ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA DA UNIÃO ESPECIALIZADA VIRTUAL DE PATRIMÔNIO
NÚCLEO JURÍDICO
PARECER n. 01039/2022/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU
NUP: 19739.118423/2022-01
INTERESSADOS: SUPERINTENDÊNCIA DO PATRIMÔNIO DA UNIÃO NO ESTADO DA BAHIA (SPU/BA)(CJU-BA)
ASSUNTOS: RECEITA PATRIMONIAL. COBRANCA RETROATIVA. CONSULTA
EMENTA: PATRIMONIO IMOBILIARIO DA UNIAO. CONSULTA. REVISAO DE TAXAS PATRIMONIAIS DECORRENTE DE ALTERACAO DO CADASTRO DO IMOVEL DE RURAL PARA URBANO. DEFINICAO DE IMOVEL RURAL BASEADA NA SUA DESTINAÇÃO/UTILIZAÇÃO, OU SEJA, EXPLORAÇÃO AGRÍCOLA, PECUÁRIA, EXTRATIVA VEGETAL, FLORESTAL OU AGRO-INDUSTRIAL INDEPENDENTEMENTE DA SUA LOCALIZACAO.
Trata-se de processo eletrônico oriundo da Superintendência do Patrimônio da União na Bahia que tem como objeto o pedido de revisão do valor das taxas patrimoniais de 2015 a 2021, subscrito por Djalma Luciano Peixoto Andrade e Ivam Pedro dos Reis Sousa (vide doc. 24183778), relativas ao imóvel cadastrado sob o RIP 3407.0100026-92.
A diferença em processo de cobrança decorre da alteração do cadastro do imóvel no sistema de gestão da SPU, antes categorizado como rural para urbano.
Os autos foram encaminhados para este NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO, Órgão consultivo integrante da estrutura da Advocacia-Geral da União competente para assessorar o Órgão consulente, com fulcro na Lei Complementar nº 73, de 1993, artigo 8-F da Lei nº 9.028, de 12 de abril de 1995, e na Portaria AGU nº 14, de 23 de janeiro de 2020, encontrando-se instruído com os seguintes principais documentos lançados no sistema SEI, cujo acesso foi autorizado pelo Órgão para possibilitar a presente análise:
24183778 Impugnação 20/04/2022 SPU-BA-NUREP
24183780 Recibo Eletrônico de Protocolo 20/04/2022 SPU-BA-NUREP
19739.118354/2022-27 Patr. União: Atendimento ao Público 20/04/2022 SPU-BA-NUREP
24249222 Despacho 25/04/2022 SPU-BA-NUREP
24314161 Despacho 26/04/2022 SPU-BA-NUCIP
25486749 Despacho 08/06/2022 SPU-BA-NUCIP
19739.127542/2022-46 Patr. União: Atendimento ao Público 08/06/2022 SPU-BA-NUREP
25510382 Despacho 08/06/2022 SPU-BA-NUGES
25727118 Planta 20/06/2022 SPU-BA-NUSUC
25729541 Despacho 20/06/2022 SPU-BA-NUSUC
25808869 Ofício 182707 22/06/2022 SPU-BA-NUCIP
25809293 Despacho 22/06/2022 SPU-BA-NUCIP
26408697 Ofício 12/07/2022 SPU-BA-NUGES
26418220 Despacho 14/07/2022 SPU-BA
26423366 Despacho 14/07/2022 SPU-BA-NUCIP
26458010 Despacho 15/07/2022 SPU-BA-NUREP
26509381 E-mail 19/07/2022 SPU-BA-NUREP
26509675 Anexo 19/07/2022 SPU-BA-NUREP
26509704 Anexo 19/07/2022 SPU-BA-NUREP
26509800 E-mail 19/07/2022 SPU-BA-NUREP
26664587 Nota Técnica 33555 25/07/2022 SPU-BA-NUCIP
26736492 Despacho 27/07/2022 SPU-BA
26749633 Despacho 27/07/2022 SPU-BA-NUREP
26834028 Despacho 01/08/2022 SPU-BA-NUCIP
26842119 Ofício 212916 01/08/2022 SPU-BA-NUCIP
26930968 E-mail 03/08/2022 SPU-BA-NUGES
26931008 E-mail 03/08/2022 SPU-BA-NUGES
27936006 E-mail 12/09/2022 SPU-BA-NUGES
