ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
DEPARTAMENTO DE COORDENAÇÃO E ORIENTAÇÃO DE ÓRGÃOS JURÍDICOS
PARECER n. 00003/2023/DECOR/CGU/AGU
NUP: 00688.000929/2020-17
Interessada: Consultoria Jurídica da União Especializada Virtual de Obras e Serviços de Engenharia
Assunto: Reajuste em sentido estrito e preclusão lógica nos contratos de escopo e de serviços continuados
DIREITO CONSTITUCIONAL. DIREITO ADMINISTRATIVO. EQUAÇÃO ECONÔMICO-FINANCEIRA DOS CONTRATOS ADMINISTRATIVOS. REAJUSTE EM SENTIDO ESTRITO. CONTRATOS DE ESCOPO. CONTRATOS DE SERVIÇOS CONTINUADOS. NÃO APLICAÇÃO EM REGRA DA PRECLUSÃO LÓGICA. HIPÓTESE EXCEPCIONAL DE INCIDÊNCIA, DESDE QUE EXPRESSAMENTE PREVISTA NO EDITAL OU CONTRATO.
I) A preclusão lógica caracteriza-se como a renúncia tácita a um direito em razão da prática de ato incompatível ou inconciliável com seu regular exercício.
II) Nos contratos administrativos de prestação de serviços contínuos, a celebração de termo aditivo para renovação das obrigações pactuadas por um período subsequente não representa per si e em regra medida logicamente incompatível com a concessão do reajuste em sentido estrito dos preços pactuados, uma vez que o reajuste consubstancia mera expressão da preservação da equação econômico-financeira dos contratos administrativos mediante correção monetária que retrate a variação efetiva dos custos de produção.
III) Nos contratos administrativos de escopo, reputa-se igualmente que em regra também não se caracteriza a renúncia tácita do direito de reajuste em sentido estrito em decorrência da celebração de aditamento de prazo de vigência para a prorrogação do cronograma de execução do objeto, uma vez que nessa hipótese a dilação contratual importa medida necessária para a própria conclusão do escopo pactuado, não representando per si e em regra ato inconciliável com ulterior concessão do reajuste em sentido estrito dos preços contratados.
IV) Por caracterizar-se o reajuste em sentido estrito como direito de ordem patrimonial e disponível, não há óbice jurídico para que, em tese, seja consumada a renúncia tácita ou a preclusão lógica do seu exercício nos contratos continuados e nos contratos de escopo, desde que cumulativamente: (a) o edital ou contrato preveja expressamente que a concessão do reajuste resta condicionada à solicitação do contratado; (b) que não haja solicitação do reajuste antes da celebração de aditamento de vigência; (c) seja celebrado aditamento para a prorrogação do prazo de vigência do contrato sem qualquer ressalva quanto à ulterior análise pela Administração do reajuste e (d) o edital expressamente preveja que a formalização do aditamento sem a concessão do reajuste, ou ressalva de sua superveniente análise, será considerada como renúncia ou preclusão lógica do direito.
V) Considerando que o reajuste em sentido estrito é um direito patrimonial disponível, que as renúncias se interpretam estritamente (art. 114 do Código Civil), que os preceitos de direito privado se aplicam supletivamente aos contratos administrativos, que os contratos administrativos devem dispor com clareza e precisão sobre os deveres, obrigações e responsabilidades das partes (§ 2º do art. 89 da Lei n. 14.133, de 2021, § 1º do art. 54 da Lei n. 8.666, de 1993), a renúncia tácita do reajuste em sentido estrito não prescinde de disciplina no edital ou contrato para fins de sua caracterização.
A douta Consultoria Jurídica da União Especializada Virtual de Obras e Serviços de Engenharia, por meio do r. Parecer n. 20/2021/COORD/E-CJU/ENGENHARIA/CGU/AGU – seq. 4, manifestou-se a respeito de temas relacionados a pedidos de revisão contratual e reajuste para fins de uniformização de “orientações gerais a serem seguidas por ocasião da apreciação de procedimentos que se destinem ao reequilíbrio econômico-financeiro de contratos regidos pelo Decreto n. 7.983, de 2013”, notadamente quanto a “aspectos da revisão contratual decorrentes da variação de preços ocorrida após a apresentação das propostas e durante o prazo da execução do contrato”.
Dentre as conclusões do referenciado Parecer, no que se refere especificamente ao objeto deste exame, observa-se que entendeu a E-CJU/ENGENHARIA que o disposto no item VI da ementa do Parecer n. 79/2019/DECOR/CGU/AGU (NUP 08008.000351/2017-17 - seq. 19/22) não se aplicaria aos contratos de escopo, ou seja, compreendeu a E-CJU/ENGENHARIA que nos contratos de escopo não há preclusão lógica do reajuste em sentido estrito, inclusive caso tenha havido aditamento contratual sem a prévia solicitação do reajuste pela empresa contratada nas hipóteses em que o pedido é exigido no edital ou contrato como condição para promoção do reajuste, uma vez que, ainda segundo a E-CJU/ENGENHARIA, e em ligeira síntese, a prorrogação do prazo de vigência nos contratos de escopo se presta para viabilizar a própria execução e conclusão do objeto contrato, e não para renovar as mesmas obrigações e condições contratuais de execução de um serviço de caráter contínuo.
Para fins de escorreita compreensão e contextualização da questão jurídica versada, cumpre reproduzir em sua literalidade os termos da ementa do Parecer n. 79/2019/DECOR/CGU/AGU (NUP 08008.000351/2017-17 - seq. 19), segundo o qual as empresas contratadas pela Administração possuem direito ao reajuste em sentido estrito por determinação de patamar constitucional, que resguarda a preservação da equação econômico-financeira dos contratos administrativos, e que essa espécie de reajuste não se sujeita, em regra, à solicitação da contratada, devendo ser concedida ex officio pela Administração após preenchidos os requisitos legais para sua incidência, não se sujeitando em regra à preclusão lógica em caso de aditamento contratual:
EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO. LICITAÇÃO. EQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO. DIREITO AO REAJUSTE CONTRATUAL. CONCESSÃO DE OFÍCIO PELA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. IMPOSSIBILIDADE DE PRECLUSÃO.
I. A manutenção da cláusula econômico-financeira inicialmente estabelecida com a aceitação da proposta pela Administração constitui direito do contratado garantido pela Constituição da República (art. 37, inc. XXI).
II. Este direito foi regulamentado pela lei de licitações, Lei n.º 8.666/93, que previu instrumentos para recompor o eventual desequilíbrio. Dentre eles está o reajuste (art. 40, inc. XI e art. 55, inc. III), que se caracteriza pela atualização do valor contratual conforme índice estabelecido contratualmente.
III. Assim, após certo período de execução contratual, a Administração Pública, de ofício, deve aplicar o índice financeiro estabelecido contratualmente para reajustar o seu preço e reequilibrar sua equação econômico-financeira.
IV. No Acórdão nº 1.827/2008-Plenário, o TCU, diante de uma hipótese de repactuação, analisou a aplicabilidade do instituto da preclusão aos contratos administrativos, e lecionou que "há a preclusão lógica quando se pretende praticar ato incompatível com outro anteriormente praticado."
V. Em regra, não há preclusão lógica do direito ao reajuste, pois, não há a possibilidade da prática de ato incompatível com outro anteriormente praticado, já que para a sua concessão exige-se apenas a mera aplicação de ofício pela Administração Pública de índice previsto contratualmente.
VI. Exceção existe na hipótese em que as partes, com previsão expressa no edital e no contrato, acordem a obrigação de prévio requerimento do contratado para a concessão do reajuste. E neste caso específico seria possível entendermos pela preclusão lógica, se transcorrido o período para o reajuste, o contratado não requerer a sua concessão e concordar em prorrogar a vigência contratual por mais um período, mantidas as demais condições inicialmente pactuadas
VII. Visando tutelar a análise da vantajosidade para a prorrogação contratual (art. 57, inc. II, da Lei n.º 8.666/93), caso tenha transcorrido o prazo para o reajuste sem a sua concessão, e chegado o momento da prorrogação contratual, quando, então, será o valor não reajustado que será parâmetro para a obtenção de preços e condições mais vantajosas para a administração, recomenda-se a negociação, com a contratada, para que esta abdique do reajuste, mantendo a vantajosidade necessária para garantir a prorrogação contratual.
A questão jurídica posta pela E-CJU/ENGENHARIA ao DECOR/CGU se refere especificamente ao item VI da ementa do Parecer n. 79/2019/DECOR/CGU/AGU acima destacado, o qual admite que a regra da não incidência da preclusão lógica do reajuste em sentido estrito seja excepcionada caso haja expressa previsão editalícia e contratual que condicione sua concessão ao requerimento do contratado e, assim, consolidou-se o entendimento no sentido de que em tese é juridicamente admissível caracterizar-se a preclusão lógica nas hipóteses em que o contratado, nesse contexto legal específico, não solicite o reajuste e aceite “prorrogar a vigência contratual por mais um período, mantidas as demais condições inicialmente pactuadas”.
É sobre este particular aspecto da incidência excepcional da preclusão lógica do reajuste em sentido estrito que versa este exame, entendendo a E-CJU/ENGENHARIA que a exceção admitida no item VI da ementa do Parecer n. 79/2019/DECOR/CGU/AGU não se aplica aos contratos administrativos de escopo, uma vez que, como já consignado neste relatório, compreendeu referenciada unidade consultiva que os aditamentos realizados em sede de contratos de escopo não se voltam para renovar as condições contratuais de execução de serviços de caráter contínuo, prestando-se para permitir a própria conclusão do objeto contratado, desta maneira, ainda segundo a E-CJU/ENGENHARIA, seria também a exceção prevista no Parecer n. 79/2019/DECOR/CGU/AGU incompatível com os contratos de escopo.
Segue, em sua literalidade, trecho do r. Parecer n. 20/2021/COORD/E-CJU/ENGENHARIA/CGU/AGU – seq. 4 que versa especificamente sobre a matéria em análise:
2.14 Aplicação das regras de reajustes como condição prévia à concessão do reequilíbrio
104. A partir das premissas já apresentadas, conclui-se ser indispensável a aplicação das regras contratuais de reajuste como condição prévia para a análise do pedido de reequilíbrio econômico-financeiro sempre que existentes as condições próprias para sua concessão, nos termos do marco inicial previsto pelo art. 3º da Lei n. 10.192, de 2001.
105. Considerando-se que as regras de reajuste contratual destinam-se a manter o equilíbrio econômico do contrato por meio da aplicação periódica de índices setoriais que acompanham a evolução geral dos preços pertinentes ao ramo contratado e que, salvo disposição contratual em contrário, a aplicação dos índices de correção deve ser automática[46], extrai-se a ilação de que a revisão contratual, sendo um meio extraordinário destinado a restabelecer o equilíbrio perdido, somente pode ocorrer após o esgotamento dos meios ordinários de manutenção do equilíbrio existente.
106. Daí porque não é possível reconhecer eventual desequilíbrio sem antes serem aplicadas as regras destinadas a manter a equação econômico-financeira do contrato.
107. Insta observar que, nos contratos de escopo, a prorrogação do prazo de vigência não implica a renovação das obrigações contratuais por igual período, mas consiste no meio disponível à Administração para a conclusão do objeto contratado e realização do interesse público[47]. A possibilidade de prorrogação dos contratos de escopo pelo prazo necessário à conclusão do objeto agora encontra previsão expressa na Lei n. 14.133, de 2021[48], que também prevê a automática prorrogação dos prazos de vigência, uma vez não concluído o objeto no prazo inicialmente previsto[49].
108. Sendo assim, conclui-se que o entendimento apresentado no Item VI da ementa do Parecer n. 079/2019/DECOR/CGU/AGU (NUP 08008.000351/2017-17, Seq. 19)[50] não se aplica aos contratos de escopo, mesmo quando condicionado o reajuste ao pedido da contratada, de modo que não incide a preclusão lógica ao caso. Essa é a conclusão que se extrai do art. 131 da Lei n. 14.133, de 2021, quando incorpora o conceito da preclusão na Lei Geral de Licitações e Contratos Administrativos e faz expressa remissão aos contratos de serviços contínuos, obviamente excluindo os contratos de escopo.
109. Portanto, ainda que o contrato demande a solicitação do reajuste por parte da contratada, o reequilíbrio dependerá da solução prévia das pendências relacionadas aos eventuais reajustes devidos. A empresa que tenha solicitado a revisão contratual por desequilíbrio econômico-financeiro, mas que tenha se mantido inerte em relação aos pedidos de reajuste, quando condicionados à solicitação da contratada, deverá ser orientada a pleitear, em primeiro lugar, os índices de reajuste previstos no contrato que ainda não tenham sido aplicados para, em seguida, examinar se ainda persistem os motivos ensejadores do primeiro pedido de revisão.
...
145. Remete-se o presente parecer à aprovação do Departamento de Coordenação e Orientação de Órgão Jurídicos - DECOR em virtude da ilação de inaplicabilidade do entendimento disposto no Item VI da Ementa do Parecer n. 079/2019/DECOR/CGU/AGU[67] (NUP 08008.000351/2017-17, Seq. 19) aos contratos de escopo.
Inicialmente este Departamento, por meio da Nota n. 186/2021/DECOR/CGU/AGU, aprovada pelo Despacho n. 560/2021/DECOR/CGU/AGU (seq. 5/6) solicitou subsídios da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional e da Procuradoria-Geral Federal.
