ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA DA UNIÃO ESPECIALIZADA VIRTUAL DE PATRIMÔNIO
NÚCLEO JURÍDICO

 

PARECER n. 00041/2023/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU

 

 

NUP: 67223.008578/2021-01

INTERESSADOS: UNIÃO - BASE AÉREA DE RECIFE - BARF

ASSUNTOS: ACORDO DE COOPERACAO TECNICA. CESSAO DE USO GRATUITA DE IMOVEL DA UNIAO ADMINISTRADO PELO COMANDO DA AERONAUTICA

 

 
 
EMENTA: PATRIMONIO IMOBILIARIO DA UNIAO. ACORDO DE COOPERACAO TECNICA. CESSAO DE USO GRATUITA DE IMOVEL DA UNIAO JURISDICIONADO AO COMANDO DA AERONAUTICA À ORGANIZAÇÃO DA SOCIEDADE CIVIL SEM FINS LUCRATIVOS.
 
 

RELATORIO

Trata-se de processo eletrônico oriundo da Base Aérea de Recife/Comando da Aeronáutica cujo objeto constitui a cessão de uso, a título gratuito, do imóvel caracterizado como parte do tombo PE.006-000, localizado à Av. Armindo Moura nº 500, Recife/PE, em favor da organização religiosa denominada União Espírita Caminho da Luz - UNILUZ.

 

Pelo que se retira do Oficio nº 001/2021 expedido pela UNIAO ESPIRITA CAMINHO DA LUZ – UNILUZ (documento juntado na Sequência 2 - Ofício 1, fl. 6, do sistema SAPIENS), a almejada cessão de uso gratuita já teria sido contemplada no Acordo de Cooperação Técnica nº 002/II COMAR/2016, firmado entre o Comando da Aeronáutica e a UNILUZ, com a finalidade de oferecer assistência religiosa e espiritual aos militares e servidores civil da Guarnição de Aeronáutica de Recife cuja vigência se projetava para 09/05/2021.

 

Com a proximidade do vencimento do aludido “Acordo de Cooperação”, como se depreende, a UNILUZ por meio do requerimento contido no Oficio nº 001/2021  da UNILUZ   propôs a ampliação da área de concessão,  bem como a definição do período de vigência  para mais 60 meses,  “como de praxe nos contratos anteriores”.

 

Os autos vieram a esta Consultoria Jurídica especializada, tendo sido emitida a NOTA n. 00130/2021/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU contendo os fundamentos jurídicos contrários à celebração do ajuste, reproduzidos na sequência:

 

"NOTA n. 00130/2021/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU
NUP: 67223.008578/2021-01
INTERESSADOS: UNIÃO - BASE AÉREA DE RECIFE - BARF
ASSUNTOS: LOCAÇÃO / PERMISSÃO / CONCESSÃO / AUTORIZAÇÃO / CESSÃO DE USO
Trata-se de opinativo de forma reduzido, em razão da simplicidade da matéria discutida.
Pretende o Comando da Base Aérea de Recife ceder, a título gratuito, parte do tombo PE.006-000, localizado à Av. Armindo Moura nº 500, Recife/PE, em favor da organização religiosa denominada União Espírita Caminho da Luz - UNILUZ.
A pretensão do órgão encontra óbices na legislação vigente e na instrução dos autos.
O princípio da impessoalidade, contido no caput do art. 37 da Constituição da República, aplica-se em todas as relações que a Administração Pública participa, em especial no trato com particulares. No caso em análise, não há qualquer justificativa exarada nos autos apta a excepcionar a aplicação do princípio, mas ainda assim o órgão não realizou processo isonômico (a exemplo do chamamento público) para selecionar o potencial beneficiário da cessão, pretendendo desde logo ceder o imóvel gratuitamente à UNILUZ.
A ausência de chamamento (ou outro procedimento congênere, que garanta a isonomia e ampla participação dos eventuais interessados) exclui outros potenciais beneficiários da possibilidade de fruírem da referida cessão gratuita, o que evidencia também violação ao princípio da publicidade - isto é, a oportunidade existe, mas não é divulgada pela Administração Pública.
A dispensa de licitação de fls. 57 se arrima no mero fato de a dispensa ser o meio mais célere e econômico para a concretização do ajuste. De fato, ela sempre é. Isto não implica no afastamento da regra licitatória (ou o legislador não teria criado as modalidades licitatórias juntamente com as hipóteses de dispensa de licitação), ou ao menos (como no caso em análise) de um procedimento isonômico que garanta a seleção justa do beneficiário da cessão. A justificativa é teratológica e, pois, ilegal. 
Não há ainda nos autos qualquer justificativa para a gratuidade da cessão. Conforme explica o laudo de avaliação (fls. 5 e seguintes), trata-se de imóvel acentuadamente valorizado (R$ 4.500.000,00, aproximadamente; valor de locação estimado em aproximadamente R$ 21.000,00) localizado no Bairro de Boa Viagem, em área vocacionada para a construção de empreendimentos multifamiliares de luxo, próximo à praia e à área nobre do Recife.
Veja-se que a cessão de uso gratuita só se opera em favor das seguintes entidades, previstas na Lei nº 9.636/98:
Art. 18. A critério do Poder Executivo poderão ser cedidos, gratuitamente ou em condições especiais, sob qualquer dos regimes previstos no Decreto-Lei no 9.760, de 1946, imóveis da União a:
 
I - Estados, Distrito Federal, Municípios e entidades sem fins lucrativos das áreas de educação, cultura, assistência social ou saúde; 
II - pessoas físicas ou jurídicas, em se tratando de interesse público ou social ou de aproveitamento econômico de interesse nacional.  
Eventual qualificação da entidade como "organização religiosa" (o que não pode ser confirmado nos autos, na medida em que a documentação referente à entidade não foi juntada) não garante sua atuação nas áreas de educação, cultura, assistência social ou saúde. Em verdade, tais atividades não são apresentadas pelo órgão como desenvolvidas pela entidade. Também não há interesse público, social ou de aproveitamento econômico de interesse nacional explicitado.
No item 2.1 do projeto básico, o órgão restringe-se a afirmar que a entidade prestará assistência religiosa aos civis e militares da força. O não enquadramento na hipótese legal, portanto, configura-se também como óbice à gratuidade da cessão.
Deve ainda o órgão atentar para a potencial ilegalidade que pode decorrer do emprego do imóvel entregue pela Secretaria do Patrimônio da União em atividade distinta daquela para a qual a entrega foi realizada. Os imóveis sob jurisdição das Forças Armadas apenas se encontram sob sua administração, não lhes pertencendo para deles dispor livremente, mas somente dentro dos limites fixados pela legislação - princípio da legalidade estrita.
Veja-se que à fl. 47 dos autos, na cláusula quarta do instrumento de entrega, item 'e', há alusão expressa ao art. 79, §2º, do Decreto-Lei nº 9.460/1946, bem como vedação à cessão do imóvel para execução de atividade distinta daquela para a qual foi entregue. O imóvel, na forma daquele mesmo documento, foi entregue para regularização imobiliária e instalação do 2º Comando Aéreo Regional.
Assim, em desejando, deve o órgão ponderar se a cessão pretendida configura uso em finalidade inadequada, ou alternativamente, justificar de que maneira a atividade desenvolvida pela organização religiosa se configuraria em uso regular da área, dentro das finalidades para as quais houve a entrega.
 Os erros mencionados na presente peça são graves e obstam o ajuste. Descabe aprovação condicional, em especial por conta da ausência de publicização da oportunidade de se tornar o cessionário gratuito do imóvel, ausência de procedimento isonômico para a seleção do beneficiário da cessão, ilegalidade da justificativa para dispensa licitatória e ausência de justificativa, bem como enquadramento legal, apto a legitimar a gratuidade da cessão pretendida.
Todo o exposto, na forma do art. 11, VI, 'b', da Lei Complementar nº 73/93, reprovo o ajuste.  
Ao órgão, como de praxe.
Manaus, Amazonas, 04 de outubro de 2021.
RAIMUNDO RÔMULO MONTE DA SILVA
Advogado da União
 

Agora,  os autos retornam a esta Especializada com novos documentos anexados como documento Ofício nº 1, da Sequência 7 do sistema SAPIENS, que são:

 

- fl. 3:  Portaria BARF Nº 148/SSCR, de 25 de agosto de 2022. Protocolo COMAER nº 67223.010598/2022-15;
 
- fls. 04 e seguintes: Edital de Chamamento Público nº 02/2022 - Cessão de Uso Gratuito, de parte de uma área da União, sob a responsabilidade patrimonial do Comando da Aeronáutica, referente à área D-9 do TOMBO PE 006-000,

 

 

FINALIDADE E ABRANGÊNCIA DO PARECER JURÍDICO

 

A presente manifestação jurídica tem o escopo de assistir a autoridade assessorada no controle interno da legalidade administrativa dos atos a serem praticados ou já efetivados. Ela envolve, também, o exame prévio e conclusivo dos textos das minutas. 

