ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA DA UNIÃO ESPECIALIZADA VIRTUAL DE PATRIMÔNIO
NÚCLEO JURÍDICO

 

PARECER n. 00102/2023/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU

 

 

NUP: 10154.169616/2021-37

INTERESSADOS: UNIÃO - SUPERINTENDÊNCIA REGIONAL DO PATRIMÔNIO DA UNIÃO NO PARANÁ - SPU/PR

ASSUNTOS:  FISCALIZACAO DE PATRIMONIO DA UNIAO.

 

 
 
EMENTA: PATRIMONIO IMOBILIARIO DA UNIAO. CONSULTA.
I. AUTUACAO POR REALIZAR ATERRO, CONSTRUÇÃO, OBRA, CERCAS OU OUTRAS BENFEITORIAS, DESMATAR OU INSTALAR EQUIPAMENTOS, SEM PRÉVIA AUTORIZAÇÃO OU EM DESACORDO COM AQUELA CONCEDIDA, EM BENS DE USO COMUM DO POVO.
II. DEFESA DA EMPRESA AUTUADA: QUANDO O FATO FOR OBJETO DE PROCEDIMENTOS INSTAURADOS POR ENTIDADE ESTADUAL RESPONSÁVEL PELO PATRIMÔNIO AMBIENTAL, ISSO IMPEDE NOVA PENALIZAÇÃO PELA AUTORIDADE FEDERAL, SOB PENA DE VIOLAR O PRINCÍPIO DO NON BIS IN IDEM INSCULPIDO, DENTRE OUTROS DISPOSITIVOS, NO ARTIGO 76 DA LEI FEDERAL Nº 9.605/98. 
 
III. ALEGACAO DE "BIS IN IDEM" QUE NAO SE SUSTENTA POIS O QUE  DETERMINOU A AÇÃO FISCALIZATÓRIA E, CONSEQUENTEMENTE, A SANÇÃO IMPOSTA, FOI A CONSTATAÇÃO "IN LOCO" DA VIOLAÇÃO AO PATRIMÔNIO PÚBLICO, QUE ESTÁ PERFEITAMENTE CARACTERIZADA DIANTE DO ATO DE CONSTRUIR E REALIZAR OBRAS EM IMÓVEL DA UNIÃO DE USO COMUM DO POVO SEM AUTORIZAÇÃO PRÉVIA E NAO DE QUESTOES AMBIENTAIS.
 

 

RELATORIO

 

Trata-se de processo eletrônico oriundo da Superintendência do Patrimônio da União no Paraná - SPU/PR contendo a seguinte consulta a ser enfrentada por esta Consultoria especializada:

 

“Por fim, recomenda-se o envio de consulta à Consultoria Jurídica da União para que se manifeste acerca da alegação de que quando um mesmo fato for objeto de procedimentos instaurados por entidade estadual responsável pelo patrimônio ambiental, isso impede nova penalização pela autoridade federal, sob pena de violar o princípio do non bis in idem insculpido, dentre outros dispositivos, no artigo 76 da Lei Federal nº 9.605/98.

 

A dúvida suscitada pelo Órgão assessorado exsurge, portanto, dos argumentos apresentados pela defesa da empresa GREGOR PARTICIPAÇÕES LTDA., autuada pela fiscalização da SPU/PR por “suposto cometimento de infração administrativa por realizar aterro, construção, obra, cercas ou outras benfeitorias, desmatar ou instalar equipamentos, sem prévia autorização ou em desacordo com aquela concedida, em bens de uso comum do povo, especiais ou dominiais, com destinação específica fixada por lei ou ato administrativo. O imóvel notificado está localizado na Comunidade Vila das Peças - Guaraqueçaba/PR. Imóveis adjacentes - RIP's: 7585 0100054-97, 7585 0100056-59 e 7585 0100152-98”.

 

No âmbito da SPU/PR foi feita a análise da defesa, conforme se extrai da Nota Técnica SEI nº 36543/2022/ME:

Assunto: Análise de Defesa.
Senhor Coordenador,
Sumário Executivo
Trata-se de autuação/notificação à GREGOR PARTICIPAÇÕES LTDA, CNPJ: 05.155.720/0001-40, por suposto cometimento de infração administrativa por realizar aterro, construção, obra, cercas ou outras benfeitorias, desmatar ou instalar equipamentos, sem prévia autorização ou em desacordo com aquela concedida, em bens de uso comum do povo, especiais ou dominiais, com destinação específica fixada por lei ou ato administrativo. O imóvel notificado está localizado na Comunidade Vila das Peças - Guaraqueçaba/PR. Imóveis adjacentes - RIP's: 7585 0100054-97, 7585 0100056-59 e 7585 0100152-98.
Análise
Nos dias 13 e 14 de outubro de 2021, foi realizada a fiscalização in loco de imóvel localizado na Comunidade Vila das Peças - Ilha das Peças - Guaraqueçaba/PR, Imóveis adjacentes - RIP's: 7585 0100054-97, 7585 0100056-59 e 7585 0100152-98, conforme consta nos documento Relatório de Fiscalização Individual - RFI 3177 (SEI nº 20371261) e Anexo Relatório Fotográfico (SEI nº 20374641).
Durante a vistoria, que foi acompanhada por equipe do ICMBio, IAT, Presidente da Associação de Moradores e outros membros da comunidade, foram observadas as seguintes situações, relatadas no relatório de fiscalização:
- Construção de muro de alvenaria.
- Construção de cercas e estruturas de contenção, utilizando, segundo denúncia, madeira retirada ilegalmente de área de preservação ambiental.
- Remoção de vegetação de mangue/aterro em área de aproximadamente 50m2 e obra de contenção em área de uso comum do povo em área de aproximadamente 40m2.
No momento da vistoria, a única atividade em andamento era a construção de uma residência (em fase final) na área em questão.
Em 08 de abril de 2022, foi emitida a notificação/autuação nº 33/2022/NUCIP/SPU-PR/SPU/SEDDM-ME (SEI nº 23867389), com base no Relatório de Fiscalização Individual - RFI 3177 (SEI nº 20371261), determinando a demolição e/ou remoção do aterro, construção, obra, cercas ou demais benfeitorias e pagamento de multa de R$ 9.341,10.
Foi recebida, em 04 de maio de 2022, a notificação/autuação nº 33/2022/NUCIP/SPU-PR/SPU/SEDDM-ME (SEI nº 23867389), conforme Aviso de Recebimento (SEI nº 25576102).
Foi tempestivamente recebida pela SPU, em 18 de maio de 2022, a defesa do autuado (SEI nº 27144986, 27145035 e anexos), na qual constam as seguintes alegações e requerimentos:
Que o mesmo fato é objeto de procedimentos instaurados pelo Instituto Água e Terra do Paraná (IAT), entidade estadual responsável pelo patrimônio ambiental paranaense, o que impediria nova penalização pela autoridade federal, sob pena de violar o princípio do non bis in idem insculpido, dentre outros dispositivos, no artigo 76 da Lei Federal nº 9.605/98.
Que a autuação lavrada pela Superintendência do Patrimônio da União no Paraná (SPU/PR) está embasada em premissas equivocadas, tendo em vista que na fotografia acostada ao processo não é possível identificar aquilo que a equipe fiscalizatória classificou como curso d’água, defendendo inexistir naquele local um curso d’água, mas apenas uma saída de água da chuva que se forma apenas com a ocorrência de intempéries climáticas, ficando seco nos demais momentos.
Que não há como considerar a construção do muro de alvenaria uma intervenção indevida em área de uso comum do povo, visto que pela densa vegetação o local não serve como passagem de pedestres nem ao uso de quem quer que seja.
Que pela área poder servir de abrigo ou esconderijo para meliantes e/ou pessoas mal intencionadas, a autuada construiu o referido muro para delimitar o imóvel e proteger o seu patrimônio.
Que a construção, em si, não causou dano ambiental ou prejuízo algum à comunidade, tendo sido edificada no limite do terreno ocupado pela Autuada, o que não é ilegal.
Que antes de construir o muro ou reformar a residência já existente, a Autuada tomou o cuidado consultar o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), o qual informou a desnecessidade de autorização para a execução de obras em terreno com Registro Imobiliário Patrimonial (RIP) válido, fora dos limites do Parque Nacional do Superagui, mas orientou a busca da anuência da Associação de Moradores e da Superintendência do Patrimônio da União no Paraná (SPU/PR) (SEI nº 27145039).
Que a SPU/PR dispensou a autorização para a execução de obras dentro de áreas devidamente cadastradas (SEI nº 27145040).
Que foi obtida a autorização da Associação dos Moradores da Vila de Ilha das Peças (SEI nº 27145037).
Que a Autuada jamais se esquivou dos seus deveres legais e adotou todas as cautelas disponíveis, não tendo encontrado óbice algum junto às autoridades federais competentes, que sequer indagaram quais melhorias ela pretendia fazer, modo que não pode ser penalizada por uma ilegalidade que não cometeu ou teve intenção de cometer.
Que não há como imputar à Autuada a realização de aterro, construção, obra, cerca ou outras benfeitorias sem prévia autorização ou em desacordo com aquela concedida, tendo em vista que o órgão administrativo e a entidade ambiental federais envolvidos foram previamente consultados e dispensaram sua anuência.
Que o muro foi construído no alinhamento divisório do terreno, ou seja, no domínio predial da Autuada, com o único fim de aumentar a sua segurança.
Que, em se tratando de responsabilização administrativa por suposto dano ambiental, não seria admitida a modalidade objetiva, mas apenas subjetiva, o que atrai a necessidade de comprovação da intenção maléfica do agente.
Que jamais houve remoção de vegetação de mangue/aterro ou obra de contenção em área de uso comum do povo, mas apenas a limpeza do local mediante a remoção dos galhos secos que, inclusive, estavam impedindo a regeneração natural da vegetação manguezal. A qual, ainda, foi impulsionada pelas novas mudas de mangue plantadas pela Autuada justamente por reconhecer a importância de preservá-lo e saber da sua utilidade para a contenção de erosões, fato reconhecido pela Polícia Federal no âmbito do Inquérito Policial IPL 2021.0004695-DPF/PNG/PR, ratificado pela Procuradoria da República e homologado pelo juízo da 23ª Vara Federal de Curitiba/PR (SEI nº 20376396).
Que a estrutura de contenção de pedras foi feita para evitar que a maré de vazante provocasse erosões, apontando que os galhos e as folhas estão com tamanho elevado e aspecto absolutamente saudável, demonstrando a assertividade da medida.
Que o manguezal permanece hígido, protegido em seu habitat e cumprindo o seu papel de protetor natural da praia e que, além disso, ao redor do imóvel ainda havia outros resíduos e entulhos que foram removidos pela Autuada para não comprometer o meio ambiente.
Que confrontando as fotografias tiradas antes e depois da limpeza, denota-se a melhoria do manguezal e de todo o entorno do imóvel, o que contribuiu para a preservação ambiental (SEI nº 27145042 e 27145043).
Que a Associação dos Moradores da Vila de Ilha das Peças, em declaração anexa, confirma a autorização e acompanhamento da reforma da residência existente no imóvel, onde não houve corte de vegetação de mangue, aterro de mangue ou qualquer outra intervenção indevida na área e que os acessos para os demais moradores foi melhorado com a retirada de lixo e entulhos, sem qualquer interferência em rios ou córregos já existentes (SEI nº 27145038).
Que não há prova de remoção indevida de vegetação e que o processo se baseia em um Termo de Georreferenciamento com uma fotografia de satélite extraída do programa Google Earth sem indicação do que são os dados que nela constam, bem como em um Termo de Levantamento Fotográfico que contém fotos tiradas ao redor da edificação questionada, mas que não comprovam a ocorrência e a extensão do dano ambiental atribuído à Autuada.
Que é mencionado o uso de um GPS com coordenadas georreferenciais, contudo inexiste no auto de infração a disponibilização dos dados coletados no referido instrumento, o que tolhe o direito de defesa da Autuada.
Que, pelas fotografias juntadas, não há como saber o que, de fato, foi cortado ou aterrado no manguezal, quando isso ocorreu e quem foi o responsável por isso. Não há registro fotográfico anterior para confrontação daquilo que, em tese, teria sido causado pela reforma em apreço.
Que naquele local há uma volumosa deposição natural da própria maré, sobretudo em períodos de cheia, o que explica que parte da vegetação fique coberta de areia em determinados períodos.
Que não é possível verificar nos autos: como o agente de polícia administrativa constatou o tamanho da área atingida; como o agente definiu a espécie de vegetação supostamente danificada; onde constam as evidências de que a vegetação foi cortada ou aterrada pela ação humana e como afirmar que decorreu única e exclusivamente da reforma em questão.
Que a autuação é eivada de nulidade pela ausência de justa causa para a penalização.
Que a Autuada fez à época foi apenas solicitar a remoção dos galhos secos que estavam atrapalhando justamente a recomposição natural do manguezal, mas em momento algum realizou ou ordenou o corte da vegetação, fato reconhecido pela Polícia Federal no âmbito do Inquérito Policial IPL 2021.0004695-DPF/PNG/PR, ratificado pela Procuradoria da República e homologado pelo juízo da 23ª Vara Federal de Curitiba/PR (SEI nº 20376396).
Que se não fosse pelo muro de contenção, em dias de maré cheia, o manguezal, a própria praia e as residências legalmente edificadas no local seriam devastadas pelo mar, como demonstram o vídeo e as imagens anexos ao processo. (SEI nº 27160501 e 27145044).
Que a jurisprudência exige a prova do dano e da sua extensão para determinar a responsabilização do agente privado, com identificação fático probatória das espécies e quantidade de árvores danificadas.
Que não há como imputar qualquer responsabilidade à Autuada, seja porque não restou comprovada a sua contribuição para o alegado dano ambiental, seja porque foram fielmente seguidas as orientações dos órgãos federais competentes, mas, especialmente, porque não há comprovação de dano algum ao meio ambiente ou prejuízo aos demais moradores e frequentadores da Ilha das Peças por quaisquer das obras executadas a mando da Autuada.
Requer o conhecimento e deferimento da defesa para anular a autuação e a sanção pecuniária impostas pela Superintendência do Patrimônio da União no Paraná (SPU/PR), alegando não terem sido praticadas as irregularidades imputadas à Autuada e tanto o ICMBio como a própria SPU/PR dispensaram as suas autorizações para a execução das obras pretendidas pela Autuada, relegando essa função à Associação dos Moradores da Vila de Ilha das Peças, que autorizou e acompanhou as atividades, confirmando que as mesmas foram feitas em conformidade aos preceitos legais e regulamentares, inexistindo, portanto, ilegalidade na conduta da Autuada.
Recomendação
Para que seja possível a análise e decisão acerca de como prosseguir com o procedimento, recomenda-se o envio do processo ao Núcleo de Destinação Patrimonial, para que se manifeste acerca da dispensa que autorização a execução de obras dentro de áreas devidamente cadastradas (SEI nº 27145040).
Ainda, recomenda-se o envio do processo ao(s) servidor(es) responsável(is) pelo Relatório de Fiscalização Individual - RFI 3177 (SEI nº 20371261), para que se manifeste(m) sobre:
A alegação de que a autuação lavrada pela Superintendência do Patrimônio da União no Paraná (SPU/PR) está embasada em premissas equivocadas, tendo em vista que na fotografia acostada ao processo não é possível identificar aquilo que a equipe fiscalizatória classificou como curso d’água, defendendo inexistir naquele local um curso d’água, mas apenas uma saída de água da chuva que se forma apenas com a ocorrência de intempéries climáticas, ficando seco nos demais momentos.
A alegação de que a construção, em si, não causou dano ambiental ou prejuízo algum à comunidade, tendo sido edificada no limite do terreno ocupado pela Autuada.
A alegação de que é mencionado o uso de um GPS com coordenadas georreferenciais, inexistindo no auto de infração a disponibilização dos dados coletados no referido instrumento, o que tolheria o direito de defesa da Autuada.
A alegação de que pelas fotografias juntadas, não há como saber o que, de fato, foi cortado ou aterrado no manguezal, quando isso ocorreu e quem foi o responsável por isso. Não há registro fotográfico anterior para confrontação daquilo que, em tese, teria sido causado pela reforma em apreço.
A alegação de que não é possível verificar nos autos: como o agente de polícia administrativa constatou o tamanho da área atingida; como o agente definiu a espécie de vegetação supostamente danificada; onde constam as evidências de que a vegetação foi cortada ou aterrada pela ação humana e como afirmar que decorreu única e exclusivamente da reforma em questão.
Por fim, recomenda-se o envio de consulta à Consultoria Jurídica da União para que se manifeste acerca da alegação de que quando um mesmo fato for objeto de procedimentos instaurados por entidade estadual responsável pelo patrimônio ambiental, isso impede nova penalização pela autoridade federal, sob pena de violar o princípio do non bis in idem insculpido, dentre outros dispositivos, no artigo 76 da Lei Federal nº 9.605/98.
À consideração superior.
Documento assinado eletronicamente
THAÍS ROLIM
Administradora
 

