ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA DA UNIÃO ESPECIALIZADA VIRTUAL DE PATRIMÔNIO
NÚCLEO JURÍDICO
PARECER n. 00961/2022/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU
NUP: 19739.141160/2022-25
INTERESSADOS: UNIÃO - SUPERINTENDÊNCIA ESTADUAL DO PATRIMÔNIO DA UNIÃO NO ESTADO DO AMAPÁ - SPU/AP E OUTROS
ASSUNTOS: ATOS ADMINISTRATIVOS. DOAÇÃO COM ENCARGOS DE IMÓVEL DE PROPRIEDADE DA UNIÃO.
EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO E OUTRAS MATÉRIAS DE DIREITO PÚBLICO. BENS PÚBLICOS. GESTÃO E GOVERNANÇA DO PATRIMÔNIO IMOBILIÁRIO DA UNIÃO. DOAÇÃO DE BEM IMÓVEL DE DOMÍNIO DA UNIÃO A ENTE FEDERATIVO MUNICIPAL. CURSO DO ANO ELEITORAL.
I) Contrato de Doação com encargos ao Município de Laranjal do Jari, de um imóvel (terreno) de propriedade da União, localizado na Av. Tancredo Neves, s/n, Bairro Castanheira, Município de Laranjal do Jari, com área de 7.200,00 m², com registro na Matrícula nº 014, fls. 20, Livro 2, de 19 de fevereiro de 1998, do Cartório de Registro “Camargo” da Comarca de Laranjal do Jari, cadastrada no SPIUnet sob o RIP Imóvel nº 0613.00016.500-0.
II) Finalidade: construção e instalação da Sede da Defesa Civil Municipal, com objetivo de uso voltado para o desenvolvimento das ações administrativas, técnicas e humanitária do órgão.
III) Valor de referência: R$ 984.000,01 (novecentos e oitenta e quatro mil reais e um centavo)
IV) Fundamento legal: Art. 31 da Lei nº 9.636/98 e art. 17, inciso I, alínea "b" da Lei nº 8.666, de 1993.
V) Análise da minuta do termo de contrato de doação.
VI) Prosseguimento do feito, condicionado às recomendações deste parecer jurídico.
I - RELATÓRIO
A Superintendência do Patrimônio da União no Amapá - SPU/AP encaminha o presente processo, para análise e manifestação, nos termos do artigo 11, inciso VI, alínea “b”, da Lei Complementar no 73, de 10 de fevereiro de 1993, que instituiu a Lei Orgânica da Advocacia-Geral da União e do artigo 19, incisos I e VI, do Ato Regimental n.º 5, de 27 de setembro de 2007, do Advogado-Geral da União, combinados com o art. 38 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993.
Os autos foram instruídos com os seguintes documentos:
Cuida-se de processo administrativo da Superintendência do Patrimônio da União no Amapá - SPU/AP, referente à DOAÇÃO COM ENCARGOS ao Município de Laranjal do Jari/AP, de imóvel de propriedade da União, classificado como terreno nacional interior, com área de 7.200,00 m², localizado na Av. Tancredo Neves, s/n, Bairro Castanheira, Município de Laranjal do Jari, registrado na Matrícula nº 014, fls. 20, Livro 2, de 19 de fevereiro de 1998, do Cartório de Registro Camargo da Comarca de Laranjal do Jari. O referido imóvel possui cadastro no Sistema de Gerenciamento de Imóveis de Uso Especial da União SPIUnet sob o RIP 0613 00016.500-0 (SEI n° 28535618).
O imóvel objeto do contrato de doação será destinado à construção e Instalação da Sede da Defesa Civil Municipal do Município de Laranjal do Jari/AP, ficando ao encargo da autarquia donatária a manutenção e melhoramentos no imóvel. Os requisitos e as razões de interesse público para a alienação encontram-se consignados na Nota Técnica SEI nº 44020/2022/ME (SEI nº 28341983):
"SUMÁRIO EXECUTIVO
1. Trata a presente Nota Técnica de proposta de Doação com Encargos ao Município de Laranjal do Jari, de um imóvel (terreno) de propriedade União, localizado na Av. Tancredo Neves, s/n, Bairro Castanheira, município de Laranjal do Jari, com área de 7.200,00 m², com registro na Matrícula nº 014, fls. 20, Livro 2, de 19 de fevereiro de 1998, do Cartório de Registro “Camargo” da Comarca de Laranjal do Jari, cadastrada no SPIUnet sob o RIP Imóvel nº 0613.00016.500-0.
