ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA DA UNIÃO ESPECIALIZADA VIRTUAL DE PATRIMÔNIO
NÚCLEO JURÍDICO

 

PARECER n. 00987/2022/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU

 

NUP: 62027.003950/2021-88

INTERESSADOS: COMANDO DO 2º DISTRITO NAVAL (2ºDN/BA) (CJU-BA)

ASSUNTOS: Inexigibilidade. Permuta de Imóvel.

 

 
EMENTA: Permuta de imóvel por obrigações a construir. Desmembramento. Não cumprimento do Oficial de registro no prazo fixado pela Lei de Registros Públicos. Prejuízo da União. Necessidade de interpelação sob pena de medidas judiciais cabíveis a juizo do órgão de contencioso. Impossibilidade de publicação do ato de inexigibilidade enquanto não aberta a matrícula da parcela desmembrada do imóvel. Objeto da licitação inexistente. Pela possibilidade de assinatura do contrato de promessa de permuta  após o dia 1º de abril de 2023 com base na Lei n. 8.666/93 desde que o procedimento de inexigibilidade de licitação que lhe der causa tiver início antes desta data.
 

 

O Comando do 2º Distrito Naval de Salvador/BA encaminha consulta a esta Consultoria Jurídica especializada de Patrimônio entabulada no Ofício nº 01.2—187, de 18 de novembro de 2022.

Pergunta em seu Ofício se diante do disposto no parágrafo 30 do PARECER n. 862/2022/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU (seq.3), i) poderia assinar, ratificar e publicar o Termo de Inexigibilidade de licitação, antes do desmembramento e registro da fração do terreno; e ii) da possibilidade de assinar o contrato de promessa de permuta, após o desmembramento e individualização da matrícula, caso ocorra após expirada a vigência da Lei n. 8.666/93.

Segundo narrado no Ofício:

“2. No decorrer do procedimento de individualização da parcela a ser permutada, o correspondente cartório de imóvel participou a impossibilidade de efetuar o registro da individualização da matrícula dele imediato, uma vez que o livro em que o registro foi assentado encontra-se em restauração, de modo que os atos cartorários somente serão praticados a posteriori, possivelmente quando a Lei 8666/91, sobre a qual se fundou o presente processo de alienação, não mais estará em vigor.
3. O item 30 do parecer em comento, com esteio no contido no art. 37, da Lei n. 6.766/1979, alerta que a formalização do contrato de promessa de permuta que se pretende só poderá ser firmado após a efetivação do desmembramento da área e abertura da respectiva matrícula, uma vez que é vedado vender ou prometer vender parcela de loteamento ou desmembramento não registrado.
4. Neste contexto, considerando que a assinatura do TJIL, com a ratificação da autoridade competente e publicação no DOU, são etapas que antecedem a formalização do contrato de promessa de permuta, suscitou-se dúvidas sobre a viabilidade de fazê-lo, pois, como dito, a vedação refere-se  à assinatura do contrato, sendo a silente no que diz respeito ao termo de afastamento do processo licitatório".

 

É o que importa relatar.

 

DOS FUNDAMENTOS

Como já noticiado nos autos, pretende o Comando do 2º Distrito Naval em Salvador/BA proceder à alienação do domínio pleno de imóveis de propriedade da União administrado pelo Comando da Marinha, mediante permuta por edificações a construir, com natureza de obra de engenharia.

Trata-se de procedimento de inexigibilidade de licitação, precedida de Chamamento público em que se apresentara uma única interessada, para fins de permuta de fração de 217,39m2, do terreno da Vila Naval do Morro do Gavazza (VNGG), RIP 3849.00399.500-3, recebendo em contrapartida, a construção de, no mínino, quatro próprios nacionais residenciais (PNR) tipo casa, a serem construídas na Vila Naval da Barragem (VNB).

Como se trata de alienação de fração de um terreno muito maior, ficou consignado no no parágrafo 30 do PARECER n. 862/2022/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU (seq.3):

"30. Segundo informações contidas nos autos, pretende-se permutar fração de 217.39m2 de uma área de 70.232,30m2, de que trata a matrícula no Registro Geral n. 7981, licro 3-K, em 27.06.1944, no cartório do 10º Ofício de Registro de Imóveis de Salvador/BA. Ocorre que, muito embora conste Ofício da SPU daquele Estado direcionado ao respectivo registro para proceder tal individualização da parcela, consta informação na Nota Técnica nº 11/2022 (fls. 471) que o referido procedimento ainda está em andamento.
31. Desta forma, adverte-se que a formalização do contrato de promessa de permuta que se pretende só poderá ser firmado após a efetivação do desmembramento da área e abertura da respectiva matrícula em obediência ao disposto no art. 37 da Lei n. 6.766/79:
 
Art. 37. É vedado vender ou prometer vender parcela de loteamento ou desmembramento não registrado.

