ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA DA UNIÃO ESPECIALIZADA VIRTUAL DE PATRIMÔNIO
NÚCLEO JURÍDICO
PARECER n. 00060/2023/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU
NUP: 04972.004499/2017-44
INTERESSADOS: ITAPEMA BEACH PLACE EMPREENDIMENTOS S/A E OUTROS
ASSUNTOS: CESSÃO DE USO ONEROSA DE ESPAÇO FÍSICO EM ÁGUAS PÚBLICAS (ESPELHO D'ÁGUA).
EMENTA: Cessão de uso onerosa de espaço físico em águas públicas (espelho d'água) em área contígua a imóvel da União acrescido de marinha. Art. 18, § 7º, da Lei 9.636 de 15 de mail de 1998.
Inexigibilidade de licitação. Inviabilidade de competição não cabalmente demonstrada. Necessidade de complementar a instrução e demonstrar que o acrescido não pode ser licitado. Art. 74, caput e inciso V e § 5º da Lei 14.133 de 1º de abril de 2021.
Instrução do processo. Não identificada a "demonstração de interesse público, social ou de aproveitamento econômico de interesse nacional, de que trata o art. 5º [da Portaria SPU/ME nº 5.629, de 23 de junho de 2022], no caso de cessão a particulares".
Minuta contratual. Ajustes pontuais.
Trata-se de processo encaminhado pela SPU de Santa Catarina, distribuído nesta e-CJU segundo as regras ordinárias. Recebido em 24/01/2023, aproximadamente às 16:00 para análise e parecer.
O processo foi iniciado para tratar da cessão de uso onerosa de espaço físico em águas públicas (espelho d'água) em área contígua a imóvel da União. Posteriormente alterado para ceder também acrescido de marinha, este contíguo a imóvel sob regime de ocupação.
No sistema Sapiens constam 4 arquivos: 3 e-mails e o r. Parecer 00921/2021/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU.
O e-mail do sequencial 4 no Sapiens fornece um link de acesso ao processo SEI. Este contém 125 arquivos, com o seguinte conteúdo, na ordem em que são exibidos
8200712 - Memorial descritivo;
8200713 - Planta baixa;
8200714 - Mapa com a LPM;
8200715 - Ata da Assembleia da requerente, Itapema Beach Place Empreendimentos S/A; (e anos a contar de 25 de agosto 2014: Luiz Carlos Dal Bianco Marchiori - presidente - e Mirian Rose Tucci Marchiori - diretora). Representação por dois diretores ou diretor e procurador.
8200716 - CNH Luiz Carlos Dal Bianco Marchiori;
8200717 - Cópia da ata 8200715;
8200718 - Planta baixa;
8200719 - Certidão vintenária do imóvel;
8200720 - Transcrição da matrícula do imóvel;
8200721 - Recibo de tributos municipais de 1983;
8200722 - Planta baixa/croqui do empreendimento;
8200723 - Planta baixa;
8200724 - ART/CREA;
8200725 - ART/CREA;
8200726 - Memorial descritivo;
8200728 - Consulta de viabilidade nº 6352, Prefeitura Municipal de Itapema/SC;
8200729 - Ofício nº 120/2017 FAACI - declara que as estruturas estão instaladas há mais de 30 anos e não concorrem com a integridade ambiental da área.
8200730, 8200731, 8200732, 8200734, 8200735 - Fotos do local;
8200736 - Requerimento (6.733,42m² de espelho d'água);
8200737 - Despacho SPU. Encaminhamento interno (CODES);
8200738 - Despacho CODES, de 01 de outubro de 2019:
"Primeiramente informamos que há possibilidade de Regularização da Marina existente, segundo a Portaria 404/2012 SPU/MP, desde que exista para sua operação Licença Ambiental expedida e válida por órgão membro do SISNAMA, Capitania dos Portos e Prefeitura, mediante o protocolo na SPU da documentação proposta especificada no Art.9o da Portaria supracitada, que transcrevo:
(...)
Todos os pedidos serão analisados e será ou não concedida a cessão de acordo com a conveniência e oportunidade, sem ferir os princípios legais ou qualquer legislação em vigor.
Ocorre ainda que, para a regularização de trapiches e espaços em água é necessário regularizar a área da União em terra que faz testada com o espaço aquático. Desta forma, informa-se que é necessária a solução das pendências relacionadas à regularização da ocupação existente do terreno adjacente, conforme autos do processo 04972.003387/2018-57, para então prosseguir com o andamento do requerimento em pauta (SC00437/2017)."