27937575 Ofício 12/09/2022 SPU-BA-NUGES
27952605 Despacho 12/09/2022 SPU-BA
28010951 Despacho 14/09/2022 SPU-BA-NUCIP
28052265 Despacho 15/09/2022 SPU-BA-NUCIP
28122008 Despacho 19/09/2022 SPU-BA-NUREP
28144332 E-mail 19/09/2022 SPU-BA-NUGES
28144420 Manifestação 19/09/2022 SPU-BA-NUGES
28148868 Despacho 19/09/2022 SPU-BA
28159222 Despacho 20/09/2022 SPU-BA-NUCIP
28243823 E-mail 22/09/2022 SPU-BA-NUGES
28244101 Petição 22/09/2022 SPU-BA-NUGES
28254488 Despacho 22/09/2022 SPU-BA-NUCIP
28300314 Despacho 26/09/2022 SPU-BA-NUREP
28434130 E-mail 29/09/2022 SPU-BA-NUREP
19739.161464/2022-17 Patr. União: Atendimento ao Público 05/12/2022 SPU-BA-NUCIP
30064822 Despacho 07/12/2022 SPU-BA-NUGES
30088806 Decisão (não numerada) 07/12/2022 SPU-BA
30209209 Anexo 12/12/2022 SPU-BA-NUREP
30209302 Anexo 12/12/2022 SPU-BA-NUREP
30246731 Petição Petição 13/12/2022 SPU-BA-COORD
30246732 Procuração PROCURAÇÃO 13/12/2022 SPU-BA-COORD
30246733 Documento Despacho SEI 13/12/2022 SPU-BA-COORD
30279385 Ofício 310433 14/12/2022 SPU-BA
30291105 Notificação (numerada) 1143 14/12/2022 SPU-BA-NUREP
30298501 E-mail 15/12/2022 SPU-BA-NUREP
30298614 Despacho 15/12/2022 SPU-BA-NUREP
30312332 Confirmação de recebimento 15/12/2022
Consoante demonstram os documentos supra relacionados, o requerimento dos Interessados foi indeferido pela autoridade competente, tendo sido apresentado pedido de “reconsideração e atribuição de efeito suspensivo em face de decisão da SPU/BA que considerou a área objeto de inscrição de natureza urbana, com efeitos financeiros relevantes".
Em sede de recurso a autoridade máxima constatou haver dois posicionamentos distintos adotados no âmbito da SPU/BA: "um que considera o PDDU e a certidão de conclusão de obra como marco jurídico de conversão da área para natureza urbana e outra que entende que a emissão do alvará de construção e a execução de obras tem o condão de alterar a situação jurídica da área de rural para urbana".
Considerando os argumentos apresentados pelos Interessados e a controvérsia quanto ao marco jurídico de conversão da área de rural para urbana, tal autoridade exarou a Decisão Administrativa SEI/ME nº 30088806, por força da qual conferiu efeito suspensivo ao recurso, "a fim de evitar dano ao recorrente e ao próprio erário, se acionado e eventualmente condenado, por repetição de indébito e ônus sucumbenciais".
Considerando, ainda, a complexidade da demanda, entendeu pertinente a mesma autoridade ouvir esta Consultoria Jurídica da União especializada sobre a seguinte questão:
em regra, qual a base jurídica para se considerar uma área como urbana, o alvará de construção ou o PDDU, a certidão municipal ou fiscalização da SPU que ateste a destinação econômica conferida ao imóvel? (ii) no caso concreto, deve prevalecer a declaração de que o imóvel é urbano, a teor Ofício Gabin nº 057/2022, SEI (26408697), oficio nº 212916, (SEI nº 26842119) e oficio nº 145/2022 (SEI nº 27937575) ou não urbano, a teor da Certidão Municipal (SEI nº 29996999)?