ANÁLISE
2. O projeto do Município de Laranjal do Jari visa a construção e instalação da Sede da Defesa Civil Municipal, com objetivo de uso voltado para o desenvolvimento das ações administrativas, técnicas e humanitária do órgão.
3. O Município de Laranjal do Jari foi criado pela Lei Federal nº 7.639, de 6 de dezembro de 1987, e está localizado na parte Sul do Estado do Amapá, possuindo uma população estimada de 51.362 habitantes. Situa-se numa região geográfica conhecida como Vale do Jari, fazendo divisa com o Município de Almeirim (Estado do Pará) e fronteira com Guiana Francesa e Suriname.
4. A cidade de Laranjal do Jari é o principal polo urbano da parte sul do Estado do Amapá, um corredor estratégico que serve de elo e conexão terrestre do Amapá com as demais regiões brasileiras.
5. Por ter sido erguida à margem do rio Jari, numa extensa área inundável, com residências predominantemente de palafitas, sem planejamento urbano e sem ordenamento territorial, a cidade de Laranjal do Jari e sua população sofrem recorrentemente com o desastre tipificado como inundações, cujos eventos sempre provocam danos humanos, ambientais e materiais, além de graves prejuízos econômicos, tanto para o poder público quanto para o conjunto das populações, sobretudo para aquelas que habitam as áreas mais baixas do núcleo urbano e das comunidades mais atingidas do meio rural.
6. Conforme o Projeto de Utilização de Imóvel da União (27226757), apresentado pelo Município de Laranjal do Jari, no item 5, Etapas e Ações, o município já tem sinalizado na plataforma do Ministério da Defesa, proposta de Convênio nº 016722/2022, recursos para a execução da obra. Se for autorizada a doação da área, o município providenciará as peças técnicas necessárias a construção, elencada no item 5, do projeto de utilização.
7. Nesse sentido, diante da necessidade do Município de Laranjal do Jari em adquirir um imóvel (terreno) para a construção da sede administrativa da Coordenação Municipal de Defesa Civil, em razão de não possuir prédio próprio com estrutura física adequada, para atender a população do município, somos favorável pela alienação (doação) do terreno da União que encontra-se sem construção.
8. Note-se que a destinação de imóveis para a estruturação de órgãos no Estado do Amapá por si só se faz relevante, e será de extrema importância para o Município de Laranjal do Jari, haja vista que essa servirá para promover políticas públicas voltadas à aplicabilidade dos princípios da Defesa Civil.
9. Após análise do processo, a Alienação por DOAÇÃO, com encargos, ao Município de Laranjal do Jari é a mais indicada, e tem sua fundamentação legal na Lei nº 9.636, de 15 de maio de 1998, no art. 31, com redação que lhe foi dada pelo art. 1º da Lei nº 11.481/2007, tratando-se de doação.
Lei nº 9.636, de 15 de maio de 1998
Art. 31. Mediante ato do Poder Executivo e a seu critério, poderá ser autorizada a doação de bens imóveis de domínio da União, observado o disposto no art. 23 desta Lei, a: (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007)
I – Estados, Distrito Federal, Municípios, fundações públicas e autarquias públicas federais, estaduais e municipais;
(…)
§ 1º No ato autorizativo e no respectivo termo constarão a finalidade da doação e o prazo para seu cumprimento.
§ 2º O encargo de que trata o parágrafo anterior será permanente e resolutivo, revertendo automaticamente o imóvel à propriedade da União, independentemente de qualquer indenização por benfeitorias realizadas, se:
I – não for cumprida, dentro do prazo, a finalidade da doação;
II – cessarem as razões que justificaram a doação; ou
III – ao imóvel, no todo ou em parte, vier a ser dada aplicação diversa da prevista.
§ 3º Nas hipóteses de que tratam os incisos I a IV do caput deste artigo, é vedada ao beneficiário a possibilidade de alienar o imóvel recebido em doação, exceto quando a finalidade for a execução, por parte do donatário, de projeto de assentamento de famílias carentes ou de baixa renda, na forma do art. 26 desta Lei, e desde que, no caso de alienação onerosa, o produto da venda seja destinado à instalação de infraestrutura, equipamentos básicos ou de outras melhorias necessárias ao desenvolvimento do projeto.