8200739 - Despacho NUDEPU/SPU/SC. Solicita barramento em 21 de maio de 2020;
8247342 - Despacho. Reitera necessidade de regularização da área em terra.
10849945 - Mapa do local com memorial descritivo e coordenadas;
10859834 - Consulta ao CNPJ (ativo);
11024542 - Ofício SEI Nº 253529/2020/ME - Consulta órgão ambiental local;
11085318, 11305077 - Encaminhamento do ofício 253529;
12026200, 12026245 e 12026297 - Resposta do Órgão Ambiental;
12854462 - CNH da Sra. Pilar Emília Noziglia Lacerda;
12854463 - Procuração (Itapema Beach Place Empreendimentos S/A para Pilar Emilia);
12854464 - Requerimento de habilitação da procuradora no processo;
12532573 - Notificação SEI nº 33/2020/NUDEP/COORD/SPU-SC/SPU/SEDDM-ME - Informa ao requerente a necessidade de complementar a documentação;
12875674 e 13675552 - Encaminhamento da notificação e recibo;
13675553 - Requerimento da Procuradora (Sra. Pilar);
14792322 e 16270545 - E-mail à Procuradora e recibo;
16270548 - Pedido de prorrogação de prazo
16413920 e 16413921 - CNH de Pilar Emília Noziglia Lacerda (2x)
16413922 - Procuração (Itapema Beach Place Empreendimentos S/A para Pilar Emilia);
16413923 - Requerimento de regularização (4,393.04 m² - acrescido);
18047180 a 18047185 - Documentos anexados pelo interessado;
18047186 - Ofício nº 744/Delitajaí - MB. Capitania dos Portos informa não objeções à regularização;
18047187 - Planta de localização;
18047190 - Planta de situação;
18047191 - Planta da estrutura náutica;
18047193 - ART/CREA;
18047195 - Tabela com informações do local;
18047196 - Requerimento/recurso adm.
19095674 - Despacho, informando movimentação de documentos para o processo principal.
19167165 - Checklist;
19187496 - Despacho interno. Determina confecção de polígono do espelho d'água;
19188233 - E-mail ao interessado, informando a necessidade de complementar documentos (conforme checklist);
19301167 - Mapa;
19301181 - Despacho interno;
19739116, 19739117 e 19739118 - Recibo e requerimento do interessado, com documentos;
19968534 e 20073371 - E-mails ao interessado esclarecendo pendências;
20157338 - Despacho interno determinando avaliação;
19943356, 19943357, 19943360 - Recibo, requerimento e novos documentos do interessado;
20276169 - Dúvida jurídica à CJU. Indaga se é caso de inexigibilidade ou dispensa de licitação.
20848355 - E-mail ao interessado, informando pendências.
20865049 - Despacho: questiona "a real necessidade de elaborar laudo de avaliação do imóvel";
20878396 - Despacho: solicita "suporte técnico para aplicação do artigo 33 da Instrução Normativa nº 5, de 28 de novembro de 2018"
20900536 - Despacho: calcula os valores devidos, inclusive atrasados;
20973010 e 20973028 - E-mail e Parecer, respondendo a dúvida jurídica exposta;
21228008, 21228014 e 21228029 - Cadastro SPIUnet;
21287716 - Arquivo compactado .7z. Não consegui acesso.
21377309, 21377310, 21377313 e 21377314 - Recibo, requerimento, manifestação da Capitania e parecer do órgão ambiental;
21377315 - Comprovante de residência do sr. Luiz Carlos Marchiori
21377319 - Memorial descritivo;
21392402 e 22283274 - Despacho: verifica problemas de arredondamento de valores;
21031121 - Minuta do Termo de Inexigibilidade de Licitação;
21031151 - Minuta de Ratificação de Inexigibilidade de Licitação;
19929796 - Minuta do contrato, que trata não só do espelho d'água, mas também do acrescido de marinha.
19929712 - Nota Técnica SEI nº 52453/2021/ME, que conclui:
Pela análise da documentação apresentada, não encontramos óbices quanto à cessão onerosa à Itapema Beach Place Empreendimentos S/A.
Ressaltamos a necessidade de confecção de um contrato com cláusula que estabeleça o acesso irrestrito às praias adjacentes à área do imóvel objeto do presente processo de cessão.
Ressaltamos que a análise quanto a conveniência e oportunidade é atributo dos Grupos Especiais de Destinação Supervisionadas instituídos por meio da Portaria SEDDM/ME nº 7397, de 24 de junho de 2021.
