ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA DA UNIÃO ESPECIALIZADA VIRTUAL DE PATRIMÔNIO
NÚCLEO JURÍDICO


PARECER n. 100/2023/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU

PROCESSO 19739.122741/2022-68

ORIGEM: SUPERINTENDÊNCIA REGIONAL DO PATRIMÔNIO DA UNIÃO NO ESTADO DO CEARÁ - SPU/CE

 

EMENTA: PATRIMÔNIO DA UNIÃO. PRAIAS. FISCALIZAÇÃO. RECOMENDAÇÃO DO MPF.
I Consulta. Infração Administrativa. Decreto-Lei n.º 2.398/87.
II Possibilidade de aplicação imediata de penalidade.
III Multa aplicável mensalmente enquanto perdurar a infração,  ser cobrada desde o início da irregularidade.
IV - O deferimento de parte dos argumentos da defesa não implica na anulação do Auto de Infração e sanções correlatas, a qual somente poderá ocorrer caso identificado, em decisão motivada, com a indicação dos fatos e fundamentos jurídicos em que se baseia, a existência de vício(s) ou defeitos cuja convalidação não seja juridicamente viável, ou quando o ato administrativo padecer de vício de legalidade insanável.
V - As recomendações exaradas pelo Ministério Público Federal não são obrigatórias, impositivas, cogentes ou sancionatórias, representando tão somente entendimento do aludido órgão sobre determinada questão. Eventual descumprimento das sugestões contidas nas Recomendação poderá ensejar o ajuizamento de ação judicial por parte do Ministério Público Federal.
 
 

Retornam a esta Consultoria Jurídica especializada da Advocacia-Geral da União, processo administrativo encaminhado pela Superintendência do Patrimônio da União no Ceará referente à aplicação de multa decorrente de lavratura de Auto de Infração nos autos relativos à fiscalização iniciada por recomendação do Ministério Público Federal em que ficou patente a OCUPAÇÃO IRREGULAR EM BEM DE USO COMUM DO POVO - PRAIA. PLANTAÇÃO DE COQUEIROS CERCAS DE CACTOS, VEGETAÇÃO DIVERSA, GRAMA,  pelo CONDOMÍNIO ESCOPA BEACH RESORT, em Porto das Dunas, Aquiraz/CE, Coordenadas: 567868 9547675 UTM 24S.

Os autos já foram analisados através do PARECER n. 00040/2023/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU (seq.3 sei 30965683), cuja ementa ficou consignada:

 
EMENTA: PATRIMÔNIO DA UNIÃO. PRAIAS. FISCALIZAÇÃO.
I Consulta. Infração Administrativa. Decreto-Lei n.º 2.398/87.
II Possibilidade de aplicação imediata de penalidade.
III Multa aplicável mensalmente enquanto perdurar a infração,  ser cobrada desde o início da irregularidade.
IV - O deferimento de parte dos argumentos da defesa não implica na anulação do Auto de Infração e sanções correlatas, a qual somente poderá ocorrer caso identificado, em decisão motivada, com a indicação dos fatos e fundamentos jurídicos em que se baseia, a existência de vício(s) ou defeitos cuja convalidação não seja juridicamente viável, ou quando o ato administrativo padecer de vício de legalidade insanável.

 

O cerne da questão ficara determinado pelo fato de após o recebimento da defesa, o órgão consulente ter enveredado por nova vistoria e verificado que a área ocupada irregularmente seria bem menor daquela apontada no Auto de Infração, reduzindo-se, consequentemente, o valor da multa de R$ 438.408,96 para R$ 43.320,91 e culminando com a dúvida de como deveria ser procedida a cobrança da multa mensal e automática:

a) Anulado o Auto de Infração 09/2022 - Assinado (SEI nº 25740779) e aplicado um novo Auto de Infração, tendo como termo inicial para a contagem da multa mensal e automática a data da notificação do novo Auto de Infração?
b) Considerar a data de entrega do Auto de Infração 09/2022 - Assinado (SEI nº 25740779), qual seja, a data de 15/06/2022, apenas ajustando o valor da multa mensal e automática para R$ 43.320,91, possibilitando assim a cobrança de 7 (sete) meses, considerando o dia de hoje (29/12/2022)?