10. Por mais que seja uma outorga gratuita, deverá constar no Contrato, cláusula resolutiva por descumprimento de finalidade ou outro encargo e prazo para seu cumprimento, além de possibilidade de se registrar cláusula de inalienabilidade do imóvel, resguardando, contudo, os interesses da SPU e seu descumprimento provocará a reversão automática do referido imóvel ao patrimônio da União.
11. Vale informar que a dispensa de licitação, no presente caso, é expressa na letra “b” do inciso I, do art. 17 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, que trata da dispensa de obrigatoriedade da licitação quando devidamente justificado interesse público.
Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993
Art. 17. A alienação de bens da Administração Pública, subordinada à existência de interesse público devidamente justificado, será precedida de avaliação e obedecerá as seguintes normas:
I – quando imóveis, dependerá de autorização legislativa para órgãos da administração direta e entidades autárquicas e fundacionais, e, para todos, inclusive as entidades paraestatais, dependerá de avaliação prévia e de licitação na modalidade de concorrência, dispensada está nos seguintes casos:
(…)
b) doação, permitida exclusivamente para outro órgão ou entidade da administração pública, de qualquer esfera de governo, ressalvado o disposto nas alíneas f, h e i.
12. Considerar-se-á também nas alienações de imóveis da União, o imperativo que trata da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzidas, disposto no Art. 1º da Lei nº 10.048/2000, Capítulo IV da Lei nº 10.098, de 19 de dezembro de 2000.
Lei nº 10.048, de 19 de novembro de 2000:
Art. 1º As pessoas portadoras de deficiência, os idosos com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos, as gestantes, as lactantes e as pessoas acompanhadas por crianças de colo terão atendimento prioritário, nos termos desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 10.741, de 2003).
Lei nº 10.098, de 19 de novembro de 2000:
“CAPÍTULO IV
DA ACESSIBILIDADE NOS EDIFÍCIOS PÚBLICOS OU DE USO COLETIVO
Art. 11. A construção, ampliação ou reforma de edifícios públicos ou privados destinados ao uso coletivo deverão ser executadas de modo que sejam ou se tornem acessíveis às pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida.
Parágrafo único. Para os fins do disposto neste artigo, na construção, ampliação ou reforma de edifícios públicos ou privados destinados ao uso coletivo deverão ser observados, pelo menos, os seguintes requisitos de acessibilidade:
I – nas áreas externas ou internas da edificação, destinadas a garagem e a estacionamento de uso público, deverão ser reservadas vagas próximas dos acessos de circulação de pedestres, devidamente sinalizadas, para veículos que transportem pessoas portadoras de deficiência com dificuldade de locomoção permanente;
II – pelo menos um dos acessos ao interior da edificação deverá estar livre de barreiras arquitetônicas e de obstáculos que impeçam ou dificultem a acessibilidade de pessoa portadora de deficiência ou com mobilidade reduzida;
III – pelo menos um dos itinerários que comuniquem horizontal e verticalmente todas as dependências e serviços do edifício, entre si e com o exterior, deverá cumprir os requisitos de acessibilidade de que trata esta Lei; e
IV – os edifícios deverão dispor, pelo menos, de um banheiro acessível, distribuindo-se seus equipamentos e acessórios de maneira que possam ser utilizados por pessoa portadora de deficiência ou com mobilidade reduzida.
13. Quanto à competência para a prática do ato de doação, o art. 1º, inciso I, da Portaria SEDDM/ME nº 12.485, de 20 de outubro de 2021.
Portaria SEDDM/ME Nº 12.485, DE 20 de outubro de 2021
Art. 1º Fica subdelegada competência ao Secretário de Coordenação e Governança do Patrimônio da União para autorizar, em imóveis com valor abaixo de R$ 100.000.000,00 (cem milhões de reais), permitida a subdelegação:
I – a alienação, a qualquer título, de imóveis da União;
14. Por sua vez, a Portaria SPU/ME nº 7.397, de 24 de junho 2021, Regulamenta a Portaria Interministerial nº 6.909/2021, do Ministro da Economia e do Ministro da Controladoria Geral da União, que institui regime especial de governança de destinação de imóveis da União e criou os Grupos Especiais de Destinações Supervisionados (GE-DESUP), de caráter permanente.