22376861 - Despacho de encaminhamento interno;
23821521 - Despacho, onde a CGDLI "entende que o pleito encontra-se apto - com ressalvas (ausência de laudo de avaliação) - a ser submetido ao crivo do Grupo Especial de Destinação Supervisionada (GE-DESUP), nível 1, conforme determinado pela Portaria nº 7.397, de 24 de junho de 2021, que, deliberado favoravelmente, deverá ser restituído à Superintendência do Patrimônio em Tocantins - SPU/SC, para prosseguimento dos trâmites de acordo com a deliberação contida em Ata de Reunião".
23899590 - Checklist, concluindo: "os autos se encontram devidamente instruídos para prosseguimento do trâmite administrativo, em conformidade com a Portaria SEDDM/ME nº 7.397, de 24 de junho de 2021, para submissão ao crivo do Grupo Especial de Destinação Supervisionada".
25286332 - Ata do Grupo Especial de Destinação Supervisionada (GE-DESUP-1 DIN), aprovando a destinação proposta.
25307540 - Despacho: submete a dispensa de inexigibilidade à Secretária de Coordenação e Governança, para ratificação e publicação;
25308525 - Termo de Inexigibilidade de Licitação;
25308622 a 25665645 - Ratificação da inexigibilidade, extrato para publicação e publicação no DO.
25992756 e 25992757 - Recibo e requerimento, pedindo a aplicação do art. 6º da Portaria 404/2012 e exclusão da cobrança do espelho d'água.
25992761 - Planta de situação com indicação do acesso;
25992764 - Memorial descritivo;
26666073, 26666074 e 26666083 - Recibo, requerimento, planta e memorial. Interessado requer a redução da área do espelho d'água e benefício do art. 18-A da Lei 9.636/98 (redução de 50%);
29930526 - Nota Técnica SEI nº 53785/2022/ME, que aprecia os requerimentos do interessado e conclui:
Quanto à solicitação de revisão da área considerada para o cálculo do valor de retribuição, a Portaria 5.629 é clara quanto a utilização da "área de utilização privativa do espaço físico em águas públicas federais" para o cômputo do valor do preço público anual da cessão de uso onerosa. Desta maneira, esta SPU-SC-NUDEPU entende que o pleito do interessado é procedente.
Quanto à utilização da nova equação de cômputo do valor do preço público anual da cessão onerosa constante da nova Portaria SPU/ME 5.629, considera-se que o valor atual do preço público anual a ser cobrado do interessado deverá passar por revisão, através de elaboração de nova avaliação conforme a equação prevista na nova Portaria SPU/ME 5.629. Para o cômputo dos valores retroativos, no entanto, entende-se que vale a forma de cobrança então vigente, ou seja, para o cálculo dos valores do preço público a serem cobrados pelo uso pretérito da área deverá ser utilizada a equação prevista na Portaria 404 então vigente.
Quanto à solicitação de desconto de 50% pela utilização pretérita da área, conforme artigo 18-A da Lei 9.636/98, este setor entende que o pleito do interessado é improcedente, haja vista que o requerimento de regularização (SEI/ME 8200736) data de 05 de abril de 2017, portanto é anterior à publicação da Lei 13.465, de 11 de julho de 2017, que inclui a redação do artigo 18-A na Lei 9.636. Entendimento prévio já foi manifestado pela Consultoria Jurídica da União em seu parecer n. 00428/2021/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU, em que esta se manifesta quanto à "Impossibilidade de retroagir para prejudicar o ato jurídico perfeito".
(...)
Recomenda-se a elaboração de nova avaliação da área com o cômputo do valor de retribuição atual. Os valores a serem cobrados pelo uso pretérito devidamente atualizados devem ser calculados no momento da assinatura do contrato.
30427125 e 31022479 - E-mail com documentos pedindo reconsideração da parte indeferida (desconto);
31035368 - Minuta do contrato de cessão de uso onerosa.
31047134 - Nota Técnica SEI nº 2159/2023/ME, reconsiderando, ante a data da MPv 759/2016 e entendendo que "Cabe a aplicação do desconto de 50% de que trata o Art. 18-A da LEI Nº 9.636, DE 15 DE MAIO DE 1998" e sugerindo o encaminhamento dos autos à CJU para análise da minuta do contrato.
31112257- Despacho, aprovando a Nota 2159 e encaminhando o processo para nova avaliação e análise da minuta.
Tudo lido e analisado, é o relatório.