Como dito, o PARECER n. 00040/2023/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU (seq.3) opinou pelo deferimento parcial da defesa, mas pela manutenção do Auto de Infração, entendendo que "que apesar de a área ocupada e agredida ter sido menor, a irregularidade continuava" e que portanto, não era motivo de anulação do auto de infração, mas somente de sua correção. Como parte de seu fundamento, trouxe a entendimento fixado pelo Superior Tribunal de Justiça - STJ :

 
MULTA POR OCUPAÇÃO IRREGULAR DE TERRENO DE MARINHA. ART. 6º, II, DO DECRETO-LEI 2.398/87. TERMO INICIAL. IMPUGNAÇÃO ADMINISTRATIVA SUSPENDE APENAS A EXIGIBILIDADE DA MULTA. JULGADA IMPROCEDENTE ESTA, A MULTA É DEVIDA DESDE A NOTIFICAÇÃO INICIAL. HISTÓRICO DA DEMANDA
1. Discute-se o termo inicial de multa por ocupação irregular de terreno de marinha. O acórdão inicialmente proferido pelo Tribunal Regional Federal da 5ª Região considerou que a multa deveria ser cobrada a partir da notificação inicial, mas, após Embargos de Declaração, decidiu que, "ante a possibilidade de interposição de recurso administrativo", deve a multa começar a correr "da data da decisão administrativa que negou provimento ao recurso". TERMO INICIAL DA MULTA
2. Para punir a ocupação irregular de terrenos de marinha, o art. 6º, II, do DL 2.398/87, na redação dada pela Lei 9.636/98, previa a aplicação automática de uma multa de determinado valor por metro quadrado e por mês, que passava a incidir em dobro se, após 30 dias de notificação administrativa, a irregularidade não fosse sanada.
3. Há precedentes estabelecendo que a multa só pode ser cobrada após a decisão do recurso administrativo, mas a questão discutida no processo é como será calculada essa reparação pecuniária.
4. Como a multa tem incidência automática, nos termos do art. 6º, II, do Decreto-Lei 2.398/87, poder-se-ia cogitar do termo inicial de sua incidência ser a data em que teve início a ocupação irregular ou a da notificação inicial, mas não a do julgamento administrativo.
5. A interposição de recurso administrativo apenas suspende a exigibilidade da multa. Julgado improcedente o recurso, a multa tornar-se-á novamente exigível, sendo calculada com base no número de meses em que houve o apossamento irregular, sendo o valor mensal dobrado se, após 30 dias da notificação administrativa, a irregularidade não foi sanada.
6. Quanto a se a multa seria devida a partir da ocupação irregular ou da notificação inicial, é questão que não se coloca, pelo menos no CASO concreto, pois a União explicitamente pediu que a cobrança fosse feita apenas a partir da notificação inicial. PRECEDENTE APLICÁVEL POR ANALOGIA
7. "TRIBUTÁRIO. LANÇAMENTO FISCAL. 1. DECADÊNCIA. A partir da notificação do contribuinte, (CTN, art. 145, I), o crédito tributário já existe - e não se pede falar em decadência do direito de constitui-lo, porque o direito foi exercido - mas ainda está sujeito á desconstituição na própria via administrativa, se for impugnado. A impugnação torna litigioso o crédito, tirando-lhe a exeqüibilídade (CTN, artigo 151, III); quer dizer, o crédito tributário pendente de discussão não pode ser cobrado, razão pela qual também não se pode cogitar de prescrição, cujo prazo só inicia na data da sua constituição definitiva (CTN, art. 174). 2. PEREMPÇÃO. O tempo que decorre entre a notificação do lançamento fiscal e a decisão final da impugnação ou do recurso administrativo corre contra o contribuinte, que, mantida a exigência fazendária, responderá pelo débito originário acrescido dos juros e da correção monetária; a demora na tramitação do processo-administrativo fiscal não implica a perempção do direito de constituir definitivamente o crédito tributário, instituto não previsto no Código Tributário Nacional. Recurso especial não conhecido." (REsp 53.467/SP, Rel. Ministro Ari Pargendler, Segunda Turma, julgado em 5/9/1996, DJ 30/9/1996, p. 36613).
CONCLUSÃO
8. A multa se torna exigível a partir da notificação inicial. Feita esta, ela passa a ser cobrada em dobro após 30 dias, se não cessar a irregularidade (parte final do inciso II do art. 6º do DL2.398/87). Apresentada impugnação administrativa, a exigibilidade dessa reparação é suspensa, sendo retomada após o julgamento (se rejeitada a impugnação, naturalmente).
9. Agravo Regimental acolhido para dar provimento ao Recurso Especial para determinar que a multa deve ser cobrada a partir da notificação inicial e, afastando a sucumbência recíproca, condenar os recorridos em honorários fixados em 10% do valor do crédito exigido.
(STJ - AgRg no REsp: 1510099 RN 2014/0292889-1, Relator: Ministro HUMBERTO MARTINS, Data de Julgamento: 13/09/2016, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 27/04/2017)