A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional exarou o Parecer SEI nº 18982/2021/ME (seq. 8), oportunidade em que discorda do posicionamento da E-CJU/ENGENHARIA e opina pela incidência da preclusão lógica nos contratos de escopo, nos termos e condições dispostas no item VI da ementa do Parecer n. 79/2019/DECOR/CGU/AGU. Sobre o tema, segue elucidativo trecho dos fundamentos da referenciada manifestação da PGFN:
21. O direito de reajuste, essencialmente, é um direito patrimonial disponível, como aliás reconhece o próprio PARECER N. 020/2021/COORD/E-CJU/ENGENHARIA/CGU/AGU, em seu item 101.
22. Veja-se que seria incongruente admitir-se a possibilidade preclusão lógica no direito de reequilíbrio econômico-financeiro, e não admiti-la no direito de reajuste, na hipótese específica do Item VI da Ementa do Parecer n. 079/2019/DECOR/CGU/AGU quando ambos os institutos tratam, essencialmente, de direitos patrimoniais disponíveis.
23. Observe-se que o próprio PARECER N. 020/2021/COORD/E-CJU/ENGENHARIA/CGU/AGU considera possível, nos contratos de escopo, a ocorrência de preclusão lógica, quando o licitante, ciente da defasagem do orçamento de referência, firma o contrato sem impugná-lo, fazendo inclusive referência a julgados do TCU neste sentido (vide itens 2.11 e 2.12 do parecer).
24. Desse modo, soaria contraditório não admitir a preclusão lógica no direito de reajuste, quando contrato de escopo exige pedido formal do contratado, e admiti-la, por outro lado, no direito de reequilíbrio econômico-financeiro, se ambos os institutos tratam, em essência, de direitos patrimoniais disponíveis.
...
27. E caso haja eventual pedido de reequilíbrio econômico-financeiro do contrato (revisão), entende-se que tal pedido não tem o condão de afastar a aplicabilidade do Item VI da Ementa do Parecer n. 079/2019/DECOR/CGU/AGU. Neste caso, poderia a Administração efetuar o cálculo do reajuste contratual que não foi solicitado pelo contratado (sem concedê-lo), apenas como base para análise do pedido de revisão contratual. E caso seja procedente o pedido de revisão contratual, afigura-se como solução mais adequada subtrair, ao final, dos preços contratuais revisados, o valor do reajuste que foi objeto de preclusão lógica. Assim, viabiliza-se a análise do pleito de revisão, com base nos preços reajustados, sem a necessidade de conceder ao contratado o efetivo reajuste, mantendo-se assim a premissa adotada no item VI da Ementa do Parecer n. 079/2019/DECOR/CGU/AGU, no sentido de que, sendo o direito de reajuste de preços de natureza patrimonial disponível, torna-se possível a renúncia pelo contratado, caso o contrato exija requerimento de reajuste pelo contratado e este deixe de fazê-lo no tempo devido, concordando com a prorrogação da vigência contratual, mantendo as condições pactuadas.
A Procuradoria-Geral Federal, por meio da sua Câmara Permanente de Licitações e Contratos Administrativos, exarou o Parecer n. 4/2022/CPLC/DEPCONSU/PGF/AGU (seq. 11), oportunidade em que também divergiu do posicionamento da E-CJU/ENGENHARIA a respeito da possibilidade de preclusão de reajuste em sentido estrito nos contratos de escopo.
Segundo a PGF deve prevalecer o entendimento de que em tese é juridicamente possível a preclusão lógica do reajuste em sentido estrito nos contratos de escopo porque não haveria uma prevalência do reajuste (álea ordinária) em relação a eventuais pedidos de revisão contratual (álea extraordinária):
41. A partir dessa percepção é possível divergir, respeitosamente, do PARECER N. 020/2021/COORD/E-CJU/ENGENHARIA/CGU/AGU, uma vez que os eventos que ensejam o reequilíbrio (álea extracontratual) e o reajuste (álea ordinária) são diversos. O reequilíbrio não depende do esgotamento dos meios ordinários de manutenção do equilíbrio existente, mas da configuração de eventos extracontratuais, como o caso fortuito, a força maior e o fato do príncipe, com as condições e requisitos apresentados acima, positivados tanto na Lei nº 8.666, de 1993 como na Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos.
42. Com efeito, não é possível condicionar a avaliação sobre a aplicabilidade do reequilíbrio ao eventual esgotamento do reajustamento em sentido estrito. Salvo melhor juízo, é tecnicamente impossível definir ordem entre os institutos, uma vez que possuem fundamentos diversos. De igual modo, o instituto do reequilíbrio econômico-financeiro não pode ser utilizado para restabelecer o valor a que teria direito o contratado se não tivesse havido a preclusão do direito ao reajuste em sentido estrito.
43. De se lembrar que ambos os institutos se afastam não só pelo fundamento jurídico que lhes garantem aplicabilidade, mas também pela sua operacionalização. O reajuste é concedido por meio da aplicação de índice de correção monetária, sem a necessidade de detalhamento casuístico da variação de preço dos insumos necessários à prestação do objeto de forma detalhada, o que é necessário no reequilíbrio econômico financeiro do contrato.
44. Por fim, o reajuste não promove alteração do contrato administrativo, na medida em que é a mera aplicação de cláusula obrigatoriamente prevista no ajuste, nos termos do inc. XI do Art. 40 da Lei nº 8.666, de 1993 e do art. 92, inc. V, da Lei nº 14.133, de 2021, razão pela qual a lei previu sua formalização por simples apostilamento.
(...)
45. Diferentemente, o reequilíbrio econômico-financeiro é verdadeira alteração do contrato administrativo. Deverá ser formalizada por termo aditivo, assinado por ambas as partes. Destaque-se, entretanto, que, considerando-se a natureza impositiva da revisão, inclusive quando em favor da Administração, a negativa em celebrar o instrumento pelo contratado não deve ser considerada como óbice à modificação, situação em que caberá ao Administrador atestar nos autos a recalcitrância e formalizar o termo aditivo de modo unilateral.
46. Desse modo, entende-se pela aplicabilidade do item VI da ementa do Parecer nº 079/2019/DECOR/CGU/AGU também aos contratos de escopo.
É o relatório
O presente pronunciamento jurídico encontra respaldo no art. 10, inciso V, do Anexo I do Decreto nº 11.174, de 2022, e no art. 9º da Portaria Normativa AGU n. 24, de 2021, uma vez que cumpre ao Departamento de Coordenação e Orientação de Órgãos Jurídicos da Consultoria-Geral da União uniformizar a jurisprudência administrativa no âmbito da Advocacia-Geral da União, em consonância com o disposto no art. 4º, incisos X e XI da Lei Complementar nº 73, de 1993.
Na espécie, resta manifesta a existência de divergência de ordem jurídica entre o posicionamento da Consultoria Jurídica da União Especializada Virtual de Obras e Serviços de Engenharia e aquele adotado pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional e pela Procuradoria-Geral Federal a respeito da incidência do instituto da preclusão lógica para o reajuste em sentido estrito nos contratos de escopo, na forma excepcional em que foi admitida a preclusão lógica no item VI da ementa do Parecer n. 79/2019/DECOR/CGU/AGU.
No âmbito da Consultoria-Geral da União prevalece o entendimento no sentido de que o reajuste em sentido estrito em regra deve ser concedido ex officio pela Administração, independentemente de solicitação da empresa contratada, por ser medida que concretiza a cláusula constitucional que resguarda a equação econômico-financeira dos contratos administrativos, sendo excepcionalmente admitida a preclusão dessa espécie de reajuste nas estritas hipóteses em que preenchidos, cumulativamente, os seguintes requisitos: a) o edital e/ou contrato expressamente condicionem a concessão do reajuste à solicitação da contratada; b) caso não tenha sido requerido o reajuste; e c) caso o contratado aceite prorrogar o prazo de vigência do instrumento preservando incólume as condições pactuadas.
O objeto deste exame, pois, é avaliar se esta excepcional hipótese de preclusão lógica é aplicável aos contratos de escopo, diante da divergência jurídica estabelecida entre a Consultoria Jurídica da União Especializada Virtual de Obras e Serviços de Engenharia, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional e a Procuradoria-Geral Federal, e considerando os termos e conclusões do Parecer n. 79/2019/DECOR/CGU/AGU e subsequentes Despachos de aprovação (NUP 08008.000351/2017-17 - seq. 19/22).
Registre-se, por pertinente, que o objeto desta manifestação é promover, em tese, a uniformização da jurisprudência administrativa sobre a temática, não cabendo a este DECOR/CGU o exame de consultas sobre casos concretos, ficando sob a responsabilidade dos órgãos consultivos de execução realizar a subsunção da orientação jurídica e a avaliar a incidência ou não da exegese consolidada aos processos que porventura lhe sejam submetidos à análise.
Da impossibilidade de aplicação de regime jurídico híbrido nas licitações públicas
Preliminarmente ao exame da controvérsia de ordem jurídica estabelecida nestes autos, cumpre rememorar os termos do art. 191 da Lei n. 14.133, de 2021, segundo o qual no curso do prazo de dois anos em que há vigência concomitante da nova lei de licitações e da legislação que será revogada (qual seja: Lei n. 8.666, de 1993; Lei n. 10.520, de 2002, e arts. 1º a 47-A da Lei n. 12.462, de 2011) é expressamente vedada a aplicação combinada das leis.
Eis, em sua literalidade, os termos do art. 190, art. 191 e do art. 193, inciso II, todos da Lei n. 14.133, de 2021:
Art. 190. O contrato cujo instrumento tenha sido assinado antes da entrada em vigor desta Lei continuará a ser regido de acordo com as regras previstas na legislação revogada.
Art. 191. Até o decurso do prazo de que trata o inciso II do caput do art. 193, a Administração poderá optar por licitar ou contratar diretamente de acordo com esta Lei ou de acordo com as leis citadas no referido inciso, e a opção escolhida deverá ser indicada expressamente no edital ou no aviso ou instrumento de contratação direta, vedada a aplicação combinada desta Lei com as citadas no referido inciso.
Parágrafo único. Na hipótese do caput deste artigo, se a Administração optar por licitar de acordo com as leis citadas no inciso II do caput do art. 193 desta Lei, o contrato respectivo será regido pelas regras nelas previstas durante toda a sua vigência.
...
Art. 193. Revogam-se:
...
II - a Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, a Lei nº 10.520, de 17 de julho de 2002, e os arts. 1º a 47-A da Lei nº 12.462, de 4 de agosto de 2011, após decorridos 2 (dois) anos da publicação oficial desta Lei.
Sobre a impossibilidade legal de incidência de regime jurídico híbrido ou combinado, observa-se que o art. 190 e o parágrafo único do art. 191 da Lei n. 14.133, de 2021, são explícitos no sentido de que os contratos celebrados sob o pálio da legislação a ser revogada seguirá por ela regido no integral curso do prazo de vigência do instrumento, inclusive após ultrapassado o período de dois anos a que se refere o art. 193, inciso II, da nova lei de licitações.
Acerca da temática, cumpre reproduzir o seguinte trecho do Despacho n. 510/2022/DECOR/CGU/AGU, o qual, ao aprovar o r. Parecer n. 6/2022/CNLCA/CGU/AGU da Câmara Nacional de Licitações e Contratos Administrativos da Consultoria-Geral da União (NUP 00688.000717/2019-98 – seq. 79/83), fixou:
2. Consolide-se, por conseguinte, o entendimento no sentido de que no curso do prazo de dois anos, contados da data da publicação e vigência da Lei nº 14.133, de 2021 (DOU 01/04/2021), seguem vigentes a Lei nº 8.666, de 1993, a Lei nº 10.520, de 2002, e os arts. 1º a 47-A da Lei nº 12.462, de 2011, salvo, quanto à primeira, as disposições relacionadas ao Direito Penal e Direito Processual Penal (arts. 89 a 108), que já foram revogadas desde a data da publicação da Lei nº 14.133, de 2021, consoante preconizam os incisos I e II do seu art. 193.
3. Em atenção ao disposto no art. 190 da Lei nº 14.133, de 2021, ao princípio da segurança jurídica e ao princípio da vinculação ao edital, a nova Lei de Licitações não se aplica aos contratos administrativos assinados antes da data de sua publicação e entrada em vigor (art. 194 - DOU 01/04/2021), os quais continuam sujeitos à legislação que fundamentou sua celebração.
4. Até a revogação da Lei nº 8.666, de 1993, da Lei nº 10.520, de 2002, e dos arts. 1º a 47-A da Lei nº 12.462, de 2011, poderá a Administração deliberar por licitar e contratar diretamente conforme a nova Lei de Licitações ou nos termos da legislação a ser revogada, vedada a combinação ou aplicação híbrida dos respectivos regimes jurídicos.
5. No decorrer deste biênio a que se refere o art. 191, parágrafo único, e o inciso II do art. 193 da Lei nº 14.133, de 2021, caso a Administração opte por licitar na forma da Lei nº 8.666, de 1993, da Lei nº 10.520, de 2002, ou dos arts. 1º a 47-A da Lei nº 12.462, de 2011, os contratos administrativos correspondentes serão regidos pela referenciada legislação durante toda vigência do instrumento, inclusive após a revogação dos mencionados diplomas legais, cujas disposições determinarão a duração dos contratos, as condições e limites de sua prorrogação, e as regras aplicáveis para eventuais alterações, uma vez que o art. 190 e o parágrafo único do art. 191 da nova Lei de Licitações admite expressamente a incidência e ultratividade da legislação que será revogada, vedando, ainda, a aplicação combinada dos regimes jurídicos.
