ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA DA UNIÃO ESPECIALIZADA VIRTUAL DE PATRIMÔNIO
NÚCLEO JURÍDICO

 

EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) PROCURADOR DA REPÚBLICA  DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

 

Inquérito Civil nº : IC Nº 1.30.009.000782/2020-64

Nup CJU: 000439000010/2022-19

Outras NUP´S correlatas: 04967.004626/2012-70 e10154.102840/2021-49

 

Anexo SEI nº 28904098 e 25239316 (informação SPU)

 

Nelson Orlando de Alarcão Duccini, Advogado da União, lotado na Consultoria Jurídica Especializada Virtual de Patrimônio, tendo em vista a intimação para que se manifeste acerca da necessidade de procedimento licitatório,  vem, expor o que se segue:

 

De início é preciso ressaltar que o parecer n . 503/2022/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU de minha lavra, tinha como desiderado subsidiar a SPU/RJ  na resposta do requerimento datado do dia 09/05/2022 da empresa São José Desenvolvimento Imobiliário S/A que, invocando sua qualidade de sucessora da empresa TOURINTER, maneja vários pedidos, não só em relação a área 10, como também de indenização referente aos rips das áreas de 01 a 09 – (que foram anulados em razão de se encontrarem em área de proteção ambiental). Esperava-se que os autos retornassem ao signatário, após a manifestação da área técnica da SPU, para manifestação conclusiva acerca da necessidade ou não do certame licitatório.

 

Segundo as informações prestadas pela SPU, (documento em anexo - SEI nº 25239316), o requerimento da empresa foi indeferido e  houve recurso hierárquico que se encontra em processamento.

 

No documento SEI nº 28904098 (em anexo) a SPU informa que há autos de infração manejados contra a referida empresa decorrente do uso indevido relatado pelo MPF como também em decorrência de vistoria administrativa realizada

 

Os autos agora retornam com as informações prestadas e, outrossim, em virtude da manifestação do Parquet, solicitando, no que tange a este órgão de assessoria jurídica, esclarecimentos quanto ao caráter mandatório de certame licitatório.   

 

De inicio é preciso ressaltar que a OCUPAÇÃO E AFORAMENTO (ENFITEUSE) dos bens imóveis da união são institutos antigos, anteriores à ordem constitucional vigente e disciplinados no  ART. 49 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição de 1988: in verbis:

 

Art. 49. A lei disporá sobre o instituto da enfiteuse em imóveis urbanos, sendo facultada aos foreiros, no caso de sua extinção, a remição dos aforamentos mediante aquisição do domínio direto, na conformidade do que dispuserem os respectivos contratos.
 § 1º Quando não existir cláusula contratual, serão adotados os critérios e bases hoje vigentes na legislação especial dos imóveis da União.
§ 2º Os direitos dos atuais ocupantes inscritos ficam assegurados pela aplicação de outra modalidade de contrato.
§ 3º A enfiteuse continuará sendo aplicada aos terrenos de marinha e seus acrescidos, situados na faixa de segurança, a partir da orla marítima.
 § 4º Remido o foro, o antigo titular do domínio direto deverá, no prazo de noventa dias, sob pena de responsabilidade, confiar à guarda do registro de imóveis competente toda a documentação a ele relativa.

 

Com efeito, a atribuição de delimitação de áreas de domínio ou posse da União, cadastramento de imóveis, discriminação de áreas da União, controle e fiscalização de imóveis de posse e domínio da União e registro de atualização das respectivas informações nas bases de dados incumbe à própria SPU, no regular exercícios das atribuições legais conferidas em normativos decorrentes de sua estrutura regimental, a teor do Decreto nº 9.745, de 8 de Abril de 2019.

 

Destarte,  consoante definição contida no inciso I do art. 2º da IN SPU nº 03, de 2016, o aforamento ou enfiteuse consiste no “ato pelo qual a União atribui a terceiros o domínio útil de imóvel de sua propriedade, obrigando-se este último (foreiro ou enfiteuta) ao pagamento de pensão anual, denominada foro, na porcentagem de 0,6% do valor do domínio pleno do terreno".