 

Pois bem, a razão da existência de tal proibição é coibir que os parcelamentos de solo urbano sejam levados a efeito sem nenhum controle ou fiscalização maior por parte das entidades públicas competentes,servindo de vetor às regulamentações de cada localidade municipal. Assim, seja para evitar fracionamentos de lotes de imóveis ao arrepio das exigências mínimas exigidos pelas normas locais, como também para definir que imóvel não registrado (no sentido amplo da palavra, para definir aquele que não tem a matrícula respectiva) não existe no mundo jurídico.

 

Note-se, inclusive, que é o entendimento obtido na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, tomando-se como exemplo:

 
Tema: Contrato de compra e venda. Desmembramento de imóvel. Matrícula individualizada. Necessidade. Averbação junto ao Cartório de Registro de Imóveis. Condição indispensável para a procedência da ação de adjudicação compulsória.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

"A norma contida no artigo 37 da Lei n. 6.766/1979 (Lei de parcelamento do solo urbano) afirma que "É vedado vender ou prometer vender parcela de loteamento ou desmembramento não registrado".

Além disso, segundo o regramento previsto no Decreto-Lei n. 58/1937, julgada procedente a ação de adjudicação compulsória, a sentença valerá como título para transcrição no cartório de registro de imóveis respectivo.

Assim, se o imóvel de cuja escritura se exige a outorga não tem matrícula própria, individualizada no registro de imóveis, eventual sentença que substitua a declaração de vontade do promitente vendedor torna-se inócua, pois insuscetível de transcrição.

A ação de adjudicação compulsória, classificada como ação de execução em sentido lato, não se limita a condenar, dispensando execução típica posterior. Por isso a existência de imóvel registrável é condição específica da ação de adjudicação compulsória, de modo que a averbação do desmembramento de imóvel urbano, devidamente aprovado pela prefeitura municipal, é formalidade que antecede necessariamente o registro de área fracionada" (REsp 1.851.104-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 12/05/2020, DJe 18/05/2020).

 

Parte-se da premissa, portanto, que não existindo o imóvel no mundo jurídico, a Administração Pública não poderá assinar, ratificar e publicar o Termo de Inexigibilidade de licitação, antes do desmembramento e registro da fração do terreno, porquanto o objeto a ser dado em permuta configurar-se-ia como inexistente.

Ademais, tal intento esbarraria no princípio da economicidade dos atos licitatórios da administração pública, já que somente com a consolidação do ato jurídico de abertura da matrícula do imóvel no registro imobiliário é que se teria a certeza da viabilidade do parcelamento do solo. Até então, são conjecturas e incertezas que parecem não caber como fundamento à abertura de um processo licitatório, principalmente, quando uma inexigibilidade.

 

DOS PRAZOS REGISTRAIS

É ressabido que o legislador pátrio estabeleceu o prazo de trinta dias para o registrador processar todos os atos pertinentes à efetivação do registro da propriedade imóvel, que vão da recepção do título ao registro da transmissão, oneração ou atos averbatórios. Nesse sentido expressamente dispõe o artigo 188 da Lei n. 6015 de 31 de dezembro de 1973 - Lei de Registros Públicos.

Art. 188. Protocolizado o título, proceder-se-á ao registro, dentro do prazo de trinta dias, salvo nos casos previstos nos artigos seguintes.
 
 

Esclarece o insigne especialista Walter Ceneviva[1]:

"No artigo, registro é usado no sentido comum, e não no técnico, do art. 168, pois se aplica à matrícula, à averbação, à inscrição, além do registro propriamente dito.
A obrigação de realizar o registro dentro de trinta dias, no máximo, é do oficial, que responde disciplinarmente pelo retardamento, sendo de notar que o prazo é reduzido a metade nos contratos referentes ao Sistema Financeiro de habitação, ...."