 

Nossa função é justamente apontar possíveis riscos do ponto de vista jurídico e recomendar providências, para salvaguardar a autoridade assessorada, a quem compete avaliar a real dimensão do risco e a necessidade de se adotar ou não a precaução recomendada.

 

Importante salientar, que o exame dos autos processuais restringe-se aos seus aspectos jurídicos, excluídos, portanto, aqueles de natureza técnica. Em relação a estes, partiremos da premissa de que a autoridade competente municiou-se dos conhecimentos específicos imprescindíveis para a sua adequação às necessidades da Administração, observando os requisitos legalmente impostos.

 

De fato, presume-se que as especificações técnicas contidas no presente processo, inclusive quanto ao detalhamento do objeto da contratação, suas características, requisitos e avaliação do preço estimado, tenham sido regularmente determinadas pelo setor competente do órgão, com base em parâmetros técnicos objetivos, para a melhor consecução do interesse público.

 

De outro lado, cabe esclarecer que, via de regra, não é papel do órgão de assessoramento jurídico exercer a auditoria quanto à competência de cada agente público para a prática de atos administrativos. Incumbe, isto sim, a cada um destes observar se os seus atos estão dentro do seu espectro de competências.  Assim sendo, o ideal, para a melhor e completa instrução processual, é que sejam juntadas ou citadas as publicações dos atos de nomeação ou designação da autoridade e demais agentes administrativos, bem como, os atos normativos que estabelecem as respectivas competências, com o fim de que, em caso de futura auditoria, possa ser facilmente comprovado que quem praticou determinado ato tinha competência para tanto. Todavia, a ausência de tais documentos, por si, não representa, a nosso ver, óbice ao prosseguimento do feito.

 

É nosso dever salientar que determinadas observações são feitas sem caráter vinculativo, mas em prol da segurança da própria autoridade assessorada a quem incumbe, dentro da margem de discricionariedade que lhe é conferida pela lei, avaliar e acatar, ou não, tais ponderações.   Não obstante, as questões relacionadas à legalidade serão apontadas para fins de sua correção. O seguimento do processo sem a observância destes apontamentos será de responsabilidade exclusiva da Administração

 

Conforme BPC n° 07, do Manual de Boas Práticas Consultivas da CGU/AGU  edição de 2016:

 

A manifestação consultiva que adentrar questão jurídica com potencial de significativo reflexo em aspecto técnico deve conter justificativa da necessidade de fazê-lo, evitando-se posicionamentos conclusivos sobre temas não jurídicos, tais como os técnicos, administrativos ou de conveniência ou oportunidade, podendo-se, porém, sobre estes emitir opinião ou formular recomendações, desde que enfatizando o caráter discricionário de seu acatamento.

 

ANALISE JURIDICA

 

Diante das considerações jurídicas expostas na NOTA n. 00130/2021/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU, os autos foram instruídos pelo Órgão assessorado, desta feita, com a minuta do edital de chamamento público visando à seleção de organização da sociedade civil interessada em celebrar Acordo de Cooperação, com a finalidade de formalizar cessão de uso gratuito de parte de uma área da União, sob a responsabilidade patrimonial do Comando da Aeronáutica, referente à área D-9 do TOMBO PE 006-000, conforme disposto no inciso I do artigo 18 da Lei nº 9.636 de 15 de maio de 1998,  para  o fim de serem submetidos à nova análise jurídica.

 

Vejamos, então, o propósito e a justificativa apresentados na referida peça editalícia:

 

1.PROPÓSITO DO EDITAL DE CHAMAMENTO PÚBLICO
1.1. A finalidade do presente Chamamento Público é a seleção de organização da sociedade civil interessada em celebração de parceria com o COMANDO DA AERONÁUTICA, por intermédio do SEGUNDO COMANDO AÉREO REGIONAL, por meio da formalização de Acordo de Cooperação, para a consecução de finalidade de interesse público e recíproco que não envolve a transferência de recursos financeiros à  organização da sociedade civil (OSC), conforme condições estabelecidas neste Edital.1.2. O procedimento de seleção reger-se-á pela Lei nº 13.019, de 31 de julho de 2014,pelo Decreto nº 8.726, de 27 de abril de 2016, e pelos demais normativos aplicáveis, além das condições previstas neste Edital.
2.1. O acordo de cooperação terá por objeto a cessão de uso gratuito, de parte de uma área da União, sob a responsabilidade patrimonial do Comando da Aeronáutica, referente à área D-9 do TOMBO PE 006-000, para a prestação de serviços religiosos, culturais e assistência social ao efetivo militar e civil, seus dependentes, bem como àqueles que necessitarem de apoio dessa natureza
3. JUSTIFICATIVA
3.1.  Considerando a necessidade de atendimento de cunho religioso à comunidade militar e civil do Comando da Aeronáutica;
3.2.  Considerando   a   necessidade   de   que   seja   mantida   a   prestação   de   serviços   de assistência social, tais como a distribuição de alimentação, doação de agasalhos e brinquedos principalmente àqueles que se encontram em vulnerabilidade pessoal ou social, conclui-se que é fundamental ser providenciada cessão de uso a título gratuito do imóvel, com base no que preconiza o inciso I do artigo 18 da Lei 9.636 de 15 de maio de 1998.
grifos da transcrição
 

A responsabilidade pela confecção do Plano de Trabalho ficou a cargo da entidade a ser selecionada por meio do chamamento público, conforme se depreende do anexo V do Edital, Modelo de Plano de Trabalho:

9.8.Constituem anexos do presente Edital, dele fazendo parte integrante:
Anexo I – Declaração de Ciência e Concordância;
Anexo II – Declaração sobre Instalações e Condições Materiais;
Anexo III – Declaração do Art. 27 do Decreto nº 8.726, de 2016, e Relação dos Dirigentes da Entidade;
Anexo IV – Declaração da Não Ocorrência de Impedimentos;
Anexo V – Modelo de Plano de Trabalho;
Anexo VI – Minuta do Acordo de Cooperação.

 

 

1. Acordo de Cooperação Técnica. Considerações Gerais. Adequação do instituto jurídico ao caso concreto

 

Já que o Órgão assessorado optou pelo Acordo de Cooperação Técnica para agasalhar o contrato de cessão de uso gratuito, torna-se importante visitar os seus pressupostos, a fim de avaliar se tais requisitos se amoldam ao caso concreto.

 

Em primeiro plano, cabe destacar que o art.116 da Lei nº 8.666, de 1993, autoriza órgãos e entidades da Administração a celebrar “convênios, acordos, ajustes e outros instrumentos congêneres”, nos seguintes termos:

 

Art. 116.  Aplicam-se as disposições desta Lei, no que couber, aos convênios, acordos, ajustes e outros instrumentos congêneres celebrados por órgãos e entidades da Administração.
§ 1o  A celebração de convênio, acordo ou ajuste pelos órgãos ou entidades da Administração Pública depende de prévia aprovação de competente plano de trabalho proposto pela organização interessada, o qual deverá conter, no mínimo, as seguintes informações:
I - identificação do objeto a ser executado;
II - metas a serem atingidas;
III - etapas ou fases de execução;
IV - plano de aplicação dos recursos financeiros;
V - cronograma de desembolso;
VI - previsão de início e fim da execução do objeto, bem assim da conclusão das etapas ou fases programadas;
VII - se o ajuste compreender obra ou serviço de engenharia, comprovação de que os recursos próprios para complementar a execução do objeto estão devidamente assegurados, salvo se o custo total do empreendimento recair sobre a entidade ou órgão descentralizador.