Como sabemos, em vigor a Lei 14.133 de 01 de abril de 2021, que dispõe:
Art. 53. Ao final da fase preparatória, o processo licitatório seguirá para o órgão de assessoramento jurídico da Administração, que realizará controle prévio de legalidade mediante análise jurídica da contratação.
§ 1º Na elaboração do parecer jurídico, o órgão de assessoramento jurídico da Administração deverá:
I - apreciar o processo licitatório conforme critérios objetivos prévios de atribuição de prioridade;
II - redigir sua manifestação em linguagem simples e compreensível e de forma clara e objetiva, com apreciação de todos os elementos indispensáveis à contratação e com exposição dos pressupostos de fato e de direito levados em consideração na análise jurídica;
III - (VETADO).
§ 2º (VETADO).
§ 3º Encerrada a instrução do processo sob os aspectos técnico e jurídico, a autoridade determinará a divulgação do edital de licitação conforme disposto no art. 54.
§ 4º Na forma deste artigo, o órgão de assessoramento jurídico da Administração também realizará controle prévio de legalidade de contratações diretas, acordos, termos de cooperação, convênios, ajustes, adesões a atas de registro de preços, outros instrumentos congêneres e de seus termos aditivos.
§ 5º É dispensável a análise jurídica nas hipóteses previamente definidas em ato da autoridade jurídica máxima competente, que deverá considerar o baixo valor, a baixa complexidade da contratação, a entrega imediata do bem ou a utilização de minutas de editais e instrumentos de contrato, convênio ou outros ajustes previamente padronizados pelo órgão de assessoramento jurídico.
§ 6º (VETADO)
Art. 192. O contrato relativo a imóvel do patrimônio da União ou de suas autarquias e fundações continuará regido pela legislação pertinente, aplicada esta Lei subsidiariamente.
Não se insere na atribuição do órgão jurídico a análise do conteúdo técnico dos respectivos atos e documentos que instruem o processo licitatório, e cuja responsabilidade limita-se aos seus emissores.
Nessa esteira, colhe-se o seguinte enunciado do Tribunal de Contas da União (TCU): "Não é da competência do parecerista jurídico a avaliação de aspectos técnicos para adoção do regime de contratação integrada (art. 9º da Lei 12.462/2011)" - Informativo de licitações e contratos 417/2021. Acórdão 1492/2021.
Como narrado acima, o processo foi inicialmente instaurado para regularizar a utilização exclusiva do espelho d'água pelo interessado, pessoa jurídica com fins lucrativos.
A opção original da SPU, como relatado, era aguardar a
"a solução das pendências relacionadas à regularização da ocupação existente do terreno adjacente, conforme autos do processo 04972.003387/2018-57, para então prosseguir com o andamento do requerimento em pauta (SC00437/2017)."
No curso do procedimento, no entanto, foi incluída a regularização de terreno acrescido de marinha com 4.393.04 m² situado entre o imóvel objeto de regular ocupação e o mar, e passou-se a tratar tanto do espelho d'água quanto deste acrescido.
As plantas anexadas aos autos (por exemplo 2561077) mostram que o espelho d'água não é contíguo ao RIP 8163.0102778-95. A área do RIP, que, ao que consta, está ocupada, não toca no espelho d'água, justamente porque entre ela e o mar existe o acrescido.
De acordo com o mapa, é a seguinte sequência de imóveis (da terra para o mar):
- área do RIP 8163.0102778-95;
- Acrescido com 4.393.04 m²;
- Espelho d'água.
A lei dispõe:
Art. 18. A critério do Poder Executivo poderão ser cedidos, gratuitamente ou em condições especiais, sob qualquer dos regimes previstos no Decreto-Lei no 9.760, de 1946, imóveis da União a:
I - Estados, Distrito Federal, Municípios e entidades sem fins lucrativos das áreas de educação, cultura, assistência social ou saúde; (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007)
II - pessoas físicas ou jurídicas, em se tratando de interesse público ou social ou de aproveitamento econômico de interesse nacional. (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007)
§ 1o A cessão de que trata este artigo poderá ser realizada, ainda, sob o regime de concessão de direito real de uso resolúvel, previsto no art. 7º do Decreto-Lei nº 271, de 28 de fevereiro de 1967, aplicando-se, inclusive, em terrenos de marinha e acrescidos, dispensando-se o procedimento licitatório para associações e cooperativas que se enquadrem no inciso II do caput deste artigo. (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007)
§ 2o O espaço aéreo sobre bens públicos, o espaço físico em águas públicas, as áreas de álveo de lagos, rios e quaisquer correntes d’água, de vazantes, da plataforma continental e de outros bens de domínio da União, insusceptíveis de transferência de direitos reais a terceiros, poderão ser objeto de cessão de uso, nos termos deste artigo, observadas as prescrições legais vigentes.