Feito o relatório, passo a opinar.
COMPETÊNCIA PARA O ASSESSORAMENTO JURÍDICO À SPU/Paraná
A Medida Provisória nº 870, de 1º de janeiro de 2019, convertida na Lei nº 13.844 de 2019, promoveu significativa modificação na organização básica dos órgãos da Presidência da República e dos Ministérios, repercutindo diretamente na competência das Consultoria Jurídicas da União nos Estados da Advocacia-Geral da União, no que se refere ao assessoramento jurídico em matéria da patrimônio imobiliário.
Por tal motivo, o CONSULTOR-GERAL DA UNIÃO e o PROCURADOR-GERAL DA FAZENDA NACIONAL expediram a Portaria Conjunta nº 1, de 29 de janeiro de 2019, por força da qual foram delegadas às Consultorias Jurídicas da União localizadas fora do Distrito Federal as atribuições consultivas relacionadas a órgãos assessorados integrantes da estrutura do Ministério da Economia localizados nos Estados, pelo prazo, prorrogável, de doze meses, consoante transcrição abaixo:
PORTARIA CONJUNTA Nº 1, DE 29 DE JANEIRO DE 2019
Dispõe sobre a delegação temporária de atribuições consultivas aos órgãos de execução da Consultoria-Geral da União e dá outras providências.
O CONSULTOR-GERAL DA UNIÃO e o PROCURADOR-GERAL DA FAZENDA NACIONAL, no uso de suas atribuições e tendo em vista o disposto no art. 55, § 3º, da Medida Provisória nº 870, de 1º de janeiro de 2019, no art. 39, I, do Decreto nº 7.392, de 13 de dezembro de 2010 e no art. 168 do Decreto nº 9.769, de 2 de janeiro de 2019, e considerando o que consta do processo administrativo nº 00688.000192/2019-91, resolvem:
Art. 1º Ficam delegadas às consultorias jurídicas da União localizadas fora do Distrito Federal as atribuições consultivas relacionadas a órgãos assessorados integrantes da estrutura do Ministério da Economia localizados nos Estados, pelo prazo, prorrogável, de doze meses.
Parágrafo único. A delegação ora promovida compreende apenas as atribuições relacionadas aos órgãos assessorados que integraram a estrutura dos extintos Ministérios do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão, da Indústria, Comércio Exterior e Serviços e do Trabalho, até o advento da Medida Provisória nº 870, de 1º de janeiro de 2019.
A delegação temporária de atribuições consultivas prevista na Portaria Conjunta nº 1, de 29 de janeiro de 2019 vem sendo prorrogada sucessivamente, sendo que a última, a PORTARIA CONJUNTA CGU/PGFN Nº 131, DE 1º DE DEZEMBRO DE 2021, estabelece:
PORTARIA CONJUNTA CGU/PGFN Nº 131, DE 1º DE DEZEMBRO DE 2021
Dispõe sobre a prorrogação da delegação temporária de atribuições consultivas aos órgãos de execução da Consultoria-Geral da União.
O CONSULTOR-GERAL DA UNIÃO e o PROCURADOR-GERAL DA FAZENDA NACIONAL, no uso de suas atribuições e tendo em vista o disposto no art. 55, § 3º, da Lei n° 13.844, de 18 de junho de 2019, no art. 43, I, do Anexo I do Decreto n° 10.608, de 25 de janeiro de 2021 e no art. 179 do Anexo I do Decreto n°9.745, de 8 de abril de 2019, resolvem:
Art. 1º Fica prorrogada, a contar de 30 de janeiro de 2022 e pelo prazo de 12 (doze) meses, a delegação às consultorias jurídicas da União localizadas fora do Distrito Federal concernente às atribuições consultivas relacionadas a órgãos assessorados integrantes da estrutura do Ministério da Economia localizados nos Estados, de que trata o artigo 1° da Portaria Conjunta n° 1, de 29 de janeiro de 2019.
Art. 2° Fica revogada a Portaria Conjunta CGU/PGFN nº 99, de 30 de dezembro de 2020.