 

No âmbito da Advocacia-Geral da União há manifestação consubstanciada no PARECER n. 00061/2020/DECOR/CGU/AGU - NUP: 08657.031176/2020-52, que aborda com muita propriedade os Acordos de Cooperação Técnica, sua natureza, características e outros temas correlatos:

"Os acordos de cooperação técnica são instrumentos congêneres a convênios, disciplinados pelo art. 116 da Lei nº 8.666, de 1993, no qual os partícipes conjugam esforços institucionais para fins de execução de objeto de competência comum ou concorrente, tudo em prol do alcance de interesse público cuja consecução é reciprocamente associada às atribuições legais dos partícipes, sempre mediante ausência de rapasse de recursos.

 

Acerca da matéria, a Consultoria-Geral da União, por sua Câmara Nacional de Convênios e Instrumentos Congêneres, exarou o Parecer nº 5/2019/CNCIC/CGU/AGU e subsequentes Despachos de aprovação, postos no sequencial 9 a 12 do NUP 0688.000718/2019-32, posteriormente complementado pelo Parecer nº 1/2020/CNCIC/CGU/AGU (seq. 236) e subsequentes Despachos de aprovação, os quais bem delimitam os contornos jurídicos incidentes sobre os acordos de cooperação técnica e os adequados termos para a juridicidade de sua regular pactuação.
 
Por sua clareza e aplicabilidade ao caso, seguem trechos relevantes do Parecer nº 5/2019/CNCIC/CGU/AGU, aos quais se recomenda observância:
 
“Do Acordo de Cooperação Técnica  
3. O Acordo de Cooperação Técnica é um dos instrumentos que a Administração Pública se utiliza para realizar parcerias com outros entes públicos, visando à união de esforços para o alcance de um objetivo comum, baseado no interesse público.
 
4. Assim como ocorre em relação aos Convênios, costuma-se afirmar na doutrina que, diferente dos contratos, tais relações têm como elo de ligação a colaboração dos partícipes para o atingimento de um interesse convergente, enquanto aqueles são interesses contrapostos, com objetivos individualizados de cada parte. O Acordo de Cooperação se distingue do convênio por não ser possível a transferência de recurso financeiro, de forma que a contribuição de cada um é feita mediante a prática de atos materiais, que se inserem nas respectivas competências. 
 
5. Neste sentido, Marçal Justem Filho1 traz uma definição de convênio, que também pode ser aplicada ao acordo de cooperação, nos seguintes termos:
“(...)
é instrumento de realização de um determinado e específico objetivo, em que os interesses não se contrapõem – ainda que haja prestações específicas e individualizadas, a cargo de cada partícipe. A assunção de deveres destina-se a regular a atividade harmônica de sujeitos integrantes da Administração Pública, que buscam a realização de um mesmo e idêntico interesse público”
 
6. O ilustre doutrinador afirma que o objetivo que determina o convênio ou acordo de cooperação técnica é a vontade entre entidades públicas em que há convergência de interesses levando a uma atuação igualmente convergente, ou seja, de colaboração dos convenentes na busca de uma finalidade comum, verificado nos autos, devidamente materializado na assinatura conjunta do plano de trabalho pelas autoridades envolvidas no acordo.
 
7. Desta forma, define-se o Acordo de Cooperação Técnica como sendo um instrumento que viabiliza  a cooperação entre entidades da Administração Pública, na consecução de um objetivo que congregue um interesse público e recíproco entre as partes.
 
8. Com base em tais características, os pressupostos para a formação da avença seriam: 
a) a configuração do interesse recíproco na execução de um objeto; e
b) a obtenção do interesse público. 
 
Neste contexto, a formação, assim como a manutenção do ajuste depende da vontade dos envolvidos em comungar esforços, com a possibilidade de se retirar da relação a qualquer momento, continuando responsável assim como auferindo vantagens pelo tempo que participou.
 
9. Ademais, pode-se afirmar que o resultado a ser alcançado deve ser oriundo do somatório de esforços e do exercício de atribuições específicas de cada partícipe, que as desenvolve de acordo com as capacidades, utilizando-se de recursos próprios, assim como dos bens, pessoal e a expertise.
 
10. De tal particularidade, exsurge a necessidade de, na minuta do instrumento, constar que não haverá transferência de recursos financeiros entre os partícipes para a execução do Acordo Cooperação Técnica, devendo todas as  despesas necessárias à plena consecução do objeto acordado serem custeadas por recursos próprios, e, em se tratando de ente público, por dotações específicas constantes nos orçamentos de cada um dos partícipes.
 
11. Do mesmo modo, como os serviços decorrentes do acordo são prestados em regime de cooperação mútua, não cabe aos partícipes qualquer remuneração pela prestação, assim como o instrumento não deve ser utilizado com desvio de finalidade para promover a cessão de servidores públicos. Admite-se que haja o compartilhamento de servidor, mas apenas por prazo determinado e para o desenvolvimento de atividade específica, sem o afastamento das suas funções.
 
12. Quanto aos partícipes da relação, podem ser entes da Administração Pública de todas as esferas, em relação aos quais, não há que se exigir a regularidade fiscal, eis que tal exigência da Lei Complementar nº 101/2000 é destinada para os instrumentos em que há transferência de recursos. 
 
13. Considerando a necessidade de haver reciprocidade, caberá à Administração aferir a compatibilidade das atribuições a serem assumidas com os seus instrumentos de instituição e regência, haja vista a necessidade de certificação de que os objetivos se conformam com a missão institucional, assim como as obrigações assumidas estão inseridas no rol de competências.
 
Dos Requisitos para Celebração
14. Os acordos de cooperação estão enquadrados na legislação nacional como instrumentos congêneres aos convênios. Nestes moldes, a previsão normativa está assentada no art.116 da Lei nº 8.666/93, a qual exige que a celebração seja precedida de elaboração e aprovação de plano de trabalho, o qual será proposto pelo ente interessado, conforme adiante se transcreve:
 
“Art. 116.  Aplicam-se as disposições desta Lei, no que couber, aos convênios, acordos, ajustes e outros instrumentos congêneres celebrados por órgãos e entidades da Administração.
 
§ 1o  A celebração de convênio, acordo ou ajuste pelos órgãos ou entidades da Administração Pública depende de prévia aprovação de competente plano de trabalho proposto pela organização interessada, o qual deverá conter, no mínimo, as seguintes informações:
 I - identificação do objeto a ser executado;
II - metas a serem atingidas;
III - etapas ou fases de execução;
IV - plano de aplicação dos recursos financeiros;
V - cronograma de desembolso;
VI - previsão de início e fim da execução do objeto, bem assim da conclusão das etapas ou fases programadas;
VII - se o ajuste compreender obra ou serviço de engenharia, comprovação de que os recursos próprios para complementar a execução do objeto estão devidamente assegurados, salvo se o custo total do empreendimento recair sobre a entidade ou órgão descentralizador.” [sem destaque no original]
 
15. O dispositivo legal em comento explicita que ao Acordo de Cooperação devem ser aplicáveis as exigências da Lei nº 8.666/93, sempre que compatível. Significa, pois, que primeiramente deve ser aferido se a realização do objeto depende das especificações contidas no próprio objeto. Ademais, deve-se fazer o temperamento das exigências da lei em referência, haja vista que o seu mote principal é garantir a isonomia de participação dos interessados em prestarem serviços ou fornecerem bens à Administração pelos quais serão remunerados, o que não se verifica no instrumento ora analisado.