(...)
§ 7o Além das hipóteses previstas nos incisos I e II do caput e no § 2o deste artigo, o espaço aéreo sobre bens públicos, o espaço físico em águas públicas, as áreas de álveo de lagos, rios e quaisquer correntes d’água, de vazantes e de outros bens do domínio da União, contíguos a imóveis da União afetados ao regime de aforamento ou ocupação, poderão ser objeto de cessão de uso. (Incluído pela Lei nº 12.058, de 2009) (Vide ADIN 4970)
Ou seja, o espaço físico em águas públicas, no caso, não é contíguo a imóvel sob regime de ocupação: o espelho d'água é contíguo ao acrescido que, ao que consta dos autos, não está sob regime de ocupação.
A publicação "Orientações para a Destinação do Patrimônio da União" (Memorando Nº 90 - SPU/MP)
25. A Cessão, prevista nos arts. 18 a 21 da Lei 9.636/1998, no Decreto-Lei 9.760/1946 e na Lei 11.481/2007, é efetivada quando a União transfere o uso ou outros direitos reais sobre seus bens para alcançar um interesse público. Os imóveis da União poderão ser cedidos gratuitamente ou em condições especiais, de forma onerosa ou com encargos específicos, sob quaisquer dos regimes aos Estados, Distrito Federal ou Municípios; a entidades sem fins lucrativos das áreas de educação, cultura, assistência social e saúde e a pessoas físicas ou jurídicas, como as associações e cooperativas, em se tratando de interesse público ou social ou de aproveitamento econômico de interesse nacional.
28. A Cessão de Uso Onerosa, prevista na Lei 9.636/98, deve ser aplicada quando se destinar a atividade lucrativa e ações de apoio ao desenvolvimento local, como comércio, indústria, turismo etc. e, havendo condições de competitividade, deve-se respeitar o disposto na Lei 8.666/93.
Anotar ainda que o STF, na ADI 4.970/DF deu interpretação conforme ao dispositivo legal:
Decisão: O Tribunal, por unanimidade, julgou parcialmente procedente o pedido formulado na ação direta para interpretar conforme à Constituição da República o § 7º do art. 18 da Lei n.9.636/1998, acrescentado pela Lei n. 12.058/2009, adotando-se compreensão que possibilita a cessão do espaço aéreo sobre bens públicos, do espaço físico em águas públicas, das áreas de álveo de lagos, dos rios e quaisquer correntes d´água, das vazantes e de outros bens do domínio da União, contíguos a imóveis da União afetados ao regime de aforamento ou ocupação, desde que destinada a Estados, Distrito Federal, Municípios ou entidades sem fins lucrativos nas áreas de educação, cultura, assistência social ou saúde, ou a pessoas físicas ou jurídicas, nesse caso demonstrado o interesse público ou social, nos termos do voto da Relatora.
Falou, pelos interessados, o Dr. Thiago Carvalho Barreto Leite, Advogado da União.
Plenário, Sessão Virtual de 3.9.2021 a14.9.2021.
No presente caso, a Requerente é pessoa jurídica de direito privado que tem por objetivo a execução de empreendimento de fim lucrativo. Portanto, o pleito estaria, como regra, sujeito a prévio procedimento licitatório, conforme o § 5º do art. 18 da Lei nº 9.636/1998.
§ 5º Na hipótese de destinação à execução de empreendimento de fim lucrativo, a cessão será onerosa e, sempre que houver condições de competitividade, serão observados os procedimentos licitatórios previstos em lei e o disposto no art. 18-B desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 13.813, de 2019)
Em caso de implantação de estruturas náuticas, há quase sempre uma necessária vinculação da parte terrestre, como área de acostagem ou retro área, com o espaço físico em águas públicas, o que tornaria inexigível a licitação para o espelho d'água. Mas no caso, como visto, a parte terrestre objeto de ocupação não é contígua.