 

 

Continua a referida manifestação jurídica:

"21. Com efeito, a fiscalização consiste na atividade desenvolvida pela SPU no exercício de seu PODER DE POLÍCIA ADMINISTRATIVA para apuração de infrações administrativas praticadas contra o patrimônio imobiliário da União conforme arcabouço legal e normativo vigente, constituindo a lavratura de Auto de Infração e aplicação de multa (sanção administrativa), consectários/desdobramentos lógicos da regular tramitação do processo administrativo instaurado.

22. Por esta razão, a verificação de que a irregularidade está encravada em área menor não implica na anulação do Auto de Infração e sanções correlatas, mas tão somente em sua adequação, por reconhecimento de que o autuado demonstrou parcialmente razão em sua narrativa.

23. Sob esse prisma, o ato fiscalizatório oriundo da atividade de polícia administrativa, para ser considerado legítimo, necessita, como ocorre com qualquer ato administrativo, estar revestido de todos os requisitos de validade, ou seja, ser praticado por agente público no exercício regular de sua competência, ser produzido segundo a  forma imposta em lei, além se revestir dos requisitos da finalidade, motivo e objeto (conteúdo). Em síntese, o ato de polícia, espécie do gênero ato administrativo, é considerado legal caso esteja em consonância com os requisitos exigidos para sua validade.

24. A competência consiste no requisito de validade segundo o qual o ato administrativo praticado se insere do feixe de atribuições legais e regulamentares do agente público que o praticou. A forma significa a observância das formalidades indispensáveis à existência ou regularidade do ato. A finalidade  representa  a pratica o ato por agente investido de competência em consonância com o fim previsto, expressamente ou implicitamente, na regra de competência. O motivo abrange a matéria de fato (fática) e de direito (jurídica) que fundamenta a prática do ato, sendo materialmente e juridicamente adequado ao resultado obtido. Já o objeto, condiz na alteração no mundo jurídico que o ato administrativo almeja implementar, correspondendo ao objetivo imediato da vontade exteriorizada pelo ato do agente público preordenado a determinado fim.

 

Inconformado com o teor da Manifestação Jurídica, o Ministério Público Federal encaminhou recomendação (SEI 31143796) à Superintendência do Patrimônio da União no Ceará para que não adotasse o entendimento supra e anulasse o

"auto de infração nº 09/2022, aplicado ao Condomínio Skopa Beach Resort, substituindo-o por novo ato administrativo, de caráter punitivo, contendo a dimensão correta do bem da União ocupado irregularmente; as providências que devem ser efetivadas pelo Administrado no sentido de recuperar a área; e, por fim, o valor correto da sanção pecuniária imposta, que só se tornará exigível a partir da efetiva notificação do Condomínio com os novos valores"

 

Após discorrer sobre as competências da Instituição, o nobre parquet expõe:

"CONSIDERANDO o teor do art. 21 caput, e parágrafo único, da Lei de introdução às Normas do Direito Brasileiro – LINDB que dispõe que " A decisão que, nas esferas administrativa, controladora ou judicial, decretar a invalidação de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa deverá indicar de modo expresso suas consequências jurídicas e administrativas", elementos ausentes no auto de infração nº 09/2022, cujo delineamento final sobr a área irregularmente ocupada, e o valor da sanção pecuniária imposta, só foram claramente apresentadas ao Administrado, mais de 06 (seis) meses após a confecção do auto;
 