 

16. Com efeito, no acordo de cooperação, não haverá qualquer tipo de remuneração, não havendo dispêndio de recurso público financeiro, de modo que, em regra, podem ser aplicáveis alguns conceitos ali previstos; a vedação quanto ao prazo de vigência indeterminado; a previsão quanto à possibilidade de prorrogação e de alteração do instrumento, guardadas as especificidades, a designação de agente para acompanhar e fiscalizar a execução, dentre outros.
 
17. Específico quanto ao prazo de prorrogação, pode-se afirmar que o Acordo de Cooperação não está adstrito ao limite do art.57 da Lei nº 8.666/93, vez que a motivação da norma em comento está relacionada à vinculação do orçamento ao exercício financeiro, que não tem qualquer influência no presente, pois não há transferência de recurso.
 
18. Em relação ao plano de trabalho, nada mais é que a concretização do planejamento da forma como será executado o objeto e alcançado o resultado do acordo de cooperação. Desta forma, é peça fundamental e, portanto, deve contemplar elementos mínimos que demonstrem os meios materiais e os recursos necessários para a concretização dos objetivos, conforme definido nas metas e em conformidade com os prazos ali estampados. Neste sentido, um plano de trabalho bem elaborado contribui para a fiel execução das obrigações pelos partícipes, assim como facilita o acompanhamento e fiscalização quanto ao seu cumprimento.
 
19. Embora não aplicável ao acordo de cooperação, conforme será adiante detalhado, podemos, com as devidas adequações, tomar por empréstimo o conceito de plano de trabalho contido no §1º, do art.1º da Portaria Interministerial nº 424/2016, que assim o define:
 
XXIV - plano de trabalho: peça processual integrante dos instrumentos, que evidencia o detalhamento do objeto, da justificativa, dos cronogramas físico e financeiro, do plano de aplicação das despesas, bem como das informações da conta corrente específica, dos partícipes e dos seus representantes;
 
20. Em relação aos requisitos mínimos exigidos no art.116 da Lei nº 8.666/93, não se pode olvidar que são aplicáveis ao Acordo de Cooperação aqueles que guardam compatibilidade com suas características, afastando-se, portanto, os relacionados à transferência de recurso financeiro.   Assim, o plano de trabalho deve contemplar:
 
1.a identificação do objeto a ser executado -  deve ser descrito de forma clara, objetiva e precisa, de modo a não suscitar duplicidade de interpretações ou se adequar a objetos genéricos. Destaca-se a relevância de tal item, vez que através do mesmo deve ser possível aferir o interesse público e recíproco almejado, assim como se permite o completo delineamento das obrigações a serem assumidas pelos partícipes para atingi-lo;
2.o detalhamento de metas quantitativas e mensuráveis - necessário descrever cada uma das atividades em que se desdobra o objeto e os quantitativos a serem alcançados, externando por exemplo: (a) os recursos humanos e de infra-estrutura; (b) a existência de recursos financeiros de cada um dos envolvidos, próprios, para que as ações sejam implementadas;  (c) o atendimento mínimo dos parâmetros dos indicadores fixados em comum acordo e que servirão de base para a aferição das metas a resultados também fixados no acordo;
3.a descrição de etapas ou fases de execução - além da agregação das metas que compõem as etapas, importante que sejam estabelecidos critérios para a aferição do cumprimento, a sequência para a realização e a identificação da interdependência ou não entre as mesmas.
4.a previsão de início e fim da execução do objeto, bem assim da conclusão das etapas ou fases programadas - deve ser estabelecido um prazo de vigência para o acordo de cooperação técnica que guarde compatibilidade com o planejamento da sua execução, considerando as metas e etapas acordadas.
 
21. Nestes termos, a celebração do Acordo de Cooperação deve ser devidamente instruída com o plano de trabalho, contemplando os requisitos mencionados, já devidamente aprovado e certificado pela área técnica do órgão assessorado. 

 

Da Designação de Gestores para os Acordos de Cooperação Técnica
22. Determina o artigo 67 caput da Lei 8.666/1993 que a execução dos contratos deverá ser acompanhada e fiscalizada por um representante da Administração:
 
Art. 67.  A execução do contrato deverá ser acompanhada e fiscalizada por um representante da Administração especialmente designado, permitida a contratação de terceiros para assisti-lo e subsidiá-lo de informações pertinentes a essa atribuição.
§ 1o  O representante da Administração anotará em registro próprio todas as ocorrências relacionadas com a execução do contrato, determinando o que for necessário à regularização das faltas ou defeitos observados.
 
23. Conforme já mencionado dantes, é recomendável, com base na previsão do caput do artigo 116 da LLCA que se exija a designação de agente para acompanhar e fiscalizar a execução do acordo. Em se tratando de parceria, objetiva-se que a atuação seja direcionada para corrigir ou aperfeiçoar atividades realizadas pelos partícipes que possam comprometer o resultado buscado.
 
24. Nesta senda, revela-se necessária a designação de gestores nos acordos de cooperação técnica , ou seja,  pessoa física formalmente indicada no instrumento firmado, a fim de promover a administração e a coordenação dos aspectos envolvidos na formalização, na execução e no relatório de cumprimento acordo de cooperação técnica. 

 

Da Publicidade e Controle de Resultados
25. Considerando os princípios que regem a Administração Pública, dentre os quais a publicidade, a fim de possibilitar a transparência das ações, o Acordo de Cooperação Técnica, em conformidade com o parágrafo único do art.61 da Lei nº 8.666/93, deve ser publicado no Diário Oficial da União.
 
26. Embora não exista prestação de contas relativa a recursos públicos, é recomendável que os partícipes instituam a obrigação de apresentação de relatório conjunto, visando aferir os resultados alcançados na parceria e o cumprimento das obrigações.
 
Da Inaplicabilidade do Decreto nº 6.170/2007 e da Portaria Interministerial CGU/MF/MP nº424/2016
27. Conquanto o Acordo de Cooperação seja um instrumento que guarda similitude com vários aspectos do convênio, ao mesmo não se aplicam as disposições contidas no Decreto nº 6.170/2007 e na Portaria Interministerial CGU/MF/MP n º 424/2016, haja vista que tais instrumentos normativos se destinam a regular as relações jurídicas entre entes públicos que envolvam a transferência de recursos financeiros oriundos do Orçamento Fiscal e da Seguridade Social (OGU).
28. Apesar do exposto, nada impede que a Administração se utilize de algumas regras procedimentais contidas em tais dispositivos, desde que compatíveis com a sua natureza, como por exemplo, as hipóteses de rescisão, denúncia e extinção do ajuste; os conceitos referentes ao objeto, metas, plano de trabalho, termo aditivo, os critérios de escolha para definição do ente com o qual será celebrado o acordo de cooperação, quando houver mais de um interessado.
...
CONCLUSÃO
36. Em síntese, a formalização de Acordos de Cooperação Técnica depende:
 
A) da certificação que o objeto a ser executado atende ao interesse público e recíproco dos partícipes;
B) da certificação quanto à natureza jurídica do ente que irá celebrá-lo com a Administração Pública Federal, a fim de se aferir as atribuições para o cumprimento do objeto e a necessidade ou não de instauração do procedimento de seleção;
C) da elaboração e aprovação prévia do plano de trabalho, o qual deverá conter todos os requisitos técnicos necessários à realização do objeto, bem como para aferição do alcance do resultado.”
 

No caso sub examine, o Acordo de Cooperação Técnica tem como escopo a cessão de uso gratuita de parte da área de imóvel da União,  para que nesse espaço sejam desenvolvidas atividades de cunho religioso, cultural e de assistência social ao efetivo militar e civil, seus dependentes, bem como àqueles que necessitarem de apoio dessa natureza.

 

Não vislumbramos na pretensão do Órgão assessorado fundamento jurídico para a celebração do Acordo de Cooperação em face dos elementos discriminados acima, e da legislação que cuida da cessão gratuita de imóvel da União,  motivo pelo qual não recomendamos a sua utilização.

 

2. cessão de uso gratuito. considerações gerais

 

A destinação de parte do imóvel da União jurisdicionada ao Comando da Aeronáutica parece definir a intenção do Órgão assessorado de transferir a posse do bem a terceiro, por meio da cessão de uso gratuita, para que no local sejam realizadas determinadas atividades de interesse da Base Aérea de Recife/Comando da Aeronáutica.

