ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA JUNTO AO MINISTÉRIO DA CULTURA
GABINETE

PARECER n. 00041/2023/CONJUR-MINC/CGU/AGU

 

NUP: 72031.002945/2023-12

INTERESSADOS: TERCEIRO INTERESSADO

ASSUNTOS: ATOS ADMINISTRATIVOS

 

EMENTA: I Análise e manifestação acerca de projeto de lei em fase de sanção presidencial. II - Projeto de Lei nº 2.676, de 2021, de autoria do Senhor Deputado Eros Biondini, que "Institui o Dia Nacional do Terço dos Homens". III. Pela ausência de pertinência temática com as competências deste Ministério da Culturaconforme art. 21 da Medida Provisória nº 1.154, de 1º de janeiro de 2023 c/c art. 1º do Anexo I do Decreto nº 11.336, de 1º de janeiro de 2023. 

 

 

I. RELATÓRIO

 

Trata-se de expediente inaugurado a partir de missiva da Secretaria Especial para Assuntos Jurídicos da Casa Civil da Presidência da República - SAJ-CC (OFÍCIO CIRCULAR Nº 58/2023/CAP/SALEG/SAJ/CC/PR - doc SUPER nº 4103445), dirigida a este Ministério da Cultura e outros Ministérios, em 05/04/2023, por conduto da qual solicita a manifestação sobre o Projeto de Lei nº 2.676, de 2021, de autoria do Senhor Deputado Eros Biondini, que "Institui o Dia Nacional do Terço dos Homens"​, o qual "abrange pauta de natureza transversal, envolvendo assuntos de competência das pastas em epígrafe, salvo melhor juízo."

 

2. Arremata a SAJ-CC o seguinte no Ofício supra:

 

Tendo em vista que a Matéria já se encontra em fase de sanção, encareço seja encaminhado a esta Subchefia parecer do órgão técnico competente, com visto ministerial, em no máximo 10 (dez) dias, até o dia 14/04/23, conforme disposto no parágrafo único do art. 25 do Decreto nº 9.191, de 1º de novembro 2017, sem prejuízo de antecipação tão logo seja realizada, no intuito de colaborar com os trâmites e a urgência que a matéria requer.

 

3. Encaminhada a missiva supra à Assessoria Especial de Assuntos Parlamentares e Federativos deste Ministério, referido órgão redireciona o pleito a esta Consultoria Jurídica, por meio do Ofício nº 67/2023/COLEP/ASPAR/GM/MinC, em 5/4/2023, para emissão de parecer, solicitando a remessa posterior dos autos ao Gabinete da Exma. Ministra, até o dia 14/04/2023.

 

4. O inteiro teor do PL encontra-se acostado aos autos do processo SEI (1103974).

 

5. É o relatório. Passo à análise.

 

II. ANÁLISE JURÍDICA

 

6. Preliminarmente, impende tecer breve consideração sobre a competência desta Consultoria Jurídica para manifestação no processo in casu.

 

7. Sabe-se que a Constituição de 1988 prevê as funções essenciais à Justiça em seu Título IV, Capítulo IV; contemplando na Seção II a advocacia pública. Essa essencialidade à justiça deve ser entendida no sentido mais amplo que se possa atribuir à expressão, estando compreendidas no conceito de essencialidade todas as atividades de orientação, fiscalização e controle necessárias à defesa dos interesses protegidos pelo ordenamento jurídico.

 

8. O art. 131 da Constituição, ao instituir em nível constitucional a Advocacia-Geral da União - AGU, destacou como sua competência as atividades de consultoria e assessoramento jurídico ao Poder Executivo, nos termos da lei complementar que dispuser sobre sua organização e funcionamento, in verbis:

 

Art. 131. A Advocacia-Geral da União é a instituição que, diretamente ou através de órgão vinculado, representa a União, judicial e extrajudicialmente, cabendo-lhe, nos termos da lei complementar que dispuser sobre sua organização e funcionamento, as atividades de consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo.
 

9. Nesta esteira, o art. 11, inciso I e V, da Lei Complementar n.º 73/1993 - Lei Orgânica da Advocacia-Geral da União -, estabeleceu, no que concerne à atividade de consultoria ao Poder Executivo junto aos Ministérios, a competência das Consultorias Jurídicas para assistir a autoridade assessorada no controle interno da constitucionalidade e legalidade administrativa dos atos a serem por ela praticados. Nesse sentido, veja-se:

 