Na citada Nota Técnica houve a proposta de oitiva do Núcleo de Destinação Patrimonial da Superintendência do Patrimônio da União no Paraná (SEI 28530544), que se  manifestou sobre a alegação da defesa de que obteve a dispensa de autorização a execução de obras dentro de áreas devidamente cadastradas:

 

Senhor superintendente
Em resposta à Nota Técnica 36543 (27160513), quem solicita manifestaçã9o acerca da dispensa que autorização a execução de obras dentro de áreas devidamente cadastradas (27145040), informo que não é de competência da SPU a autorização de obras em imóveis da União devidamente cadastrados sob regime de ocupação de Uso.
Esta atribuição é do Município, através do Alvará de Construção, e do órgão ambiental, através do licenciamento ambiental.
Outrossim, a alegada dispensa de autorização para a execução de obras dentro de áreas devidamente cadastradas (27145040) deixa claro que ela se aplicava para pequenas reformas e que deveria seguir a legislação vigente.
Documento assinado eletronicamente
LUCIE MARA PYDD WINTER
Analista de Infraestrutura
De acordo.
JEAN PAULO DOLINSKI
Superintendente do Patrimônio da União no Paraná
 

Houve a proposta, também, de oitiva do Núcleo de Caracterização e Incorporação da Superintendência do Patrimônio da União no Paraná (SEI    31103522), que prestou os seguintes esclarecimentos:

Processo nº 10154.169616/2021-37
Assunto: Resposta ao despacho SPU-PR-NUCIP 31075402 - parágrafo 09 da Nota Técnica SEI nº 36543/2022/ME
Em atenção ao despacho supracitado, apontamos acerca dos itens da referida Nota Técnica:
A alegação de que a autuação lavrada pela Superintendência do Patrimônio da União no Paraná (SPU/PR) está embasada em premissas equivocadas, tendo em vista que na fotografia acostada ao processo não é possível identificar aquilo que a equipe fiscalizatória classificou como curso d’água, defendendo inexistir naquele local um curso d’água, mas apenas uma saída de água da chuva que se forma apenas com a ocorrência de intempéries climáticas, ficando seco nos demais momentos.
Resp.: A vistoria foi acompanhada por membros da Comunidade, os quais informaram se tratar de um curso d'água ao lado do imóvel, sendo identificado nas fotos por possuir uma ponte de madeira sobre o mesmo.
A alegação de que a construção, em si, não causou dano ambiental ou prejuízo algum à comunidade, tendo sido edificada no limite do terreno ocupado pela Autuada.
Resp.: As obras executadas, mesmo no limite do terreno regularmente ocupado, estão sujeitas a legislação cabível. Devem obrigatoriamente possuir projeto assinado por profissional habilitado, alvará municipal de obra e anuência ambiental. A alegação da defesa de que foi realizada obra de contenção para proteção do manguezal carece de embasamento técnico. É obrigação do ocupante apresentar informações detalhadas sobre as intervenções realizadas na área da União.
A alegação de que é mencionado o uso de um GPS com coordenadas georreferenciais, inexistindo no auto de infração a disponibilização dos dados coletados no referido instrumento, o que tolheria o direito de defesa da Autuada.
Resp.: O local se trata de imóvel cadastrado junto a SPU/PR e usufruído pelo ocupante regularmente inscrito. Considerando que, tanto no relatório da SPU/PR, quanto no material apresentado pela defesa, há fotos do imóvel, não faz sentido questionar coordenadas, pois não há dúvidas sobre a localização do mesmo. 
A alegação de que pelas fotografias juntadas, não há como saber o que, de fato, foi cortado ou aterrado no manguezal, quando isso ocorreu e quem foi o responsável por isso. Não há registro fotográfico anterior para confrontação daquilo que, em tese, teria sido causado pela reforma em apreço.
Resp.: A denúncia de retirada de madeira do mangue para a construção de cerca partiu da Associação de Moradores. Sendo informado que foram contratados membros da própria comunidade para realizar a extração da madeira. Cabe ao ocupante esclarecer a origem do material, caso conteste a denúncia.
A alegação de que não é possível verificar nos autos: como o agente de polícia administrativa constatou o tamanho da área atingida; como o agente definiu a espécie de vegetação supostamente danificada; onde constam as evidências de que a vegetação foi cortada ou aterrada pela ação humana e como afirmar que decorreu única e exclusivamente da reforma em questão.
Resp.: A medição de área é realizada com os recursos disponíveis, sendo medição em campo, comparação de fotos de satélite, análise de projetos de obra, quando apresentados. A não apresentação de alvará de obras e anuência ambiental já caracteriza irregularidade nas intervenções. É obrigação do ocupante providenciar essa documentação, antes de realizar as atividades e de possuir a mesma, quando questionado sobre alguma alteração em área da União. 
Curitiba, 25 de janeiro de 2023
Documento assinado eletronicamente
ALEX GARCIA SANTA MARIA
Analista de Nível Superior - Engenheiro
À consideração.
LUCIANO SABATKE DIZ
Coordenador
 

Os autos foram encaminhados para este NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO, Órgão consultivo integrante da estrutura da Advocacia-Geral da União competente para assessorar o Órgão consulente, com fulcro na Lei Complementar nº 73, de 1993, artigo 8-F da Lei nº 9.028, de 12 de abril de 1995, e na Portaria Normativa AGU nº 72, de 07 de dezembro de 2022 encontrando-se instruído com os seguintes principais documentos lançados no sistema SEI, cujo acesso foi autorizado pelo Órgão para possibilitar a análise do processo:

          20371261       Relatório de Fiscalização Individual - RFI 3177 18/11/2021          SPU-PR-NUCIP

            20374641        Anexo 18/11/2021     SPU-PR-NUCIP

            20376396        Anexo 18/11/2021     SPU-PR-NUCIP

            20376683        Despacho        18/11/2021     SPU-PR-NUCIP

            20710431        CNPJ   30/11/2021     SPU-PR-NUCIP

            20710435        Quadro            30/11/2021     SPU-PR-NUCIP

            21640105        E-mail             12/01/2022     SPU-PR-NUCIP

            21640850        Anexo 12/01/2022     SPU-PR-NUCIP

            21642554        Anexo 12/01/2022     SPU-PR-NUCIP

            21642932        Ofício 8923    12/01/2022     SPU-PR-NUCIP

            21642964        Despacho        12/01/2022     SPU-PR-NUCIP

            21666254        E-mail             13/01/2022     SPU-PR-NUCIP

            21693538        E-mail             14/01/2022     SPU-PR-NUCIP

            23552689        Notificação (numerada) 29    25/03/2022     SPU-PR-NUCIP

            23665677        Despacho        30/03/2022     SPU-PR-NUCIP

            23816443        Consulta         06/04/2022     SPU-PR-NUREP

            23817879        Anexo 06/04/2022     SPU-PR-NUREP

            23817999        Despacho        06/04/2022     SPU-PR-NUREP

            23821456        E-mail             06/04/2022     SPU-PR-NUCIP

            23821473        Deliberação    06/04/2022     SPU-PR-NUCIP

            23867389        Notificação (numerada) 33    07/04/2022     SPU-PR-NUCIP

            24314718        Despacho        26/04/2022     SPU-PR-NUCIP

            24359735        Confirmação   28/04/2022     SPU-PR-NURIN

            25576102        Aviso de Recebimento - AR 10/06/2022     SPU-PR-NUCIP

            27144986        E-mail             10/08/2022     SPU-PR-NUCIP

            27145035        Defesa            10/08/2022     SPU-PR-NUCIP

            27145036        Anexo 10/08/2022     SPU-PR-NUCIP

            27145037        Anexo 10/08/2022     SPU-PR-NUCIP

            27145038        Declaração      10/08/2022     SPU-PR-NUCIP

            27145039        Anexo 10/08/2022     SPU-PR-NUCIP

            27145040        E-mail             10/08/2022     SPU-PR-NUCIP

            27145041        Escritura         10/08/2022     SPU-PR-NUCIP

            27145042        Anexo 10/08/2022     SPU-PR-NUCIP

            27145043        Anexo 10/08/2022     SPU-PR-NUCIP

            27145044        Anexo 10/08/2022     SPU-PR-NUCIP

            27145045        Procuração      10/08/2022     SPU-PR-NUCIP

            27145046        Substabelecimento     10/08/2022     SPU-PR-NUCIP

            27160501        Anexo 10/08/2022     SPU-PR-NUCIP

            27160513        Nota Técnica 36543   11/08/2022     SPU-PR-NUCIP

            27163435        Despacho        11/08/2022     SPU-PR-NUCIP

            28528779        Despacho        04/10/2022     SPU-PR-NUCIP

            28530544        Despacho        04/10/2022     SPU-PR-NUDEP

            29129335        Petição            26/10/2022     SPU-PR-NUCIP

            31075402        Despacho        20/01/2023     SPU-PR-NUCIP

            31103522        Despacho        23/01/2023     SPU-PR-NUCIP

            31373739        Ofício 18950

 

Feito o relatório, passo a opinar.

 

FINALIDADE E ABRANGÊNCIA DO PARECER JURÍDICO

 

A presente manifestação jurídica tem o escopo de assistir a autoridade assessorada no controle interno da legalidade administrativa dos atos a serem praticados ou já efetivados. Ela envolve, também, o exame prévio e conclusivo dos textos das minutas.

 

Nossa função é justamente apontar possíveis riscos do ponto de vista jurídico e recomendar providências, para salvaguardar a autoridade assessorada, a quem compete avaliar a real dimensão do risco e a necessidade de se adotar ou não a precaução recomendada.

 

Importante salientar, que o exame dos autos processuais restringe-se aos seus aspectos jurídicos, excluídos, portanto, aqueles de natureza técnica. Em relação a estes, partiremos da premissa de que a autoridade competente municiou-se dos conhecimentos específicos imprescindíveis para a sua adequação às necessidades da Administração, observando os requisitos legalmente impostos.

 

De fato, presume-se que as especificações técnicas contidas no presente processo, inclusive quanto ao detalhamento do objeto da contratação, suas características, requisitos e avaliação do preço estimado, tenham sido regularmente determinadas pelo setor competente do órgão, com base em parâmetros técnicos objetivos, para a melhor consecução do interesse público.

 

De outro lado, cabe esclarecer que, via de regra, não é papel do órgão de assessoramento jurídico exercer a auditoria quanto à competência de cada agente público para a prática de atos administrativos. Incumbe, isto sim, a cada um destes observar se os seus atos estão dentro do seu espectro de competências.  Assim sendo, o ideal, para a melhor e completa instrução processual, é que sejam juntadas ou citadas as publicações dos atos de nomeação ou designação da autoridade e demais agentes administrativos, bem como, os atos normativos que estabelecem as respectivas competências, com o fim de que, em caso de futura auditoria, possa ser facilmente comprovado que quem praticou determinado ato tinha competência para tanto. Todavia, a ausência de tais documentos, por si, não representa, a nosso ver, óbice ao prosseguimento do feito.

 

É nosso dever salientar que determinadas observações são feitas sem caráter vinculativo, mas em prol da segurança da própria autoridade assessorada a quem incumbe, dentro da margem de discricionariedade que lhe é conferida pela lei, avaliar e acatar, ou não, tais ponderações.   Não obstante, as questões relacionadas à legalidade serão apontadas para fins de sua correção. O seguimento do processo sem a observância destes apontamentos será de responsabilidade exclusiva da Administração

 

Conforme BPC n° 07, do Manual de Boas Práticas Consultivas da CGU/AGU edição de 2016:

 

"A manifestação consultiva que adentrar questão jurídica com potencial de significativo reflexo em aspecto técnico deve conter justificativa da necessidade de fazê-lo, evitando-se posicionamentos conclusivos sobre temas não jurídicos, tais como os técnicos, administrativos ou de conveniência ou oportunidade, podendo-se, porém, sobre estes emitir opinião ou formular recomendações, desde que enfatizando o caráter discricionário de seu acatamento."

 

Frise-se que a presente manifestação jurídica se restringe à consulta formulada, não se estendendo, portanto, ao demais aspectos da autuação.

 

 

A MEDIDA PROVISÓRIA Nº 1.154, DE 1º DE JANEIRO DE 2023

 

Antes de tudo, imperativo fazer referência às significativas modificações implementadas com o advento da Medida Provisória nº 1.154, de 1º de janeiro de 2023 na organização básica dos órgãos da Presidência da República e dos Ministérios.