15. Acrescente-se que o (GE-DESUP-1), para imóveis com Valor de Referência (VREF) inferior a R$10.000.000,00 (dez milhões de reais);
16. Vemos assim que a competência para autorizar a doação neste caso, fica subdelegado à Secretária do Patrimônio da União, uma vez que se trata de alienação e está avaliada em R$ 984.000,01 (novecentos e oitenta e quatro mil reais e um centavo), conforme Laudo de Avaliação n° 652/2022 (27770347)
17. Diante do exposto, e preenchidos os requisitos legais e considerando o interesse do Município de Laranjal do Jari, e sob os aspectos de conveniência e oportunidade administrativa, verificamos que a destinação pleiteada está legalmente embasada e em consonância com as diretrizes de destinação desta Secretaria de Coordenação e Governança do Patrimônio da União.
CONCLUSÃO
18. Diante do exposto, em razão do interesse do Município de Laranjal do Jari no imóvel, para fins de construção e instalação da Sede da Defesa Civil Municipal, sob os aspectos de conveniência e oportunidade administrativa, manifestamos favoravelmente à pretendida doação, juntamos ao presente, declaração de dispensa de licitação (28341260) e minuta da portaria autorizativa (28341547), submetemos à apreciação de Vossa Senhoria e sugerimos que os autos sejam encaminhados ao GE-DESUP, solicitando análise e manifestação.
RECOMENDAÇÃO
19. Analisando os aspectos técnicos formais de conveniência e oportunidade administrativa, aprovo a presente Nota Técnica. Encaminhe-se à Superintendente do Patrimônio da União no Amapá, para anuência.
À consideração superior.
Documento assinado eletronicamente
JOSÉ LUIZ SILVA LOBATO
Auxiliar Operacional
Documento assinado eletronicamente
IRENILDA BATISTA DOS SANTOS URSULINO
Coordenadora
De acordo. Analisados os aspectos técnicos e formais de conveniência e oportunidade administrativa, encaminho o presente processo ao GE-DESUP, solicitando análise e manifestação, quanto a publicação da Dispensa Licitação e Portaria.
Documento assinado eletronicamente
LIELY GONÇALVES DE ANDRADE
Superintendente do Patrimônio da União no Amapá”
É o relatório.
II - FINALIDADE E ABRANGÊNCIA DO PARECER
Esta manifestação jurídica tem a finalidade de assistir a autoridade assessorada no controle interno da legalidade administrativa. A função do órgão de consultoria é apontar possíveis riscos do ponto de vista jurídico e recomendar providências para salvaguardar o Gestor Público, a quem compete avaliar a real dimensão do risco e a necessidade de se adotar ou não a precaução recomendada.
Importante salientar que o exame dos autos se restringe aos seus aspectos jurídicos, excluídos, portanto, aqueles de natureza técnica e/ou financeira. Em relação a estes, partiremos da premissa de que a autoridade assessorada municiou-se dos conhecimentos específicos imprescindíveis para a sua adequação às necessidades da Administração, observando os requisitos legalmente impostos.
De outro lado, cabe esclarecer que não é papel do órgão de assessoramento jurídico exercer a auditoria quanto à competência de cada agente público para a prática de atos administrativos. Incumbe, isto sim, a cada um destes observar se os seus atos estão dentro do seu limite de competências.
Destaque-se que determinadas observações são feitas sem caráter vinculativo, mas em prol da segurança da própria autoridade assessorada, a quem compete, dentro da margem de discricionariedade que lhe é conferida pela lei, avaliar e acatar, ou não, tais ponderações. Não obstante, as questões relacionadas à legalidade serão apontadas para fins de sua correção. O seguimento do processo sem a observância destes apontamentos será de responsabilidade exclusiva do(s) agente(s) público(s) envolvido(s).
Assim, caberá tão somente a esta Consultoria, à luz do art. 131 da Constituição Federal de 1988 e do art. 11 da Lei Complementar nº 73, de 1993, prestar assessoramento sob o enfoque estritamente jurídico, não sendo competência deste órgão consultivo o exame da matéria em razão das motivações técnica e econômica, nem da oportunidade e conveniência, tampouco fazer juízo crítico sobre cálculos e avaliações, ou mesmo invadir o campo relacionado à necessidade material no âmbito do órgão assessorado.
Ademais, tanto a possibilidade de doação quanto a possibilidade de dispensa foram objeto de apreciação no Parecer Referencial n. 00232/2020/ACS/CGJPU/CONJUR-PDG/PGFN/AGU, sendo desnecessário analisar novamente a matéria já sedimentada. Portanto, esta manifestação limita-se à análise da Minuta do Contrato de Doação com Encargos ao Município de Laranjal do Jari (SEI nº 29182767).