Art. 3º Esta Portaria entra em vigor em 30 de janeiro de 2022.
ARTHUR CERQUEIRA VALÉRIO
Consultor-Geral da União
RICARDO SORIANO DE ALENCAR
Procurador-Geral da Fazenda Nacional
Deste modo, a competência para o presente assessoramento jurídico tem fundamento na autorização prevista nos referidos atos normativos.
FINALIDADE E ABRANGÊNCIA DO PARECER JURÍDICO
A presente manifestação jurídica tem o escopo de assistir a autoridade assessorada no controle interno da legalidade administrativa dos atos a serem praticados ou já efetivados. Ela envolve, também, o exame prévio e conclusivo dos textos das minutas.
Nossa função é justamente apontar possíveis riscos do ponto de vista jurídico e recomendar providências, para salvaguardar a autoridade assessorada, a quem compete avaliar a real dimensão do risco e a necessidade de se adotar ou não a precaução recomendada.
Importante salientar, que o exame dos autos processuais restringe-se aos seus aspectos jurídicos, excluídos, portanto, aqueles de natureza técnica. Em relação a estes, partiremos da premissa de que a autoridade competente municiou-se dos conhecimentos específicos imprescindíveis para a sua adequação às necessidades da Administração, observando os requisitos legalmente impostos.
De fato, presume-se que as especificações técnicas contidas no presente processo, inclusive quanto ao detalhamento do objeto da contratação, suas características, requisitos e avaliação do preço estimado, tenham sido regularmente determinadas pelo setor competente do órgão, com base em parâmetros técnicos objetivos, para a melhor consecução do interesse público.
De outro lado, cabe esclarecer que, via de regra, não é papel do órgão de assessoramento jurídico exercer a auditoria quanto à competência de cada agente público para a prática de atos administrativos. Incumbe, isto sim, a cada um destes observar se os seus atos estão dentro do seu espectro de competências. Assim sendo, o ideal, para a melhor e completa instrução processual, é que sejam juntadas ou citadas as publicações dos atos de nomeação ou designação da autoridade e demais agentes administrativos, bem como, os atos normativos que estabelecem as respectivas competências, com o fim de que, em caso de futura auditoria, possa ser facilmente comprovado que quem praticou determinado ato tinha competência para tanto. Todavia, a ausência de tais documentos, por si, não representa, a nosso ver, óbice ao prosseguimento do feito.
É nosso dever salientar que determinadas observações são feitas sem caráter vinculativo, mas em prol da segurança da própria autoridade assessorada a quem incumbe, dentro da margem de discricionariedade que lhe é conferida pela lei, avaliar e acatar, ou não, tais ponderações. Não obstante, as questões relacionadas à legalidade serão apontadas para fins de sua correção. O seguimento do processo sem a observância destes apontamentos será de responsabilidade exclusiva da Administração
Conforme BPC n° 07, do Manual de Boas Práticas Consultivas da CGU/AGU edição de 2016:
"A manifestação consultiva que adentrar questão jurídica com potencial de significativo reflexo em aspecto técnico deve conter justificativa da necessidade de fazê-lo, evitando-se posicionamentos conclusivos sobre temas não jurídicos, tais como os técnicos, administrativos ou de conveniência ou oportunidade, podendo-se, porém, sobre estes emitir opinião ou formular recomendações, desde que enfatizando o caráter discricionário de seu acatamento."
Relevante registrar que a presente manifestação jurídica não levou em consideração a modalidade da destinação do imóvel em apreço, a época em que foi efetivamente formalizada, e tão-pouco a regularidade da obra realizada no terreno de propriedade da União, eis que, além de não terem sido objeto da consulta, os documentos correspondentes não foram carreados para o processo sub examine.
Há escassa referência sobre a espécie de destinação, mas ao que parece, trata-se de inscrição de ocupação e, sendo assim, torna-se oportuno relembrar que via de regra "a inscrição, ressalvados os casos de preferência ao aforamento, terá sempre caráter precário, não gerando, para o ocupante, quaisquer direitos sobre o terreno ou a indenização por benfeitorias realizadas", conforme legislação abaixo, Lei nº 9.636, de 1998:.