 

Vejamos:

 

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 62 da Constituição, adota a seguinte Medida Provisória, com força de lei:
Art. 1º  Esta Medida Provisória estabelece a organização básica dos órgãos da Presidência da República e dos Ministérios.
§ 1º  O detalhamento da organização dos órgãos de que trata esta Medida Provisória será definido nos decretos de estrutura regimental.
§ 2º  A denominação e as competências das unidades administrativas integrantes dos órgãos de que trata esta Medida Provisória serão definidas na forma prevista no § 1º.
§ 3º  Ato do Poder Executivo federal estabelecerá a vinculação das entidades aos órgãos da administração pública federal.
 
(...)
Da estrutura ministerial
Art. 17. Os Ministérios são os seguintes:
I - Ministério da Agricultura e Pecuária;
II - Ministério das Cidades;
III - Ministério da Cultura;
IV - Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação;    
V - Ministério das Comunicações;   
VI - Ministério da Defesa;
VII - Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar;
VIII - Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional;
IX - Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome;
X - Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania;
XI - Ministério da Fazenda;
XII - Ministério da Educação;
XIII - Ministério do Esporte;
XIV - Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos;
XV - Ministério da Igualdade Racial;
XVI - Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços;
XVII - Ministério da Justiça e Segurança Pública;
XVIII - Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima;
XIX - Ministério de Minas e Energia;
XX - Ministério das Mulheres;
XXI - Ministério da Pesca e Aquicultura;
XXII - Ministério do Planejamento e Orçamento;
XXIII - Ministério de Portos e Aeroportos;
XXIV - Ministério dos Povos Indígenas;
XXV - Ministério da Previdência Social;
XXVI - Ministério das Relações Exteriores;
XXVII - Ministério da Saúde;
XXVIII - Ministério do Trabalho e Emprego;
XXIX - Ministério dos Transportes;
XXX - Ministério do Turismo; e
XXXI - Controladoria-Geral da União.
 

A matéria relativa ao patrimônio imobiliário da União migrou para a pasta do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, na forma do inciso VII do art. 32,  com a ressalva contida no inciso XXIII, do artigo 24,  in verbis:

 

Do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos
 
Art. 32.  Constituem áreas de competência do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos:
 
I - diretrizes, normas e procedimentos voltadas à gestão pública eficiente, eficaz, efetiva e inovadora para geração de valor público e redução das desigualdades;
 
II - política de gestão de pessoas e de desenvolvimento de competências transversais e de liderança para o quadro de servidores da administração pública federal;
 
III - inovação em serviços públicos, simplificação e aumento da eficiência e da eficácia das políticas públicas;
 
IV - transformação digital dos serviços públicos, governança e compartilhamento de dados;
 
V - coordenação e gestão dos sistemas estruturadores de organização e inovação institucional, de serviços gerais, de pessoal civil, da administração dos recursos de tecnologia da informação, de gestão de parcerias e de gestão de documentos e arquivos;
 
VI - supervisão e execução de atividades administrativas do Ministério e de outros órgãos e entidades da administração pública federal;
 
VII - diretrizes, normas e procedimentos para a administração do patrimônio imobiliário da União;
 
VIII - diretrizes, coordenação e definição de critérios de governança corporativa das empresas estatais federais;
 
IX - política nacional de arquivos;
 
X - políticas e diretrizes para transformação permanente do Estado e ampliação da capacidade estatal; e
 
XI - cooperação federativa nos temas de competência do Ministério.
 
Parágrafo único.  Nos conselhos de administração das empresas públicas, das sociedades de economia mista, de suas subsidiárias e controladas e das demais empresas em que a União, direta ou indiretamente, detenha a maioria do capital social com direito a voto, sempre haverá um membro indicado pelo Ministro de Estado da Gestão e da Inovação
grifo da transcrição
 

Como ressaltado, o patrimônio imobiliário administrado pelas Forças Armadas constitui área de competência do Ministério da Defesa, sem prejuízo das competências atribuídas ao Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos;

 

Art. 24. Constituem áreas de competência do Ministério da Defesa:
(...)
XXIII - patrimônio imobiliário administrado pelas Forças Armadas, sem prejuízo das competências atribuídas ao Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos;
 

Mais adiante, o artigo 69 abarca diretriz sobre a permanência transitória das estruturas regimentais e os estatutos dos órgãos e das entidades da administração pública federal direta, autárquica e fundacional em vigor na data de publicação da Medida Provisória até a sua revogação expressa, no seguintes termos:

 

Das estruturas regimentais em vigor
 Art. 69. As estruturas regimentais e os estatutos dos órgãos e das entidades da administração pública federal direta, autárquica e fundacional em vigor na data de publicação desta Medida Provisória continuarão aplicáveis até a sua revogação expressa.
§ 1º O disposto no caput inclui, até a data de entrada em vigor das novas estruturas regimentais ou dos novos estatutos:
I - a manutenção dos cargos em comissão e das funções de confiança de nível hierárquico igual ou inferior ao nível 18 ou equivalentes, previstos em estruturas regimentais ou estatutos; e
II - a possibilidade de os órgãos criados por fusão ou transformação:
a) utilizarem o número de inscrição no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica - CNPJ e os demais elementos identificadores de um dos órgãos fundidos que lhe criaram ou do órgão transformado; e
b) manterem os mesmos acessos a sistemas eletrônicos utilizados pelos órgãos de origem.
§ 2º  Na hipótese prevista na alínea “a” do inciso II do § 1º, ato do Ministro de Estado poderá autorizar a utilização definitiva do número de inscrição no CNPJ.
§ 3º  Na hipótese de as estruturas regimentais de órgãos entre os quais tenha havido troca de competências ou de unidades administrativas entrarem em vigor em datas distintas, exceto se houver disposição em contrário em decreto, continuará aplicável a estrutura regimental anterior que trata da competência ou da unidade administrativa, até que a última estrutura regimental dos órgãos envolvidos entre em vigor.
§ 4º  Os cargos em comissão e funções de confiança referidos no I do § 1º poderão ter a alocação ou a denominação alteradas por ato do Poder Executivo federal antes da entrada em vigor das novas estruturas regimentais ou dos novos estatutos.
 

A Estrutura Regimental e o Quadro Demonstrativo dos Cargos em Comissão e das Funções de Confiança do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos foi aprovada pelo  Decreto nº 11.345, de 1º de janeiro de 2023,  tendo fixado para o início da sua vigência o dia 24 de janeiro de 2023:

 

Art. 1º  Ficam aprovados a Estrutura Regimental e o Quadro Demonstrativo dos Cargos em Comissão e das Funções de Confiança do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, na forma dos Anexos I e II
 
(...)
  
Art. 4º Este Decreto entra em vigor em 24 de janeiro de 2023.
grifo nosso

 

A citada Estrutura Regimental Ministério Gestão e da Inovação em Serviços Públicos constou do ANEXO I.

 

O seu artigo 1º relaciona  as  competências  do Ministério, figurando no inciso VII   as ações voltadas à administração do patrimônio da União:

 

Art. 1º  O Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, órgão da administração pública federal direta, tem como área de competência os seguintes assuntos:
(...)
VII - diretrizes, normas e procedimentos para a administração do patrimônio imobiliário da União;
 

Na nova configuração do Ministério Gestão e da Inovação em Serviços Públicos,  especificamente na Seção II - Dos órgãos específicos singulares do CAPÍTULO III - da competência dos Órgãos, art. 2º, inciso II, "f", foi inserida a Secretaria de Gestão do Patrimônio da União, com suas subdivisões em cinco Departamentos:

 

 Art. 2º  O Ministério da Gestão e da Inovação em serviços públicos tem a seguinte estrutura organizacional:
 
(...)
II - órgãos específicos singulares:
 
(...)
 
f) Secretaria de Gestão do Patrimônio da União:
 
1. Departamento de Receitas Patrimoniais;
 
2. Departamento de Caracterização e Incorporação de Imóveis;
 
3. Departamento de Destinação de Imóveis;
 
4. Departamento de Modernização e Inovação; e
 
5. Departamento de Assuntos Administrativos e Supervisão de Unidades Descentralizadas;

 

(...)