No mais, em relação à esfera discricionária do Administrador e à matéria eminentemente técnica (não jurídica), tem-se a orientação do Enunciado nº 7 do Manual de Boas Práticas Consultivas da Advocacia-Geral da União, no sentido de que:
"O Órgão Consultivo não deve emitir manifestações conclusivas sobre temas não jurídicos, tais como os técnicos, administrativos ou de conveniência ou oportunidade, sem prejuízo da possibilidade de emitir opinião ou fazer recomendações sobre tais questões, apontando tratar-se de juízo discricionário, se aplicável. Ademais, caso adentre em questão jurídica que possa ter reflexo significativo em aspecto técnico deve apontar e esclarecer qual a situação jurídica existente que autoriza sua manifestação naquele ponto".
III – FUNDAMENTAÇÃO
Ao abordar a doação de bens públicos, doutrina Marçal Justen Filho:
“Ressalva-se a hipótese de doação de bem público, gravada com encargo. Assim, por exemplo, poderá ser do interesse estatal a construção de um certo edifício em determinada área. Poderá surgir como solução promover uma doação de imóvel com encargo para o donatário promover a edificação. Essa é uma hipótese em que a doação deverá ser antecedida de licitação, sob pena de infringência do princípio da isonomia. Em outras hipóteses, porém, o encargo assumirá relevância de outra natureza. A doação poderá ter em vista a situação do donatário ou sua atividade de interesse social. Nesse caso, não caberá a licitação. Assim, por exemplo, uma entidade assistencial poderá receber doação de bens gravada com determinados encargos. (...) O instrumento de doação deverá definir o encargo, o prazo de seu cumprimento e a cláusula de reversão para o patrimônio público do bem doado em caso de descumprimento. A regra aplica-se tanto aos casos de dispensa de licitação como aqueles em que a licitação ocorrer." (Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 9ª edição. São Paulo: Dialética, 2002) (grifos e destaques)
Neste processo, pretende-se a formalização de contrato de doação, tendo como Outorgado-Donatário o Município de Laranjal do Jari/AP, ente federativo municipal, para fins de construção e instalação da Sede da Defesa Civil Municipal, com objetivo de uso voltado para o desenvolvimento das ações administrativas, técnicas e humanitária do órgão, declinados o encargo e o interesse nos serviços de natureza pública que serão prestados com a utilização do imóvel transferido pela União.
Logo, a alienação pretendida, na forma de Doação, tem por fundamento legal o disposto no art. 31 da Lei nº 9.636/98, que dispõe sobre a regularização, administração, aforamento e alienação de bens imóveis de domínio da União, altera dispositivos dos Decretos-Leis nº 9.760, de 5 de setembro de 1946, e nº 2.398, de 21 de dezembro de 1987, regulamenta o § 2º do art. 49 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, e dá outras providências:
"Art. 31. Mediante ato do Poder Executivo e a seu critério, poderá ser autorizada a doação de bens imóveis de domínio da União, observado o disposto no art. 23 desta Lei, a: (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007)
I - Estados, Distrito Federal, Municípios, fundações públicas e autarquias públicas federais, estaduais e municipais; (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)
(...)
§ 1 º No ato autorizativo e no respectivo termo constarão a finalidade da doação e o prazo para seu cumprimento.
§ 2 º O encargo de que trata o parágrafo anterior será permanente e resolutivo, revertendo automaticamente o imóvel à propriedade da União, independentemente de qualquer indenização por benfeitorias realizadas, se:
I - não for cumprida, dentro do prazo, a finalidade da doação;
II - cessarem as razões que justificaram a doação;
III - ao imóvel, no todo ou em parte, vier a ser dada aplicação diversa da prevista.
3º Nas hipóteses de que tratam os incisos I a IV do caput deste artigo, é vedada ao beneficiário a possibilidade de alienar o imóvel recebido em doação, exceto quando a finalidade for a execução, por parte do donatário, de projeto de assentamento de famílias carentes ou de baixa renda, na forma do art. 26 desta Lei, e desde que, no caso de alienação onerosa, o produto da venda seja destinado à instalação de infraestrutura, equipamentos básicos ou de outras melhorias necessárias ao desenvolvimento do projeto. (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007) (...)" (grifos e destaques)
Consoante a Lei nº 8.666/93, será dispensada a licitação ante o estabelecido no art. 17, inciso I, alínea "b" deste diploma:
"Art. 17. A alienação de bens da Administração Pública, subordinada à existência de interesse público devidamente justificado, será precedida de avaliação e obedecerá às seguintes normas:
I - quando imóveis, dependerá de autorização legislativa para órgãos da administração direta e entidades autárquicas e fundacionais, e, para todos, inclusive as entidades paraestatais, dependerá de avaliação prévia e de licitação na modalidade de concorrência, dispensada esta nos seguintes casos:
(...)
b) doação, permitida exclusivamente para outro órgão ou entidade da administração pública, de qualquer esfera de governo, ressalvado o disposto nas alíneas f, h e i; (Redação dada pela Lei nº 11.952, de 2009)
(...)