 

Com efeito, é o que se extrai da finalidade, propósito e justificativa lançados na minuta do Edital:

 

A finalidade do presente Chamamento Público é a seleção de organização da sociedade civil interessada em celebração de parceria com o COMANDO DA AERONÁUTICA, por intermédio do SEGUNDO COMANDO AÉREO REGIONAL, por meio da formalização de Acordo de Cooperação, para a consecução de finalidade de interesse público e recíproco que não envolve a transferência de recursos financeiros à  organização da sociedade civil (OSC), conforme condições estabelecidas neste Edital.1.2. O procedimento de seleção reger-se-á pela Lei nº 13.019, de 31 de julho de 2014,pelo Decreto nº 8.726, de 27 de abril de 2016, e pelos demais normativos aplicáveis, além das condições previstas neste Edital.
2.1. O acordo de cooperação terá por objeto a cessão de uso gratuito, de parte de uma área da União, sob a responsabilidade patrimonial do Comando da Aeronáutica, referente à área D-9 do TOMBO PE 006-000, para a prestação de serviços religiosos, culturais e assistência social ao efetivo militar e civil, seus dependentes, bem como àqueles que necessitarem de apoio dessa natureza
3. JUSTIFICATIVA
3.1.  Considerando a necessidade de atendimento de cunho religioso à comunidade militar e civil do Comando da Aeronáutica;
3.2.  Considerando   a   necessidade   de   que   seja   mantida   a   prestação   de   serviços   de assistência social, tais como a distribuição de alimentação, doação de agasalhos e brinquedos principalmente àqueles que se encontram em vulnerabilidade pessoal ou social, conclui-se que é fundamental ser providenciada cessão de uso a título gratuito do imóvel, com base no que preconiza o inciso I do artigo 18 da Lei 9.636 de 15 de maio de 1998.

 

Nessa senda, urge indagar se a pretensão configura mera cessão de uso gratuita prevista no artigo 18 da Lei nº 9.636, de 1998,  ou cessão de uso para o desenvolvimento atividade de apoio admitida no artigo 20 da Lei nº 9.636, de 1998.

 

Sendo assim, interessante pontuar em linhas gerais os pressupostos de cada uma.

 

2.1. cessão de uso gratuito. artigo 18 da Lei n 9.636, de 1998

O instituto jurídico denominado de cessão foi adotado, originalmente, como forma de utilização dos bens imóveis, quando houvesse interesse da União em concretizar auxílio ou colaboração que entendesse prestar, gratuitamente, nos moldes do § 3º do artigo 64 do Decreto-lei nº 9.760, de 1946, que dispôs sobre os bens imóveis da União:

 

Art. 64. Os bens imóveis da União não utilizados em serviço público poderão, qualquer que seja a sua natureza, ser alugados, aforados ou cedidos.
§ 1º A locação se fará quando houver conveniência em tornar o imóvel produtivo, conservando porém, a União, sua plena propriedade, considerada arrendamento mediante condições especiais, quando objetivada a exploração de frutos ou prestação de serviços.
§ 2º O aforamento se dará quando coexistirem a conveniência de radicar-se o indivíduo ao solo e a de manter-se o vínculo da propriedade pública.
§ 3º A cessão se fará quando interessar à União concretizar, com a permissão da utilização gratuita de imóvel seu, auxílio ou colaboração que entenda prestar.
 

O seu regramento específico encontrava-se nos artigos 125 e 126 do diploma legal citado, ou seja:

Art. 125. Por ato do Governo, e a seu critério, poderão ser cedidos, gratuitamente ou em condições especiais, sob qualquer dos regimes previstos neste Decreto-lei, imóveis da União aos Estados, aos Municípios, a entidades educacionais, culturais ou de finalidades sociais e, em se tratando de aproveitamento econômico de interesse nacional, que mereça tal favor, a pessoa física ou jurídica.
 
Art. 126. Nos casos previstos no artigo anterior, a cessão se fará mediante termo ou contrato, de que expressamente constarão as condições estabelecidas, e tornar-se-á nula, independentemente de ato especial, se ao imóvel, no todo ou em parte, for dada aplicação diversa da que lhe tenha sido destinada.

 

Em 1998, os artigos 125 e 126 foram expressamente revogados pela Lei nº 9.636, que tratou da regularização, administração, aforamento e alienação de bens imóveis de domínio da União (regulamentada posteriormente pelo Decreto nº 3.725, de 2001), que passou a tratar do instituto no seu artigo 18.

 

Houve ampliação das possibilidades de utilização da cessão, incluindo a forma onerosa destinada a empreendimento de fins lucrativos, a cessão parcial para atividades de apoio (art.20), e aquela sob o regime de concessão de direito real de uso resolúvel, entre outras modificações

 

Assim, nos termos da referida norma,  ficou estabelecido que:

 

Art. 18. A critério do Poder Executivo poderão ser cedidos, gratuitamente ou em condições especiais, sob qualquer dos regimes previstos no Decreto-Lei no 9.760, de 1946, imóveis da União a: (Decreto nº 3.725, de 10.1.2001)
 
I - Estados, Distrito Federal, Municípios e entidades sem fins lucrativos das áreas de educação, cultura, assistência social ou saúde; (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007)
 
 II - pessoas físicas ou jurídicas, em se tratando de interesse público ou social ou de aproveitamento econômico de interesse nacional. (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007).
 
§ 1o A cessão de que trata este artigo poderá ser realizada, ainda, sob o regime de concessão de direito real de uso resolúvel, previsto no art. 7o do Decreto-Lei no 271, de 28 de fevereiro de 1967, aplicando-se, inclusive, em terrenos de marinha e acrescidos, dispensando-se o procedimento licitatório para associações e cooperativas que se enquadrem no inciso II do caput deste artigo
.........................................
 
§5º. A cessão, quando destinada à execução de empreendimento de fim lucrativo, será onerosa, e sempre que houver condições de competitividade, deverão ser observados os procedimentos licitatórios previstos em lei”
 

Os imóveis da União poderão ser cedidos gratuitamente ou em condições especiais, de forma onerosa ou com encargos específicos, sob quaisquer dos regimes aos Estados, Distrito Federal ou Municípios; a entidades sem fins lucrativos das áreas de educação, cultura, assistência social e saúde e a pessoas físicas ou jurídicas, como as associações e cooperativas, em se tratando de interesse público ou social ou de aproveitamento econômico de interesse nacional.

 

No âmbito das normas de natureza administrativa,  é importante mencionar a  Portaria nº 144, de 09 de julho 2001, emitida pelo Ministro do Planejamento, Orçamento e Gestão.

 

Com o fito de fixar as diretrizes para as proposições formuladas pela Secretaria do Patrimônio da União, que tenham por objeto a cessão de uso gratuito ou em condições especiais de imóveis de domínio da União, com amparo no art. 18 da Lei nº 9.636, de 15 de maio de 1998, o MINISTRO DE ESTADO DO PLANEJAMENTO, ORÇAMENTO E GESTÃO expediu a Portaria nº 144, de 09 de julho 2001.

 

Infere-se da Portaria que a cessão objetiva a transferência do uso de bem público para que o cessionário desenvolva atividade que traduza, de algum modo, em interesse público.  

 

Art. 1º Estabelecer as diretrizes para as proposições formuladas pela Secretaria do Patrimônio da União, deste Ministério, que tenham por objeto a cessão de uso gratuito ou em condições especiais de imóveis de domínio da União, com amparo no art. 18 da Lei nº 9.636, de 15 de maio de 1998.
 