Art. 11 - Às Consultorias Jurídicas, órgãos administrativamente subordinados aos Ministros de Estado, ao Secretário-Geral e aos demais titulares de Secretarias da Presidência da República e ao Chefe do Estado-Maior das Forças Armadas, compete, especialmente:
I - assessorar as autoridades indicadas no caput deste artigo;
(...)
III - fixar a interpretação da Constituição, das leis, dos tratados e dos demais atos normativos a ser uniformemente seguida em suas áreas de atuação e coordenação quando não houver orientação normativa do Advogado-Geral da União;
(...)
V - assistir a autoridade assessorada no controle interno da legalidade administrativa dos atos a serem por ela praticados ou já efetivados, e daqueles oriundos de órgão ou entidade sob sua coordenação jurídica;
 

10. Ressalte-se, por oportuno, que o controle interno da legalidade realizado por este órgão jurídico não tem o condão de se imiscuir em aspectos relativos à conveniência e à oportunidade da prática dos atos administrativos, que estão reservados à esfera discricionária do administrador público legalmente competente, tampouco examinar questões de natureza eminentemente técnica, administrativa e/ou financeira, conforme se extrai do Enunciado nº 7 do Manual de Boas Práticas Consultivas da Advocacia-Geral da União, que possui o seguinte teor:

 

A manifestação consultiva que adentrar questão jurídica com potencial de significativo reflexo em aspecto técnico deve conter justificativa da necessidade de fazê-lo, evitando-se posicionamentos conclusivos sobre temas não jurídicos, tais como os técnicos, administrativos ou de conveniência ou oportunidade, podendo-se, porém, sobre estes emitir opinião ou formular recomendações, desde que enfatizando o caráter discricionário de seu acatamento.

 

11. Elaboradas essas considerações preliminares, adentra-se à análise da proposta.

 

12. O Projeto de Lei em comento já percorreu o trâmite legislativo no âmbito do Congresso Nacional, tendo sido enviado para sanção ou veto do Exmo. Presidente da República, nos termos do art. 66 da Constituição Federal.[1]

 

13. Adentrando-se a leitura de seu teor, verifica-se que a proposta visa instituir o Dia Nacional do Terço dos Homens, a ser celebrado anualmente no dia 8 de setembro, e a respeito do qual, em consulta ao sítio eletrônico da Câmara dos Deputados[2], verifica-se o seguinte na justificativa apresentada pelo autor da proposta: 

 

A instituição do Dia Nacional do Terço dos Homens corresponde ao critério de alta significação para o segmento religioso que professa a fé católica.
O Terço dos Homens é um movimento cristão que tem o propósito de engajar na Igreja Católica homens de todas as gerações, mediante esse ato de fé e devoção, como estímulo fundamental à formação da família cristã e da sociedade como um todo.
A origem do Terço dos Homens, em nível mundial, é desconhecida. No exterior, há notícias de grupos de homens que se reúnem para a oração do terço ao menos desde 1912. No Brasil, foi instituído por Frei Peregrino, no dia 8 de setembro de 1936, no povoado da Vila da Providência, hoje cidade de Itabi, no estado de Sergipe. No Movimento Apostólico de hoenstatt, baseado na aliança de amor com a Virgem Maria, originário da Alemanha e estabelecido no Brasil desde 1935, o Terço dos Homens começou a partir da iniciativa de um pequeno grupo de homens, que faziam essa oração na rua, enquanto suas esposas participavam das reuniões do movimento. Nos anos seguintes, a prática se expandiu para diversas paróquias, destacando-se sua presença no estado de Pernambuco. Na cidade de Olinda, teve grande repercussão, tornando-se manifestação cada vez mais relevante do Movimento Mãe Rainha Três Vezes Admirável, do Movimento Apostólico de Schoenstatt. Daí surge a denominação de Terço dos Homens Mãe Rainha.
Os grupos do Terço dos Homens continuam crescendo por todo o País. Sua dimensão levou ao surgimento, a partir de 2008, das romarias anuais do Terço dos Homens ao Santuário Nacional de Nossa Senhora Aparecida. São centenas de homens que acorrem a esse evento, provindos de todos os recantos do território nacional.
(...) A escolha do dia 8 de setembro corresponde à data em que se registra sua primeira manifestação no Brasil, por obra magnífica de Frei Peregrino.
 

14. A justificativa faz menção, ainda, a audiências públicas que teriam sido realizadas - embora não se visualize a comprovação pelo teor extraído no referido sítio eletrônico - em cumprimento ao disposto na Lei nº 12.345, de 9 de dezembro de 2010, a qual "Fixa critério para instituição de datas comemorativas." A respeito, vejam-se os requisitos exigidos pela Lei em comento:

Art. 1o  A instituição de datas comemorativas que vigorem no território nacional obedecerá ao critério da alta significação para os diferentes segmentos profissionais, políticos, religiosos, culturais e étnicos que compõem a sociedade brasileira. 
Art. 2o  A definição do critério de alta significação será dada, em cada caso, por meio de consultas e audiências públicas realizadas, devidamente documentadas, com organizações e associações legalmente reconhecidas e vinculadas aos segmentos interessados. 
Art. 3o  A abertura e os resultados das consultas e audiências públicas para a definição do critério de alta significação serão objeto de ampla divulgação pelos meios oficiais, facultando-se a participação dos veículos de comunicação social privados. 
Art. 4o  A proposição de data comemorativa será objeto de projeto de lei, acompanhado de comprovação da realização de consultas e/ou audiências públicas a amplos setores da população, conforme estabelecido no art. 2o desta Lei. 
 