§ 1º Os imóveis doados com base na alínea "b" do inciso I deste artigo, cessadas as razões que justificaram a sua doação, reverterão ao patrimônio da pessoa jurídica doadora, vedada a sua alienação pelo beneficiário.
§ 2º A Administração também poderá conceder título de propriedade ou de direito real de uso de imóveis, dispensada licitação, quando o uso destinar-se: (Redação dada pela Lei nº 11.196, de 2005)
I - a outro órgão ou entidade da Administração Pública, qualquer que seja a localização do imóvel; (Incluído pela Lei nº 11.196, de 2005)” (grifado e destacado)
As razões de conveniência e oportunidade quanto à doação com encargo do imóvel de propriedade da União, assim como a Justificativa fundamentada para o ato, demonstrando o interesse público e social, nos termos da legislação vigente, foram consignadas pela área técnica do órgão assessorado na Nota Técnica SEI nº 44020/2022/ME (SEI nº 28341983).
Dos autos consta despacho checklist, com o fito de verificação da conformidade da documentação com o art. 31 da citada Lei nº 9.636, de 15 de maio de 1998, com os termos da Portaria SPU/ME nº 14.094, de 30 de novembro de 2021 e Portaria SEDDM/ME Nº 7.397 de 24 de junho de 2021 (SEI nº 28626450).
Conforme asseverado no documento supramencionado, elaborado pela Coordenação-Geral de Gestão de Bens de Uso da Administração Pública, é necessário submeter a referida doação à apreciação do Grupo Especial de Destinação Supervisionada (GE-DESUP), para atender ao estabelecido no inciso I do art. 3º da PORTARIA SEDDM/ME Nº 7.397, DE 24 DE JUNHO DE 2021, que regulamenta a Portaria Interministerial nº 6909/2021, do Ministro da Economia e do Ministro da Controladoria Geral da União, que institui regime especial de governança de destinação de imóveis da União:
"Art. 1º
(...)
II – Alienação por:
a) Doação;
(...)
§ 3º As alienações a que se refere o inciso II, do art. 1º desta Portaria, serão apreciadas e deliberadas pelos GE-DESUP-2, independentemente de valor e com distribuição equitativa de processos.
(...)
Art. 3º Para fins de análise, apreciação e deliberação de processos sobre imóveis abrangidos nas destinações previstas nessa portaria, deverão ser instituídos pela SPU os seguintes Grupos Especiais de Destinação Supervisionada (GE-DESUP), de caráter permanente:
I - Nível 1 (GE-DESUP-1), para imóveis com Valor de Referência (VREF) inferior a R$10.000.000,00 (dez milhões de reais);
II - Nível 2 (GE-DESUP-2), para imóveis com Valor de Referência (VREF) igual ou superior a R$10.000.000,00 (dez milhões de reais) e inferior a R$100.000.000,00 (cem milhões de reais); e"
A título de observação, destaca-se que a Portaria SEDDM/ME nº 7.397 de 24 de junho de 2021 foi revogada pela Portaria SEDDM/ME nº 9.239, de 20 de outubro de 2022, publicada em 21/10/2022. Contudo, quanto à destinação de imóveis da União na modalidade “alienação por doação”, manteve-se a competência do GE-DESUP-2 para realizar análise, apreciação e deliberação sobre esses processos:
“Art. 1º A destinação de imóveis da União, ou parcela deste(s), deverá observar o regime especial de governança instituído na presente portaria, que compreende as seguintes formas de destinação de imóveis geridos pela Secretaria de Coordenação e Governança do Patrimônio da União (SPU) da Secretaria Especial de Desestatização, Desinvestimento e Mercados (SEDDM) do Ministério da Economia:
(...)
II - Alienação por:
a) Doação;
(...)
Art. 3º Para fins de análise, apreciação e deliberação de processos sobre imóveis abrangidos nas destinações previstas nessa portaria, deverão ser instituídos pela SPU os seguintes Grupos Especiais de Destinação Supervisionada (GE-DESUP), de caráter permanente:
(...)