6. No mesmo sentido, e em estrita observância aos termos do art. 190 e art. 191, parágrafo único, da Lei nº 14.133, de 2021, as atas de registro de preço formalizadas com fundamento na legislação a ser revogada seguirão válidas pelos prazos previstos nos instrumentos correspondentes, independentemente do decurso do período de dois a que se refere o inciso II do art. 193 da nova Lei de Licitações, não havendo, portanto, óbice jurídico para celebração dos contratos administrativos que lhes são decorrentes enquanto perdurar a validade da ata, sendo certo que nesses casos os contratos também se sujeitarão ao regime jurídico aplicado na ata - Lei nº 8.666, de 1993, da Lei nº 10.520, de 2002, ou dos arts. 1º a 47-A da Lei nº 12.462, de 2011, inclusive caso sejam celebrados após a revogação dos referenciados diplomas legais.
Estas considerações prestam-se para destacar que os órgãos de assessoramento jurídico, por ocasião da análise das consultas a que lhe são submetidas, devem atentar para a legislação de regência do edital e contrato administrativo e a partir dela realizar o exame jurídico, apresentando as orientações para a autoridade assessorada e destacando o regime jurídico aplicável ao caso de forma clara e objetiva.
Neste sentido, considerando que o art. 191 da Lei n. 14.133, de 2021, veda a adoção de um regime jurídico híbrido, e com o objetivo de resguardar uma plena compreensão deste especial aspecto pelos gestores públicos, relacionado à proscrição da combinação de disposições legais, recomenda-se que referências a artigos de uma lei que não se aplica ao edital ou contrato no caso concreto (seja da Lei nº 14.133, de 2021, ou da Lei nº 8.666, de 1993, da Lei nº 10.520, de 2002, e da Lei nº 12.462, de 2011) sejam feitas a título hermenêutico, como por exemplo para fins de realização de uma interpretação histórica ou comparada entre as leis.
A respeito da relevância da evolução histórica das normas para fins de consolidação da sua melhor exegese, segue elucidativa doutrina de Carlos Maximiliano (Hermenêutica e Aplicação do Direto, Editora Forense, 19ª Edição. 2010, p. 112 e 114):
142 - Não é possível manejar com desembaraço, aprender a fundo uma ciência que se relacione com a vida do homem em sociedade, sem adquirir antes o preparo propedêutico indispensável. Deste faz parte o estudo da história especial do povo a que se pretende aplicar o mencionado ramo de conhecimentos, e também o da história geral, principalmente política, da humanidade. O Direito inscreve-se na regra enunciada, que, aliás, não comporta exceções: para o conhecer bem, cumpre familiarizar-se com os fastos da civilização, sobretudo daquela que assimilamos diretamente: a europeia em geral; a lusitana em particular. Complete-se o cabedal de informações proveitosas com estudo da História do Brasil.
143 – O que hoje vigora, abrolhou de germes existentes no passado; o Direito não se inventa; é um produto lento da evolução, adaptado ao meio; com acompanhar o desenvolvimento desta, descobrir a origem e as transformações históricas de um instituto, obtém-se alguma luz para o compreender bem. Só as pessoas estranhas da ciência jurídica acreditam na possibilidade de se fazerem leis inteiramente novas, crêem ser um Código obra pessoal de A ou B. O autor aparente da norma positiva apenas assimila, aproveita e consolida o que encontra no país e, em pequena parte, entre povos do mesmo grau de civilização. Consiste o Direito atual em reproduções, ora integrais, ora ligeiramente modificadas, de preceitos preexistentes.
Pois bem: se o presente é um simples desdobramento do passado, o conhecer este parece indispensável para compreender aquele: daí a grande utilidade da História do Direito, para o estudo da ciência jurídica. Segundo o chanceler Portalis, a Historia é ¨a Física Experimental da legislação¨; acrescenta Geny ser a História do Direito a Física Experimental da jurisprudência.
(...)
146 – É dupla a utilidade do elemento histórico. Disposições antigas, restabelecidas, consolidadas ou simplesmente aproveitadas em novo texto, conservam a exegese do original. Pouco importa que se não reproduzam as palavras: basta que fique a essência, o conteúdo, substancialmente se haja mantido o pensamento primitivo. Por outro lado, pelo espírito das alterações e reformas sofridas por um preceito em sua trajetória histórica, chega-se ao conhecimento do papel que ele é chamado a exercer na atualidade.
O confronto de disposições vigentes com outras anteriores, paralelas, ou análogas, não só evidencia a continuidade, embora progressiva, de ideias e teorias pré-existentes; como também prova que essa perpetuação relativa é a regra; o contraste, a mudança radical aparecem como exceções.
Eis porque, acerca de todos os ramos das ciências sociais, no passado se encontram ensinamentos para compreender o presente e prevenir o futuro.
Isto posto, uma vez que há vedação legal para adoção de um regime jurídico híbrido consubstanciado na combinação de disposições da Lei nº 14.133, de 2021, com a Lei nº 8.666, de 1993, a Lei nº 10.520, de 2002, e com os arts. 1º a 47-A da Lei nº 12.462, de 2011, preliminarmente ao exame da controvérsia jurídica em referência, recomenda-se que os órgãos jurídicos sejam ciosos quanto ao disposto no art. 191 da Lei n. 14.133, de 2021, de maneira a não restar dúvidas para os gestores públicos a respeito da legislação de regência dos editais e contratos administrativos que foram submetidos à análise e acerca dos fundamentos e artigos legais que são efetivamente aplicáveis e regem o caso concreto objeto da consulta, não havendo, evidentemente, empecilho para que nas razões da manifestação sejam realizadas referências a disposições homólogas que cuidam do tema no âmbito da legislação que não incide sobre o edital ou contrato examinado, desde que para fins estritamente hermenêuticos.
Da equação econômico-financeira dos contratos administrativos
Feitas as considerações iniciais, relacionadas à caracterização da competência deste Departamento de Coordenação e Orientação de Órgãos Jurídicos da Consultoria-Geral da União para promover a uniformização da jurisprudência administrativa e dirimir a controvérsia de ordem jurídica estabelecida neste processo, e sobre a incidência do art. 191 da Lei n. 14.133, de 2021, resta avançar no exame para apreciar a questão jurídica a ser uniformizada.
Conforme já relatado, e em ligeiro resumo, a divergência diz respeito à possibilidade jurídica de ocorrência de preclusão lógica da concessão de reajuste em sentido estrito nos contratos de escopo, nas específicas hipóteses em que o edital e o contrato administrativo prevejam a solicitação da contratada como condição para sua concessão e que tenha havido aditamento para prorrogação do prazo de vigência do instrumento sem prévia aplicação do índice de reajuste pactuado, consentindo o contratado com a dilação do período nas mesmas condições adrede pactuadas.
Por meio do Parecer n. 79/2019/DECOR/CGU/AGU (NUP 08008.000351/2017-17 - seq. 19), consolidou-se que o reajuste em sentido estrito, como expressão da cláusula constitucional da preservação da equação econômico-financeira dos contratos administrativos de que cuida o inciso XXI do art. 37 da Constituição Federal, deve em regra ser concedido ex officio pela Administração, independentemente de solicitação da empresa contratada, desta maneira esta espécie de reajuste não está (também em regra) sujeita à preclusão lógica em caso de celebração de termo aditivo antes da sua concessão.
De fato, o reajuste em sentido não importa aditamento contratual, mas mero apostilamento, e consubstancia correção monetária que reflete a variação dos custos do mercado, desta maneira a aplicação do índice contratual pela Administração apenas preserva a determinação constitucional que protege a equação econômico-financeira dos contratos administrativos.
Ao celebrar contratos administrativos, as partes comprometem-se a prestações recíprocas mutuamente equilibradas, e a relação jurídica estabelecida deve se fincar nas premissas da lealdade e da boa-fé. No âmbito dos contratos administrativos, a relação de equidade econômico-financeira entre a Administração e o contratado possui resguardo de patamar constitucional, pois segundo o inciso XXI do art. 37 da Carta as licitações devem, salvo exceções legalmente admitidas, preceder a celebração de contratos administrativo e objetivam a “igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei”.
A preservação da equação econômico-financeira dos contratos administrativos, portanto, é preceito de assento constitucional que em ultima ratio faz acertadamente prevalecer o interesse público sobre aspirações estritamente patrimoniais. Não há aspiração coletiva contra legem, nem tampouco se implementa sua consecução mediante sacrifício de legítimo direito alheio.
A dicção do art. 3º da Lei nº 10.192, de 2001, parece peremptória ao determinar a correção monetária dos contratos administrativos por meio do uso do termo “serão”, ou seja, na forma da referenciada lei, os “contratos em que seja parte órgão ou entidade da Administração Pública direta ou indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, serão reajustados ou corrigidos monetariamente de acordo com as disposições desta Lei, e, no que com ela não conflitarem, da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993”, o que revela que a correção do valor contratado pela Administração, cumpridos os requisitos para sua incidência, é mero cumprimento das obrigações legais decorrentes da celebração do contrato administrativo.
Sobre a correção monetária, seguem elucidativas razões e conclusões do Parecer nº GQ-111 (disponível em: https://antigo.agu.gov.br/page/atos/detalhe/idato/8290), vinculante para toda a Administração porque aprovado pelo Chefe do Poder Executivo e publicado no Diário Oficial da União (DOU 24.09.1996):
15. A correção monetária é "instrumento pelo qual - através do reajuste de unidades pecuniárias - se mantém o equilíbrio entre a dívida e o valor da prestação destinada à satisfação do credor", na feliz assertiva de Humberto Gomes de Barros, quando, como Procurador-Geral, analisou a questão no âmbito da Administração do Distrito Federal. É a conseqüência da corrosão da moeda, isto é, o "descompasso, ao longo do tempo, entre a expressão nominal e a expressão real do dinheiro, assentando, por tal meio a correspondência verdadeira entre duas nominações numéricas ao longo da dilação temporal" (Celso Antônio Bandeira de Mello, Contrato de Obra Pública com Sociedade de Economia Mista - Atraso no Pagamento de Faturas, in RDP n° 74/ 103-116, p. 114). É adequação do valor material da obrigação ao valor formal. Para Caio Tácito, "a correção monetária não altera a substância econômica; altera apenas a sua expressão nominal, em termos monetários, eliminando a instabilidade no valor real dos pagamentos e mantendo a eqüivalência legítima das obrigações bilaterais, quando não são simultâneas, mas sucessivas ou diferidas no tempo. É, em suma, o antídoto eficaz aos efeitos da inflação sobre as relações jurídicas entre o Estado e os particulares" (Direito Administrativo, São Paulo, Saraiva, 1975, p. 332). A "correção monetária não tem nenhuma semelhança com juros, que são um plus. Ela é a própria indenização primitiva quando retificada", como disse o Ministro Xavier de Albuquerque (RTJ 79/735), ao apartear o Ministro Djaci Falcão, no julgamento da Reclamação n°35-SP, em 04/04/74 (RTJ 79/726). É a atualização do débito, para que seja completa a satisfação do credor. Como disse, também, o Ministro Célio Borja (R.E. n°113.892- SP), "a correção monetária foi instituída para que se mantenha o poder de compra da moeda, tendo em vista sua crescente desvalorização. (...) tem por finalidade a atualização do crédito; não é penalidade por atraso, como são os juros contratados." Ou, ainda, como disse o Ministro Cordeiro Guerra, já em 1975, "a correção monetária não remunera o capital, apenas assegura sua identidade no tempo." (R.E. n°82.419 - SP, D.J. 10/12/75, p. 9.263).
16. Não é, portanto, uma pena e independe de culpa, como já reconheceram o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça. Não é, também, um "plus" a exigir expressa previsão legal, mas simples atualização da dívida, decorrência natural da retenção indevida. Sua incidência objetiva exclusivamente manter o valor da prestação. Não configura nenhum acréscimo e independe, pois, de expressa previsão legal. Como diz Maria da Graça Antunes Varela, a "despesa já foi autorizada por Lei. Não pagar a correção monetária implica pagar menos do que a Lei autorizou. Pagá-la implica gastar exatamente o permitido em Lei. O princípio da legalidade não é, de forma alguma desrespeitado." (Correção monetária de valores quitados com atraso pela Administração Pública,in Revista da Procuradoria Geral do Estado da Bahia, vol. 14, p. 23-28, especificamemte p.25).
17. Em regime inflacionário anormal, o pagamento de débitos vencidos, sem a atualização de seu valor nominal, configura pagamento incompleto, insusceptível de saldar a obrigação. E se o pagamento é incompleto, ganha o devedor por não ter que desembolsar a quantia devida; perde o credor, justamente aquele que, tendo tido seu direito violado, deveria merecer a proteção do Direito. Quem recebe com atraso e sem correção, recebe valores menores do que aqueles a que teria direito. Não recebe a real satisfação do que lhe cabe por direito. "O risco da depreciação monetária, ou seja, da desvalorização do poder aquisitivo da moeda corre por conta do devedor, que tem a disponibilidade do valor até o momento do efetivo pagamento", como diz Arnoldo Wald em artigo intitulado "Aspectos processuais da aplicação da teoria das dívidas de valor". (Revista de Informação Legislativa, nº 69, jan/mar. 1981, p. 229-260, especialmente, p.239).
18. Não constitui, como supôs a PGFN, indenização por danos sofridos. Para fazer jus à indenização, o lesado deve comprovar o prejuízo e a indenização deve ser fixada, tendo em vista diversos fatores. Não é assim no caso de correção monetária, que é devida para que o pagamento seja integral, completo.