Art. 2º As cessões de uso gratuito ou em condições especiais de imóveis da União deverão observar as seguintes destinações:
 
I- ao uso no serviço público, para os seguintes fins:
a) a fundações e autarquias que integrem a Administração Pública Federal; e
b) a empresas públicas e sociedades de economia mista com controle acionário majoritário da União,para afetação aos seus fins institucionais;

 

II- a Estados e Municípios, para os seguintes fins:a) uso no serviço público estadual ou municipal, inclusive para entidades vinculadas da Administração Pública indireta, bem como para empresas públicas e de economia mista;b) afetação ao uso urbano, tais como ruas, avenidas, praças ou outros fins de uso comum;c) execução de projeto de desenvolvimento econômico ou industrial;d) execução de projeto de conservação ou recuperação ambiental;e) implantação de projeto habitacional ou de assentamento destinado a famílias de baixa renda;f) regularização fundiária limitada a adquirentes de imóveis de domínio da União, na suposição de que fossem alodiais, em decorrência da ausência de demarcação de áreas de domínio da União; e g) implantação de atividade cultural executada diretamente pelo Poder Público;
 
III - a entidades sem fins lucrativos, de caráter educacional, cultural ou de assistência social, para os seguintes fins:
a) implantação de ensino gratuito destinado à comunidade local;
b) implantação de centro de ensino especial ou de atividade de atendimento a excepcionais;
c )implantação de atividade cultural;
d) implantação de atividade de assistência social gratuita destinada ao atendimento de carentes e idosos; e
e) implantação de centro de saúde ou hospitais, desde que contemplado o atendimento preponderantemente a carentes e que o proponente integre a rede do Sistema Único de Saúde - SUS ou serviço de atendimento à saúde que lhe suceda.
§ 1º A proposição de que trata a alínea "c" do inciso II deverá estar instruída com manifestação do proponente ou dos órgãos que integram a sua estrutura, demonstrando a relevância da atividade pretendida e os seus reflexos na geração de emprego e renda
.§ 2º A proposição de que trata a alínea "d" do inciso II deverá contar com contar com aprovação ou manifestação de viabilidade exarada pelo órgão competente do meio ambiente.§ 3º As proposições de que tratam as alíneas "a" e "b", "c", "d" e "e" do inciso III deverão contar com prévia manifestação favorável dos Ministérios da Educação, da Cultura, da Previdência e Assistência Social e das Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde, respectivamente
 

Como visto, o escopo da cessão de uso gratuita tem contornos bem delimitados

 

Não se discute que a administração dos imóveis das Forças Armadas encontra-se amparada por leis especiais em relação à competência para dispor deles, nos termos da NOTA DECOR/CGU/AGU Nº 245/2007-PCN, do PARECER Nº 10/2011/DECOR/CGU/AGU, do PARECER Nº 5/2012/DECOR/CGU/AGU, do PARECER Nº 83/2012/DECOR/CGU/AGU e do PARECER n. 22/2021/DECOR/CGU/AGU.

 

O PARECER n. 22/2021/DECOR/CGU/AGU é enfático nesse ponto:

 

“54. De  fato,  não  se  pode  perder  de  vista  que  o  entendimento  deste  Departamento  sobre  a competência  das  Forças  Armadas  para  administrar  imóveis  sob  sua  jurisdição  está  encorado  na  interpretação jurídica que entende aplicáveis leis especiais e não apenas na Lei nº 9.636, de 1998.
55.Essas leis especiais são  as  Leis nºs  5.651,  de  1970,  e  5.658,  de  1971,  que  tratam expressamente das hipóteses de venda e permuta, in verbis: 
Lei nº 5.651, de 1970: 
"Art.  1º É  autorizado   o  Ministério  do  Exército  a  proceder  a  venda  ou  permuta  de  bens imóveis da União, de qualquer natureza sob sua jurisdição, cuja utilização ou exploração não atenda mais as necessidades do Exército. 
§ 1º Para cada caso deverá haver aprovação expressa do Ministro do Exército. 
§ 2º No processo da aprovação serão observadas as normas estabelecidas no Título XII do Decreto-lei número 200, de 25 de fevereiro de 1967.”
 ........................... 
Lei nº 5.658, de 1971: 
“Art. 1º Os Ministérios da Aeronáutica e da Marinha são autorizados a proceder à venda ou permuta  de  bens  imóveis  da  União,  de  qualquer  natureza,  sob  suas  jurisdições,  cuja utilização ou exploração não atenda mais às necessidades da Marinha e da Aeronáutica. 
§ 1º Para cada caso deverá haver aprovação expressa do respectivo Ministro.  § 2º No processo da aprovação serão observadas as normas estabelecidas no Título XII do Decreto-lei nº 200, de 25 de fevereiro de 1967.” 
 (...)
57. Em  momento  posterior,  quando  este  Departamento  tratou  da  autorização  para  que  o só Órgãos  militares  realizassem  contratos  de  arrendamento  de  imóveis  da  União  (PARECER  Nº10/2011/DECOR/CGU/AGU), o fundamento foi o mesmo, ou seja, defendeu-se a aplicação do princípio da especialidade,  a  exemplo  do  que  já  havido  feito  em relação  às  Leis  nº  5.651,  de  1970,  e  5.658,  de1971. 
58. Entendeu-se aplicável, naquela oportunidade, ao invés do art. 40 da Lei nº 9.636, de 1998, o Decreto-Lei nº 1.310, de 8 de fevereiro de 1974 e o Decreto nº 77.095, de 30 de janeiro de 1976. 
59. Não obstante,  por  intermédio  do  PARECER  Nº  083/2012/DECOR/CGU/AGU  foi  dada  uma interpretação  mais  abrangente  do  disposto  nas  Leis especiais  em  questão,  para  admitir que a “entrega provisória”  e a  “cessão  de  uso  gratuita”  de  imóveis  da  União  também  poderiam  ser realizadas pelas Forças Armadas. 
60.Isso seria permitido para garantir a utilização futura desses imóveis em finalidade militar objetiva ou complementar.
Grifo nosso

 

Relevante salientar que se admite a cessão de uso gratuita de imóveis da União sob administração militar, considerando que esses órgãos podem ter planos para a utilização futura desses bens, o que caracterizaria o interesse na manutenção da sua administração pelas Forças Armadas (PARECER Nº 083/2012/DECOR/CGU/AGU).

 

Levando-se  em conta tais parâmetros jurídicos fixados no âmbito da AGU, e considerando que o Órgão assessorado busca ceder parte do imóvel da União para entidade sem fins lucrativos que preste serviço religioso, cultural e de assistência social ao efetivo militar e civil, seus dependentes atividades direcionadas, portanto, para seu público interno, tem-se que essa forma de cessão de uso  não se adequa à realização  desses propósitos em razão do que não recomendamos a sua utilização.

 

Com efeito, a cessão de uso em comento integra um conjunto de outras modalidades de destinação patrimonial a cargo da autoridade competente com vistas a transferir o uso de imóvel público a terceiros, configurando atos de gestão patrimonial.

 

O caso vertente  não se enquadra nesse perfil, uma vez que o Órgão pretende utilizar a cessão de uso como meio para satisfazer demandas internas, fato que permite cogitar sobre a adequação da cessão de uso para atividade de apoio.

 

2.2. Cessão de uso para atividade de apoio

Primeiramente, oportuno revisitar a legislação que versa sobre a cessão de imóvel/espaço público federal, para fins de atividade de apoio.

 

Vejamos:

 

Decreto-Lei nº 9.760, de 1946:
Art. 79. A entrega de imóvel para uso da Administração Pública Federal direta compete privativamente à Secretaria do Patrimônio da União - SPU. (Redação dada pela Lei nº 9.636,de 1998):
 
§ 1º A entrega, que se fará mediante termo, ficará sujeita a confirmação 2 (dois) anos após a assinatura do mesmo, cabendo ao S.P.U. ratificá-la, desde que, nesse período tenha o imóvel sido devidamente utilizado no fim para que fora entregue.
 
§ 2º O chefe de repartição, estabelecimento ou serviço federal que tenha a seu cargo próprio nacional, não poderá permitir, sob pena de responsabilidade, sua invasão, cessão, locação ou utilização em fim diferente do que lhe tenha sido prescrito.
 