 

Observa-se que o final do art. 188 faz as ressalvas ao cumprimento daquele prazo, que estão nos artigos seguintes, a saber:

Art. 189 - Apresentado título de segunda hipoteca, com referência expressa à existência de outra anterior, o oficial, depois de prenotá-lo, aguardará durante 30 (trinta) dias que os interessados na primeira promovam a inscrição. Esgotado esse prazo, que correrá da data da prenotação, sem que seja apresentado o título anterior, o segundo será inscrito e obterá preferência sobre aquele.                     (Renumerado do art. 190 com nova redação pela Lei nº 6.216, de 1975).

Art. 190 - Não serão registrados, no mesmo dia, títulos pelos quais se constituam direitos reais contraditórios sobre o mesmo imóvel.                   (Renumerado do art. 191 com nova redação pela Lei nº 6.216, de 1975).

Art. 191 - Prevalecerão, para efeito de prioridade de registro, quando apresentados no mesmo dia, os títulos prenotados no Protocolo sob número de ordem mais baixo, protelando-se o registro dos apresentados posteriormente, pelo prazo correspondente a, pelo menos, um dia útil.                   (Renumerado do art. 192 com nova redação pela Lei nº 6.216, de 1975).

Art. 192 - O disposto nos arts. 190 e 191 não se aplica às escrituras públicas, da mesma data e apresentadas no mesmo dia, que determinem, taxativamente, a hora da sua lavratura, prevalecendo, para efeito de prioridade, a que foi lavrada em primeiro lugar.               (Renumerado do artigo 192 parágrafo único pela Lei nº 6.216, de 1975).

Art. 193. O registro será feito pela simples exibição do título, sem dependência de extratos.

Art. 194. Os títulos físicos serão digitalizados, devolvidos aos apresentantes e mantidos exclusivamente em arquivo digital, nos termos estabelecidos pela Corregedoria Nacional de Justiça do Conselho Nacional de Justiça.     (Redação dada pela Lei nº 14.382, de 2022)

Art. 195 - Se o imóvel não estiver matriculado ou registrado em nome do outorgante, o oficial exigirá a prévia matrícula e o registro do título anterior, qualquer que seja a sua natureza, para manter a continuidade do registro.                (Renumerado do art. 197 com nova redação pela Lei nº 6.216, de 1975).

 

Inclua-se entre as exceções do prazo fixado no art. 188, a suscitação de dúvida prevista no art. 198, com as repercussões do art. 203, a saber:

 

Art. 198. Se houver exigência a ser satisfeita, ela será indicada pelo oficial por escrito, dentro do prazo previsto no art. 188 desta Lei e de uma só vez, articuladamente, de forma clara e objetiva, com data, identificação e assinatura do oficial ou preposto responsável, para que:   (Redação dada pela Lei nº 14.382, de 2022)

I - (revogado);   (Redação dada pela Lei nº 14.382, de 2022)

II - (revogado);   (Redação dada pela Lei nº 14.382, de 2022)

III - (revogado);    (Redação dada pela Lei nº 14.382, de 2022)

IV - (revogado);   (Redação dada pela Lei nº 14.382, de 2022)

V - o interessado possa satisfazê-la; ou   (Incluído pela Lei nº 14.382, de 2022)

VI - caso não se conforme ou não seja possível cumprir a exigência, o interessado requeira que o título e a declaração de dúvida sejam remetidos ao juízo competente para dirimi-la.   (Incluído pela Lei nº 14.382, de 2022)

§ 1º O procedimento da dúvida observará o seguinte:   (Incluído pela Lei nº 14.382, de 2022)

I - no Protocolo, o oficial anotará, à margem da prenotação, a ocorrência da dúvida;    (Incluído pela Lei nº 14.382, de 2022)

II - após certificar a prenotação e a suscitação da dúvida no título, o oficial rubricará todas as suas folhas;   (Incluído pela Lei nº 14.382, de 2022)

III - em seguida, o oficial dará ciência dos termos da dúvida ao apresentante, fornecendo-lhe cópia da suscitação e notificando-o para impugná-la perante o juízo competente, no prazo de 15 (quinze) dias; e   (Incluído pela Lei nº 14.382, de 2022)

IV - certificado o cumprimento do disposto no inciso III deste parágrafo, serão remetidos eletronicamente ao juízo competente as razões da dúvida e o título.    (Incluído pela Lei nº 14.382, de 2022)

§ 2º A inobservância do disposto neste artigo ensejará a aplicação das penas previstas no art. 32 da Lei nº 8.935, de 18 de novembro de 1994, nos termos estabelecidos pela Corregedoria Nacional de Justiça do Conselho Nacional de Justiça.   (Incluído pela Lei nº 14.382, de 2022)

Art. 199 - Se o interessado não impugnar a dúvida no prazo referido no item III do artigo anterior, será ela, ainda assim, julgada por sentença.                 (Renumerado do art. 201 § 1º com nova redação pela Lei nº 6.216, de 1975).