Portanto, irregular a parte terrestre (contígua) a ser cedida, parece-nos que a inexigibilidade de licitação não foi corretamente fundamentada:
DECLARO que a Cessão Onerosa do imóvel de propriedade da União, acima identificado, realizar-se-á diretamente à Itapema Beach Place Empreendimentos S/A., pessoa jurídica de direito privado, com fundamento nos seguintes dispositivos: 1) a Itapema Beach Place Empreendimentos S/A. informou, por meio do requerimento SC00437/2017 (SEI 8200736), que o início da ocupação se deu em 17 de fevereiro de 1983; 2) o requerente ocupa área em terra, contígua à de espelho d'água e de acrescido de marinha, que requer, de acordo com a Certidão SPU-SC-NUPRIV (SEI 10410884); 3) por terra parece não haver outra possibilidade de acesso à área de espelho d'água e acrescido de marinha sem que se faça a utilização da área contígua em terra (regularmente ocupada pelo requerente, conforme Mapa de Caracterização (SEI 19301167), caracterizando assim, a inviabilidade de competição, o que justifica a aplicação do art. 18, parágrafo 7º, da Lei nº 9.636, de 15 de maio de 1998, ouvindo-se previamente o respectivo órgão de assessoramento jurídico, do regime excepcional previsto no art. 25, caput, da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, e de acordo com o que consta no Processo Administrativo no 04972.004499/2017-44.
Melhor explicando, parece-nos que ocorre um "salto" lógico na declaração de inexigibilidade, data venia. O interessado ocupa um imóvel que é contíguo ao acrescido - irregular com mais de 4 mil metros quadrados - que por sua vez é contíguo ao espelho d'água.
Logo, antes de declarar que a competição é impossível, ao nosso juízo deveria a SPU avaliar se o acrescido sozinho pode constituir unidade autônoma e, portanto, deve ser licitado.
A falta de acesso à via pública da parte terrestre, por si só, não inviabiliza a competição, pois o direito civil contém solução para tais casos (servidão de passagem, etc).
Além disso, as fotos anexadas aos autos deixam claro que existem praias ao lado do acrescido, e o acesso à praia não pode ser obstado. O que sugere que existe outro acesso, ainda que não seja o mais confortável.
Outro detalhe que merece alguma atenção é a expressão "parece" na justificativa, que denota a falta de certeza, e é incompatível com a declaração de inviabilidade de competição. Pedimos vênia para transcrever:
3) por terra parece não haver outra possibilidade de acesso à área de espelho d'água e acrescido de marinha sem que se faça a utilização da área contígua em terra
Note-se que a Nova Lei das Licitações, aplicável subsidiariamente, determina:
Art. 74. É inexigível a licitação quando inviável a competição, em especial nos casos de:
I - aquisição de materiais, de equipamentos ou de gêneros ou contratação de serviços que só possam ser fornecidos por produtor, empresa ou representante comercial exclusivos;
II - contratação de profissional do setor artístico, diretamente ou por meio de empresário exclusivo, desde que consagrado pela crítica especializada ou pela opinião pública;
III - contratação dos seguintes serviços técnicos especializados de natureza predominantemente intelectual com profissionais ou empresas de notória especialização, vedada a inexigibilidade para serviços de publicidade e divulgação:
a) estudos técnicos, planejamentos, projetos básicos ou projetos executivos;
b) pareceres, perícias e avaliações em geral;
c) assessorias ou consultorias técnicas e auditorias financeiras ou tributárias;
d) fiscalização, supervisão ou gerenciamento de obras ou serviços;
e) patrocínio ou defesa de causas judiciais ou administrativas;
f) treinamento e aperfeiçoamento de pessoal;
g) restauração de obras de arte e de bens de valor histórico;
h) controles de qualidade e tecnológico, análises, testes e ensaios de campo e laboratoriais, instrumentação e monitoramento de parâmetros específicos de obras e do meio ambiente e demais serviços de engenharia que se enquadrem no disposto neste inciso;
IV - objetos que devam ou possam ser contratados por meio de credenciamento;
V - aquisição ou locação de imóvel cujas características de instalações e de localização tornem necessária sua escolha.
§ 1º Para fins do disposto no inciso I do caput deste artigo, a Administração deverá demonstrar a inviabilidade de competição mediante atestado de exclusividade, contrato de exclusividade, declaração do fabricante ou outro documento idôneo capaz de comprovar que o objeto é fornecido ou prestado por produtor, empresa ou representante comercial exclusivos, vedada a preferência por marca específica.
§ 2º Para fins do disposto no inciso II do caput deste artigo, considera-se empresário exclusivo a pessoa física ou jurídica que possua contrato, declaração, carta ou outro documento que ateste a exclusividade permanente e contínua de representação, no País ou em Estado específico, do profissional do setor artístico, afastada a possibilidade de contratação direta por inexigibilidade por meio de empresário com representação restrita a evento ou local específico.