III - Nível 2 (GE-DESUP-2), para imóvel(is), ou parcela deste(s), com valor igual ou superior a R$ 10.000.000,00 (dez milhões de reais) e inferior a R$ 100.000.000,00 (cem milhões de reais), para imóveis de qualquer valor quando se tratar das destinações do inciso II do art. 1º desta Portaria e para o caso de que trata §4º, alínea "c", do art. 7º, desta Portaria, excluídas as destinações do inciso XIX do art. 1º desta Portaria e aquelas atribuídas ao GE-DESUP-0;”
Nesse ponto, foi juntado ao SEI nº 28905550 a Ata de Reunião do Grupo Especial de Destinação Supervisionada (GE-DESUP-2 REF APF), com deliberação "favorável à destinação, recomendando a autoridade competente o prosseguimento dos trâmites processuais". Contudo, a destinação fica condicionada à assinatura do contrato e juntada aos autos de esclarecimentos, por parte da prefeitura municipal, acerca da eventual necessidade de convalidação do convênio firmado, considerando que, segundo consta no processo, o início de sua vigência se deu em 3 de agosto, data coincidente com o período de defeso eleitoral.
Pelos termos da Portaria SPU/ME nº 14.094, de 30 de novembro de 2021, que delega competências para as autoridades que menciona para a prática de atos administrativos, os Superintendentes do Patrimônio da União estão autorizados a firmar os termos e contratos de alienação relativos a imóveis da União, após deliberação pelas instâncias competente. Em razão, o processo deve ser instruído com o ato autorizativo do(a) Secretário(a) de Coordenação e Governança do Patrimônio da União, da Secretaria Especial de Desestatização, Desinvestimento e Mercados, do Ministério da Economia, no uso da competência que lhe foi delegada pelo art. 1º, inciso I, da Portaria MP nº 54, de 22 de fevereiro de 2016.
Verifica-se nos autos minuta de portaria de autorização assinada pela autoridade competente levada à publicação - PORTARIA SPU/ME Nº 9262, DE 20 DE OUTUBRO DE 2022 (SEI nº 28975439 e 29061028).
Consta da instrução processual o Laudo de Avaliação n° 652/2022 (SEI 27770347), datado de 30/08/2022, o qual encontra-se vigente.
Quanto à minuta de contrato (SEI nº 29182767) elaborada para formalizar a doação, constata-se que suas cláusulas foram redigidas com clareza e em conformidade com a legislação aplicável, indicando a finalidade da doação, com previsão de prazos para cumprimento dos encargos, em conformidade com o § 1º do art. 31 da Lei nº 9.636, de 1998, contando com indicação do fundamento legal que embasa a doação e o ato de dispensa, assim como os normativos que conferem competência para a prática do ato pelos agentes públicos firmatários, além de descrição do objeto e seus elementos característicos, finalidade, vigência, obrigações da autarquia donatária, responsabilidades e rescisão contratual.
Recomenda-se a revisão de todos os seus termos para evitar indicação de normativos revogados, erros materiais, gramaticais ou de técnica de redação, sem alteração do teor dos aspectos jurídicos já abordados, sob pena de se criar necessidade de retorno para análise em caráter complementar, o que não se cogita por ora, posto que esta conferência dos dados é atribuição própria do órgão assessorado.
Objetivando aprimorar a redação, proponho a Superintendência do Patrimônio da União no Amapá (SPU/AP) observar, caso repute adequado e oportuno, a(s) seguinte(s) orientação(ões):
a) avaliar a conveniência da substituição da CLÁUSULA DÉCIMA TERCEIRA, a qual trata somente da eleição de foro, por CLÁUSULA dispondo sobre a possibilidade de conciliação e a eleição de foro, com a seguinte redação:
"As controvérsias decorrentes da execução do presente Contrato de Doação, com encargos, que não puderem ser solucionadas diretamente por mútuo acordo entre os partícipes, deverão ser encaminhadas ao órgão de consultoria e assessoramento jurídico do órgão ou entidade pública federal, sob a coordenação e supervisão da Câmara de Mediação e de Conciliação da Administração Federal (CCAF), órgão da Advocacia-Geral da União (AGU), para prévia tentativa de conciliação e solução administrativa de dúvidas de natureza eminentemente jurídica relacionadas à execução da parceria.