 

Por outro lado, a ocupação não gera qualquer direito ao particular, sendo sempre concedida em caráter precário, podendo ser cancelada a qualquer tempo, por motivos de interesse público.

 

Via de regra, a legislação impõe que a concessão do aforamento seja precedida de certame licitatório, a fim de buscar a melhor oferta para a Administração, bem como abrindo a oportunidade de concorrência a todos os interessados na aquisição do referido domínio.

Há, porém, hipóteses excepcionais em que se prevê a possibilidade do exercício do direito de preferência por aqueles que cumpram a determinados requisitos legais.

 

Têm direito ao aforamento, na forma explicitada pela IN SPU nº 03, de 2016, aqueles que se enquadram no previsto pelos arts. 105 e 215 do Decreto-Lei nº 9.760, de 1946:

 

"Art. 104. Decidida a aplicação do regime enfitêutico a terrenos compreendidos em determinada zona, a SPU notificará os interessados com preferência ao aforamento nos termos dos arts. 105 e 215, para que o requeiram dentro do prazo de cento e oitenta dias, sob pena de perda dos direitos que porventura lhes assistam. (Redação dada pela Lei nº 9.636, de 1998)
Parágrafo único. A notificação será feita por edital afixado na repartição arrecadadora da Fazenda Nacional com jurisdição na localidade do imóvel, e publicado no Diário Oficial da União, mediante aviso publicado três vezes, durante o período de convocação, nos dois jornais de maior veiculação local e, sempre que houver interessados conhecidos, por carta registrada. (Redação dada pela Lei nº 9.636, de 1998) 
 
Art. 105. Tem preferência ao aforamento:
1º – os que tiverem título de propriedade devidamente transcrito no Registo de Imóveis;
2º – os que estejam na posse dos terrenos, com fundamento em título outorgado pelos Estados ou Municípios;
3º – os que, necessariamente, utilizam os terrenos para acesso às suas propriedades;
4º – os ocupantes inscritos até o ano de 1940, e que estejam quites com o pagamento das devidas taxas, quanto aos terrenos de marinha e seus acrescidos;
5º – os que, possuindo benfeitorias, estiverem cultivando, por si e regularmente, terras da União, quanto às reservadas para exploração agrícola, na forma do art. 65; (Revogado pela Lei nº 9.636, de 1998)
6º – os concessionários de terrenos de marinha, quanto aos seus acréscidos, desde que estes não possam constituir unidades autônomas;
7º – os que no terreno possuam benfeitorias, anteriores ao ano de 1940, de valor apreciável em relação ao daquele;"
[...]
Art. 106. Os pedidos de aforamento serão dirigidos ao Chefe do órgão local do S.P.U., acompanhados dos documentos comprobatórios dos direitos alegados pelo interessado e de planta ou croquis que identifique o terreno. Art. 107.  (Revogado pelo Decreto-lei nº 2.398, de 1987)
 
Art. 108. O Superintendente do Patrimônio da União no Estado apreciará a documentação e, deferindo o pedido, calculará o foro, com base no art. 101, e concederá o aforamento, devendo o foreiro comprovar sua regularidade fiscal perante a Fazenda Nacional até o ato da contratação. (Redação dada pela Lei nº 13.139, de 2015)       
Parágrafo único.  O Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão estabelecerá diretrizes e procedimentos simplificados para a concessão do aforamento de que trata o caput(Incluído pela Lei nº 13.139, de 2015)  
 
Art. 109.  Concedido o aforamento, será lavrado em livro próprio da Superintendência do Patrimônio da União o contrato enfitêutico de que constarão as condições estabelecidas e as características do terreno aforado.    (Redação dada pela Lei nº 13.139, de 2015) 
Art. 110. Expirado o prazo de que trata o art. 104 e não havendo interesse do serviço público na manutenção do imóvel no domínio pleno da União, a SPU promoverá a venda do domínio útil dos terrenos sem posse, ou daqueles que se encontrem na posse de quem não tenha atendido à notificação a que se refere o mesmo artigo ou de quem, tendo requerido, não tenha preenchido as condições necessárias para obter a concessão do aforamento. (Redação dada pela Lei nº 9.636, de 1998)
 