 

A partir do artigo 39 até o artigo 44 foram delimitadas as competências da Secretaria de Gestão do Patrimônio da União e de seus Departamentos:

 

Art. 39.  À Secretaria de Gestão do Patrimônio da União compete:
 
I - administrar o patrimônio imobiliário da União e zelar por sua conservação;
 
II - adotar as providências necessárias à regularidade dominial dos bens da União;
 
III - lavrar, com força de escritura pública, os contratos de aquisição, alienação, locação, arrendamento, aforamento, cessão e demais atos relativos a imóveis da União e providenciar os registros e as averbações junto aos cartórios competentes;
 
IV - promover o controle, a fiscalização e a manutenção dos imóveis da União utilizados em serviço público;
 
V - proceder às medidas necessárias à incorporação de bens imóveis ao patrimônio da União;
 
VI - formular, propor, acompanhar e avaliar a Política Nacional de Gestão do Patrimônio da União e os instrumentos necessários à sua implementação;
 
VII - formular e propor a política de gestão do patrimônio das autarquias e das fundações públicas federais; e
 
VIII - integrar a Política Nacional de Gestão do Patrimônio da União com as políticas públicas destinadas ao desenvolvimento sustentável.
 
 
Art. 40.  Ao Departamento de Receitas Patrimoniais compete coordenar, controlar e orientar as atividades relativas aos processos de arrecadação e cobrança de créditos patrimoniais.
 
Art. 41.  Ao Departamento de Caracterização e Incorporação de Imóveis compete:
 
I - planejar, coordenar, controlar e orientar as atividades relacionadas com a identificação, o cadastramento, a fiscalização e a incorporação imobiliária ao patrimônio da União, nas diversas modalidades de aquisição;
 
II - coordenar e orientar as atividades de avaliação e contabilidade dos ativos patrimoniais da União; e

 

III - planejar e coordenar as atividades de verificação in loco dos imóveis a serem incorporados, a preservação e regularização dominial desses imóveis e a articulação com entidades e instituições envolvidas.
 
Art. 42.  Ao Departamento de Destinação de Imóveis compete:
 
I - coordenar, controlar e orientar as atividades relacionadas com o desenvolvimento de ações e projetos voltados à destinação e à regularização fundiária dos imóveis da União;
 
II - desenvolver estudos e modelos de análise vocacional dos imóveis da União e de gestão dos imóveis desocupados;
 
III - coordenar e orientar as atividades voltadas à racionalização do uso e ocupação dos imóveis de uso especial;
 
IV - elaborar estudos, propor e coordenar atividades voltadas ao aproveitamento econômico dos ativos imobiliários;

 

V - elaborar estudos, propor e coordenar atividades voltadas ao apoio de políticas públicas, com destaque para as áreas de habitação, meio ambiente, regularização fundiária, titulação de comunidades tradicionais e apoio ao desenvolvimento local e infraestrutura;
 
VI - implementar as atividades necessárias à destinação de imóveis da União, em suas diversas modalidades; e
 
VII - realizar o monitoramento dos contratos e atos de destinação de imóveis e coordenar as atividades de gestão contratual.
 
Art. 43.  Ao Departamento de Modernização e Inovação compete:
 
I - organizar as informações disponíveis nas plataformas da Secretaria, inclusive as referentes à geoinformação e ao controle de atos administrativos;
 
II - coordenar e orientar as atividades de transformação dos serviços digitais;
 
III - supervisionar as atividades relacionadas a governança e gestão da tecnologia da informação e comunicação;
 
IV - direcionar e coordenar ações relacionadas à inovação tecnológica e de processos âmbito da Secretaria; e
 
V - coordenar ações de transformação de serviços corporativos.
 
Art. 44.  Ao Departamento de Assuntos Administrativos e Supervisão de Unidades Descentralizadas compete:
 
I - orientar as unidades sobre assuntos relativos a questões administrativas, observadas as diretrizes da Secretaria de Gestão Corporativa;
 
II - desenvolver ações voltadas para melhoria contínua da governança corporativa e da gestão estratégica;
 
III - gerir a programação e a execução orçamentária e financeira, os convênios, as licitações e os contratos e a infraestrutura das unidades do órgão;
 
IV - realizar e supervisionar, no âmbito da Secretaria, a elaboração de relatórios de gestão e de atividades e a consolidação dos planos e dos programas anuais e plurianuais;
 
V - gerir e monitorar o tratamento às demandas judiciais, de órgãos de controle interno e externo, do Ministério Público e da Corregedoria;
 
VI - coordenar, supervisionar a implementação e difundir as diretrizes de governança e de gestão de riscos;
 
VII - supervisionar a atuação e representação descentralizada da Secretaria; e
 
VIII - facilitar a interlocução das superintendências com os demais Departamentos da Secretaria, com o objetivo de garantir a padronização dos processos e a disseminação das melhores práticas de gestão e governança.

 

E, por fim,  localizada topograficamente na Seção III - Das unidades descentralizadas do CAPÍTULO III - da competência dos Órgãos, especificamente no artigo 53, a Superintendência do Patrimônio da União e suas atribuições, da seguinte forma:

 

 Art. 53.  Às Superintendências do Patrimônio da União compete:
I - programar, executar e prestar contas das ações necessárias à gestão do patrimônio, inclusive as atividades de caracterização, incorporação, destinação, gestão de receitas patrimoniais e fiscalização em sua área de jurisdição, conforme as diretrizes da Unidade Central;
II - zelar pelos bens imóveis que estejam sob sua guarda; e
III -  executar o levantamento e a verificação no próprio local dos imóveis a serem incorporados, a preservação e a regularização dominial desses imóveis e a articulação com as entidades e instituições envolvidas.

 

Nesse contexto normativo, e considerando que o Decreto acima entrou  em vigor em 24 de janeiro de 2023 será emitida a presente manifestação jurídica.

 

 

ANALISE JURIDICA

 

1. o objeto da consulta

A consulta formulada pela SPU/PR se circunscreve a um determinado ponto versado na defesa da empresa autuada, ou seja:

 

"quando o fato for objeto de procedimentos instaurados por entidade estadual responsável pelo patrimônio ambiental, isso impede nova penalização pela autoridade federal, sob pena de violar o princípio do non bis in idem insculpido, dentre outros dispositivos, no artigo 76 da Lei Federal nº 9.605/98.”

 

Sendo assim, torna-se necessário nos determos na narrativa consignada no relatório de fiscalização da SPU/PR, reproduzida na Notificação nº 33/2022/NUCIP, a fim de diferenciá-la de condutas ilícitas relacionadas à esfera ambiental.

 

2. a prática infracional.