Art. 7o A inscrição de ocupação, a cargo da Secretaria do Patrimônio da União, é ato administrativo precário, resolúvel a qualquer tempo, que pressupõe o efetivo aproveitamento do terreno pelo ocupante, nos termos do regulamento, outorgada pela administração depois de analisada a conveniência e oportunidade, e gera obrigação de pagamento anual da taxa de ocupação.
§ 1o É vedada a inscrição de ocupação sem a com
Em virtude dessa particularidade, recomendamos que o Orgão se detenha sobre esse aspecto, com o objetivo de analisar de forma ampla a regularidade do uso do imóvel, bem como da implantação do empreendimento do Interessado denominado "Piscinas Naturais Residence".
A CONSULTA
OS IMÓVEIS RURAIS DA UNIÃO. ADMINISTRACAO . INCRA. COMPETÊNCIA.
Quando se aborda o tema relacionado a imóvel rural, imperativo conhecer os limites da competência do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) por se tratar de autarquia federal criada pelo Decreto nº 1.110, de 9 de julho de 1970, com a missão prioritária de realizar a reforma agrária, manter o cadastro nacional de imóveis rurais e, também de administrar as terras públicas da União.
O Estatuto da Terra - Lei nº 4.504, de 30 de novembro de 1964, regula os direitos e obrigações concernentes aos bens imóveis rurais, para os fins de execução da reforma agrária e promoção da política agrícola, em que o INCRA tem atuação institucional relevante.
Determina a Lei no seu artigo 10 que o Poder Público "poderá explorar direta ou indiretamente, qualquer imóvel rural de sua propriedade, unicamente para fins de pesquisa, experimentação, demonstração e fomento, visando ao desenvolvimento da agricultura, a programas de colonização ou fins educativos de assistência técnica e de readaptação".
Fora desses objetivos só se admite em caráter transitório e desde que não haja viabilidade de transferi-los para a propriedade privada, in verbis:
Art. 10. O Poder Público poderá explorar direta ou indiretamente, qualquer imóvel rural de sua propriedade, unicamente para fins de pesquisa, experimentação, demonstração e fomento, visando ao desenvolvimento da agricultura, a programas de colonização ou fins educativos de assistência técnica e de readaptação.
§ 1° Somente se admitirá a existência de imóveis rurais de propriedade pública, com objetivos diversos dos previstos neste artigo, em caráter transitório, desde que não haja viabilidade de transferi-los para a propriedade privada.
§ 2º Executados os projetos de colonização nos imóveis rurais de propriedade pública, com objetivos diversos dos previstos neste artigo, em caráter transitório.
O paragrafo 3º do indigitado artigo 10 é bem claro ao estabelecer que os imóveis rurais da União, cuja utilização não se enquadrem nos seus termos, ou seja, pesquisa, experimentação, demonstração e fomento, visando ao desenvolvimento da agricultura, a programas de colonização ou fins educativos de assistência técnica e de readaptação, poderão ser transferidos ao ao Instituto Brasileiro de Reforma Agrária:
§ 3º Os imóveis rurais pertencentes à União, cuja utilização não se enquadre nos termos deste artigo, poderão ser transferidos ao Instituto Brasileiro de Reforma Agrária, ou com ele permutados por ato do Poder Executivo.
Lembramos que o Decreto-Lei nº 1.110, de 9 de julho de 1970 criou o INCRA e extinguiu, dentre outros, o Instituto Brasileiro de Reforma Agrária (IBRA), cujas atribuições passaram para a nova autarquia:
Art. 1º É criado o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), entidade autárquica, vinculada ao Ministério da Agricultura, com sede na Capital da República.
Art. 2º Passam ao INCRA todos os direitos, competência, atribuições e responsabilidades do Instituto Brasileiro de Reforma Agrária (IBRA), do Instituto Nacional de Desenvolvimento Agrário (INDA) e do Grupo Executivo da Reforma Agrária (GERA), que ficam extintos a partir da posse do Presidente do novo Instituto.