19. A correção monetária tem conteúdo essencialmente moral: visa a evitar o enriquecimento ilícito do devedor contra o correspondente empobrecimento do credor, titular do direito de crédito. Não houvesse a correção, o devedor seria tanto mais beneficiado quanto mais tempo demorasse para saldar o débito, para cumprir a obrigação a que estivesse sujeito. E, inversamente, o credor, titular do direito, seria tanto mais prejudicado quanto mais tempo demorasse a ver satisfeito o seu direito. Ganharia o faltoso, perderia o titular do direito. Premiar-se-ia o inadimplente e punir-se-ia, sem qualquer razão plausível, o credor, pois, em época inflacionária, pagamento feito com atraso e sem correção monetária é pagamento a menor, pagamento incompleto. Tal situação repugna a qualquer sistema jurídico e, mais ainda, ao sistema vigente num Estado democrático de direito.
O reajuste em sentido estrito, pois, por consubstanciar instituto jurídico que preserva a manutenção da equação econômico-financeira originariamente contratada, formalizado por mero apostilamento, representa medida impositiva, que não altera o contrato e resguarda o interesse público perseguido na norma constitucional que disciplina as licitações públicas, não sendo juridicamente cabível que a Administração, em prol de interesses patrimoniais secundários e pontuais, frustre indevidamente as legítimas expectativas das empresas contratadas e se negue a suportar, com a mesma lealdade e boa-fé que espera que a contratada cuide da execução do objeto, o pagamento dos preços contratados, incluindo, evidentemente, os reajustes devidos pelos índices que façam recompor as variações efetivas dos custos de produção.
A postura administrativa leal quanto ao fiel cumprimento das suas obrigações, que a própria Administração se atribuiu ao lançar o edital e celebrar o contrato administrativo, implica, mediante preservação da estabilidade da equivalência dos ônus contratuais pactuados, a redução dos riscos da contratação e dos influxos que as incertezas geram no mercado e no preço a ser contratado, sendo, pois, medida que também possui potencial para ensejar a fiel execução do objeto pelo contratado e para diminuir os custos ou os impactos que as inseguranças geram na precificação do objeto perseguido nas licitações públicas.
E é justamente a obtenção da melhor proposta para o alcance do interesse público um dos fundamentais objetivos das licitações públicas, na esteira da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal abaixo colacionada:
EMENTA:
...
3. A licitação é um procedimento que visa à satisfação do interesse público, pautando-se pelo princípio da isonomia. Está voltada a um duplo objetivo: o de proporcionar à Administração a possibilidade de realizar o negócio mais vantajoso --- o melhor negócio --- e o de assegurar aos administrados a oportunidade de concorrerem, em igualdade de condições, à contratação pretendida pela Administração. Imposição do interesse público, seu pressuposto é a competição. Procedimento que visa à satisfação do interesse público, pautando-se pelo princípio da isonomia, a função da licitação é a de viabilizar, através da mais ampla disputa, envolvendo o maior número possível de agentes econômicos capacitados, a satisfação do interesse público. A competição visada pela licitação, a instrumentar a seleção da proposta mais vantajosa para a Administração, impõe-se seja desenrolada de modo que reste assegurada a igualdade (isonomia) de todos quantos pretendam acesso às contratações da Administração.
...
6. A lei pode, sem violação do princípio da igualdade, distinguir situações, a fim de conferir a uma tratamento diverso do que atribui a outra. Para que possa fazê-lo, contudo, sem que tal violação se manifeste, é necessário que a discriminação guarde compatibilidade com o conteúdo do princípio.
7. A Constituição do Brasil exclui quaisquer exigências de qualificação técnica e econômica que não sejam indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações. A discriminação, no julgamento da concorrência, que exceda essa limitação é inadmissível.
8. Ação direta julgada procedente para declarar inconstitucionais os artigos 16 e 19, e seu parágrafo, da Lei n. 260/90 do Estado de Rondônia.
(ADI 2716, Relator(a): EROS GRAU, Tribunal Pleno, julgado em 29/11/2007, DJe-041 DIVULG 06-03-2008 PUBLIC 07-03-2008 EMENT VOL-02310-01 PP-00226 RTJ VOL-00204-03 PP-01114)
De todo o exposto, se observa que, não sendo o reajuste em sentido estrito medida que altera o contrato administrativo, representando mera recomposição do valor contratual pelo índice editalício ou contratual previsto que reflete as variações mercadológicas dos custos correspondentes (álea ordinária), a sua concessão ex officio pela Administração, independentemente de solicitação do contratado, é medida que se coaduna com os mandamentos constitucionais que preservam a equivalência econômico-financeira dos contratos e que buscam concretizar o objetivo do procedimento licitatório que se relaciona com a obtenção de proposta que melhor satisfaça o interesse público.
Sobre este particular aspecto, cumpre rememorar trecho do Despacho n. 496/2020/DECOR/CGU/AGU (08008.000351/2017-17 – seq. 21), que ao aprovar o Parecer n. 79/2019/DECOR/CGU/AGU, consignou que “a previsão de índices de reajuste em sentido estrito, além de respeitar o art. 2º e o art. 3º da Lei nº 10.192, de 2001; e o art. 40, inciso XI, e art. 55, inciso III, ambos da Lei 8.666, de 1993; presta-se essencialmente para resguardar a obtenção da melhor proposta para a Administração, um dos valores decorrentes do preceito constitucional da licitação de que cuida o inciso XXI do art. 37 da CF/1988 e o art. 3º da Lei nº 8.666, de 1993, uma vez que a previsão editalícia de reajuste evita que as propostas encaminhadas no certame pelos interessados sejam mensuradas com acréscimo de valores para suportar futuras elevações de custos de insumos e hipotéticas expectativas inflacionárias”.
A preservação da equação econômico-financeira dos contratos administrativos mediante promoção de reajuste em sentido estrito, por meio da aplicação de índice que reflita efetivamente as variações dos custos do mercado, não representa, pois, uma modificação contratual e sua concessão ex officio pela Administração deve ser a regra, independentemente da natureza do objeto pactuado, incluindo serviços continuados e contratos de escopo, por ser medida que satisfaz o interesse público, cumpre mandamento constitucional do inciso XXI do art. 37 da Carta, é expressão da lealdade e da boa-fé, e tem potencial para reduzir os riscos e inseguranças nas contratações públicas, concorrendo para a redução dos preços e para a contratação de propostas mais vantajosas para a Administração.
Da preclusão lógica do reajuste em sentido estrito nos contratos administrativos
Extrai-se do Despacho n. 496/2020/DECOR/CGU/AGU (08008.000351/2017-17 – seq. 21), que aprovou o Parecer n. 79/2019/DECOR/CGU/AGU, que o reajuste em sentido estrito “vem disciplinado no art. 61 da IN nº 5, de 2017, e ‘consiste na aplicação de índice de correção monetária previsto no contrato, que deverá retratar a variação efetiva do custo de produção, admitida a adoção de índices específicos ou setoriais’; sendo admitida sua previsão ‘nos contratos de prazo de duração igual ou superior a um ano, desde que não haja regime de dedicação exclusiva de mão de obra’ (§ 1º do art. 61 da IN nº 5, de 2017); e ‘Nos casos em que o valor dos contratos de serviços continuados sejam preponderantemente formados pelos custos dos insumos’ (§ 4º do art. 61 da IN nº 5, de 2017). Registre-se que, acertadamente, para o reajuste em sentido estrito a IN nº 5, de 2017, não estabelece como regra a necessidade de pedido do contratado, nem tampouco traz disposição homóloga àquela prevista no § 7º do seu art. 57, que cuida da preclusão lógica do direito à repactuação após a celebração de aditamentos de vigência”.
A preclusão lógica caracteriza-se pela prática de um ato que se revele incompatível com o exercício de um direito, entendendo-se que a parte abdicou implicitamente ao direito diante de uma ação ou omissão que se mostre logicamente inconciliável, contraditória ou conflitante com seu regular exercício.
A renúncia também pode se efetivar expressamente, ou seja, entender que o reajuste em sentido estrito está ou não sujeito à preclusão lógica sob determinadas circunstâncias não importa abolir a possibilidade jurídica de sua renúncia de forma expressa pelo contratado. E este particular aspecto merece especial relevo, pois se faz determinante para a escorreita compreensão do tema e para a consolidação da uniformização da jurisprudência administrativa na espécie.
O Parecer n. 79/2019/DECOR/CGU/AGU, ao consolidar como regra que o reajuste em sentido estrito não está sujeito à preclusão lógica, não aboliu a possibilidade jurídica de sua renúncia, notadamente da renúncia expressa desse direito por parte de contratado.
Por conseguinte, admitir ou não a preclusão lógica do reajuste em sentido estrito nos contratos de escopo diante da assinatura de um aditamento sem sua expressa concessão ou ressalva não importa qualquer embaraço jurídico para a renúncia explícita desse reajuste pelo contratado.
As renúncias devem ser interpretadas estritamente, nos termos do art. 114 do Código Civil, o que se aplica aos contratos administrativos, na forma do que dispõe o § 2º do art. 89 da Lei n. 14.133, de 2021, e o § 1º do art. 54 da Lei n. 8.666, de 1993, que determinam que aos contratos administrativos incidem supletivamente as disposições de direito privado, e que as suas cláusulas devem definir, com clareza e precisão, os direitos, obrigações e responsabilidades das partes:
Lei n. 8.666, de 1993
Art. 54. Os contratos administrativos de que trata esta Lei regulam-se pelas suas cláusulas e pelos preceitos de direito público, aplicando-se-lhes, supletivamente, os princípios da teoria geral dos contratos e as disposições de direito privado.
§ 1º Os contratos devem estabelecer com clareza e precisão as condições para sua execução, expressas em cláusulas que definam os direitos, obrigações e responsabilidades das partes, em conformidade com os termos da licitação e da proposta a que se vinculam.
...
Lei n. 14.133, de 2021
Art. 89. Os contratos de que trata esta Lei regular-se-ão pelas suas cláusulas e pelos preceitos de direito público, e a eles serão aplicados, supletivamente, os princípios da teoria geral dos contratos e as disposições de direito privado.
§ 1º Todo contrato deverá mencionar os nomes das partes e os de seus representantes, a finalidade, o ato que autorizou sua lavratura, o número do processo da licitação ou da contratação direta e a sujeição dos contratantes às normas desta Lei e às cláusulas contratuais.
§ 2º Os contratos deverão estabelecer com clareza e precisão as condições para sua execução, expressas em cláusulas que definam os direitos, as obrigações e as responsabilidades das partes, em conformidade com os termos do edital de licitação e os da proposta vencedora ou com os termos do ato que autorizou a contratação direta e os da respectiva proposta.
Em sede de repactuação a Instrução Normativa n. 5, de 2017, foi claríssima ao determinar os efeitos da celebração de aditamento de prorrogação de prazo de vigência sem prévia repactuação, e essa previsão normativa se faz legítima e necessária para conferir segurança jurídica à Administração e aos particulares contratados, os quais ficam previamente cientes das consequências jurídicas decorrentes da ausência de tempestivo requerimento da repactuação. Assim dispõe o § 7º do art. 57 da IN n. 5, dde 2017:
Art. 57 (...)
...
§ 7ºAs repactuações a que o contratado fizer jus e que não forem solicitadas durante a vigência do contrato serão objeto de preclusão com a assinatura da prorrogação contratual ou com o encerramento do contrato.
Não se olvide, ainda, que nos termos da IN SEGES/ME n. 98, de 2022, a IN n. 5, de 2017, aplica-se “no que couber” aos processos de licitação de que cuida a Lei n. 14.133, de 2021.
O reajuste em sentido estrito, pois, é um direito patrimonial de caráter disponível do contratado, passível, inclusive, de conciliação mediante atuação de câmaras de prevenção e resolução de conflitos, nos termos do art. 3º, e art. 32, § 5º, ambos da Lei nº 13.140, de 2016. Por conseguinte, mesmo representando uma expressão da equivalência econômico-financeira dos contratos, a natureza disponível do reajuste admite que o contratado abdique do exercício do seu direito, seja de forma expressa, ou mediante renúncia tácita, a qual deve ser interpretada estritamente, na forma do art. 114 do Código Civil, e na esteira do § 2º do art. 89 da Lei n. 14.133, de 2021, e o § 1º do art. 54 da Lei n. 8.666, de 1993.
A preclusão lógica encerra em si uma renúncia tácita, e sua caracterização, no que se relaciona ao reajuste em sentido estrito no âmbito dos contratos administrativos, não prescinde de expressa previsão editalícia (ou contratual) das condições necessárias para sua incidência, uma vez que as renúncias devem ser interpretadas estritamente. Sobre as renúncias tácitas, segue precedente do Superior Tribunal de Justiça:
CIVIL. RENÚNCIA. INTERPRETAÇÃO ESTRITA. CÓDIGO CIVIL, ART. 114.
A interpretação estrita prevista no art. 114 do Código Civil pode identificar a renúncia, ainda que a comunicação de vontade não utilize esse vocábulo; a manifestação de vontade incompatível com o exercício do direito importa em renúncia.
Requerendo que a permissão de transporte público, que lhe havia sido deferida, fosse assegurada "tão-somente" a outras permissionárias, a empresa autora renunciou de fato ao serviço que até então estava autorizada a prestar.
Recurso especial conhecido, mas desprovido.