Art. 111.  (Revogado pelo Decreto-lei nº 2.398, de 1987)
[...]
Art. 215. Os direitos peremptos por força do disposto nos arts. 2028 e 35 do Decreto-lei n° 3.438, de 17 de Julho de 1941, e 7º do Decreto-lei n° 5.666, de 15 da Julho de 1943, ficam revigorados correndo os prazos para o seu exercício da data da notificação de que trata o art. 104 deste Decreto-lei." 

 

Por sua vez, prevê o Decreto-Lei 2.398/1987:

 

"Art. 5o Ressalvados os terrenos da União que, a critério do Poder Executivo, venham a ser considerados de interesse do serviço público, conceder-se-á o aforamento:                (Redação dada pela Lei nº 9.636, de 1998)
I - independentemente do pagamento do preço correspondente ao valor do domínio útil, nos casos previstos nos arts. 105 e 215 do Decreto-Lei no 9.760, de 1946;                (Redação dada pela Lei nº 9.636, de 1998)
II - mediante leilão público ou concorrência, observado o disposto no art. 99 do Decreto-Lei no 9.760, de 1946.                 (Redação dada pela Lei nº 9.636, de 1998)
Parágrafo único. Considera-se de interesse do serviço público todo imóvel necessário ao desenvolvimento de projetos públicos, sociais ou econômicos de interesse nacional, à preservação ambiental, à proteção dos ecossistemas naturais e à defesa nacional, independentemente de se encontrar situado em zona declarada de interesse do serviço público, mediante portaria do Secretário do Patrimônio da União.             (Incluído pela Lei nº 9.636, de 1998) "

 

Segundo o previsto pelo Art. 14 e da IN SPU n. 03, de 2016:

 

"Art. 14. Tem preferência ao aforamento gratuito, conforme oart. 105 do Decreto-Lei nº 9.760, de 1946:
I - os que tiverem título de propriedade devidamente registrado ou transcrito no Registro de Imóveis cuja cadeia retroaja ininterruptamente a 5 de setembro de 1946, desde que, naquela data,os registros e transcrições não fizessem qualquer menção que pudesse levar à conclusão de que a verdadeira proprietária da área era a União, a exemplo de referências a terrenos de marinha e acrescidos de marinha;
[...]
Art. 15. Tem preferência ao aforamento gratuito os que se enquadrem no art. 20 ou 35do Decreto-Lei nº 3.438, de 1941, combinado com o art. 215 do Decreto-Lei nº 9.760,de 1946.
Parágrafo único. Para ser reconhecido o direito ao aforamento gratuito com base no art.20 do Decreto-Lei nº 3.438, de 1941, combinado com o art. 215 do Decreto-Lei nº9.760, de 1946, não é suficiente a comprovação da existência de um vínculo jurídico com o bem, sendo indispensável que o posseiro ou os antecessores na cadeia ininterrupta exercessem de fato detenção física sobre o imóvel em 22 de julho de 1941,data de publicação daquele diploma legal." (sem negritos no original).

 

 

 Assim a depender da hipótese específica, o aforamento poderá ser:

 

Logo, incumbe à SPU verificar se persiste a preferência ao aforamento gratuito ou se à mingua deste, é possível o aforamento  oneroso,  conforme o art. 13 da Lei 9.636/1998:

 

Art. 13.  Na concessão do aforamento, será dada preferência a quem, comprovadamente, em 10 de junho de 2014, já ocupava o imóvel há mais de 1 (um) ano e esteja, até a data da formalização do contrato de alienação do domínio útil, regularmente inscrito como ocupante e em dia com suas obrigações perante a Secretaria do Patrimônio da União do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão.         