§ 3º Para fins do disposto no inciso III do caput deste artigo, considera-se de notória especialização o profissional ou a empresa cujo conceito no campo de sua especialidade, decorrente de desempenho anterior, estudos, experiência, publicações, organização, aparelhamento, equipe técnica ou outros requisitos relacionados com suas atividades, permita inferir que o seu trabalho é essencial e reconhecidamente adequado à plena satisfação do objeto do contrato.
§ 4º Nas contratações com fundamento no inciso III do caput deste artigo, é vedada a subcontratação de empresas ou a atuação de profissionais distintos daqueles que tenham justificado a inexigibilidade.
§ 5º Nas contratações com fundamento no inciso V do caput deste artigo, devem ser observados os seguintes requisitos:
I - avaliação prévia do bem, do seu estado de conservação, dos custos de adaptações, quando imprescindíveis às necessidades de utilização, e do prazo de amortização dos investimentos;
II - certificação da inexistência de imóveis públicos vagos e disponíveis que atendam ao objeto;
III - justificativas que demonstrem a singularidade do imóvel a ser comprado ou locado pela Administração e que evidenciem vantagem para ela.
Portanto, não há espaços para dúvidas. Ou a competição é inviável e a licitação é inexigível ou a competição é viável e deve ser feita licitação (se não houver motivo legal para dispensá-la).
Assim, parece-nos que é imprescindível caracterizar de forma robusta a impossibilidade de competição, ou, sendo viável esta, realizar o procedimento licitatório.
Após detida análise, parece-nos que o processo está regularmente instruído, na forma do Art. 10 da Portaria SPU/ME nº 5.629, de 23 de junho de 2022, exceto em relação ao item IV que não foi identificada:
IV - demonstração de interesse público, social ou de aproveitamento econômico de interesse nacional, de que trata o art. 5º, no caso de cessão a particulares;
Nenhuma outra impropriedade foi detectada.
A SPU/SC corretamente utilizou como base a minuta trazida no Anexo I da Portaria nº 11.190, de 1º de novembro de 2018, que foi um pouco alterada pela Portaria SPU/ME nº 5.629, de 23 de junho de 2022. Esta determina:
Art. 9º Nos casos de cessão onerosa ou de cessão em condições especiais, o contrato estabelecerá, sem prejuízo de outras condições:
I - valor anual devido pelo uso privativo da área da União;
II - valor relativo à ocupação não autorizada até a data da efetiva regularização com a assinatura do contrato, se for o caso;
III - prazo de carência para início do pagamento e condições para sua quitação, quando for o caso, com vencimento da primeira parcela no último dia útil do mês subsequente ao término da carência;
IV - correção anual do valor contratado, utilizando-se Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo - IPCA, divulgado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE, ou índice que vier a substituí-lo;
V - valor da retribuição à União será pago em parcelas mensais e sucessivas vencíveis no último dia útil de cada mês;
VI - vencimento da primeira parcela ocorrerá no último dia útil do mês subsequente ao da assinatura do contrato ou do aditivo contratual;
VII - previsão dos seguintes acréscimos para as parcelas não pagas até a data do vencimento:
a) multa de mora, calculada à taxa de 0,33% (trinta e três centésimos por cento), por dia de atraso, até o limite de 20% (vinte por cento); e
b) juros de mora equivalentes à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic) para títulos federais, acumulada mensalmente, do primeiro dia do mês posterior ao vencimento até o mês anterior ao efetivo pagamento, acrescida de 1% (um por cento) relativo ao mês do pagamento.
VIII - forma de parcelamento pactuada entre o cessionário e a União, se for o caso;
IX - rescisão contratual no caso de inadimplemento de parcela, total ou parcial, por prazo superior a 90 dias; e
X - revisão a qualquer tempo do valor da retribuição, desde que comprovada a existência de fatores supervenientes que alterem o equilíbrio econômico do contrato, nos termos da legislação vigente.
§ 1º Nos casos de contratos firmados com Municípios, Estados ou Distrito Federal o pagamento da retribuição à União poderá ser feito de acordo com os incisos V e VI do caput ou em parcelas semestrais, com vencimento no último dia útil dos meses de junho e dezembro de cada ano, sendo que o vencimento da primeira parcela ocorrerá no último dia útil dos meses junho ou dezembro subsequentes ao término da carência, quando for o caso.
§ 2º O valor de que trata o inciso II do caput será calculado observando-se as seguintes premissas:
I - utilização das metodologias vigentes à época, a partir da data de conhecimento pela União da ocupação não regularizada, observadas as regras de prescrição e decadência; e
II - após calculado o montante devido, a atualização do mesmo a valor presente até a data da efetiva regularização pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo - IPCA, divulgado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE, ou índice que vier a substituí-lo.