CONSIDERANDO ainda o teor do art 21 caput, e parágrafo único, da Lei de introdução às Normas do Direito Brasileiro LINDB de que  “a decisão a que se refere o caput deste artigo deverá, quando for o caso, INDICAR as condições para que a regularização ocorra de modo PROPORCIONAL e EQUÂNIME e sem prejuízo aos interesses gerais, não se podendo impor aos sujeitos atingidos ÔNUS ou PERDAS que, em função das peculiaridades do caso, sejam ANORMAIS ou EXCESSIVOS”, algo que vem ocorrendo no cumprimento do auto de infração nº 09/2022, com a pretensão de cobrança retroativa da multa desde de sua lavratura, e com a possibilidade de duplicação mensal reiterada de seu valor, quando aquele ato administrativo, de caráter punitivo, apresentam vícios extrínsecos e intrísecos tornando-o imprestável no mundo jurídico;"
 

Os autos encontram-se no  sistema Sapiens/AGU no qual foi inserido o acesso externo ao sistema Sei por meio do link a seguir: https://sei.economia.gov.br/sei/processo_acesso_externo_consulta.php?id_acesso_externo=2566161&infra_hash=b9c751f529c19616b52f08baa178456e

 

É a síntese do necessário. Passo a me manifestar.

 

ANÁLISE.

Primeiramente, destaca-se competir a esta Consultoria Jurídica, nos termos do art. 11 da Lei Complementar nº 73/1993, prestar consultoria sob o prisma estritamente jurídico, não lhe cabendo adentrar em aspectos relativos à conveniência e à oportunidade da prática dos atos administrativos, reservados à esfera discricionária do administrador público legalmente competente. Tampouco cabe a esta Consultoria examinar questões de natureza eminentemente técnica, administrativa e/ou financeira.

Ademais, como já registrado alhures e como argumento para a análise da recomendação do Parquet, registro que a presente manifestação apresenta natureza meramente opinativa, e por tal motivo, as orientações estabelecidas não se tornam vinculantes para o gestor público, o qual pode, de forma justificada, adotar orientação contrária ou diversa daquela emanada por esta Consultoria Jurídica.

 

DA NATUREZA JURÍDICA DAS RECOMENDAÇÕES EMANADAS PELO MPF

Cumpre-se esclarecer ao órgão consulente, que as recomendações exaradas pelo Ministério Público Federal não apresentam caráter obrigatório, impositivo, sancionatório ou cogente, constituindo-se em mera admoestação ou indicativo do posicionamento daquele órgão sobre determinada questão.

 

A recomendação é um ato administrativo exarado com espeque no inciso XX do art. 6º da Lei Complementar nº 75, de 1993 e no art. 27, parágrafo único, inc. IV, da Lei 8.625/1993 (Lei Orgânica do Ministério Público), em que o representante do Ministério Público solicita aos particulares ou ao Poder Público que atuem ou previnam determinadas condutas que, no entender do próprio Parquet, não seriam adequadas ou, ainda, que precisem ser realizadas ou modificadas.

 

Inobstante o caráter não vinculante das recomendações, é possível inferir que tal solicitação já indica o posicionamento do Parquet sobre determinado tema e que, portanto, caso não se cumpram as orientações apresentadas, o mencionado órgão poderá buscar a imposição das obrigações indicadas a partir do ajuizamento de ações judiciais.

 

Consoante escólio de Gustavo Milaré Almeida[1], as recomendações se apresentam "como clara advertência que as medidas judiciais cabíveis poderão ser adotadas a persistir determinada conduta”.

 

Esse risco deve ser sopesado pelo agente político mencionado na Recomendação, in casu, o Superintendente do Patrimônio da União no Ceará, que poderá, de forma justificada, adotar as orientações do Ministério Público Federal ou, em sentido oposto, indicar a inconsistência ou desnecessidade de cumprimento do teor da aludida Recomendação apresentada.

 

DA FISCALIZAÇÃO DO PATRIMÔNIO DA UNIÃO

 

Inicialmente, cumpre trazer à baila, acerca da infração, o disposto no art. 6º do Decreto-Lei nº 2.398/1987:

"Art. 6o Considera-se infração administrativa contra o patrimônio da União toda ação ou omissão que viole o adequado uso, gozo, disposição, proteção, manutenção e conservação dos imóveis da União. (Redação dada pela  Lei nº 13.139, de 2015)
I - (Revogado);  (Redação dada pela  Lei nº 13.139, de 2015)
II - (Revogado). (Redação dada pela  Lei nº 13.139, de 2015)
§ 1o Incorre em infração administrativa aquele que realizar aterro, construção, obra, cercas ou outras benfeitorias, desmatar ou instalar equipamentos, sem prévia autorização ou em desacordo com aquela concedida, em bens de uso comum do povo, especiais ou dominiais, com destinação específica fixada por lei ou ato administrativo. (Incluído pela  Lei nº 13.139, de 2015)
§ 2o O responsável pelo imóvel deverá zelar pelo seu uso em conformidade com o ato que autorizou sua utilização ou com a natureza do bem, sob pena de incorrer em infração administrativa. (Incluído pela  Lei nº 13.139, de 2015)
§ 3o Será considerado infrator aquele que, diretamente ou por interposta pessoa, incorrer na prática das hipóteses previstas no caput. (Incluído pela  Lei nº 13.139, de 2015)
§ 4o Sem prejuízo da responsabilidade civil, as infrações previstas neste artigo serão punidas com as seguintes sanções: (Incluído pela  Lei nº 13.139, de 2015)
I - embargo de obra, serviço ou atividade, até a manifestação da União quanto à regularidade de ocupação; (Incluído pela  Lei nº 13.139, de 2015)
II - aplicação de multa; (Incluído pela  Lei nº 13.139, de 2015)
III - desocupação do imóvel; e (Incluído pela  Lei nº 13.139, de 2015)
IV - demolição e/ou remoção do aterro, construção, obra, cercas ou demais benfeitorias, bem como dos equipamentos instalados, à conta de quem os houver efetuado, caso não sejam passíveis de regularização. (Incluído pela  Lei nº 13.139, de 2015)
§ 5o A multa será no valor de R$ 73,94 (setenta e três reais e noventa e quatro centavos) para cada metro quadrado das áreas aterradas ou construídas ou em que forem realizadas obras, cercas ou instalados equipamentos. (Incluído pela  Lei nº 13.139, de 2015)
§ 6o O valor de que trata o § 5o será atualizado em 1o de janeiro de cada ano com base no Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), apurado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), e os novos valores serão divulgados em ato do Secretário de Patrimônio da União do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. (Incluído pela  Lei nº 13.139, de 2015)
§ 7o Verificada a ocorrência de infração, a Secretaria do Patrimônio da União do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão aplicará multa e notificará o embargo da obra, quando cabível, intimando o responsável para, no prazo de 30 (trinta) dias, comprovar a regularidade da obra ou promover sua regularização. (Incluído pela  Lei nº 13.139, de 2015)
§ 8o (VETADO). (Incluído pela  Lei nº 13.139, de 2015)
§ 9o A multa de que trata o inciso II do § 4o deste artigo será mensal, sendo automaticamente aplicada pela Superintendência do Patrimônio da União sempre que o cometimento da infração persistir. (Incluído pela  Lei nº 13.139, de 2015)
§ 10.  A multa será cominada cumulativamente com o disposto no parágrafo único do art. 10 da Lei no 9.636, de 15 de maio de 1998. (Incluído pela  Lei nº 13.139, de 2015)
§ 11.  Após a notificação para desocupar o imóvel, a Superintendência do Patrimônio da União verificará o atendimento da notificação e, em caso de desatendimento, ingressará com pedido judicial de reintegração de posse no prazo de 60 (sessenta) dias. (Incluído pela  Lei nº 13.139, de 2015)
§ 12.  Os custos em decorrência de demolição e remoção, bem como os respectivos encargos de qualquer natureza, serão suportados integralmente pelo infrator ou cobrados dele a posteriori, quando efetuados pela União. (Incluído pela  Lei nº 13.139, de 2015)
§ 13.  Ato do Secretário do Patrimônio da União do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão disciplinará a aplicação do disposto neste artigo, sendo a tramitação de eventual recurso administrativo limitada a 2 (duas) instâncias. (Incluído pela  Lei nº 13.139, de 2015)"

 

Percebe-se do parágrafo 9º transcrito supra que a incidência da multa se renova a cada mês. Essa mesma lógica era adotada na redação anterior à Lei nº 13.139/15, já que o inciso II do caput do art. 6º do Decreto-Lei nº 2.398/87 falava em “automática aplicação de multa mensal”. Assim, ao menos sob o plano teórico, não estamos a tratar de uma única multa, mas de várias que vão se renovando a cada trinta dias, ainda que o valor cobrado venha a ser consolidado num único documento.