(REsp n. 1.264.112/PR, relator Ministro Ari Pargendler, Primeira Turma, julgado em 12/11/2013, DJe de 29/11/2013.)
A respeito de tema homólogo – preclusão da revisão de contrato de escopo, segue elucidativo trecho do voto do Ministro Banjamin Zymler no Acórdão 4365/2014 – Primeira Câmara, da Corte de Contas:
21. Dado o exíguo prazo de vigência do negócio jurídico, o edital não estabeleceu critério para reajustamento de preços. Ainda que houvesse um índice fixado, tenho que a construtora, ao aceitar dar início aos serviços sem condicioná-los a uma revisão de preços, implicitamente reconheceu a adequação e a exequibilidade dos valores propostos na licitação. Dito de outro modo, o ato voluntário da recorrente trouxe consigo a renúncia ao reequilíbrio econômico-financeiro do contrato, dando azo à ocorrência de preclusão lógica.
22. Menciono como paradigma o Acórdão 1828/2008-TCU-Plenário. Nesse precedente, foi decidido que, caso haja termos aditivos de prorrogação de contrato de serviços continuados sem que seja suscitada correção dos preços de mão de obra, a contratada ratifica os valores até então acordados e deixa de exercer o seu direito à repactuação, entendida esta como uma espécie do reajuste.
Sobre este particular aspecto da possibilidade jurídica de renúncia expressa do contratado ao reajuste em sentido estrito, verifica-se que o Despacho n. 496/2020/DECOR/CGU/AGU (08008.000351/2017-17 – seq. 21), que aprovou o Parecer n. 79/2019/DECOR/CGU/AGU, consignou-se que:
12. Portanto, considerando a natureza não preclusiva do reajuste em sentido estrito, e em complemento ao Parecer ora acolhido, deve ser destacado que, nas hipóteses em que porventura tenha ocorrido a prorrogação do prazo de vigência do contrato administrativo sem o prévio reajuste em sentido estrito do preço, desde que evidentemente tenham sido cumpridos os requisitos legais para sua concessão, deve a Administração avaliar a possibilidade de renúncia do reajuste em sentido estrito pelo contratado, ou, em caso negativo: a) deve ser verificado se o índice contratual previsto efetivamente acompanha a variação dos preços de mercado, de maneira a certificar ou não a vantagem econômica da prorrogação com os preços reajustados; e b) em atenção ao art. 7º, § 2º, inciso III, e § 6º, da Lei nº 8.666, de 1993, deve ser avaliado se remanesce lastro orçamentário para custear o reajuste em sentido estrito.
13. Por conseguinte, em atenção ao preceito da vinculação ao instrumento convocatório e à garantia constitucional que resguarda a preservação da equação econômico-financeira dos contratos administrativos, eventual prorrogação do prazo de vigência de contrato administrativo não representa, per si, impedimento legal absoluto para concessão de reajuste em sentido estrito pela Administração por se tratar de mero cumprimento de cláusula contratual que, via de regra, independe de solicitação do contratado. Não obstante, recomenda-se, nesta hipótese, que seja inicialmente avaliada a possibilidade de renúncia do direito ao reajuste pelo contratado. Não sendo admitida, a legalidade da continuidade da execução resta condicionada: a) à certificação de que o preço reajustado é vantajoso para a Administração, na forma da Orientação Normativa AGU nº 60 e do Anexo IX da IN nº 5, de 2017; e b) ao ateste de respaldo orçamentário para realização dos pagamentos.
14. Isto posto, acolho o Parecer nº 79/2019/DECOR/CGU/AGU, nos termos do Despacho nº 480/2020/DECOR/CGU/AGU, e o submeto à elevada apreciação superior, sugerindo-se que seja consolidado o entendimento no sentido de que:
a) a repactuação de preços nos contratos continuados com dedicação exclusiva de mão de obra está sujeita à preclusão, nos termos do § 7º do art. 57 da IN nº 5, de 2017;
b) salvo disposição editalícia em sentido contrário, o reajuste em sentido estrito de que cuida o art. 61 da IN nº 5, de 2017, deve ser aplicado ex officio pela Administração, independentemente de solicitação do contratado, e mediante mero apostilamento (art. 65, § 8º, da Lei nº 8.666, de 1993), desde que preenchidos os pressupostos legais e contratuais para sua incidência, não estando sujeito à preclusão lógica;
c) caso haja prorrogação da vigência contratual sem a prévia concessão do reajuste em sentido estrito, a legalidade da continuidade da execução do contrato deve ser precedida de negociação, de maneira a verificar se é possível que haja renúncia ao reajuste pelo contratado ou; em caso negativo, deve a Administração avaliar se há vantagem econômica para a prorrogação caso os preços sejam reajustados, observando a Orientação Normativa AGU nº 60 e o Anexo IX da IN nº 5, de 2017, e se há lastro orçamentário para os pagamentos, na esteira do art. 7º, § 2º, inciso III, e § 6º, da Lei nº 8.666, de 1993.
Cumpre destacar, outrossim, que atenta leitura do Despacho n. 496/2020/DECOR/CGU/AGU (08008.000351/2017-17 – seq. 21) e do Parecer n. 79/2019/DECOR/CGU/AGU revelam que o objeto da manifestação se referiu estritamente aos contratos administrativos cujo objeto é a prestação de serviços continuados. Referências nas razões e conclusões das mencionadas manifestações à repactuação, ao exame da vantagem da prorrogação, à Orientação Normativa AGU n. 60, e ao art. 57, inciso II, da Lei n. 8.666, de 1993, demonstram que o objeto da manifestação se referia especificamente aos serviços continuados.
Corroborando essa constatação, verifica-se que a manifestação paradigma da divergência jurídica, então dirimida pela DECOR/CGU, referia-se a caso concreto cujo contrato administrativo tinha por objeto a prestação de serviços de caráter continuado, como se verifica do Parecer n. 00422/2019/CONJUR-MJSP/CGU/AGU (NUP 08008.000351/2017-17, seq. 5 – parágrafo 2).
Aclare-se, pois, que o Parecer n. 79/2019/DECOR/CGU/AGU aplica-se aos contratos de prestação de serviços de natureza continuada.
Não obstante, e acerca dos contratos de escopo, merece prevalecer o entendimento homólogo no sentido de que em regra a preclusão lógica do reajuste em sentido estrito não se aplica como regra, até mesmo porque a prorrogação do prazo de vigência nos instrumentos dessa natureza não representa uma renovação de prestação de serviços de caráter contínuo, voltando-se em sua essência para viabilizar a própria conclusão do objeto contratado, assim, a celebração do aditamento para redefinição do cronograma de execução do escopo pactuado não se revela per si, e ao menos em regra (reitere-se), medida incompatível com a superveniente concessão do reajuste em sentido estrito.
Ademais, o reajuste em sentido estrito, seja nos contratos de prestação de serviços continuados, seja nos contratos de escopo, representa mera correção monetária do valor contratado para fins de recompor a variação efetiva dos correspondentes custos de produção. Em ambos os casos, portanto, não há alteração do contrato, sendo a concessão do reajuste medida que pode se formalizar via apostilamento e que representa o cumprimento das cláusulas pactuadas e do mandamento constitucional de preservação da equivalência econômico-financeira dos contratos administrativos.
Nos contratos de escopo, e em razão de sua natureza, a celebração de aditamento de prorrogação de prazo de vigência e execução do objeto não implica, ao menos em regra, uma renúncia (ou preclusão lógica) do reajuste em sentido estrito, tudo sem qualquer prejuízo da possibilidade jurídica de que o contratado expressamente abdique do reajuste em sentido estrito no curso das tratativas voltadas para a formalização do aditamento.
O aditamento de prorrogação do prazo de vigência nos serviços de natureza continuada não é um direito subjetivo do contratado, na forma do inciso II do art. 57 da Lei n. 8.666, de 1993, sendo medida que se condiciona, dentre outros requisitos legais, à caracterização técnica da vantagem da prorrogação para a Administração, portanto, considerando que os serviços de caráter continuado se configuram por serem aqueles em que há perene necessidade de execução, a renovação contratual sem prévio pedido de reajuste em sentido estrito, nas hipóteses em que o instrumento convocatório condiciona sua concessão à apresentação desse pedido, pode juridicamente caracterizar-se como uma renúncia tácita ou a denominada preclusão lógica do reajuste, desde que haja previsão no edital ou contrato.
Não obstante as circunstâncias distintas que envolvem a prorrogação dos contratos de escopo e dos contratos de serviços continuados, conclui-se, igualmente, que nos contratos de escopo não parece haver em regra uma incompatibilidade lógica entre o aditamento de prorrogação de vigência de execução do objeto e o reajuste em sentido estrito, contudo, dado o caráter disponível desse direito do contratado, parece não haver empecilho jurídico para a renúncia expressa desse direito, nem tampouco parece existir impedimento legal para que seja admitida sua renúncia tácita, desde que as condições para sua caracterização sejam previamente definidas no edital ou contrato, ou seja, sendo omisso o edital (ou contrato) quanto a essa hipótese, a melhor exegese do art. 114 do Código Civil, combinado como § 2º do art. 89 da Lei n. 14.133, de 2021, ou com o § 1º do art. 54 da Lei n. 8.666, de 1993, enseja a impossibilidade jurídica da caracterização da preclusão lógica do reajuste em sentido estrito.
O Parecer JT-02, vinculante para toda a Administração Pública porque aprovado pelo Chefe do Poder Executivo e publicado no Diário Oficial da União que circulou em 06.03.2009 (disponível em: http://www.planalto.gov.br/CCIVIL_03/AGU/PRC-JT-02-2009.htm), tratou da repactuação nos contratos administrativos de natureza continuada com dedicação exclusiva de mão de obra, e concluiu que “A repactuação deverá ser pleiteada até a data da prorrogação contratual subseqüente, sendo certo que, se não o for de forma tempestiva, haverá a preclusão do direito do contratado de repactuar”. Assim ficou caracterizada a preclusão lógica em sua fundamentação:
Ora, no momento em que se firma novo termo aditivo ao contrato, está-se, na verdade, constituindo novo contrato tendente a prorrogar a avença com vistas à obtenção de preços e condições mais vantajosas para a Administração, conforme pode se ver pelo art. 57 da Lei de Licitações:
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Marçal Justen Filho reafirma este entendimento ao diferenciar renovação e modificação contratual:
“A renovação contratual consiste em promover uma nova contratação, de conteúdo similar a um contrato anterior, para que tenha vigência por período posterior, mantendo-se as partes em situação jurídica similar à derivada da avença que se extingue. Em termos jurídicos, a renovação não é uma modificação contratual. Envolve uma nova contratação, ainda que com cláusulas e condições similares às constantes do contrato extinto. Por isso, a renovação de contratação não se confunde com a mera alteração do prazo de vigência de um único e mesmo contrato.”
Isto porque, todo contrato - e aqui se inclui os respectivos termos aditivos - possui um prazo de vigência especificado, não podendo ter vigência indeterminada, sendo certo que todos os efeitos dele decorrentes devem advir deste período em que se encontrava vigorando.
Findo seu prazo de duração e prorrogado o contrato, sem que o interessado argua seu direito decorrente de evento do contrato originário ou anterior, entende-se, conforme decidiu a Corte de Contas, que houve preclusão lógica do direito consubstanciada na prática de ato incompatível com outro anteriormente praticado.
A preclusão é a perda da faculdade de praticar ato em razão da prática de outro ato incompatível com aquele que se pretenda exercitar. Trata-se de fenômeno processual, que acaba por interferir no direito material da parte.
E a incidência do instituto processual no caso em tela se justifica diante do fato de que a execução do contrato compreende a concatenação de atos administrativos tendentes a um produto final.
Na forma do Código Civil, as renúncias devem ser interpretadas estritamente, e, ao disciplinar a renúncia tácita da prescrição, dispõe o diploma que é ato que se deduz da postura do interessado, incompatível com a prescrição, tudo a revelar que de fato a preclusão lógica representa, na verdade, uma abdicação a um direito pela prática de ato inconciliável com seu exercício:
Art. 114. Os negócios jurídicos benéficos e a renúncia interpretam-se estritamente.
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Art. 191. A renúncia da prescrição pode ser expressa ou tácita, e só valerá, sendo feita, sem prejuízo de terceiro, depois que a prescrição se consumar; tácita é a renúncia quando se presume de fatos do interessado, incompatíveis com a prescrição.
A respeito da natureza restritiva dos atos de renúncia e sua interpretação, observa-se que por meio do Despacho n. 487/2008, que compõe o Parecer JT-02, fixou-se que mesmo nos casos de contratação de serviços contínuos com dedicação exclusiva de mão de obra a possibilidade jurídica de preclusão lógica de repactuação deve ser expressamente prevista no edital/contrato, medida que também expressa os ditames da lealdade e da boa-fé, e que se depreende do § 1º do art. 54 da Lei n. 8.666, de 1993:
Com efeito, o entendimento perfilhado pela douta parecerista é no sentido de que a repactuação, motivada em decorrência de majoração salarial, pode ser exercida até o momento imediatamente anterior ao da assinatura da prorrogação contratual, sob pena de não mais poder ser exercida em razão da ocorrência, após este momento, de preclusão lógica.
Entendimento este que se coaduna com o posicionamento firmado pelo Tribunal de Contas da União.
Adotando-se este raciocínio, não se pretende anular o direito de o contratado pleitear a repactuação.
Busca-se, em verdade, é salvaguardar a Administração Pública de possíveis dificuldades advindas de um pedido de repactuação, com efeitos financeiros retroativos em prazos superiores ao da prorrogação da vigência do contrato.