15. A Lei nº 12.345, de 2010, antevê que as datas comemorativas possam atender diferentes "segmentos sociais", a exemplo de religiosos ou culturais. No caso em apreço, a partir da leitura da justificativa do PL, verifica-se que a data tem natureza eminentemente religiosa - razão pela qual é de se inferir que seu conteúdo foge à competência deste Ministério da Cultura, não se encontrando no rol de matérias afetas a esta Pasta, senão, vejam-se os termos da Medida Provisória nº 1.154, de 1º de janeiro de 2023 ("Estabelece a organização básica dos órgãos da Presidência da República e dos Ministérios") c/c art. 1º do Anexo I do Decreto nº 11.336, de 1º de janeiro de 2023 (o qual aprova a estrutura do Ministério da Cultura):

 

MP nº 1.154, de 2023
Seção IV
Do Ministério da Cultura
Art. 21.  Constituem áreas de competência do Ministério da Cultura:
I - política nacional de cultura e política nacional das artes;
II - proteção do patrimônio histórico, artístico e cultural;
III - regulação dos direitos autorais;
IV - assistência ao Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar e ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - Incra nas ações de regularização fundiária, para garantir a preservação da identidade cultural dos remanescentes das comunidades dos quilombos;
V - proteção e promoção da diversidade cultural;
VI - desenvolvimento econômico da cultura e a política de economia criativa;
VII - desenvolvimento e implementação de políticas e ações de acessibilidade cultural; e
VIII - formulação e implementação de políticas, de programas e de ações para o desenvolvimento do setor museal.
 
...
Decreto nº 11.336, de 2023
CAPÍTULO I
DA NATUREZA E DA COMPETÊNCIA
 
Art. 1º  O Ministério da Cultura, órgão da administração pública federal direta, tem como área de competência os seguintes assuntos:
I - política nacional de cultura e política nacional das artes;
II - proteção do patrimônio histórico, artístico e cultural;
III - regulação dos direitos autorais;
IV - assistência ao Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar e ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária nas ações de regularização fundiária, para garantir a preservação da identidade cultural dos remanescentes das comunidades dos quilombos;
V - proteção e promoção da diversidade cultural;
VI - desenvolvimento econômico da cultura e a política de economia criativa;
VII - desenvolvimento e a implementação de políticas e ações de acessibilidade cultural; e
VIII - formulação e implementação de políticas, de programas e de ações para o desenvolvimento do setor museal.
 

16. Quanto aos aspectos estritamente formais, insta ponderar que ao Projeto de Lei se aplicam as regras encartadas pela Lei Complementar nº 95, de 26 de fevereiro de 1998, que dispõe sobre a elaboração, a redação, a alteração e a consolidação das leis, conforme determina o parágrafo único do art. 59 da Constituição.

 

III. CONCLUSÃO

 

17. Diante do exposto, sem adentrar nos valores de conveniência e oportunidade na criação de mecanismos institucionais, não sujeitos ao crivo desta CONJUR, depreende-se que o Projeto de Lei nº 2.676, de 2021, de autoria do Senhor Deputado Eros Biondini, que "Institui o Dia Nacional do Terço dos Homens"​, ora submetido ao apreço, não trata de matéria inserta nas competências legais deste Ministério da Cultura.

 

18. De todo modo, para fins de apreço pela Casa Civil, recomenda-se seja aferida a comprovação de audiências e consultas públicas, em observância ao disposto na Lei nº 12.345, de 2010.

 

19. Encaminhem-se os autos, via SEI, ao Gabinete da Exma. Ministra da Cultura, conforme solicitação da ASPAR no Ofício nº 67/2023/COLEP/ASPAR/GM/MinC, em prosseguimento.

 

 

Brasília, 10 de abril de 2023.

 

 

(assinado eletronicamente)

SOCORRO JANAINA M. LEONARDO

Advogada da União

Consultora Jurídica Substituta

 

 

 


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Notas

  1. ^ Constituição: Art. 66. A Casa na qual tenha sido concluída a votação enviará o projeto de lei ao Presidente da República, que, aquiescendo, o sancionará.
  2. ^ Disponível em: https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=2050012&filename=Tramitacao-PL%202676/2021 . Acesso em 10 de abril.



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