 

Inegável, pois, que da mesma forma como o autuado deve ter respeitado os limites de sua propriedade com o vizinho particular, ele também deveria ter zelado pela utilização do bem nos limites de sua propriedade, abstendo-se de invadir e/ou construir, colocar cercas ou outras benfeitorias, irregularmente em bem da União, bem de uso comum do povo, contíguo ao seu lote, sob pena de aplicação das sanções legais.

 

Na lição de Hely Lopes Meirelles e Celso Antônio Bandeira de Mello[2] os bens de uso comum do povo são definidos “como aqueles abertos ao uso indistinto de todos” e nessa qualidade “é  preciso que o uso assuma um caráter comum sujeito aos mandamentos da isonomia, da generalidade, da ausência de restrições salvo quando algum interesse público primário as permitir ou exigir e sempre à luz da razoabilidade”. Observe-se que se por essa qualidade de atender ao interesse de todos, até o poder público tem limitações quanto aos atributos da propriedade do bem de uso comum do povo,  muito menos é permitido a qualquer particular querer se apropriar de seu uso.

 

Nesse passo, a teor do §3º do art. 6º do Decreto-Lei 2398/87 acima transcrito, será considerado infrator aquele que diretamente ou por interposta pessoa venha incorrer na prática de algum dos atos mencionados no caput. Portanto, basta que se identifique a infração e os responsáveis pelo imóvel para que se aplique a sanção.

 

É oportuno ressaltar que a ninguém é dado o direito de alegar o desconhecimento da lei para justificar o respectivo descumprimento. Alegar que a multa só vale depois da correta notificação, é infringir o disposto na  Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro:

Art. 3o  Ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece. 
 

Nesse caso, a lei em questão nada mais é que a Constituição Federal, que em seu art. 20 estabelece:

"Art. 20. São bens da União:
(...)
IV - as ilhas fluviais e lacustres nas zonas limítrofes com outros países; as praias marítimas; as ilhas oceânicas e as costeiras, excluídas, destas, as áreas referidas no art. 26, II;
(...)
VII - os terrenos de marinha e seus acrescidos;
(...)

 

Assim, com a identificação da infração e dos responsáveis pelo imóvel, a Administração tem o dever de autuar, devendo ser contado a partir da notificação o prazo para  a defesa. Mas o fator de acolhimento parcial da defesa, não quer dizer que ensejará a nulidade do auto de infração. Ao contrário, o acolhimento parcial da defesa é pressuposto da observância do contraditório e ampla defesa. É o comando contido na Lei e o qual a Administração não pode se desvencilhar.

 

Com efeito, o art. 6º, §7º, do DL 2.398/87, com redação dada pela Lei 13.139/2015, prevê que, verificada a ocorrência de infração, a SPU aplicará multa, sendo o responsável intimado para, no prazo de 30 dias, comprovar a regularidade da obra ou promover sua regularização. O §8º desse dispositivo, vetado quando da sanção da lei, possibilitava a suspensão da multa caso fosse requerida a regularização da obra (ou o afastamento da irregularidade). Portanto, a intenção que se pretende ver aplicada pelo ilustre parquet não subsistiu por ocasião da sanção da Lei, o que afasta incontineti à Administração, a possibilidade no atendimento do pleito.

 

Registre-se que a Advocacia-Geral da União já se posicionou em questão semelhante, através do PARECER n. 01124/2015/MAA/CONJUR-MP/CGU/AGU (NUP: 04905.201964/2015-25), quando ao discorrer sobre as normas introduzidas pela Lei 13.139/2015 no DL 2.398/87, explicou:

"46. Como se vê da leitura do dispositivo legal acima transcrito, verificada a ocorrência de infração, a SPU deverá aplicar multa e notificar o embargo da obra, quando cabível. A lei dispõe, ainda, que a multa será mensal devendo ser aplicada automaticamente pela SPU.

47. Ora, tais disposições afastam o entendimento da SPU de que a multa não deve ser aplicada até a regularização por parte daquela secretaria. Em primeiro lugar, porque a lei prevê expressamente que a multa será aplicada de forma automática, renovando-se a cada mês. Além disso, nem sempre a regularização será possível, hipótese em que não se pode deixar de aplicar a multa decorrente do cometimento de infração contra o patrimônio da União.