Tal posicionamento justifica-se em face da vinculação da Administração Pública aos preceitos orçamentários aos quais deve fiel obediência, além de dificultar de sobremaneira a análise, a destempo, da demonstração analítica apresentada pelo contratado em respaldo ao seu pedido, uma vez que tal análise deve ter por base a conjuntura do mercado vigente à época da majoração salarial.
Não obstante restar configurada a preclusão lógica, se o contratado não pleitear a repactuação até o momento imediatamente anterior ao da prorrogação, entendo ser prudente, para evitar qualquer questionamento na seara judicial, que haja expressa previsão editalícia e contratual prevendo que a repactuação, com efeitos retroativos, quando originada de majoração salarial deve ser obrigatoriamente pleiteada até a data anterior da eventual prorrogação contratual.
Por conseqüência, acaso o direito a repactuação não seja exercido até a data da assinatura da prorrogação contratual subseqüente, o contratado não mais fará jus à repactuação.
Tem-se, portanto, que em regra nos contratos de escopo o reajuste em sentido estrito também deve prescindir de pedido do contratado, devendo a Administração concedê-lo ex offcio, por não representar a recomposição uma alteração contratual e por expressar a preservação da equação econômico-financeira dos contratos administrativos.
A formalização de termo aditivo de prorrogação contratual, seja nos contratos de serviços contínuos, seja nos contratos de escopo, não importa em regra e per si a preclusão lógica ou a renúncia tácita do reajuste em sentido estrito, sem prejuízo da possibilidade de renúncia expressa ou explícita, a ser inequivocamente manifestada pelo contratada ou expressa no termo aditivo. A inexistência em regra da preclusão lógica do reajuste em sentido estrito nos contratos de escopo não importa, pois, a impossibilidade jurídica de renúncia parcial ou integral desse direito pelo contratado, apenas é conclusão que se extrai da natureza jurídica dessa espécie de reajustamento, dos preceitos da lealdade e da boa-fé, bem como exegese que se extrai a partir da compreensão de que a prorrogação do contrato de escopo não enseja a renovação da execução de serviços continuados, implicando aditamento necessário para a conclusão do objeto mediante fixação do cronograma para sua execução.
Portanto, a despeito da distinta natureza dos contratos de prestação de serviço continuado e de escopo, observa-se que, em tese, considerando que o reajuste em sentido estrito encerra direito patrimonial disponível, é juridicamente possível que a Administração estipule uma renúncia tácita também nos contratos de escopo, a exemplo do que se admitiu no item VI da ementa do Parecer n. 79/2019/DECOR/CGU/AGU.
Ou seja, mesmo considerando que em princípio a mera prorrogação do prazo de vigência de um contrato de escopo não representa per si medida incompatível com a superveniente promoção do reajuste em sentido estrito, não se mostra contrário à ordem jurídica que a Administração em determinadas hipóteses, a exemplo do que se entende nos contratos de prestação de serviços contínuos, condicione o reajuste à solicitação do contrato, e que nestes casos seja admissível a preclusão lógica ou a renúncia tácita do reajustamento, desde que haja expressa previsão no edital ou no contrato de cláusula neste sentido, a exemplo do que se exige para fins de caracterização da preclusão da repactuação.
Conforme se extrai de atenta leitura do Parecer JT-02, mesmo nas hipóteses de repactuação de contratos de prestação de serviços com dedicação exclusiva de mão de obra, eventual preclusão lógica do direito ao reajuste da contratada em razão da celebração de aditamento de prorrogação do contrato não prescinde de expressa disposição editalícia ou contratual no sentido de que a renúncia se dará nesta específica circunstância.
Considerando que as renúncias devem ser interpretadas estritamente, segue firme, vigente e conforme o Direito a recomendação disposta no Parecer JT-02 no sentido de que, para evitar discussões administrativas ou demandas judiciais, a preclusão lógica da repactuação em caso de celebração de aditamento de prorrogação de vigência de contratos de prestação de serviços continuados com dedicação exclusiva de mão de obra não prescinde de expressa cláusula editalícia ou contratual que caracterize este específico cenário fático-jurídico como renúncia tácita (ou preclusão lógica).
É se recomendar, pois, que nos contratos de escopo e nos contratos de prestação de serviços continuados eventual preclusão lógica do reajuste em sentido estrito também se condicione a uma prévia e expressa disposição editalícia ou contratual que, além de demandar pedido do contratado de reajuste, também considere como preclusão lógica a celebração de aditamento contratual sem sua concessão, ou ao menos uma expressa ressalva da oportuna avaliação por parte da Administração.
Por conseguinte, seja nas hipóteses de contrato de escopo, seja nas hipóteses de prestação de serviços de natureza continuada, eventual preclusão lógica do reajuste em sentido estrito não prescinde de expressa previsão editalícia ou contratual que caracterize a ausência de tempestivo pedido de reajuste e a celebração de termo aditivo de prorrogação contratual como circunstâncias que ensejam a renúncia tácita do reajustamento em sentido estrito. Considerando que o reajuste em sentido estrito é um direito patrimonial disponível, que as renúncias se interpretam estritamente (art. 114 do Código Civil), que os preceitos de direito privado se aplicam supletivamente aos contratos administrativos, que os contratos administrativos devem dispor com clareza e precisão sobre os deveres, obrigações e responsabilidades das partes (§ 2º do art. 89 da Lei n. 14.133, de 2021, § 1º do art. 54 da Lei n. 8.666, de 1993), a renúncia tácita do reajuste em sentido estrito não prescinde de disciplina no edital ou contrato para fins de sua caracterização.
Cumpre consignar que as conclusões ora lançadas aplicam-se para as contratações públicas regidas pela Lei n. 8.666, de 1993, e pela Lei n. 14.133, de 2021, visto que em ambos os regimes o reajustamento em sentido estrito expressa a manutenção da equação econômico-financeira dos contratos administrativos mediante correção monetária dos preços pactuados, e que em ambos o reajustamento também não se caracteriza como alteração contratual, sendo viabilizado por meio de apostilamento, encerrando direito patrimonial disponível do contratado, passível, pois, de renúncia, expressa ou tácita.
Na forma da Lei n. 8.666, de 1993, o critério de reajuste, que retrate a efetiva variação dos custos de produção, deve ser previsto no edital e no contrato, podendo ser promovido por mero apostilamento por não ser alteração unilateral ou bilateral do contrato, mas uma mera providência naturalmente decorrente do seu devido cumprimento:
Art. 40. O edital conterá no preâmbulo o número de ordem em série anual, o nome da repartição interessada e de seu setor, a modalidade, o regime de execução e o tipo da licitação, a menção de que será regida por esta Lei, o local, dia e hora para recebimento da documentação e proposta, bem como para início da abertura dos envelopes, e indicará, obrigatoriamente, o seguinte:
...
XI - critério de reajuste, que deverá retratar a variação efetiva do custo de produção, admitida a adoção de índices específicos ou setoriais, desde a data prevista para apresentação da proposta, ou do orçamento a que essa proposta se referir, até a data do adimplemento de cada parcela;
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Art. 55. São cláusulas necessárias em todo contrato as que estabeleçam:
...
III - o preço e as condições de pagamento, os critérios, data-base e periodicidade do reajustamento de preços, os critérios de atualização monetária entre a data do adimplemento das obrigações e a do efetivo pagamento;
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Art. 65. Os contratos regidos por esta Lei poderão ser alterados, com as devidas justificativas, nos seguintes casos:
...
§ 8o A variação do valor contratual para fazer face ao reajuste de preços previsto no próprio contrato, as atualizações, compensações ou penalizações financeiras decorrentes das condições de pagamento nele previstas, bem como o empenho de dotações orçamentárias suplementares até o limite do seu valor corrigido, não caracterizam alteração do mesmo, podendo ser registrados por simples apostila, dispensando a celebração de aditamento.
Destaque-se, outrossim, que na forma da Lei n. 8.666, de 1993, aplicável supletivamente aos editais e contratos regidos pela Lei n. 10.520, de 2002, os aditamentos de prorrogação de prazo de vigência devem ser precedidos de justificativa, sendo vedada a vigência indeterminada. Relevante consignar, outrossim, que as hipóteses de prorrogação de vigência de que cuida o § 1o do seu art. 57, que se relacionam aos contratos de escopo, expressamente convergem para a manutenção da equação econômico-financeira dos contratos, o que corrobora que eventual preclusão tácita do reajuste em sentido estrito nessas hipóteses de prorrogação não deve ser a regra, nem tampouco pode prescindir de explícita previsão editalícia ou contratual:
Art. 57. A duração dos contratos regidos por esta Lei ficará adstrita à vigência dos respectivos créditos orçamentários, exceto quanto aos relativos:
I - aos projetos cujos produtos estejam contemplados nas metas estabelecidas no Plano Plurianual, os quais poderão ser prorrogados se houver interesse da Administração e desde que isso tenha sido previsto no ato convocatório;
II - à prestação de serviços a serem executados de forma contínua, que poderão ter a sua duração prorrogada por iguais e sucessivos períodos com vistas à obtenção de preços e condições mais vantajosas para a administração, limitada a sessenta meses;
...
§ 1º Os prazos de início de etapas de execução, de conclusão e de entrega admitem prorrogação, mantidas as demais cláusulas do contrato e assegurada a manutenção de seu equilíbrio econômico-financeiro, desde que ocorra algum dos seguintes motivos, devidamente autuados em processo:
I - alteração do projeto ou especificações, pela Administração;
II - superveniência de fato excepcional ou imprevisível, estranho à vontade das partes, que altere fundamentalmente as condições de execução do contrato;
III - interrupção da execução do contrato ou diminuição do ritmo de trabalho por ordem e no interesse da Administração;
IV - aumento das quantidades inicialmente previstas no contrato, nos limites permitidos por esta Lei;
V - impedimento de execução do contrato por fato ou ato de terceiro reconhecido pela Administração em documento contemporâneo à sua ocorrência;
VI - omissão ou atraso de providências a cargo da Administração, inclusive quanto aos pagamentos previstos de que resulte, diretamente, impedimento ou retardamento na execução do contrato, sem prejuízo das sanções legais aplicáveis aos responsáveis.
§ 2º Toda prorrogação de prazo deverá ser justificada por escrito e previamente autorizada pela autoridade competente para celebrar o contrato.
§ 3º É vedado o contrato com prazo de vigência indeterminado.
No regime jurídico dos contratos administrativos regidos pela Lei nº 14.133, de 2021, observa-se que, sobre este especialíssimo aspecto objeto desse Parecer, não há disposições substancialmente distintas em relação aos comandos da Lei n. 8.666, de 1993.
A Lei nº 14.133, de 2021, prevê expressamente o conceito de reajustamento em sentido estrito no inciso LVIII do seu art. 6º, o qual não difere materialmente do reajuste de que cuida o inciso XI do art. 40 da Lei nº 8.666, de 1993. É confirmado, outrossim, o caráter patrimonial e disponível do reajustamento, por ser admitida a resolução de conflitos sobre a matéria por meio de conciliação ou outras formas alternativas de prevenção de controvérsias:
Art. 6º Para os fins desta Lei, consideram-se:
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LVIII - reajustamento em sentido estrito: forma de manutenção do equilíbrio econômico-financeiro de contrato consistente na aplicação do índice de correção monetária previsto no contrato, que deve retratar a variação efetiva do custo de produção, admitida a adoção de índices específicos ou setoriais;
...
Art. 25. O edital deverá conter o objeto da licitação e as regras relativas à convocação, ao julgamento, à habilitação, aos recursos e às penalidades da licitação, à fiscalização e à gestão do contrato, à entrega do objeto e às condições de pagamento.
...
§ 7º Independentemente do prazo de duração do contrato, será obrigatória a previsão no edital de índice de reajustamento de preço, com data-base vinculada à data do orçamento estimado e com a possibilidade de ser estabelecido mais de um índice específico ou setorial, em conformidade com a realidade de mercado dos respectivos insumos.
§ 8º Nas licitações de serviços contínuos, observado o interregno mínimo de 1 (um) ano, o critério de reajustamento será por:
I - reajustamento em sentido estrito, quando não houver regime de dedicação exclusiva de mão de obra ou predominância de mão de obra, mediante previsão de índices específicos ou setoriais;
II - repactuação, quando houver regime de dedicação exclusiva de mão de obra ou predominância de mão de obra, mediante demonstração analítica da variação dos custos.
...
Art. 92. São necessárias em todo contrato cláusulas que estabeleçam:
...
V - o preço e as condições de pagamento, os critérios, a data-base e a periodicidade do reajustamento de preços e os critérios de atualização monetária entre a data do adimplemento das obrigações e a do efetivo pagamento;
...
§ 3º Independentemente do prazo de duração, o contrato deverá conter cláusula que estabeleça o índice de reajustamento de preço, com data-base vinculada à data do orçamento estimado, e poderá ser estabelecido mais de um índice específico ou setorial, em conformidade com a realidade de mercado dos respectivos insumos.
§ 4º Nos contratos de serviços contínuos, observado o interregno mínimo de 1 (um) ano, o critério de reajustamento de preços será por:
I - reajustamento em sentido estrito, quando não houver regime de dedicação exclusiva de mão de obra ou predominância de mão de obra, mediante previsão de índices específicos ou setoriais;
II - repactuação, quando houver regime de dedicação exclusiva de mão de obra ou predominância de mão de obra, mediante demonstração analítica da variação dos custos.