Não logrando êxito a tentativa de conciliação e solução administrativa, será competente para dirimir as questões decorrentes deste instrumento contratual o foro da Justiça Federal, Seção Judiciária do Estado do Amapá, nos termos do artigo 109, inciso I, da Constituição Federal, com renúncia de qualquer outro, por mais privilegiado ou especial que seja".
Conforme o Despacho SPU-DEGAT-CGBAP (SEI 28915688), “Tendo em vista que o caput do artigo 26 da Lei nº 8.666/1993 não menciona a referida hipótese de dispensa licitatória, não há necessidade de ratificação do ato pela autoridade superior, sendo suficiente a assinatura da Dispensa de Licitação pela chefia da Superintendência local, órgão competente para firmar o contrato de doação, conforme delineado no PARECER Nº 08915.2.2/2014/DPC/CONJURMP/CGU/AGU” (grifos nossos).
Em relação à distribuição gratuita de bens da União para entidades privadas ou públicas, verifica-se que a Lei nº 14.194, de 20 de agosto de 2021, em seu artigo 81-A (incluído por meio da Lei nº 14.435, de 04 de agosto de 2022), afastou a incidência da Lei nº 9.504, de 30 de setembro de 1997 quanto às doações com encargo para o donatário. Esta última legislação trata das proibições de transferências voluntárias de recursos da União, sob pena de nulidade de pleno direito, no ano em que se realizar eleição, nos termos abaixo destacados:
Lei nº 9.504/1997
Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:
(...)
§ 10. No ano em que se realizar eleição, fica proibida a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da Administração Pública, exceto nos casos de calamidade pública, de estado de emergência ou de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior, casos em que o Ministério Público poderá promover o acompanhamento de sua execução financeira e administrativa. (Incluído pela Lei nº 11.300, de 2006). (Negritei)
Com a nova legislação, a referida vedação passou a ser afastada em casos de doação de bens, valores ou benefícios a entidades privadas e públicas, desde que com encargo para o donatário, conforme se segue:
Lei nº 14.194/2021
Art. 81-A. A doação de bens, valores ou benefícios por parte da Administração Pública a entidades privadas e públicas, durante todo o ano, e desde que com encargo para o donatário, não se configura em descumprimento do § 10, do art. 73, da Lei nº 9.504, de 30 de setembro de 1997. (Redação dada pela Lei nº 14.435, de 2022) (Negritei)
De acordo com o Parecer nº 00535/2022/PGFN/AGU, vinculado ao Processo nº 19739.147636/2021-51, esclareceu-se que a alteração na legislação é aplicável ao ano eleitoral de 2022. Contudo, permanece válida a recomendação para a “não realização de solenidades, cerimônias, atos, eventos ou reuniões públicas de divulgação, ou qualquer outra forma de exaltação do ato administrativo de transferência capaz de afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais”.
Dessa forma, interpreta-se que o ato administrativo que se pretende consolidar por meio do Contrato de Doação com Encargos de imóvel da União é abrangido pelo artigo 81-A, da Lei nº 14.194/2021. Com isso, o procedimento ora analisado não se submete à vedação legal de distribuição de bens a particulares durante todo o ano de eleição.
IV - CONCLUSÃO
Pelo exposto, nos limites da análise jurídica efetuada e abstraídas questões atinentes ao mérito administrativo, conclui-se pela possibilidade jurídica da celebração do Contrato de Doação com Encargos (SEI nº 29182767) ora analisado, observadas as ressalvas e recomendações contidas nos parágrafos 26, 27 e 32 deste opinativo.
Feito tais registros, ao protocolo da Consultoria Jurídica da União Especializada de Patrimônio (eCJU/PATRIMÔNIO), para restituir o processo a Superintendência do Patrimônio da União no Amapá (SPU-AP) para ciência desta manifestação jurídica, objetivando a adoção da(s) providência(s) pertinente(s) para viabilizar a assinatura da minuta do Contrato de Doação com Encargos (SEI nº 29182767).
Brasília, 21 de novembro de 2022.
GLÓRIA BEATRIZ SARAIVA DE ALBUQUERQUE
ESTAGIÁRIA
JOÉLIA DE LIMA RODRIGUES
ADVOGADA DA UNIÃO CJU-RR/CGU/AGU
Atenção, a consulta ao processo eletrônico está disponível em https://supersapiens.agu.gov.br mediante o fornecimento do Número Único de Protocolo (NUP) 19739141160202225 e da chave de acesso 1446ba6a