48. É preciso ter em mente que a multa é aplicada em decorrência de uma infração à legislação patrimonial, ou seja, tem como origem uma conduta contrária ao ordenamento jurídico. A partir do momento em que o infrator é autuado pela SPU, ele passa a ter indubitável ciência desse fato, podendo optar pelo imediato desfazimento da intervenção considerada irregular. Caso pretenda requerer a regularização, ele estará assumindo o risco de essa não vir a ser deferida, hipótese em que a multa será devida desde o momento da notificação inicial, conforme determina a lei.

(...)

50. A despeito do veto ao §8º do art. 6º do DL 2.398/87, entendemos que o mesmo raciocínio se aplica à nova legislação. Conforme se extrai do art. 6º, §9º, do DL 2.398/87, a multa será aplicada "sempre que o cometimento da infração persistir". Ou seja, após notificado o infrator, caso a intervenção não seja desfeita, a multa será renovada a cada mês, até o momento em que cessar o comportamento infracional.

 

 

Assim, ainda para os casos possíveis de regularização - o que de longe é o caso dos autos, por se tratar de privatização e modificação da vegetação da área de praia - é indispensável a regularização do lapso temporal pretérito, em que o particular utilizou o imóvel da União de forma irregular, devendo-se promover a cobrança retroativa por esse uso. Isso porque a Lei proíbe o uso gratuito de bens da União.

 

Como arremate, é o entendimento exposto no PARECER n. 00735/2017/ACS/CGJPU/CONJUR-MP/CGU/AGU (NUP: 04905.001354/2017-95):

 

"28. No que tange ao ajuizamento de ação de reintegração de posse, conforme determinação do art. 6º, parágrafo 11, do Decreto-Lei 2398/87, esclarecemos que não há qualquer comando para suspensão da multa prevista no parágrafo 4º do mesmo dispositivo em caso de judicialização do feito, motivo pelo qual entendemos que, salvo determinação judicial expressa de suspensão da cobrança da sanção pecuniária, a mesma continuará incidindo até que se finde a infração persistente (voluntariamente ou por decisão judicial), com fulcro no parágrafo 9º do referido ato normativo.
 
"§ 9o A multa de que trata o inciso II do § 4o deste artigo será mensal, sendo automaticamente aplicada pela Superintendência do Patrimônio da União sempre que o cometimento da infração persistir. (Incluído pela  Lei nº 13.139, de 2015)
(...)
§ 11.  Após a notificação para desocupar o imóvel, a Superintendência do Patrimônio da União verificará o atendimento da notificação e, em caso de desatendimento, ingressará com pedido judicial de reintegração de posse no prazo de 60 (sessenta) dias. (Incluído pela  Lei nº 13.139, de 2015)"
 
29. Com relação à preocupação exarada pelo órgão patrimonial no sentido de que a demora do curso do processo judicial possui o condão de tornar o valor da multa administrativa excessivo, ressaltamos que o infrator deve considerar todas as variantes antes de optar por descumprir uma determinação proferida por órgão público.
30. De qualquer sorte, este órgão de assessoramento jurídico entende que não há previsão legal para a suspensão da multa por decisão da Administração Pública, devendo o infrator arcar com os ônus da opção de discutir a questão no Judiciário. Ademais, o fato de existir a ação judicial não impede o infrator de dar cabo voluntariamente à infração administrativa, cuja esfera é independente da judicial.
31. Ou seja, enquanto a infração administrativa persistir, esteja a questão ou não submetida ao Judiciário, a multa continua a incidir. A ressalva óbvia fica por conta de alguma decisão judicial, ainda que liminar, que suspenda a sua incidência.

 

Em sintonia com as teses supra, é a exegese obtida a partir da leitura do art. 11 da Instrução Normativa SPU nº 23, DE 18 DE MARÇO DE 2020 (Estabelece as diretrizes e procedimentos das atividades de fiscalização dos imóveis da União) quanto à possibilidade de, após a completa identificação dos responsáveis pelo imóvel, retroagir a cobrança da multa, respeitada a prescrição. Segue abaixo o dispositivo referido:

No Manual de Fiscalização da SPU (2018), resta claramente demostrada a interpretação do dispositivo acima transcrito, na parte relativa à perguntas e respostas. Veja-se:

E não se diga que tal orientação não está abarcada pela Lei. Tem respaldo no art. 47 da Lei nº 9.636/1998, in verbis:

Portanto, o fato de o auto de infração ser retificado para aceitar a redução do valor da multa não retira a materialidade da infração (já que a infração administrativa e a fundamentação legal nele descritas) continua a mesma, e não sendo fator de invalidação, não afasta a aplicação da penalidade de multa retroativa ao momento da identificação da infração, desde que, naturalmente, seja observada a incidência de eventual prescrição.