...
Art. 136. Registros que não caracterizam alteração do contrato podem ser realizados por simples apostila, dispensada a celebração de termo aditivo, como nas seguintes situações:
I - variação do valor contratual para fazer face ao reajuste ou à repactuação de preços previstos no próprio contrato;
...
Art. 151. Nas contratações regidas por esta Lei, poderão ser utilizados meios alternativos de prevenção e resolução de controvérsias, notadamente a conciliação, a mediação, o comitê de resolução de disputas e a arbitragem.
Parágrafo único. Será aplicado o disposto no caput deste artigo às controvérsias relacionadas a direitos patrimoniais disponíveis, como as questões relacionadas ao restabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro do contrato, ao inadimplemento de obrigações contratuais por quaisquer das partes e ao cálculo de indenizações.
Destaque-se que a Lei nº 8.666, de 1993, não estabeleceu expressamente a possibilidade jurídica a renúncia tácita ou preclusão lógica da repactuação nos contratos de prestação de serviços de natureza continuada com dedicação exclusiva de mão de obra, e isso não impediu sua aplicação pelo Parecer JT-02, uma vez que a renúncia no caso decorre da prática de ato incompatível com o reajuste, e diante da incidência supletiva das disposições de direito privado (art. 54 da Lei n. 8.666, de 1993, combinado com art. 114 do Código Civil) no âmbito dos contratos administrativos.
A mesma compreensão se dá no âmbito da Lei nº 14.133, de 2021, que se refere expressamente apenas à possibilidade de renúncia tácita de reequilíbrio econômico-finaceiro dos contratos administrativos de serviços continuados, não obstante, essa previsão não obsta que se evidencie a renúncia, expressa ou tácita, do reajustamento em sentido estrito, seja nos contratos de escopo, seja nos serviços continuados, diante da aplicação supletiva das normas de direito privado (art. 89 da Lei n. 14.133, de 2021) aos contratos administrativos, desde que observadas as premissas do Parecer n. 79/2019/DECOR/CGU/AGU e haja expressa previsão no edital ou contrato nesse sentido:
Art. 107. Os contratos de serviços e fornecimentos contínuos poderão ser prorrogados sucessivamente, respeitada a vigência máxima decenal, desde que haja previsão em edital e que a autoridade competente ateste que as condições e os preços permanecem vantajosos para a Administração, permitida a negociação com o contratado ou a extinção contratual sem ônus para qualquer das partes.
...
Art. 131. A extinção do contrato não configurará óbice para o reconhecimento do desequilíbrio econômico-financeiro, hipótese em que será concedida indenização por meio de termo indenizatório.
Parágrafo único. O pedido de restabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro deverá ser formulado durante a vigência do contrato e antes de ventual prorrogação nos termos do art. 107 desta Lei.
Não se olvide, outrossim, que a Lei n. 14.133, de 2021, nos casos em que for elaborada a matriz de riscos, na forma do seu art. 103, admite a possibilidade jurídica de renúncia do restabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro, nos termos em que especifica seus §§ 4º e 5º. Portanto, como a nova lei de licitações admitiu a renúncia do equilíbrio da equação econômico-financeira dos contratos em razão de álea extraordinária, merece prevalecer o entendimento no sentido de que suas disposições não impedem a renúncia tácita da equação da álea ordinária.
Lei nº 14.133, de 2021
Art. 6º (...)
...
XXVII - matriz de riscos: cláusula contratual definidora de riscos e de responsabilidades entre as partes e caracterizadora do equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato, em termos de ônus financeiro decorrente de eventos supervenientes à contratação, contendo, no mínimo, as seguintes informações:
a) listagem de possíveis eventos supervenientes à assinatura do contrato que possam causar impacto em seu equilíbrio econômico-financeiro e previsão de eventual necessidade de prolação de termo aditivo por ocasião de sua ocorrência;
b) no caso de obrigações de resultado, estabelecimento das frações do objeto com relação às quais haverá liberdade para os contratados inovarem em soluções metodológicas ou tecnológicas, em termos de modificação das soluções previamente delineadas no anteprojeto ou no projeto básico;
c) no caso de obrigações de meio, estabelecimento preciso das frações do objeto com relação às quais não haverá liberdade para os contratados inovarem em soluções metodológicas ou tecnológicas, devendo haver obrigação de aderência entre a execução e a solução predefinida no anteprojeto ou no projeto básico, consideradas as características do regime de execução no caso de obras e serviços de engenharia;
...
Art. 103. O contrato poderá identificar os riscos contratuais previstos e presumíveis e prever matriz de alocação de riscos, alocando-os entre contratante e contratado, mediante indicação daqueles a serem assumidos pelo setor público ou pelo setor privado ou daqueles a serem compartilhados.
...
§ 4º A matriz de alocação de riscos definirá o equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato em relação a eventos supervenientes e deverá ser observada na solução de eventuais pleitos das partes.
§ 5º Sempre que atendidas as condições do contrato e da matriz de alocação de riscos, será considerado mantido o equilíbrio econômico-financeiro, renunciando as partes aos pedidos de restabelecimento do equilíbrio relacionados aos riscos assumidos, exceto no que se refere:
I - às alterações unilaterais determinadas pela Administração, nas hipóteses do inciso I do caput do art. 124 desta Lei;
II - ao aumento ou à redução, por legislação superveniente, dos tributos diretamente pagos pelo contratado em decorrência do contrato.
Nestes termos, as conclusões do Parecer n. 79/2019/DECOR/CGU/AGU aplicam-se aos contratos de prestação de serviços continuados e aos contratos de escopo, regidos pela Lei n. 8.666, de 1993, e Lei n. 10.520, de 2002, como também para aqueles regidos pela Lei n. 14.133, de 2021, uma vez que em ambas as hipóteses o reajustamento em sentido estrito deve em regra ser concedido ex officio pela Administração, e não está (também em regra) sujeito à preclusão lógica diante da celebração de um aditamento de vigência, uma vez que o reajustamento expressa o mandamento constitucional da preservação da equação econômico-financeira dos contratos administrativos e sua concessão não representa per si uma alteração contratual, formalizando-se por mero apostilamento.
Não obstante, é em tese juridicamente possível caracterizar-se a preclusão lógica do reajuste em sentido estrito nos contratos de prestação de serviços contínuos e nos contratos de escopo, no regime jurídico da Lei n. 8.666, de 1993, e da Lei n. 14.133, de 2021, desde que cumulativamente: a) o edital expressamente condicione o reajustamento à solicitação do contratado; b) o contratado não solicite o reajuste antes da formalização do aditamento de vigência; c) haja celebração de termo aditivo de prorrogação contratual sem qualquer ressalva quanto aos preços contratados ou previsão de avaliação oportuna acerca de pedido de reajuste; e d) na esteira do Parecer JT-02 (DOU 06.03.2009), o edital ou contrato expressamente preveja que haverá renúncia do reajuste em sentido estrito nessas hipóteses em que haja formalização de aditamento de prazo de vigência sem prévia solicitação de reajustamento ou ressalva de sua ulterior análise pela Administração no termo.
Como bem colacionado pela E-CJU/ENGENHARIA, há que se fazer uma ressalva especial em relação a um particular aspecto que se aplica apenas ao regime jurídico da Lei n. 14.133, de 2021, e decorre do seu art. 111, o qual delimita uma hipótese de prorrogação automática do prazo de vigência dos contratos de escopo, que se dá ex lege e ao fim do prazo de vigência inicialmente estabelecido, caso o escopo pactuado não tenha sido concluído:
Art. 111. Na contratação que previr a conclusão de escopo predefinido, o prazo de vigência será automaticamente prorrogado quando seu objeto não for concluído no período firmado no contrato.
Parágrafo único. Quando a não conclusão decorrer de culpa do contratado:
I - o contratado será constituído em mora, aplicáveis a ele as respectivas sanções administrativas;
II - a Administração poderá optar pela extinção do contrato e, nesse caso, adotará as medidas admitidas em lei para a continuidade da execução contratual.
Nesses casos a prorrogação automática não pode se caracterizar como uma renúncia tática do direito ao reajuste em sentido estrito, pois como a prorrogação se efetivou ex lege e automaticamente, na prorrogação não há propriamente um ato do contratado, muito menos um ato incompatível com o superveniente exercício do direito ao reajuste em sentido estrito. Por conseguinte, a hipótese excepcional em que se admite a preclusão lógica do reajuste em sentido estrito, no âmbito da Lei n. 14.133, de 2021, ocorre nos casos em que são efetivamente celebrados aditamentos, antes do termo final do prazo de vigência previsto no contrato.
Por fim, duas derradeiras considerações devem ser consignadas.
Deve prevalecer o entendimento da E-CJU/ENGENHARIA, posto no r. Parecer n. 20/2021/COORD/E-CJU/ENGENHARIA/CGU/AGU – seq. 4, no sentido de que a “utilização do instituto do reequilíbrio econômico-financeiro (revisão contratual) é situação excepcional que somente deve ser efetivada após o insucesso da aplicação dos critérios de reajuste do contrato na manutenção do equilíbrio entre os encargos assumidos pela contratada e a contraprestação devida”.
Ao contrário do que fora aduzido pela douta Procuradoria-Geral Federal, referenciadas orientações da E-CJU/ENGENHARIA partem da inconteste e acertada premissa de que os fundamentos jurídicos do reajuste em sentido estrito (álea ordinária) e do pedido de revisão dos contratos (álea extraordinária) são distintos, e que neste último, por ensejar alteração do contrato, não podem ser incluídas e devem necessariamente ser expurgadas as variações decorrentes da elevação ordinária dos custos de produção calculada pela aplicação do índice contratado.
O entendimento da E-CJU/ENGENHARIA, pois, tem o pragmático mérito de destacar para a Administração e para o particular contratado que as variações de preço decorrentes da álea ordinária não podem ser incluídas nos pedidos de revisão dos contratos, assim, nestes casos de pedido de revisão, se houver reajuste em sentido estrito pendente de solicitação ou concessão, deve a Administração realiza-lo, inclusive ex officio se assim admitir o edital ou o contrato, de maneira a possibilitar que, pragmaticamente (reitere-se), seja possível delimitar com precisão a variação decorrente da álea ordinária, e assim avaliar com segurança técnica a procedência ou não, ou em que medida, do pedido de revisão por álea extracontratual.
Neste especial aspecto, merece ser adotado e reproduzido os seguintes e elucidativos trechos do r. Parecer n. 20/2021/COORD/E-CJU/ENGENHARIA/CGU/AGU – seq. 4:
2.14 Aplicação das regras de reajustes como condição prévia à concessão do reequilíbrio
104. A partir das premissas já apresentadas, conclui-se ser indispensável a aplicação das regras contratuais de reajuste como condição prévia para a análise do pedido de reequilíbrio econômico-financeiro sempre que existentes as condições próprias para sua concessão, nos termos do marco inicial previsto pelo art. 3º da Lei n. 10.192, de 2001.
105. Considerando-se que as regras de reajuste contratual destinam-se a manter o equilíbrio econômico do contrato por meio da aplicação periódica de índices setoriais que acompanham a evolução geral dos preços pertinentes ao ramo contratado e que, salvo disposição contratual em contrário, a aplicação dos índices de correção deve ser automática[46], extrai-se a ilação de que a revisão contratual, sendo um meio extraordinário destinado a restabelecer o equilíbrio perdido, somente pode ocorrer após o esgotamento dos meios ordinários de manutenção do equilíbrio existente.
106. Daí porque não é possível reconhecer eventual desequilíbrio sem antes serem aplicadas as regras destinadas a manter a equação econômico-financeira do contrato.
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109. Portanto, ainda que o contrato demande a solicitação do reajuste por parte da contratada, o reequilíbrio dependerá da solução prévia das pendências relacionadas aos eventuais reajustes devidos. A empresa que tenha solicitado a revisão contratual por desequilíbrio econômico-financeiro, mas que tenha se mantido inerte em relação aos pedidos de reajuste, quando condicionados à solicitação da contratada, deverá ser orientada a pleitear, em primeiro lugar, os índices de reajuste previstos no contrato que ainda não tenham sido aplicados para, em seguida, examinar se ainda persistem os motivos ensejadores do primeiro pedido de revisão.
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2. 18 Procedimentos
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133. Previamente à análise de eventual pedido de reequilíbrio econômico-financeiro, a empresa contratada deve ser orientada a solicitar eventuais reajustes a que fizer jus, com base nas próprias regras contratuais, caso os reajustes não tenham sido concedidos nas épocas próprias, vez que "reajuste e a recomposição possuem fundamentos distintos" [60].
134. Depois, é necessário que a contratada aponte onde houve o descompasso das regras de reajuste com a realidade econômica, indicando os itens e quantitativos da planilha que pretende sejam revisados[61], com os motivos econômicos que levaram ao desequilíbrio, valendo-se da trajetória de preços das tabelas referenciais utilizadas na licitação (SINAPI, ORSE, etc.) em comparação com a trajetória esperada no momento da apresentação das propostas.
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Parece, pois, ser pragmaticamente acertada e razoável que prevaleça o entendimento no sentido de que, em sede de pedido de revisão contratual, a Administração deve previamente avaliar se no caso concreto incide ou resta pendente a concessão de reajuste em sentido estrito, o que possibilitará a escorreita identificação das variações ordinárias de preço que são cabíveis em razão da aplicação do índice de correção contratado, e assim permitirá segura apreciação técnica do pedido de revisão por álea extraordinária, o qual, se for procedente, não compreenderá as variações cobertas pela mera aplicação do índice de reajuste contratado, ou apenas poderá alcançar as variações de preços que porventura excedam aquelas decorrentes da álea ordinária.
