ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA JUNTO AO MINISTÉRIO DA CULTURA
GABINETE

 

PARECER n. 00042/2023/CONJUR-MINC/CGU/AGU

 

NUP: 01400.004926/2023-29

INTERESSADOS: ASPAR/MINC

ASSUNTOS: ATOS ADMINISTRATIVOS

 

EMENTA: I Análise e manifestação acerca de projeto de lei em tramitação no Congresso Nacional. Aprovado na Câmara dos Deputados e remetido ao Senado Federal.
II - Projeto de Lei nº 3.322, de 2021, de autoria da Deputada Lídice da Mata, que “Inscreve o nome de Adhemar Ferreira da Silva no Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria”.
​III. Pela ausência de pertinência temática com as competências deste Ministério da Culturaconforme art. 21 da Medida Provisória nº 1.154, de 1º de janeiro de 2023 c/c art. 1º do Anexo I do Decreto nº 11.336, de 1º de janeiro de 2023.  

 

I. RELATÓRIO

 

Trata-se de expediente inaugurado a partir de missiva da Assessoria Especial de Assuntos Parlamentares e Federativos deste Ministério (Ofício nº 57/2023/COLEP/ASPAR/GM/MinC), remetido a esta Consultoria Jurídica na data de 05/04/2023, por conduto da qual solicita a manifestação sobre o Projeto de Lei n° 3.322, de 2021, que “Inscreve o nome de Adhemar Ferreira da Silva no Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria”, de autoria da Deputada Lídice da Mata.

 

2. O inteiro teor do PL encontra-se acostado aos autos do processo SEI (1095762).

 

3. É o sucinto relatório. Passo à análise.

 

II. ANÁLISE JURÍDICA

 

4. Preliminarmente, impende tecer breve consideração sobre a competência desta Consultoria Jurídica para manifestação no processo in casu.

 

5. Sabe-se que a Constituição de 1988 prevê as funções essenciais à Justiça em seu Título IV, Capítulo IV; contemplando na Seção II a advocacia pública. Essa essencialidade à justiça deve ser entendida no sentido mais amplo que se possa atribuir à expressão, estando compreendidas no conceito de essencialidade todas as atividades de orientação, fiscalização e controle necessárias à defesa dos interesses protegidos pelo ordenamento jurídico.

 

6. O art. 131 da Constituição, ao instituir em nível constitucional a Advocacia-Geral da União - AGU, destacou como sua competência as atividades de consultoria e assessoramento jurídico ao Poder Executivo, nos termos da lei complementar que dispuser sobre sua organização e funcionamento, in verbis:

 

Art. 131. A Advocacia-Geral da União é a instituição que, diretamente ou através de órgão vinculado, representa a União, judicial e extrajudicialmente, cabendo-lhe, nos termos da lei complementar que dispuser sobre sua organização e funcionamento, as atividades de consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo.
 

7. Nesta esteira, o art. 11, inciso I e V, da Lei Complementar n.º 73/1993 - Lei Orgânica da Advocacia-Geral da União -, estabeleceu, no que concerne à atividade de consultoria ao Poder Executivo junto aos Ministérios, a competência das Consultorias Jurídicas para assistir a autoridade assessorada no controle interno da constitucionalidade e legalidade administrativa dos atos a serem por ela praticados. Nesse sentido, veja-se:

 

Art. 11 - Às Consultorias Jurídicas, órgãos administrativamente subordinados aos Ministros de Estado, ao Secretário-Geral e aos demais titulares de Secretarias da Presidência da República e ao Chefe do Estado-Maior das Forças Armadas, compete, especialmente:
I - assessorar as autoridades indicadas no caput deste artigo;
(...)
III - fixar a interpretação da Constituição, das leis, dos tratados e dos demais atos normativos a ser uniformemente seguida em suas áreas de atuação e coordenação quando não houver orientação normativa do Advogado-Geral da União;
(...)
V - assistir a autoridade assessorada no controle interno da legalidade administrativa dos atos a serem por ela praticados ou já efetivados, e daqueles oriundos de órgão ou entidade sob sua coordenação jurídica;
 

8. Ressalte-se, por oportuno, que o controle interno da legalidade realizado por este órgão jurídico não tem o condão de se imiscuir em aspectos relativos à conveniência e à oportunidade da prática dos atos administrativos, que estão reservados à esfera discricionária do administrador público legalmente competente, tampouco examinar questões de natureza eminentemente técnica, administrativa e/ou financeira, conforme se extrai do Enunciado nº 7 do Manual de Boas Práticas Consultivas da Advocacia-Geral da União, que possui o seguinte teor:

 

A manifestação consultiva que adentrar questão jurídica com potencial de significativo reflexo em aspecto técnico deve conter justificativa da necessidade de fazê-lo, evitando-se posicionamentos conclusivos sobre temas não jurídicos, tais como os técnicos, administrativos ou de conveniência ou oportunidade, podendo-se, porém, sobre estes emitir opinião ou formular recomendações, desde que enfatizando o caráter discricionário de seu acatamento.

 

9. Elaboradas essas considerações preliminares, adentra-se à análise da proposta, cujo teor visa inscrever o nome de Adhemar Ferreira da Silva no Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria, depositado no Panteão da Pátria e da Liberdade Tancredo Neves, em Brasília, Distrito Federal.