Assim, em resumo, de acordo com as normas reproduzidas, a União poderá explorar direta ou indiretamente suas propriedades rurais unicamente para fins de pesquisa, experimentação, demonstração e fomento, visando ao desenvolvimento da agricultura, a programas de colonização ou fins educativos de assistência técnica e de readaptação.
Fora dessas hipóteses, a União poderá mantê-las sob a sua administração apenas em caráter transitório, se não for possível transferi-las para a propriedade particular ou transferi-los para o INCRA, sobretudo para fins de reforma agrária.
DEFINICAO DE IMOVEL RURAL
Uma vez conhecidas as competências no campo da administração do imóvel rural público, cabe, agora, perquirir sobre a maneira de definir a sua natureza agrária.
É possível antecipar que a definição do imóvel como rural não está atrelada à sua localização como se costuma acreditar.
Significa dizer, que o simples fato de o imóvel estar fora do perímetro urbano não lhe confere o status de rural.
Na verdade, o critério que distingue um imóvel rural é a sua utilização/destinação, consoante preceitua a Lei nº 4.504, de 30 de novembro de 1964, o denominado "Estatuto da Terra", vejamos:
Art. 4º Para os efeitos desta Lei, definem-se:
I - "Imóvel Rural", o prédio rústico, de área contínua qualquer que seja a sua localização que se destina à exploração extrativa agrícola, pecuária ou agro-industrial, quer através de planos públicos de valorização, quer através de iniciativa privada;
grifo nosso
O Decreto nº 55.891, de 31 de março de 1965 que regulamenta o Capítulo I do Título I e a Seção II do Capítulo IV do Título II da Lei nº 4.504, de 30 de novembro de 1964 é ainda mais claro nesse ponto:
Art. 5º Imóvel rural é o prédio rústico, de área contínua, qualquer que seja a sua localização em perímetros urbanos, suburbanos ou rurais dos municípios, que se destine à exploração extrativa, agrícola, pecuária ou agro-industrial, quer através de planos públicos de valorização, quer através da iniciativa privada.
grifo nosso
Vale destacar o conceito estabelecido na Instrução Normativa INCRA nº 82 de 27/03/2015, que dispõe sobre o cadastro de imóveis rurais no Sistema Nacional de Cadastro Rural:
Art. 6º. Imóvel rural é a extensão contínua de terras com destinação (efetiva ou potencial) agrícola, pecuária, extrativa vegetal, florestal ou agroindustrial, localizada em zona rural ou em perímetro urbano.
grifo nosso
Além dessas normas, impende citar, também, a Lei nº 8.629, de 25 de fevereiro de 1993 que dispõe sobre a regulamentação dos dispositivos constitucionais relativos à reforma agrária, previstos no Capítulo III, Título VII, da Constituição Federal, cujo artigo 4º abarca o conceito de imóvel rural;
Art. 4º Para os efeitos desta lei, conceituam-se:
I- Imóvel Rural - o prédio rústico de área contínua, qualquer que seja a sua localização, que se destine ou possa se destinar à exploração agrícola, pecuária, extrativa vegetal, florestal ou agro-industrial;
grifo nosso
Com amparo nos indigitados dispositivos legais, não há dúvida: o que define o imóvel como rural é a sua destinação/utilização, ou seja, se nele houver atividade de exploração agrícola, pecuária, extrativa vegetal, florestal ou agro-industrial.
Embora a legislação apontada adote tal critério da destinação/utilização, não podemos deixar de mencionar que o Código Tributário Nacional - CTN, Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966, ao regular o imposto sobre propriedade rural, adota critério distinto.
Nos termos do seu artigo 29, o imposto sobre a propriedade territorial rural “tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de imóvel por natureza, como definido na lei civil, localizado fora da zona urbana do Município”.
Art. 29. O imposto, de competência da União, sobre a propriedade territorial rural tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de imóvel por natureza, como definido na lei civil, localização fora da zona urbana do Município.
Art. 30. A base do cálculo do imposto é o valor fundiário.
Infere-se, portanto, que para o Direito Tributário, o imóvel rural é aquele localizado fora da zona urbana do Município.