Art. 200 - Impugnada a dúvida com os documentos que o interessado apresentar, será ouvido o Ministério Público, no prazo de dez dias.                      (Renumerado do art. 202 com nova redação pela Lei nº 6.216, de 1975).

Art. 201 - Se não forem requeridas diligências, o juiz proferirá decisão no prazo de quinze dias, com base nos elementos constantes dos autos. 

Art. 203 - Transitada em julgado a decisão da dúvida, proceder-se-á do seguinte modo:                  (Renumerado dos arts. 203 e 204 com nova redação pela Lei nº 6.216, de 1975).

I - se for julgada procedente, os documentos serão restituídos à parte, independentemente de translado, dando-se ciência da decisão ao oficial, para que a consigne no Protocolo e cancele a prenotação;

II - se for julgada improcedente, o interessado apresentará, de novo, os seus documentos, com o respectivo mandado, ou certidão da sentença, que ficarão arquivados, para que, desde logo, se proceda ao registro, declarando o oficial o fato na coluna de anotações do Protocolo.

 

Pelo exposto, parece-nos que o fato de o livro estar em fase de restauração não enseja motivo para o Oficial se abster de proceder ao registro no prazo fixado pelo art. 188, o que impõe seja interpelado a respeito pelo órgão consulente. Acaso continue com a negativa, deverá o órgão consulente provocar a Procuradoria Regional da União em Salvador para que esta tome as medidas judiciais que entender pertinentes, porquanto ser evidente que a demora acarreta prejuízos à União, proprietário de parte remanescente, e que necessita efetuar o desmembramento do registro para suas atividades e inerentes ao seu direito de propriedade constitucionalmente assegurado.

 

Ademais, a Lei 8935/1994 dispõe acerca das obrigações dos registradores:

 

Art. 30. São deveres dos notários e dos oficiais de registro:
I - manter em ordem os livros, papéis e documentos de sua serventia, guardando-os em locais seguros;
II - atender as partes com eficiência, urbanidade e presteza;
III - atender prioritariamente as requisições de papéis, documentos, informações ou providências que lhes forem solicitadas pelas autoridades judiciárias ou administrativas para a defesa das pessoas jurídicas de direito público em juízo;
IV - manter em arquivo as leis, regulamentos, resoluções, provimentos, regimentos, ordens de serviço e quaisquer outros atos que digam respeito à sua atividade;
V - proceder de forma a dignificar a função exercida, tanto nas atividades profissionais como na vida privada;
VI - guardar sigilo sobre a documentação e os assuntos de natureza reservada de que tenham conhecimento em razão do exercício de sua profissão;
VII - afixar em local visível, de fácil leitura e acesso ao público, as tabelas de emolumentos em vigor;
VIII - observar os emolumentos fixados para a prática dos atos do seu ofício;
IX - dar recibo dos emolumentos percebidos;
X - observar os prazos legais fixados para a prática dos atos do seu ofício;
(...)
 
Art. 31. São infrações disciplinares que sujeitam os notários e os oficiais de registro às penalidades previstas nesta lei:
I - a inobservância das prescrições legais ou normativas;
II - a conduta atentatória às instituições notariais e de registro;
III - a cobrança indevida ou excessiva de emolumentos, ainda que sob a alegação de urgência;
IV - a violação do sigilo profissional;
V - o descumprimento de quaisquer dos deveres descritos no art. 30.
 

Segue a referida lei acerca da fiscalização dos atos de registro.