 

Conforme dispõe o Art. 18 da IN SPU n. 03, de 2016:

 

"Art. 18. Decidido o aforamento, previamente à deflagração do procedimento licitatório, será dada preferência a quem, comprovadamente, em 10 de junho de 2014, já ocupava o imóvel há mais de1 (um) ano e esteja, até a data da formalização do contrato de alienação do domínio útil, regularmente inscrito como ocupante e em dia com suas obrigações perante a Secretaria do Patrimônio da União do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão."

 

De forma diversa da preferência ao aforamento gratuito, no qual se verifica a cadeia possessória, no aforamento oneroso a legislação fez menção somente à ocupação pelo próprio interessado.

Por outro lado a In 04, de 2018, disciplina as condicionantes para que a concessão de ocupação, em seu artigo 6º:

 

Art. 6º A inscrição de ocupação somente ocorrerá quando forem preenchidos os seguintes requisitos legais e normativos:
I - comprovação do efetivo aproveitamento;
II - interessado comprovar que a ocupação do imóvel ocorreu até a data prevista no inc. I do art. 9º da Lei nº 9.636, de 1998; e
III - que o imóvel não esteja inserido nas vedações do art. 9º da Lei nº 9.636, de 1998, e do art. 12 desta IN.
 
Art. 9o É vedada a inscrição de ocupações que:
I - ocorreram após 10 de junho de 2014;                   (Redação dada pela Lei nº 13.139, de 2015)
II - estejam concorrendo ou tenham concorrido para comprometer a integridade das áreas de uso comum do povo, de segurança nacional, de preservação ambiental ou necessárias à preservação dos ecossistemas naturais e de implantação de programas ou ações de regularização fundiária de interesse social ou habitacionais das reservas indígenas, das áreas ocupadas por comunidades remanescentes de quilombos, das vias federais de comunicação e das áreas reservadas para construção de hidrelétricas ou congêneres, ressalvados os casos especiais autorizados na forma da lei.                   (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007)

 

A legislação prorrogou os prazos para que os ocupantes pudessem estabilizar suas relações jurídicas com a União, a depender do preenchimentos dos requisitos fáticos nela contidos, e desde que não colidisse com interesse público de maior magnitude (embaraços à navegação, à proteção de fronteiras, segurança nacional, meio ambiente etc) tudo conforme o complexo de normativos que disciplinam a matéria.

 

Recorde-se que,  na reunião do dia 03 de junho de 2022, a área técnica da SPU havia sinalizado, de maneira perfunctória, que a empresa requerente teria direito, em tese, a concessão de aforamento gratuito, desde que comprovada a cadeia possessória.  

 

Preenchido este requisito, a necessidade de prévia licitação encontra-se afastada, sendo possível, outrossim, à míngua desta, também em tese, a concessão de aforamento oneroso, se a ocupação se deu até 2014, mas cujo rito é bem diferente, exigindo-se, inclusive, publicação de edital para que eventuais terceiros interessados possam impugná-lo.

 

Esclareço ainda, que a competência para concessão ou não de aforamento ou outro instrumento de natureza contratual não é da autoridade local, mas sim de órgão colegiado, situado na SPU/SEDE, a depender o instrumento que será celebrado e do valor de alçada.

 

Por derradeiro,  solicito que as intimações referentes sejam endereçadas à caixa de e-mail criada e destinada exclusivamente para este fim: cjurj.intima@agu.gov.br

 

                            Termos em que pede deferimento. 

 

                            Rio de Janeiro, 22 de novembro de 2022.

 

 

 

 

NELSON ORLANDO DE ALARCÃO DUCCINI

ADVOGADO DA UNIÃO

MATRÍCULA SIAPE 1311909 OAB/RJ 77.103

 

 


Atenção, a consulta ao processo eletrônico está disponível em https://supersapiens.agu.gov.br mediante o fornecimento do Número Único de Protocolo (NUP) 00439000010202219 e da chave de acesso 3bdfc07c

 




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