De outro lado, para o CTN, o imóvel urbano é aquele situado dentro da zona urbana, tal qual definido em lei municipal, e, para fins de incidência do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU):
Art. 32. O imposto, de competência dos Municípios, sobre a propriedade predial e territorial urbana tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel por natureza ou por acessão física, como definido na lei civil, localizado na zona urbana do Município.
§ 1º Para os efeitos deste imposto, entende-se como zona urbana a definida em lei municipal; observado o requisito mínimo da existência de melhoramentos indicados em pelo menos 2 (dois) dos incisos seguintes, construídos ou mantidos pelo Poder Público:
O aparente conflito de normas foi sendo dissipado pelas manifestações doutrinárias e pela construção jurisprudencial.
No julgamento do Recurso Especial nº 621.680/RJ, por exemplo, os ministros do STJ entenderam que, no acórdão do TRF-2, "existe a afirmação categórica da impossibilidade de se desapropriar imóvel urbano para fins de reforma agrária, ocasião em que ficou decidido que o imóvel em questão era rural, considerando a sua destinação, e não sua localização, conforme a conceituação definida no art. 4º do Estatuto da Terra, ao contrário do que afirma o espólio recorrido, nas razões do agravo de instrumento apresentado na origem, em atitude que beira a má-fé".
No AR 3971/GO do Superior Tribunal de Justiça. 1ª Seção, de 24 de fevereiro de 2010 constou:
Ementa
PROCESSO CIVIL E ADMINISTRATIVO - AÇÃO RESCISÓRIA - DESAPROPRIAÇÃO PARA FIM DE REFORMA AGRÁRIA - DEFINIÇÃO DA NATUREZA DA ÁREA DO IMÓVEL - FINALIDADE ECONÔMICA.
1. É a municipalidade que, com base no art. 30 da Constituição Federal/88, estabelece a sua zona rural e a sua zona urbana, observado por exclusão o conceito apresentado pelo Estatuto da Terra (Lei 4.504/64) para imóvel rural para definir os imóveis urbanos.
2. Apesar de o critério de definição da natureza do imóvel não ser a localização, mas a sua destinação econômica, os Municípios podem, observando a vocação econômica da área, criar zonas urbanas e rurais. Assim, mesmo que determinado imóvel esteja em zona municipal urbana, pode ser, dependendo da sua exploração, classificado como rural.
3. O acórdão rescindindo reformou o julgado do Tribunal de Justiça de Goiás para considerar o imóvel desapropriado como sendo urbano e rural quando o correto, segundo o art. 4º da Lei n. 4.504/64 (Estatuto da Terra), seria somente rural em virtude de sua finalidade econômica. 4. A destinação dada à terra era de exploração extrativa agrícola, que não pode ser afastada em razão de mero loteamento formalizado na Prefeitura local, mas não implementado na prática. Ação rescisória procedente.
grifo nosso
E no RECURSO ESPECIAL Nº 1.112.646 – SP (2009/0051088-6) restou assentado que:
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
RECURSO ESPECIAL Nº 1.112.646 – SP (2009/0051088-6)
RELATOR: MINISTRO HERMAN BENJAMIN
EMENTA
TRIBUTÁRIO. IMÓVEL NA ÁREA URBANA. DESTINAÇÃO RURAL. IPTU. NÃO-INCIDÊNCIA. ART. 15 DO DL 57/1966. RECURSO REPETITIVO. ART. 543-C DO CPC.
1. Não incide IPTU, mas ITR, sobre imóvel localizado na área urbana do Município, desde que comprovadamente utilizado em exploração extrativa, vegetal, agrícola, pecuária ou agroindustrial (art. 15 do DL 57/1966).
2. Recurso Especial provido. Acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ.
grifo nosso
Como se vê, o critério da destinação/utilização para a caracterização do imóvel como rural constitui entendimento pacificado, ou seja, é preciso que a finalidade do imóvel seja de exploração agrícola, pecuária ou agroindustrial, independentemente de sua localização.