Por fim, nas estritas e excepcionais hipóteses em que reste caracterizada a renúncia tácita ao direito de reajuste em sentido estrito nos contratos de escopo, eventual pedido de revisão apresentado pela contratada não poderá envolver ou alcançar o reajustamento, aplicando-se neste especial aspecto o entendimento da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, extraído do trecho do Parecer SEI nº 18982/2021/ME – seq. 8 que segue abaixo reproduzido, ou seja, nessa remotíssima hipótese deve a Administração calcular reajuste contratual que não foi solicitado pelo contratado (e não promovê-lo), apenas para fins de exame do pedido de revisão contratual e, nos casos em que seja procedente o pedido de revisão contratual, a solução jurídica mais adequada é subtrair, ao final, dos preços contratuais revisados, o valor do reajuste que foi objeto da preclusão lógica:
24. Desse modo, soaria contraditório não admitir a preclusão lógica no direito de reajuste, quando contrato de escopo exige pedido formal do contratado, e admiti-la, por outro lado, no direito de reequilíbrio econômico-financeiro, se ambos os institutos tratam, em essência, de direitos patrimoniais disponíveis.
25. Ademais, é preciso rememorar: no Parecer n. 079/2019/DECOR/CGU/AGU, o Departamento de Coordenação e Orientação de Órgãos Jurídicos, da Consultoria-Geral da União, assentou o entendimento de que, em regra, a Administração Pública deve aplicar, de ofício, o índice financeiro estabelecido contratualmente para reajustar o seu preço e reequilibrar sua equação econômico-financeira, não havendo preclusão lógica do direito de reajuste (álea ordinária). Assim, a exceção prevista no item VI da Ementa do referido parecer trata de uma situação específica, qual seja, quando contrato exige requerimento formal do contratado para obtenção do reajuste contratual, e o contratado, transcorrido o período para o reajuste, não requer a sua concessão e concorda em prorrogar a vigência contratual por mais um período, mantidas as demais condições inicialmente pactuadas.
26. Assim, trata-se de uma situação específica, que prestigia o princípio da vinculação às regras estabelecidas no certame.
27. E caso haja eventual pedido de reequilíbrio econômico-financeiro do contrato (revisão), entende-se que tal pedido não tem o condão de afastar a aplicabilidade do Item VI da Ementa do Parecer n. 079/2019/DECOR/CGU/AGU. Neste caso, poderia a Administração efetuar o cálculo do reajuste contratual que não foi solicitado pelo contratado (sem concedê-lo), apenas como base para análise do pedido de revisão contratual. E caso seja procedente o pedido de revisão contratual, afigura-se como solução mais adequada subtrair, ao final, dos preços contratuais revisados, o valor do reajuste que foi objeto de preclusão lógica. Assim, viabiliza-se a análise do pleito de revisão, com base nos preços reajustados, sem a necessidade de conceder ao contratado o efetivo reajuste, mantendo-se assim a premissa adotada no item VI da Ementa do Parecer n. 079/2019/DECOR/CGU/AGU, no sentido de que, sendo o direito de reajuste de preços de natureza patrimonial disponível, torna-se possível a renúncia pelo contratado, caso o contrato exija requerimento de reajuste pelo contratado e este deixe de fazê-lo no tempo devido, concordando com a prorrogação da vigência contratual, mantendo as condições pactuadas.
Nestes termos, como o reajuste em sentido estrito concretiza o comando constitucional da equivalência da equação econômico-financeira dos contratos administrativos, deve em regra ser promovido ex officio, independentemente de solicitação do particular contratado, mediante aplicação do índice previsto no edital, e sendo a renúncia interpretada estritamente, não há, em regra, preclusão lógica do reajuste em sentido estrito em razão de aditamentos de vigência, seja nos contratos de escopo, seja nos contratos de prestação de serviços continuados, uma vez que não representam per si ato incompatível com a superveniente concessão do reajustamento.
Por caracterizar-se o reajuste em sentido estrito como direito patrimonial de caráter disponível, e considerando que as renúncias se interpretam estritamente (art. 114 do Código Civil), que os preceitos de direito privado se aplicam supletivamente aos contratos administrativos, que os contratos administrativos devem dispor com clareza e precisão sobre os deveres, obrigações e responsabilidades das partes (§ 2º do art. 89 da Lei n. 14.133, de 2021, § 1º do art. 54 da Lei n. 8.666, de 1993), conclui-se que a plena segurança jurídica das partes recomenda que a caracterização da renúncia tácita ao reajuste em sentido estrito nos contratos de escopo e nos contratos de serviços continuados demanda expressa previsão no edital ou contrato (assim como se dá na repactuação – Parecer JT-02), seja qual for o regime jurídico aplicável ao caso concreto - Lei n. 8.666, de 1993, ou Lei n. 14.133, de 2021.
Conclusões
Isto posto, no regular exercício das atribuições regulamentares relacionadas à uniformização da jurisprudência administrativa conferidas pelo art. 10, inciso V, do Anexo I do Decreto nº 11.174, de 2022, e pelo art. 9º da Portaria Normativa AGU n. 24, de 2021, recomenda-se que seja consolidados, no âmbito da Advocacia-Geral da União, o entendimento no sentido de que:
a) considerando a vedação legal para adoção de um regime jurídico híbrido, consubstanciado na combinação de disposições da Lei nº 14.133, de 2021, com a Lei nº 8.666, de 1993, a Lei nº 10.520, de 2002, e com os arts. 1º a 47-A da Lei nº 12.462, de 2011, recomenda-se que os órgãos jurídicos sejam ciosos quanto ao disposto no art. 191 da Lei n. 14.133, de 2021, de maneira a não restar dúvidas para os gestores públicos a respeito da legislação de regência dos editais e contratos administrativos que foram submetidos à análise e acerca dos fundamentos e artigos legais que são efetivamente aplicáveis e regem o caso concreto, não havendo, evidentemente, empecilho para que nas razões da manifestação sejam realizadas referências a disposições homólogas que cuidam do tema no âmbito da legislação que não incide sobre o edital ou contrato que é objeto da consulta, desde que para fins estritamente hermenêuticos;
b) a preservação da equivalência econômico-financeira dos contratos administrativos mediante promoção de reajuste em sentido estrito, por meio da aplicação de índice que reflita efetivamente as variações dos custos do mercado, não representa uma modificação contratual e sua concessão ex officio pela Administração deve ser a regra, independentemente da natureza do objeto, incluindo serviços continuados e contratos de escopo, por ser medida que satisfaz o interesse público, cumpre mandamento constitucional do inciso XXI do art. 37 da Carta, é expressão da lealdade de da boa-fé, e tem potencial para reduzir os riscos e inseguranças nas contratações públicas, concorrendo para a redução dos preços e para a contratação de propostas mais vantajosas para a Administração;
c) a preclusão lógica caracteriza-se como a renúncia tácita a um direito em razão da prática de ato incompatível ou inconciliável com seu regular exercício;
d) as renúncias devem ser interpretadas estritamente, nos termos do art. 114 do Código Civil, o que se aplica aos contratos administrativos, na forma do que dispõe o § 2º do art. 89 da Lei n. 14.133, de 2021, e o § 1º do art. 54 da Lei n. 8.666, de 1993, que determinam que aos contratos administrativos se aplicam supletivamente as disposições de direito privado, e que as suas cláusulas devem definir, com clareza e precisão, os direitos, obrigações e responsabilidades das partes;
e) a renúncia pode também se dar expressamente, ou seja, entender que o reajuste em sentido estrito está ou não sujeito à preclusão lógica sob determinadas circunstâncias que são próprias de cada caso concreto não importa abolir a possibilidade jurídica de sua abdicação de forma expressa pelo contratado, o que se recomenda seja clara e precisamente previsto no aditamento, em atenção ao art. 114 do Código Civil, ao § 2º do art. 89 da Lei n. 14.133, de 2021, ou ao § 1º do art. 54 e § 1º do art. 57 da Lei n. 8.666, de 1993;
f) Nos contratos administrativos de prestação de serviços contínuos, a celebração de termo aditivo para renovação das obrigações pactuadas por um período subsequente não representa per si e em regra medida logicamente incompatível com a ulterior concessão do reajuste em sentido estrito dos preços pactuados, uma vez que o reajuste consubstancia mera expressão da preservação da equação econômico-financeira dos contratos administrativos mediante correção monetária que retrate a variação efetiva dos custos de produção;
g) Nos contratos administrativos de escopo, reputa-se igualmente que em regra também não se caracteriza a renúncia tácita do direito de reajuste em sentido estrito em decorrência da celebração de aditamento de prazo de vigência para a prorrogação do cronograma de execução do objeto, uma vez que nessa hipótese a dilação contratual importa medida necessária para a própria conclusão do objeto pactuado, não representando per si e em regra ato inconciliável com superveniente concessão do reajuste em sentido estrito dos preços pactuados.
h) por caracterizar-se o reajuste em sentido estrito como direito de ordem patrimonial, com caráter disponível, não há óbice jurídico para que, em tese, seja consumada a renúncia tácita ou a preclusão lógica do seu exercício nos contratos continuados e nos contratos de escopo, desde que cumulativamente: (a) o edital ou contrato preveja expressamente que a concessão do reajuste resta condicionada à solicitação do contratado; (b) que não haja solicitação do reajuste antes da celebração do aditamento; (c) seja celebrado aditamento para a prorrogação do prazo de vigência do contrato sem qualquer ressalva quanto à ulterior análise do reajuste pela Administração e (d) o edital expressamente preveja que a formalização do aditamento sem a concessão do reajuste, ou ressalva de sua superveniente análise, será considerada como renúncia ou preclusão lógica do direito;
i) considerando que o reajuste em sentido estrito é um direito patrimonial disponível, que as renúncias se interpretam estritamente (art. 114 do Código Civil), que os preceitos de direito privado se aplicam supletivamente aos contratos administrativos, que os contratos administrativos devem dispor com clareza e precisão sobre os deveres, obrigações e responsabilidades das partes (§ 2º do art. 89 da Lei n. 14.133, de 2021, § 1º do art. 54 da Lei n. 8.666, de 1993), a renúncia tácita do reajuste em sentido estrito não prescinde de disciplina no edital ou contrato para fins de sua caracterização.
j) as conclusões lançadas aplicam-se para as contratações públicas regidas pela Lei n. 8.666, de 1993, e pela Lei n. 14.133, de 2021, visto que em ambas o reajustamento em sentido estrito expressa a manutenção da equação econômico-financeira dos contratos administrativos mediante correção monetária dos preços pactuados, em ambas o reajustamento não se caracteriza como alteração contratual, sendo viabilizado por mero de apostilamento, e encerra direito patrimonial de caráter disponível do contratado, passível, pois, de renúncia, expressa ou tácita;
k) no regime jurídico da Lei n. 14.133, de 2021, e em razão do disposto no seu art. 111, que delimita uma hipótese de prorrogação automática do prazo de vigência dos contratos de escopo, que se dá ex lege e ao fim do prazo de vigência inicialmente estabelecido, não se caracteriza a renúncia tática do direito ao reajuste em sentido estrito, pois como a prorrogação se efetivou ex lege e automaticamente, não há na prorrogação propriamente um ato do contratado, muito menos um ato incompatível com o superveniente exercício do direito ao reajuste em sentido estrito, portanto a hipóteses excepcional em que se admite a preclusão lógica do reajuste nos contrato de escopo, no âmbito da Lei n. 14.133, de 2021, ocorre apenas nos casos em que são efetivamente celebrados aditamentos de prorrogação de vigência, antes do termo final do prazo de vigência previsto no contrato;
l) a “utilização do instituto do reequilíbrio econômico-financeiro (revisão contratual) é situação excepcional que somente deve ser efetivada após o insucesso da aplicação dos critérios de reajuste do contrato na manutenção do equilíbrio entre os encargos assumidos pela contratada e a contraprestação devida” - Parecer n. 20/2021/COORD/E-CJU/ENGENHARIA/CGU/AGU; e
m) nas estritas hipóteses em que reste caracterizada a renúncia tácita ao direito de reajuste em sentido estrito, eventual pedido de revisão apresentado pela contratada não poderá compreender o reajustamento, portanto nessa remotíssima hipótese deve a Administração calcular reajuste contratual que não foi solicitado pelo contratado (e não promovê-lo), apenas para fins de exame do pedido de revisão contratual e, nos casos em que seja procedente o pedido de revisão contratual, a solução jurídica mais adequada é subtrair, ao final, dos preços contratuais revisados, o valor correspondente ao reajuste que foi objeto de preclusão lógica.
Caso acolhido, recomenda-se (a) restituição dos autos para ciência da Consultoria Jurídica da União Especializada Virtual de Obras e Serviços de Engenharia; (b) promoção de ciência à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, à Procuradoria-Geral Federal, à Procuradoria-Geral do Banco Central do Brasil, às Consultorias Jurídicas junto aos Ministérios e órgãos assemelhados e às Consultorias Jurídicas da União nos Estados e no município de São José dos Campos; e (c) anotação deste Parecer e subsequentes Despachos junto ao Parecer n. 79/2019/DECOR/CGU/AGU no repositório de pesquisa de precedentes da Consultoria-Geral da União.
Brasília, 13 de janeiro de 2023.
VICTOR XIMENES NOGUEIRA
ADVOGADO DA UNIÃO
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