos:

 

a) a revogação dos Pareceres nº 79/2011/DECOR/CGU/AGU, nº 18/2011/CGU/AGU e n.º 10/2011/MCA/CGU/AGU, no que se referem à licença à gestante, à licença ao (à) adotante e à licença paternidade, passando a vigorar o entendimento de que a licença gestante, a licença adotante e a licença paternidade (art. 207 a 210 da Lei n.º 8.112/90) não suspendem a contagem do prazo do estágio probatório previsto no art. 41 da Constituição de 1988;

 

b) a sua vigência a partir da data do Despacho de Aprovação do Advogado-Geral da União, nos termos do art. 2º, XIII, da Lei nº 9.784/1999;

 

c) a sua aplicação às hipóteses de servidores cujas avaliações de estágio probatório ainda estejam em aberto na data do referido Despacho.

 

 

Brasília, 17 de agosto de 2016.

 

 

Leonardo Raupp Bocorny

Advogado da União

Membro CNU/CGU

Revisor

 

André Rufino do Vale

Procurador Federal

Diretor DECOR/CGU

Presidente CNU/CGU

 

Bruno Andrade Costa

Procurador Federal

Membro CNU/CGU

 

Daniel Rocha

de Farias

Advogado da União

Membro CNU/CGU

 

 

Joaquim Modesto

Pinto Júnior

Advogado da União

Membro CNU/CGU

 

Luiz Palumbo Neto

Advogado da União

Membro CNU/CGU

 

Manoel Paz e Silva Filho

Advogado da União

Membro CNU/CGU

 

 

Marcelo Augusto

Carmo de Vasconcellos

Advogado da União

Membro CNU/CGU

 

 

Marcelo Azevedo

de Andrade

Advogado da União

Membro CNU/CGU

 

Rafael Figueiredo Fulgêncio

Advogado da União

Membro CNU/CGU

 

 

Rafael Magalhães Furtado

Advogado da União

Membro CNU/CGU

 

 

Ronny Charles

Lopes de Torres

Advogado da União

Membro CNU/CGU

 

 

Teresa Villac

Pinheiro Barki

Advogada da União

Membro CNU/CGU

 

Vanessa Canedo

 Pinto Boaventura

Advogada da União

Membro CNU/CGU

 

Victor Ximenes Nogueira

Advogado da União

Membro CNU/CGU

 

 

 

 


Atenção, a consulta ao processo eletrônico está disponível em http://sapiens.agu.gov.br mediante o fornecimento do Número Único de Protocolo (NUP) 05100200059201586 e da chave de acesso e111b135

 




Documento assinado eletronicamente por ANDRE RUFINO DO VALE, de acordo com os normativos legais aplicáveis. A conferência da autenticidade do documento está disponível com o código 10354028 no endereço eletrônico http://sapiens.agu.gov.br. Informações adicionais: Signatário (a): ANDRE RUFINO DO VALE. Data e Hora: 26-08-2016 16:58. Número de Série: 13357071. Emissor: Autoridade Certificadora SERPRORFBv4.