 
CAPÍTULO VII
Da Fiscalização pelo Poder Judiciário
Art. 37. A fiscalização judiciária dos atos notariais e de registro, mencionados nos artes. 6º a 13, será exercida pelo juízo competente, assim definido na órbita estadual e do Distrito Federal, sempre que necessário, ou mediante representação de qualquer interessado, quando da inobservância de obrigação legal por parte de notário ou de oficial de registro, ou de seus prepostos.
Parágrafo único. Quando, em autos ou papéis de que conhecer, o Juiz verificar a existência de crime de ação pública, remeterá ao Ministério Público as cópias e os documentos necessários ao oferecimento da denúncia.
 
Art. 38. O juízo competente zelará para que os serviços notariais e de registro sejam prestados com rapidez, qualidade satisfatória e de modo eficiente, podendo sugerir à autoridade competente a elaboração de planos de adequada e melhor prestação desses serviços, observados, também, critérios populacionais e sócio-econômicos, publicados regularmente pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.

 

DAS REPERCUSSÕES DA NOVA LEI DE LICITAÇÕES

Convém registrar a publicação, no Diário Oficial da União de 01/04/2021, Edição extra-F, da Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021, nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, que entrou em vigor na data de sua publicação. No art. 193, inciso II, da nova Lei, dispôs-se que as Leis nº 8.666, de 1993, nº 10.520, de 17 de julho de 2002, e os arts. 1º a 47-A da Lei nº 12.462, de 4 de agosto de 2011, estarão revogadas após o decurso do prazo de 2 (dois) anos da publicação oficial da referida Lei.

Previu-se que, até o decurso do prazo de 2 (dois) anos da publicação oficial da nova Lei de Licitações e Contratos, a Administração poderá optar por licitar ou contratar diretamente de acordo com a referida Lei ou de acordo com as Leis nº 8.666, de 1993, nº 10.520, de 2002, e nº 12.462, de 2011, devendo a opção escolhida ser indicada expressamente no edital ou no aviso ou instrumento de contratação direta, vedada a aplicação combinada da nova Lei de Licitações e Contratos com os dispositivos das leis revogadas, conforme previsto no art. 191 da Lei nº 14.133, de 2021, verbis:

 

Art. 191. Até o decurso do prazo de que trata o inciso II do caput do art. 193, a Administração poderá optar por licitar ou contratar diretamente de acordo com esta Lei ou de acordo com as leis citadas no referido inciso, e a opção escolhida deverá ser indicada expressamente no edital ou no aviso ou instrumento de contratação direta, vedada a aplicação combinada desta Lei com as citadas no referido inciso.
Parágrafo único. Na hipótese do caput deste artigo, se a Administração optar por licitar de acordo com as leis citadas no inciso II do caput do art. 193 desta Lei, o contrato respectivo será regido pelas regras nelas previstas durante toda a sua vigência.

 

Sobre o tema, ao examinar a aplicabilidade da Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, a Câmara Nacional de Modelos de Licitações e Contratos Administrativos da Consultoria-Geral da União — CNMLC/DECOR/CGU, que integra a Advocacia-Geral da União, exarou o Parecer nº 00002/2021/CNMLC/CGU/AGU, no qual concluiu que a Lei nº 8.666, de 1993, a Lei nº 10.520, de 2002, e a Lei nº 12.462, de 2011, devem continuar em aplicação até que sejam editados os regulamentos previstos na Lei nº 14.133, de 2021, para os pontos em que isso ficou estabelecido pelo Congresso Nacional no novo texto legal.

 

Pois bem, a consulta formulada pelo órgão consulente traz conotação sui generis, típico de direito intertemporal. Ou seja, vigência e aplicabilidade de normas em momento de transição entre normativos.

A regra acima, prevista no parágrafo único do art. 191, dispõe que no caso de o órgão utilizar as legislações previstas no art. 193, II, da Lei n. 14.133/2021, o contrato será regido pela Lei n. 8.666/93 e pela Lei n. 10.520/2002 (objetos da consulta), independente se o instrumento contratual for assinado antes ou depois do dia 1º de abril de 2023, quando estas legislações estarão revogadas.