 
LEI nº 9.636, de 1998
Art. 20. Não será considerada utilização em fim diferente do previsto no termo de entrega, a que se refere o § 2o do art. 79 do Decreto-Lei no 9.760, de 1946, acessão de uso a terceiros, a título gratuito ou oneroso, de áreas para exercício de atividade de apoio, definidas em regulamento, necessárias ao desempenho da atividade do órgão a que o imóvel foi entregue.
 
Parágrafo único. A cessão de que trata este artigo será formalizada pelo chefe da repartição, estabelecimento ou serviço público federal a que tenha sido entregue o imóvel,desde que aprovada sua realização pelo Secretário-Geral da Presidência da República,respectivos Ministros de Estado ou autoridades com competência equivalente nos Poderes Legislativo ou Judiciário, conforme for o caso, e tenham sido observadas as condições previstas no regulamento e os procedimentos licitatórios previstos em lei.
 
 
Decreto nº 3.725/2001
Art. 12. Não será considerada utilização em fim diferente do previsto no termo de entrega, a que se refere o § 2o do art. 79 do Decreto-Lei no 9.760, de 1946, a cessão de uso aterceiros, a título gratuito ou oneroso, de áreas para exercício das seguintes atividades de apoio necessárias ao desempenho da atividade do órgão a que o imóvel foi entregue:
I - posto bancário;
II - posto dos correios e telégrafos;
III - restaurante e lanchonete;
IV - central de atendimento a saúde;
V - creche; e  
VI - outras atividades similares que venham a ser consideradas necessárias pelos Ministros de Estado, ou autoridades com competência equivalente nos Poderes Legislativo e Judiciário, responsáveis pela administração do imóvel.
 
Parágrafo único.  As atividades previstas neste artigo destinar-se-ão ao atendimento das necessidades do órgão cedente e de seus servidores
 

Indispensável,  ainda, o preenchimento de determinados requisitos previstos no art. 13, também do Decreto nº 3.725/2001:

 

Art. 13. A cessão de que trata o artigo anterior será formalizada pelo chefe da repartição,estabelecimento ou serviço público federal a que tenha sido entregue o imóvel, desde que aprovada sua realização pelo Chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República,respectivos Ministros de Estado ou autoridades com competência equivalente nos Poderes Legislativo e Judiciário, conforme for o caso, observados os procedimentos licitatórios previstos em lei e as seguintes condições:
I - disponibilidade de espaço físico, de forma que não venha a prejudicar a atividade-fim da
repartição;
II - inexistência de qualquer ônus para a União, sobretudo no que diz respeito aos
empregados da cessionária;
III - compatibilidade de horário de funcionamento da cessionária com o horário de funcionamento do órgão cedente;
IV - obediência às normas relacionadas com o funcionamento da atividade e às normas de utilização do imóvel;
V - aprovação prévia do órgão cedente para realização de qualquer obra de adequação do espaço físico a ser utilizado pela cessionária;
VI - precariedade da cessão, que poderá ser revogada a qualquer tempo, havendo interesse do serviço público, independentemente de indenização;
VII - participação proporcional da cessionária no rateio das despesas com manutenção, conservação e vigilância do prédio;
VIII - quando destinada a empreendimento de fins lucrativos, a cessão deverá ser sempre onerosa e sempre que houver condições de competitividade deverão ser observados os procedimentos licitatórios previstos em lei; e
IX - outras que venham a ser estabelecidas no termo de cessão, que será divulgado pela Secretaria do Patrimônio da União.

 

Com amparo no inciso VI do artigo 12 do Decreto nº 3,725 , de 2001,  que permitiu que outras atividades similares que venham a ser consideradas necessárias pelos Ministros de Estado, ou autoridades com competência equivalente nos Poderes Legislativo e Judiciário, responsáveis pela administração do imóvel, foi expedida a PORTARIA GABAER Nº 289/GC4, de 17 de maio de 2022, no âmbito do Comando da Aeronáutica com as diretrizes para autorizar a cessão de uso de bens imóveis de domínio da União, sujeitos à administração do COMAER, in verbis:

 

ESTADO-MAIOR DA AERONÁUTICA
PORTARIA GABAER Nº 289/GC4, DE 17 DE MAIO DE 2022.
Fixa diretrizes e delega competências para autorizar a cessão de uso de bens imóveis de domínio da União, sujeitos à administração do COMAER.
O COMANDANTE DA AERONÁUTICA, no uso da atribuição que lhe é conferida pelo §1º e o inciso XIV do art. 23 da Estrutura Regimental do Comando da Aeronáutica, aprovada pelo Decreto nº 6.834, de 30 de abril de 2009, e tendo em vista o disposto na Portaria GM-MD nº 4.411, de 27 de outubro de 2021, resolve:
Art. 1º Delegar competência ao Comandante, Chefe, Diretor ou Secretário do Órgão de Direção Setorial (ODS) ao qual a OM ou Unidade da Aeronáutica responsável pelo imóvel objeto da cessão estiver subordinada, para emitir a autorização para a cessão de uso de bens imóveis de domínio da União, sujeitos à administração do COMAER, de que trata o parágrafo único do art. 20 da Lei nº 9.636, de 15 de maio de 1998.
Parágrafo Único. É vedada a subdelegação de competência de que trata o presente artigo.
Art. 2º A autorização de que trata o art. 1º se restringe ao exercício das seguintes atividades de apoio, destinadas ao atendimento das necessidades da administração e de seus respectivos militares e servidores:
I - barbearia e cabeleireiro;
II - alfaiataria, sapateiro, boteiro, engraxate, confecção e venda de uniformes e artigos militares;
III - padaria, lanchonete, restaurante, mercearia, supermercado, loja de conveniência, loja de souvenir, lavanderia, estabelecimento para atividades físicas e posto de abastecimento de combustível;
IV - estabelecimento de fotografia e filmagem;
V - papelaria, livraria, banca de revistas e gráfica em estabelecimento de ensino, organização militar de saúde e vilas militares;
VI - ótica e farmácia em organização militar de saúde e vilas militares;
VII - posto de atendimento bancário ou para financiamento, empréstimo, empreendimentos habitacionais, consórcio e atividades correlatas e voltadas à assistência de militares e civis;
VIII - creche pré-escolar, escolas de ensino infantil, fundamental e médio e cursos preparatórios para as carreiras militares;
IX - promoção de intercâmbio social, recreativo, cultural, educacional, assistencial e cívico, primordialmente entre os militares e seus familiares e entre estes e os demais segmentos da sociedade;
X - antena de telefonia móvel;
XI - estabelecimento comercial de artigos náuticos, marítimos, esportivos e agropecuários, de equitação, como vestimentas, arreamentos, acessórios para os esportes equestres e suplementos veterinários, e para a alimentação equina;
XII - equipamentos provedores de internet; e
XIII - estrutura para geração de energia renovável.
Art. 3º A autorização de que trata o art. 1º da presente Portaria deverá ser providenciada imediatamente após a abertura do Processo Administrativo de Gestão.
Parágrafo Único. A cessão de uso deverá observar os procedimentos licitatórios aplicáveis a cada caso concreto, em conformidade com o parágrafo único do art. 20 da Lei nº 9.636, de 15 de maio de 1998.
Art. 4º Revoga-se a Portaria nº 957/GC4, de 13 de outubro de 2020, publicada no DOU n° 203, de 22 de outubro de 2020, e no BCA nº 194, de 27 de outubro de 2020.
Art. 5º Esta Portaria entrará em vigor em de 1º de junho de 2022.
Ten Brig Ar CARLOS DE ALMEIDA BAPTISTA JUNIOR
Comandante da Aeronáutica
grifo da transcrição

 

2.2.1.  O caso concreto

A moldura jurídica dos institutos da cessão de uso gratuita de que trata o artigo 18 da Lei nº 9.636, de 1998 e da cessão gratuita para atividade de apoio de que cuida o artigo 20 do mesmo diploma legal,  não deixa dúvida a respeito de ser este último o que reúne, em tese, o aparato indispensável para que o Órgão possa transferir áreas para exercício de atividade de apoio, ou seja, aquelas necessárias ao desempenho da sua atividade institucional.