Retira-se do  Relatório de Fiscalização Individual - RFI 3177 (SEI 20371261) que durante a vistoria no local foram constatadas as irregularidades abaixo discriminadas em área de uso comum do povo de propriedade da União:

9. CARACTERIZAÇÃO DAS CONDIÇÕES VERIFICADAS NA FISCALIZAÇÃO:
As vistorias foram acompanhadas por equipe do ICMBio, IAT e pelo Presidente da Associação de Moradores. Também por outros membros da Comunidade.
Tratam-se de imóveis adquiridos de nativos, pela empresa supracitada, e no momento da vistoria o responsável não estava na residência, apenas os pedreiros.
Durante a visita, foram observadas as seguintes situações:
- Construção de muro de alvenaria.
- Construção de cercas e estruturas de contenção, utilizando, segundo denúncia, madeira retirada ilegalmente de área de preservação ambiental.
- Remoção de vegetação de mangue/aterro em área de aproximadamente 50m2 e obra de contenção em área de uso comum do povo em área de aproximadamente 40m2.
No momento da vistoria, a única atividade em andamento era a construção de uma residência (em fase final) na área em questão.

 

Como se depreende do citado relatório, o servidor público responsável pela fiscalização constatou, de forma irrefutável,  que a empresa autuada empreendeu ações vedadas pela lei contra o patrimônio imobiliário da União, consubstanciadas na construção de muro de alvenaria; construção de cercas e estruturas de contenção, utilizando, segundo denúncia, madeira retirada ilegalmente de área de preservação ambiental e remoção de vegetação de mangue/aterro em área de aproximadamente 50m2 e obra de contenção em área de uso comum do povo em área de aproximadamente 40m2 em área considerada de uso comum do povo.

 

A prática irregular consiste, como se denota, no uso privativo de bem destinado ao uso comum da coletividade e não na utilização de madeira retirada ilegalmente (segundo denúncias) e na simples remoção de mangue/vegetação. Essas referências são meramente ilustrativas, eis que não compõem o tipo legal da infração. 

 

Sobre os bens para uso comum, trazemos à colação um trecho do MANUAL DE FISCALIZACAO DO PATRIMÔNIO DA UNIÃO -2018, elaborado pelo antigo Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão:

 
“Qualquer pessoa tem o direito de utilizar de diversas formas um bem público: passear em um parque, andar nas ruas e praças, caminhar numa praia. Da mesma forma, as pessoas têm o dever de preservar estes bens para uso comum da coletividade.
As práticas de uso privativo de praias, praças, ruas, rios e águas são claras violações ao direito coletivo da população.
Para garantir que esses bens sejam de livre utilização do povo, a lei define quais são os bens destinados ao uso coletivo, ou seja, os bens de uso comum do povo são definidos por lei ou pela própria natureza. Podem ser usados indistintamente pelas pessoas, em igualdade de condições.
São exemplos de bens de uso comum do povo: as vias públicas, as praças públicas, os parques públicos, as praias marítimas, as águas, os rios, espelhos d’água (portos, ancoradouros).
Os bens de uso comum do povo são regidos pelo regime de direito público, isto é, seus interesses são pertinentes à sociedade e não aos particulares. São, portanto, inalienáveis (não podem ser transmitidos, mediante doação, venda, permuta), imprescritíveis (não podem ser objeto de usucapião), impenhoráveis (não podem ser transferidos forçadamente) e insuscetíveis de serem onerados (não podem ser dados em garantia por uma dívida contraída pelo poder público).

 

Lembramos que de acordo com o Código Civil, bens de uso comum do povo são bens públicos destinados ao uso da população, como é o caso das praias, ruas, praças etc.:

 
CAPÍTULO III
Dos Bens Públicos
Art. 98. São públicos os bens do domínio nacional pertencentes às pessoas jurídicas de direito público interno; todos os outros são particulares, seja qual for a pessoa a que pertencerem.
Art. 99. São bens públicos:
I - os de uso comum do povo, tais como rios, mares, estradas, ruas e praças;
II - os de uso especial, tais como edifícios ou terrenos destinados a serviço ou estabelecimento da administração federal, estadual, territorial ou municipal, inclusive os de suas autarquias;
III - os dominicais, que constituem o patrimônio das pessoas jurídicas de direito público, como objeto de direito pessoal, ou real, de cada uma dessas entidades.
Parágrafo único. Não dispondo a lei em contrário, consideram-se dominicais os bens pertencentes às pessoas jurídicas de direito público a que se tenha dado estrutura de direito privado.
Art. 100. Os bens públicos de uso comum do povo e os de uso especial são inalienáveis, enquanto conservarem a sua qualificação, na forma que a lei determinar.
Art. 101. Os bens públicos dominicais podem ser alienados, observadas as exigências da lei.
Art. 102. Os bens públicos não estão sujeitos a usucapião.
Art. 103. O uso comum dos bens públicos pode ser gratuito ou retribuído, conforme for estabelecido legalmente pela entidade a cuja administração pertencerem.

 

Na esfera da União, as diretrizes básicas sobre os seus bens imóveis encontram-se no Decreto-Lei nº 9.760, de 5 de setembro de 1946 e na Lei nº 9.636 de 15 de maio de 1998, esta última dispondo sobre a regularização, administração, aforamento e alienação de bens imóveis de domínio da União.

 

Sem embargo, o arcabouço jurídico em matéria de patrimônio da União é profícuo, cabendo destacar, ainda, o Decreto-Lei nº 2.398, de 21 de dezembro de 1987, que trata da regularização, administração, aforamento e alienação de bens imóveis de domínio da União, e cujo artigo 6º dispõe especificamente acerca da infração administrativa contra o patrimônio da União:

 

Art. 6o Considera-se infração administrativa contra o patrimônio da União toda ação ou omissão que viole o adequado uso, gozo, disposição, proteção, manutenção e conservação dos imóveis da União
I - (Revogado);                (Redação dada pela  Lei nº 13.139, de 2015)
II - (Revogado).                    (Redação dada pela  Lei nº 13.139, de 2015)
§ 1o Incorre em infração administrativa aquele que realizar aterro, construção, obra, cercas ou outras benfeitorias, desmatar ou instalar equipamentos, sem prévia autorização ou em desacordo com aquela concedida, em bens de uso comum do povo, especiais ou dominiais, com destinação específica fixada por lei ou ato administrativo.               (Incluído pela  Lei nº 13.139, de 2015)
§ 2o O responsável pelo imóvel deverá zelar pelo seu uso em conformidade com o ato que autorizou sua utilização ou com a natureza do bem, sob pena de incorrer em infração administrativa.                  (Incluído pela  Lei nº 13.139, de 2015)
§ 3o Será considerado infrator aquele que, diretamente ou por interposta pessoa, incorrer na prática das hipóteses previstas no caput.                (Incluído pela  Lei nº 13.139, de 2015)
§ 4o Sem prejuízo da responsabilidade civil, as infrações previstas neste artigo serão punidas com as seguintes sanções:                    (Incluído pela  Lei nº 13.139, de 2015)
I - embargo de obra, serviço ou atividade, até a manifestação da União quanto à regularidade de ocupação;                    (Incluído pela  Lei nº 13.139, de 2015)
II - aplicação de multa;                  (Incluído pela  Lei nº 13.139, de 2015)
III - desocupação do imóvel; e                   (Incluído pela  Lei nº 13.139, de 2015)
IV - demolição e/ou remoção do aterro, construção, obra, cercas ou demais benfeitorias, bem como dos equipamentos instalados, à conta de quem os houver efetuado, caso não sejam passíveis de regularização.                  (Incluído pela  Lei nº 13.139, de 2015)

 

Com fundamento de validade na legislação apontada foi expedida a Instrução Normativa nº 23, de 18 de março de 2020, que estabelece as diretrizes e procedimentos das atividades de fiscalização dos imóveis da União, de onde se retira o artigo 10:

 

 Art. 10. Considera-se infração administrativa contra o patrimônio da União toda ação ou omissão que consista em:
I -violação do adequado uso, gozo, disposição, proteção, manutenção e conservação dos imóveis da União;
II -realização de aterro, construção, obra, cercas ou outras benfeitorias, desmatar ou instalar equipamentos, sem prévia autorização ou em desacordo com aquela concedida, em bens de uso comum do povo, especiais ou dominiais, com destinação específica fixada por lei ou ato administrativo;
III -descaracterização dos bens imóveis da União sem prévia autorização; e
IV -descumprimento de cláusulas previstas nos contratos de destinação patrimonial e no termo de adesão da gestão de praias.
§1º Será considerado infrator, aquele que, diretamente ou por interposta pessoa, por ação ou omissão, incorrer na prática das hipóteses previstas neste artigo.