Neste sentido, colhe-se lição extraída do e-book Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, pg. 09 (Joel de Menezes Niebuhr et al. 2. ed. Curitiba: Zênite, 2021. 1. 283p.):

 
"O caput do artigo 190 da Lei n. 14.133/2021 preceitua que o contrato assinado antes da entrada em vigor da lei nova continua seguindo o regime antigo, até porque se configura como ato jurídico perfeito, não podendo ser alterado pela lei nova, como reconhece o artigo 6º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro. Daí que, tudo que foi contratado até a publicação da lei nova, segue o regime antigo, baseado na Lei n. 8.666/1993.
Em adição, o parágrafo único do artigo 191 esclarece que, mesmo depois da entrada em vigência da Lei n. 14.133/2021, nas situações em que a Administração preferir licitar com o regime antigo, dentro dos 2 (dois) anos autorizados pelo caput do mesmo artigo 191, os contratos que lhe sejam decorrentes seguem o regime antigo.
A regra é relativamente simples: o regime do contrato segue o regime da licitação, porque o contrato é vinculado à licitação. Se a licitação é pelo regime antigo, o contrato, da mesma forma, é pelo regime antigo. Licitado pelo regime novo, o contrato segue o regime novo.
Sendo assim, pode vir a ocorrer de licitação ser concluída antes do marco final de 2 (dois) anos e demorar-se para assinar o contrato, por qualquer razão, de modo que passe o prazo sem que ele tenha sido adequadamente formalizado. O contrato, nesse caso, deve seguir o mesmo regime antigo, que foi o adotado na licitação, em vista do parágrafo único do artigo 191 da Lei n. 14.133/2021. Não há impedimento de que seja assinado sob o regime antigo depois que decorridos os 2 (dois) anos".

 

Assim sendo, com arrimo na interpretação do art. 191, parágrafo único, da Lei n. 14.133/2021 e respondendo à consulta entabulada, os processos iniciados antes de 31 de março de 2023 não deverão ser anulados tampouco reiniciados com base na nova lei a partir de 1º de abril de 2023, apenas seguirão o regime contratual da Lei n. 8.666/93, mesmo que assinados após a revogação destas, posto que os processos foram instruídos com fundamentos legais nestas legislações.

 

CONCLUSÃO

Ante o exposto, em atenção aos questionamentos apresentados, conclui-se que:

a)  imóvel não registrado (no sentido amplo da palavra, para definir aquele que não tem a matrícula respectiva) não existe no mundo jurídico  e consequentemente não pode figurar como fundamento para assinatura, ratificação e publicação de Termo de Inexigibilidade de licitação, porquanto o objeto a ser dado em permuta configurar-se-ia como inexistente;

b) a restauração de livro de registro não se encontra como fundamento para o Oficial de registro recusar a abertura de matrícula de imóvel no prazo fixado pelo art. 188 a lei de registros públicos;

c) o contrato de promessa de permuta poderá ser assinado após do dia 1º de abril de 2023 com base na Lei n. 8.666/93 se o procedimento de inexigibilidade de licitação de lhe der causa tiver início antes desta data.

Cumpre salientar que a presente manifestação toma por base, exclusivamente, os elementos que constam até a presente data nos autos do processo em epígrafe. Destarte, à luz do art. 131, da Constituição Federal de 1988 e do art. 11, da Lei Complementar nº 73/1993, incumbe a este órgão de execução da Consultoria-Geral da União prestar consultoria sob o prisma estritamente jurídico, não lhe competindo adentrar à conveniência e à oportunidade dos atos praticados, nem analisar aspectos de natureza eminentemente técnico-administrativa.

É o parecer.

Devolvam-se os autos ao órgão consulente, com as considerações de estilo.

 

Brasília, 30 de novembro de 2022.

 

PATRÍCIA KARLLA BARBOSA DE MELLO

ADVOGADA DA UNIÃO

 

 


Atenção, a consulta ao processo eletrônico está disponível em https://supersapiens.agu.gov.br mediante o fornecimento do Número Único de Protocolo (NUP) 62027003950202188 e da chave de acesso 53e76f6b

Notas

  1. ^ In Lei de Registros Públicos Comentada:19 ed. São Paulo: Saraiva, 2009 p. 438



Documento assinado eletronicamente por PATRICIA KARLLA BARBOSA DE MELLO, com certificado A1 institucional (*.agu.gov.br), de acordo com os normativos legais aplicáveis. A conferência da autenticidade do documento está disponível com o código 1049390638 no endereço eletrônico http://sapiens.agu.gov.br. Informações adicionais: Signatário (a): PATRICIA KARLLA BARBOSA DE MELLO, com certificado A1 institucional (*.agu.gov.br). Data e Hora: 30-11-2022 18:55. Número de Série: 77218269410488336199396275606. Emissor: Autoridade Certificadora do SERPRO SSLv1.