 

Nessa esteira, impende, de plano, apontar que não se identifica entre as atividades admitidas na legislação destacada, a prestação de serviços religiosos destinada ao atendimento das necessidades da administração e de seus respectivos militares e servidores e, menos ainda,  voltadas para o público externo.

 

Em virtude da ausência de subsunção desse aspecto da almejada contratação às hipóteses normativas enunciadas, é nosso entendimento que eventual formalização de cessão de uso gratuita envolvendo prestação de serviços religiosos ao efetivo militar e civil, seus dependentes, bem como àqueles que necessitarem de apoio dessa natureza,  estará afetada por de vício de irregularidade e, nesse sentido, passível de censura pelos Órgãos de controle.

 

No que concerne às demais atividades,  ou seja, culturais e de assistência social,  outras ponderações merecem ser feitas.

 

A minuta do Edital é por demais genérica sobre a efetiva necessidade da administração e de seus respectivos militares e servidores relacionada a essas ações.

 

De outro lado, não há demonstração da razoabilidade entre a extensão da área reservada para a cessão de uso e as atividades a serem implementadas, sobretudo porque se trata de utilização sem ônus financeiro para a cessionária.

 

É dizer, o Órgão não se desincumbiu a contento de demonstrar não só a conformidade da dimensão do imóvel para o desenvolvimento das  atividades previstas na minuta do Edital, como também,   as particularidades relacionadas ao seu efetivo militar e de dependentes que justifique providenciar atendimento a essas demandas  na área da cultura e da assistência social.

 

Mesmo porque, para ser viável a apresentação de propostas por parte das organizações sem fins lucrativos interessadas, torna-se imperativo discriminar com clareza as demandas a serem  por elas satisfeitas.

 

Assim, caberia explicitar o que compreende a  atividade cultural almejada pelo Orgão assessorado; qual o público alvo; a frequência de eventos dessa natureza e assim por diante.

 

No que tange à assistência social, incumbiria a demonstração da sua compatibilidade com as políticas traçadas pelo Ministério da Defesa ou pela próprio Comando da Aeronáutica .

 

Ao pesquisar sobre a existência de normas que regulam a matéria, encontramos as Portarias discriminadas na sequência.

 

Embora não tenha sido possível confirmar o status das respectivas vigências, constata-se a relevância que as Forças Armadas conferem ao assunto:

 

PORTARIA NORMATIVA Nº 1173/MD, de 06 de setembro de 2006, que trata da  Política  de   Assistência   Social   das   Forças Armada
 
PORTARIA NORMATIVA Nº 881/MD, de 26 de maio de 2010aprovou as diretrizes para o desenvolvimento dos programas da Política de Assistência Social das Forças Armadas.
 

Por fim, resta assinalar que o Parecer 83/2012/DECOR/CGU/AGU define a competência dos Órgão Militares para dispor de bens imóveis, de forma gratuita e provisória em favor de Órgãos e entidades da Administração Pública,  o que exclui as organizações sem fins lucrativos.

 

Diante disso, entendemos que o cumprimento das normas aplicáveis à cessão de uso para atividade de apoio não foram devidamente atendidas.

 

2.2.2. A gratuidade da contratação

Afora os apontamentos anteriores, digna de realce a repercussão que a gratuidade da contratação pode acarretar para toda a corporação militar, a recomendar muita cautela na decisão da autoridade competente.

 

Na NOTA n. 00130/2021/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU, o Advogado da União,  já havia alertado para o seguinte ponto:

 

“Não há ainda nos autos qualquer justificativa para a gratuidade da cessão. Conforme explica o laudo de avaliação (fls. 5 e seguintes), trata-se de imóvel acentuadamente valorizado (R$ 4.500.000,00, aproximadamente; valor de locação estimado em aproximadamente R$ 21.000,00) localizado no Bairro de Boa Viagem, em área vocacionada para a construção de empreendimentos multifamiliares de luxo, próximo à praia e à área nobre do Recife.”
 

Na mesma linha, enfatizamos que a oportunidade de o Fundo da Aeronáutica ser contemplado com o siginificativo valor mensal da locação referente à área em apreço, até que outro destino vinculado à atuação do Órgão assessorado seja deliberado,  só poderá ser colocada em segundo plano se as justificativas relalcionadas à gratuidade forem robustas e a observância das hipóteses legais rigorosamente atendidas.

 

Com efeito, assim dispõe o DECRETO-LEI Nº 1.252, DE 22 de dezembro de 1972 que altera e consolida a legislação referente ao Fundo Aeronáutico.

 
 Art. 2º Constituem receitas do Fundo Aeronáutico:
1 - para aplicação limitada, sujeita às normas gerais de planejamento, programação e orçamento, as obtidas:
 
a) do produto das operações realizadas de conformidade com a Lei nº 5.658, de 7 de junho de 1971, que dispõe sobre a venda ou permuta de bens imóveis da União sob a jurisdição do Ministério da Aeronáutica;

 

Não se pode perder de vista que as receitas do Fundo Aeronáutico visam a auxiliar o provimento de recursos financeiros para o aparelhamento da Força Aérea Brasileira, conforme norma:

 

DECRETO Nº 73.070, DE 1 DE NOVEMBRO DE 1973.. Aprova o Regulamento do "Fundo Aeronáutico" e dá outras providências.
 
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA , usando da atribuição que lhe confere o artigo 81, item III, da Constituição, e tendo em vista o artigo 6º, do Decreto-lei nº 1.252, de 22 de dezembro de 1972,
 
DECRETA:
 
Art 1º Fica aprovado o Regulamento do "Fundo Aeronáutico", que com este baixa, assinado pelo Ministro de Estado da Aeronáutica.
 
 
REGULAMENTO DO FUNDO AERONÁUTICO
CAPÍTULO I
Da Finalidade
Art 1º O Fundo Aeronáutico, criado pelo Decreto-lei nº 8.373, de 14 de dezembro de 1945, modificado pelo Decreto-lei nº 9.651, de 23 de agosto de 1946, é um fundo de natureza contábil destinado a auxiliar o provimento de recursos financeiros para o aparelhamento da Força Aérea Brasileira e para as realizações ou serviços que se façam necessários, no sentido de assegurar o cumprimento eficiente da missão constitucional da Aeronáutica, conforme estabelece o Decreto-lei nº 1.252, de 22 de dezembro de 1972, que altera e consolida a legislação referente ao Fundo Aeronáutico.
 
(...)
Fontes de Receita
Art 3º Constituem receitas do Fundo Aeronáutico:
1 - para aplicação limitada, sujeita as normas gerais de planejamento, programação e orçamento, as obtidas:
 
a) do produto das operações realizadas de conformidade com a Lei nº 5.658, de 7 de junho de 1971, que dispõe sobre a venda ou permuta de bens imóveis da União sob a jurisdição do Ministério da Aeronáutica
grifo nosso

 

Deste modo, a destinacão gratuita de imóvel da União sem a observância de todas as cautelas legais, normativas e administrativas pode configurar, em última análise, uma forma de renúncia de receita pública, isto é, o abandono pelo gestor público, sem base legal, do recebimento de valores instituídos em lei e cuja finalidde seria o de fortalecer, no caso, o orçamento do Fundo Aeronáutico.

 

CONCLUSÃO

 

Em face do exposto, opinamos, nos limites da análise jurídica e excluídos os aspectos técnicos e o juízo de oportunidade e conveniência do ajuste, pela impossibilidade de celebração do Acordo de Cooperação Técnica, e da cessão de uso gratuita, nos moldes em que apresentados, com base nos fundamentos declinados ao longo deste Parecer Jurídico, sobretudo aquelas  sublinhadas e grafadas em negrito.

 

É o parecer, de caráter opinativo, que prescinde de aprovação por força do art. 21 da Portaria E-CJU/Patrimônio/CGU/AGU n° 1/2020 – Regimento Interno da e-CJU/Patrimônio, publicada no Suplemento B do BSE nº30, de 30 de julho de 2020.

 

 

São Paulo, 17 de janeiro de 2023.

 

 

LUCIANA MARIA JUNQUEIRA TERRA

ADVOGADA DA UNIÃO

 

 


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