 

É extreme de dúvida que o agente público norteou a sua atuação nos estritos termos das normas acima mencionadas, adotando a atitude prevista na lei ao se deparar com a ingerência não autorizada no patrimônio da União,  categorizado como bem de uso comum do povo.

 

Diante das evidências, não lhe restaria outra conduta a não ser a de observar as regras e procedimentos previstos na Instrução Normativa nº 23/2020, sob pena de se afastar dos seus deveres institucionais e sujeitar-se às penas da lei.

 

3. boa-fé

De outro lado, a alegação de que a construção de cercas, aterro e obra em áreas de de uso comum do povo teria sido feita a pretexto de proteção ou conservação do imóvel não se sustenta, ainda que de boa-fé.

 

Aliás, importante assinalar que o tema foi objeto de estudo realizado pelo DECOR, conforme  Parecer nº 100/2018/Decor-CGU/AGU (24/12/2018), cuja ementa abaixo se reproduz:

 

EMENTA:
I – Direito Administrativo. Art. 207 do Decreto nº 16.197, de 31/10/1923, e § 1o do art. 6º do Decreto-Lei nº 2.398, de 21/12/1987: Benfeitorias e acessões artificiais sobre bem de uso comum do povo (praia marítima). Inciso II do art. 9º da Lei nº 9.636, de 15/05/1998, c/c § 1ºdo art. 132 do Decreto-Lei nº 9.760, de 05/09/1946: Cancelamento parcial da inscrição de ocupação, remoção dos itens introduzidos e avaliação teórica de sua boa-fé.
II – Inexistência de presunção de boa-fé na introdução irregular de benfeitorias e acessões artificiais privadas em bens públicos de uso comum do povo. Precedentes jurisprudenciais do Superior Tribunal de Justiça.
 
III – Possibilidade jurídica de anulação ou cancelamento parcial da inscrição de ocupação ínsita à área pública de uso comum do povo atingida.
 
IV – Descabimento de indenização pública pelos itens a serem removidos.
V – Admissibilidade em tese de arguição acessória do artigo 4º da Lei n° 9.784, de 29/01/1999. Sua aparente inaplicabilidade ao caso concreto.
 
VI – Viabilidade de sindicar-se administrativamente eventual má-fé ou agir temerário, quando tecnicamente aferíveis.
 
VII– Superação parcial dos critérios abstratos de elegibilidade à indenização preconizados no Parecer nº 653/2018/DPC/CGJPU/Conjur-MP/CGU/AGU (05/06/2018), excetuada a hipótese assinalada ao final.

 

Vale a transcrição de alguns trechos:

 
"10. Porém, notadamente quando tal se dá sobre bens de uso comum do povo, há inversão da presunção de boa-fé que em regra norteia o direito à indenização, pois que em situações tais invariavelmente operam impeditivos legais expressos ou implícitos, cujo descumprimento sempre configura dano in re ipsa, inconciliável com a admissão teórica ou empírica de boa-fé da conduta.
(...)
12 . Logo, todos os aterros e benfeitorias ou acessões artificiais privadas introduzidas irregularmente em segmentos de áreas de uso comum do povo configuram ilícitos civis ou administrativos, pois que impõem dano ficto a valores públicos e coletivos tutelados por lei-[[39]], e,portanto, afastam o pressuposto formal para acesso à sua indenização, porque não apenas a boa-fé é conceito restrito a fenômenos de posse individual, inexistentes na ocupação de terrenos públicos, onde opera mera e precária detenção (ou, quando muito, posse coletiva), como também descabe falar-se de boa-fé oponível a expressa disposição legal, a propósito merecendo leitura os seguintes julgados:(...)"
 

Assim, "os aterros e benfeitorias ou acessões artificiais privadas introduzidas irregularmente em segmentos de áreas de uso comum do povo configuram ilícitos civis ou administrativos, pois que impõem dano ficto a valores públicos e coletivos tutelados por lei".

 

4. ocorrência do “bis in idem”

Decorre da argumentação antes articulada, que a alegada ocorrência do “bis in idem” pela defesa da empresa autuada também não merece guarida.

 

Na verdade, a locução latina, “bis in idem”, utilizada para significar que não se devem aplicar duas penas sobre a mesma falta, constitui mera estratégia de defesa.

 

Não se discute que há ações ou omissões que, além de caracterizarem infrações patrimoniais, podem configurar infrações ambientais, sanitárias, etc.

 

Porém,  isso não significa que elas se confundem.

 

No caso ventilado nos autos, a conduta reprovável se consubstancia na intervenção irregular no patrimônio da União de uso comum do povo, como descrito no relatório de fiscalização e na notificação nº 33/2022.

 

A simples alusão a termos que podem remeter à questão ambiental,  por si só, não significa que a infração deve ser enquadrada nessa matéria.  

 

O servidor público ao descrever a conduta praticada pela empresa indicou com clareza o tipo infracional: a construção  de cercas e estruturas de contenção; a remoção de vegetação de mangue/aterro  e a obra de contenção em área de uso comum do povo,   que constituem inquestionavelmente, ofensa ao patrimônio da União.

 

Fica patente que o fundamento da infração patrimonial não alcança o fundamento infracional da legislação específica (ambiental, sanitária, etc.), não podendo se cogitar de "bis in idem".

 

Relevante assinalar,  para corroborar a inexistência do "bis in idem",  que a SPU/PR vistoriou o local juntamente com o ICMbio numa demonstração inequívoca de que havia perfeita compreensão por parte das autoridades públicas,  detentoras das competências e dos recursos técnicos especializados em suas áreas de atuação,  da concomitância de violação ao patrimônio da União e ao meio ambiente a demandar providências distintas, como de fato ocorreu.

 

CONCLUSAO

 

Em face do exposto, não merece propsperar a alegação contida na defesa de que quando um mesmo "fato for objeto de procedimentos instaurados por entidade estadual responsável pelo patrimônio ambiental, isso impede nova penalização pela autoridade federal, sob pena de violar o princípio do non bis in idem insculpido, dentre outros dispositivos, no artigo 76 da Lei Federal nº 9.605/98", pois, como suficientemente demonstrado,  o que determinou a ação fiscalizatória e, consequentemente, a sanção imposta,  foi a constatação in loco da violação ao patrimônio público, perfeitamente caracterizada diante do ato de construir e realizar obras em imóvel da União de uso comum do povo sem autorização prévia,   e não de questões de ordem ambiental.

 

É o parecer, de caráter opinativo, que prescinde de aprovação por força do art. 21 da Portaria E-CJU/Patrimônio/CGU/AGU n° 1/2020 – Regimento Interno da e-CJU/Patrimônio, publicada no Suplemento B do BSE nº30, de 30 de julho de 2020.

 

 

São Paulo, 09 de fevereiro de 2023.

 

 

LUCIANA MARIA JUNQUEIRA TERRA

ADVOGADA DA UNIÃO

 

 


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