Querer anular o auto de infração para postergar a aplicação da multa, em nosso sentir, é compactuar com a má-fé da autuada que, de posse da matrícula emitida pelo Cartório de Registro de Imóveis, tinha conhecimento de quais eram os limites de sua propriedade. Ao extrapolar os limites da área registrada em seu nome e privatizar área de toda a COLETIVIDADE, o particular assumiu o risco de ser autuado. Ademais, ao ver consignado no Auto de Infação o valor do metro quadrado para a área irregular, e tendo conhecimento dos limites de sua propriedade, é inconteste que sabia qual o valor final da multa.

Note-se que a multa aplicada em procedimentos de fiscalização do Patrimônio da União tem como peculiaridade servir como mecanismo de punição e de coerção. Por isso uma de suas características principal, é não precisar ser precedida de notificação prévia para informar a aplicação do auto de infração.

Nesse arcarbouço, traz-se excertos contidos no Manual de Fiscalização da SPU (2018):

"O Parecer Jurídico n. 00319-2016-ACS-CGJPU-CONJUR-MP-CGU-AGU trouxe alguns esclarecimentos a respeito da aplicação da multa. A utilização da palavra “automática” no art. 6 do Decreto-Lei 2.398/87 tem por objetivo despertar o interessado a verdadeira urgência com a qual se deve providenciar a remoção da irregularidade na área. Sendo assim, é importante esclarecer que não cabe suspensão da cobrança da multa por nenhuma razão administrativa específica.
É preciso ter em mente que a multa é aplicada em decorrência de uma infração à legislação, ou seja, tem como origem conduta contrária ao ordenamento jurídico. A partir do momento em que o infrator é autuado pela SPU, ele passa a ter indubitável ciência desse fato, podendo optar pelo imediato desfazimento da intervenção considerada irregular. Caso pretenda a regularização, ele estará assumindo o risco de essa não vir a ser deferida, hipótese em que a multa será devida desde o momento da notificação inicial, conforme determina lei.
Sendo assim, não cabe efeito suspensivo e paralização da cobrança de multa enquanto o processo encontra-se em análise ou estiver em tramite ação judicial que trata do tema em questão". (grifos nosso)

 

Desta forma, fundamentado no princípio da legalidade a que a Administração Pública está subordinada, impõe-se que não há autorização legal para a anulação do auto de Infração sob os fundamentos apresentados. 

 

CONCLUSÃO

Por tudo exposo, verifica-se que os argumentos apresentados encontram respaldo jurídico e, salvo melhor juízo, estão aptas a justificar eventual decisão de não acatamento da Recomendação apresentada pelo Ministério Público Federal, mantendo-se o entendimento de que a multa deve ser cobrada retroativamente à data da fiscalização, data em que se verificou a ocrrência da irregularidade.

É o parecer, de caráter opinativo, que prescinde de aprovação por força do art. 22 da PORTARIA NORMATIVA CGU/AGU Nº 10, DE 14 DE DEZEMBRO DE 2022 – Dispõe sobre a organização e funcionamento das Consultorias Jurídicas da União Especializadas Virtuais.

Ao protocolo da Consultoria Jurídica da União Especializada Virtual de Patrimônio (E-CJU/PATRIMÔNIO) para restituir o processo à SPU consulente,  para ciência deste, bem como para adoção da(s) providência(s) pertinente(s), com as considerações de estilo.

 

Maceió, 14de fevereiro de 2023.

 

 

PATRÍCIA KARLLA BARBOSA DE MELLO

ADVOGADA DA UNIÃO

 

 

 

Atenção, a consulta ao processo eletrônico está disponível em https://supersapiens.agu.gov.br mediante o fornecimento do Número Único de Protocolo (NUP) 19739122741202268 e da chave de acesso 8316a369

 

 


Chave de acesso ao Processo: 8316a369 - https://supersapiens.agu.gov.br

Notas

  1. ^ MILARÉ, Gustavo Almeida. Poderes investigatórios do Ministério Público nas ações coletivas, n.° 4.2.5, 2010.
  2. ^ MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 471 e BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo, p. 921



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