Falta à minuta do contrato o "valor relativo à ocupação não autorizada até a data da efetiva regularização com a assinatura do contrato, se for o caso", devendo ser complementada a cláusula oitava para indicá-lo.
Outro ponto que merece atenção é a representação da empresa interessada no processo. A documentação trazida aos autos pela própria empresa está defasada e, ao menos em análise sumária, o Diretor Presidente deverá assinar conjuntamente com outro Diretor ou com Procurador (SEI 8200715). A questão pode ser abordada quando da assinatura, quando devem ser apresentados os documentos atualizados.
O objeto do contrato ("descrição do imóvel objeto do contrato") não levou em conta a redução de área acatada na Nota Técnica SEI nº 53785/2022/ME, devendo ser retificada. Observar as ponderações sobre o tema no próximo tópico.
Falta ao contrato cláusula que assegure o acesso à praia, como bem anotado na Nota Técnica SEI nº 52453/2021/ME. É certo que o item XIV da Cláusula Décima Segunda prevê a rescisão caso o cessionário coloque obstáculos, mas é de grande valia inserir a obrigação na cláusula sexta, onde melhor couber, para sepultar qualquer especulação sobre o tema.
Como dito acima, não cabe à Assessoria Jurídica tratar dos aspectos técnicos, mas um pequeno ponto chamou a atenção e merece ser mencionado para avaliação do gestor, se entender oportuno.
O fato é que o interessado reduziu bastante a área do espelho d'água em seus últimos requerimentos e o pedido de redução foi acatado.
No entanto, observando o anexo 26666083, a impressão, para o leigo, é de que a redução foi indevida, ao menos em parte.
Isso porque a própria foto anexada mostra que até os barcos atracados estão fora da área a ser cedida, o que não parece ser correto, já que a área de utilização privativa deve compreender não só a parte da estrutura física, mas também a parte que for fechada a terceiros.
Como dito acima, não nos cabe fazer tal análise, até por falta de capacidade técnica no tema. Mas é estranho que a "área de manobra" dentro de um píer (que é um semi círculo) seja considerada como de uso "não exclusivo". Seria interessante saber se a empresa permitiria que algum barco estranho ancorasse em tal local.
Assim, sugere-se ao gestor que avalie com cautela a área a ser cedida, para que o particular não se aproveite gratuitamente de área que, ao que parece, tenderá a tratar como exclusiva.
Ante o exposto, adota-se o seguinte entendimento:
a) É imprescindível caracterizar de forma robusta a impossibilidade de competição, especialmente verificando se o acrescido (parte terrestre) sozinho pode constituir unidade autônoma; sendo viável a competição, necessário realizar o procedimento licitatório;
b) se superado o item acima, falta ao processo a "demonstração de interesse público, social ou de aproveitamento econômico de interesse nacional, de que trata o art. 5º [da Portaria SPU/ME nº 5.629, de 23 de junho de 2022], no caso de cessão a particulares";
c) necessário acrescer ao contrato o "valor relativo à ocupação não autorizada até a data da efetiva regularização com a assinatura do contrato, se for o caso", devendo ser complementada a cláusula oitava para indicá-lo.
d) atentar para a correta representação da empresa interessada, quando da assinatura do contrato.
e) ajustar o objeto do contrato ("descrição do imóvel objeto do contrato") que não levou em conta a redução de área acatada na Nota Técnica SEI nº 53785/2022/ME. Se mantida a redução da área (vide item "g" abaixo), deve ser feita a correção.
f) inserir a obrigação de permitir o acesso de qualquer do povo às praias na cláusula sexta, como melhor couber, para sepultar qualquer especulação sobre o tema.
g) sugere-se ainda avaliar se a redução de área no espelho d'água acatada na Nota Técnica SEI nº 53785/2022/ME deve ser mantida, ou se a área excluída será, de fato, utilizada com exclusividade pela cessionária.
Dispensada a aprovação do Exmo. Coordenador, é o parecer.
Brasília, 26 de janeiro de 2023.
LUÍS EDUARDO NOGUEIRA MOREIRA
ADVOGADO DA UNIÃO
Atenção, a consulta ao processo eletrônico está disponível em https://supersapiens.agu.gov.br mediante o fornecimento do Número Único de Protocolo (NUP) 04972004499201744 e da chave de acesso 8bdb88d9