Assim sendo, não é porque no registro cartorário de um dado imóvel conste a designação de "Fazenda XXX", e sua localização esteja fora do perímetro urbano que este, ou os imóveis dele desmembrados, deva ser, necessariamente, tido como imóvel rural. O que lhe empresta tal qualificação, repise-se, é a sua utilização.
Em outras palavras, se o imóvel for utilizado para atividades de exploração da terra, nos termos da legislação apontada, ele será considerado rural, mesmo que esteja situado em zona urbana.
Sob tal perspectiva, torna-se irrelevante, para efeito de caracterizar o imóvel em apreço como urbano o momento da implantação do empreendimento "Piscinas Naturais Residence".
Assim, se o órgão assessorado, respaldado pela legislação de regência especificada, verificar a necessidade de promover alterações no cadastro do imóvel lançado no sistema de gestão da SPU, diante do conhecimento de que a área antes catalogada como rural constitui, na realidade, bem imóvel de natureza urbana cumpre-lhe, no que couber, observar as normas contidas na INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 1, DE 23 DE JULHO DE 2007, que dispõe sobre o lançamento e a cobrança de créditos originados em receitas patrimoniais, de onde se retira os artigos abaixo transcritos:
Art. 19º - O crédito originado de receita patrimonial se sujeita ao prazo decadencial de dez anos para sua constituição, mediante lançamento, contados da data de conhecimento, por iniciativa da União ou do interessado, das circunstâncias e fatos que caracterizam a hipótese de incidência da respectiva receita patrimonial.
Parágrafo único. Quando a data do conhecimento for anterior a 30 de dezembro de 1998, conta-se a partir desta última o prazo decadencial a que se refere o caput deste artigo.
Art. 20º - É inexigível o crédito não constituído originado em receita patrimonial cujo fato gerador anteceda cinco anos ou mais da data do conhecimento das circunstâncias e fatos quecaracterizam a hipótese de incidência da respectiva receita, considerando-se como fato gerador:
I - para os créditos de foro e taxa de ocupação, a data em que deveria ter ocorrido o lançamento estabelecido conforme o disposto no art. 3º.
II - para o crédito de diferença de laudêmio, a data do título aquisitivo quando ocupação, e de seu registro quando aforamento.
III - para o crédito de laudêmio sobre cessão, a data da transação, se estiver definida, ou à míngua de definição da data, a data do instrumento que a mencione.
§ 1º Para o crédito de multa de transferência, são inexigíveis as parcelas que antecederem a sessenta meses da data do conhecimento.
§ 2º Quando a data do conhecimento for anterior a 30 de dezembro de 1998, são inexigíveis os créditos não constituídos anteriores a 30 de dezembro de 1993.
Art. 21º - Os créditos decorrentes de receitas patrimoniais, quando regularmente constituídos,sujeitam-se ao prazo prescricional de cinco anos, observados os procedimentos correspondentes estabelecidos em lei, inclusive quanto às causas interruptivas ou suspensivas da contagem do transcurso do prazo para a exigência do correspondente crédito.
§ 1º Conta-se o prazo prescricional a partir da data do lançamento do crédito, determinada conforme §§ 1º e 2º do art. 3º desta IN.
§ 2º Para as obrigações vencidas anteriormente a 18 de maio de 1998, a prescrição será reconhecida no menor prazo prescricional verificado para a sua ocorrência, adotando-se a regrada prescrição vintenária a partir do vencimento da obrigação, ou a prescrição qüinqüenária contada a partir de 18 de maio de 1998
É o parecer, de caráter opinativo, que prescinde de aprovação por força do art. 21 da Portaria E-CJU/Patrimônio/CGU/AGU n° 1/2020 – Regimento Interno da e-CJU/Patrimônio, publicada no Suplemento B do BSE nº30, de 30 de julho de 2020.
São Paulo, 21 de dezembro de 2022.
LUCIANA MARIA JUNQUEIRA TERRA
ADVOGADA DA UNIÃO
Atenção, a consulta ao processo eletrônico está disponível em https://supersapiens.agu.gov.br mediante o fornecimento do Número Único de Protocolo (NUP) 19739118423202201 e da chave de acesso 8de3cdcd