 

10. A respeito do tema, mister trazer a lume os requisitos legais para a inscrição de brasileiro, brasileira ou grupo de brasileiros no Livro de Heróis e Heroínas da Pátria, conforme Lei nº 11.597, de 29 de novembro de 2007:

 

Art. 1º O Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria, depositado no Panteão da Pátria e da Liberdade Tancredo Neves, destina-se ao registro perpétuo do nome dos brasileiros e brasileiras ou de grupos de brasileiros que tenham oferecido a vida à Pátria, para sua defesa e construção, com excepcional dedicação e heroísmo. (Artigo com redação dada pela Lei nº 13.433, de 12/4/2017)
 
Art. 2º A distinção será prestada mediante a edição de lei, decorridos 10 (dez) anos da morte ou da presunção de morte do homenageado. (“Caput” do artigo com redação dada pela Lei n º 13.229, de 28/12/2015)
Parágrafo único. Excetua-se da necessidade de observância de prazo a homenagem aos brasileiros mortos ou presumidamente mortos em campo de batalha.
 
Art. 3º O registro levará em consideração o transcurso de data representativa de feito memorável da vida do laureado.

 

11. Em consulta ao sítio eletrônico da Câmara dos Deputados[1], extrai-se o seguinte da justificativa do PL in verbis

 

(...)
Teve sua primeira experiência olímpica em 1948, nos Jogos Olímpicos de Londres, terminando na 14º colocação. Porém, nos anos seguintes, sua carreira no salto triplo registrou crescimento contínuo. Em 1949, saltou 15,51m e se tornou recordista sul-americano da modalidade, superando marca que já durava 25 anos. Em 1950, igualou o recorde mundial, que perdurava desde 1936, saltando 16 metros. Em 1951, conquistou seu primeiro título panamericano. A consagração chegou em 1952, nas Olimpíadas de Helsinki, Finlândia onde conquistou a medalha de ouro (...)Recebeu em 1993 o título de Herói de Helsinque, junto com Emil Zatopek. Foi agraciado ainda pelo COB em 2000, com o Mérito Olímpico. Em 2012, foi imortalizado no Hall da Fama do atletismo. Adhemar Ferreira da Silva é o único brasileiro a representar o país no salão da Federação Internacional de Atletismo (IAAF), criado como parte das celebrações do centenário da instituição. Terminou a vida trabalhando para o Estado de São Paulo, organizando competições nacionais e internacionais de Atletismo. Adhemar Ferreira da Silva morreu no dia 12 de janeiro de 2001, de parada cardíaca. O Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria homenageia a liberdade, a democracia e todos os homens e mulheres que se sacrificaram para garantir a autonomia e o engrandecimento da nação nos episódios históricos em que o direito à liberdade foi colocado em risco, enfim, pessoas que tiveram papel fundamental na construção do País, e o esporte é parte fundamental na construção de qualquer nação.
 

12. Depreende-se da leitura supra que o PL objetiva promover a inscrição de brasileiro com histórico de dedicação ao atletismo/esporte, já tendo decorrido o prazo de dez anos desde sua morte, conforme requisito disposto na Lei nº 11.597, de 2007.

 

13. Não obstante a nobreza da iniciativa, é de se inferir que seu conteúdo foge à competência deste Ministério da Cultura, não se encontrando no rol de matérias afetas a esta Pasta, senão, vejam-se os termos da Medida Provisória nº 1.154, de 1º de janeiro de 2023 ("Estabelece a organização básica dos órgãos da Presidência da República e dos Ministérios") c/c art. 1º do Anexo I do Decreto nº 11.336, de 1º de janeiro de 2023 (o qual aprova a estrutura do Ministério da Cultura):

 

MP nº 1.154, de 2023
Seção IV
Do Ministério da Cultura
Art. 21.  Constituem áreas de competência do Ministério da Cultura:
I - política nacional de cultura e política nacional das artes;
II - proteção do patrimônio histórico, artístico e cultural;
III - regulação dos direitos autorais;
IV - assistência ao Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar e ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - Incra nas ações de regularização fundiária, para garantir a preservação da identidade cultural dos remanescentes das comunidades dos quilombos;
V - proteção e promoção da diversidade cultural;
VI - desenvolvimento econômico da cultura e a política de economia criativa;
VII - desenvolvimento e implementação de políticas e ações de acessibilidade cultural; e
VIII - formulação e implementação de políticas, de programas e de ações para o desenvolvimento do setor museal.
 
...
Decreto nº 11.336, de 2023
CAPÍTULO I
DA NATUREZA E DA COMPETÊNCIA
 
Art. 1º  O Ministério da Cultura, órgão da administração pública federal direta, tem como área de competência os seguintes assuntos:
I - política nacional de cultura e política nacional das artes;
II - proteção do patrimônio histórico, artístico e cultural;
III - regulação dos direitos autorais;
IV - assistência ao Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar e ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária nas ações de regularização fundiária, para garantir a preservação da identidade cultural dos remanescentes das comunidades dos quilombos;
V - proteção e promoção da diversidade cultural;
VI - desenvolvimento econômico da cultura e a política de economia criativa;
VII - desenvolvimento e a implementação de políticas e ações de acessibilidade cultural; e
VIII - formulação e implementação de políticas, de programas e de ações para o desenvolvimento do setor museal.
 

14. Quanto aos aspectos estritamente formais, insta ponderar que ao Projeto de Lei se aplicam as regras encartadas pela Lei Complementar nº 95, de 26 de fevereiro de 1998, que dispõe sobre a elaboração, a redação, a alteração e a consolidação das leis, conforme determina o parágrafo único do art. 59 da Constituição.

 

III. CONCLUSÃO

 

15. Diante do exposto, sem adentrar nos valores de conveniência e oportunidade na criação de mecanismos institucionais, não sujeitos ao crivo desta CONJUR, depreende-se que o Projeto de Lei n° 3.322, de 2021, que “Inscreve o nome de Adhemar Ferreira da Silva no Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria”, de autoria da Deputada Lídice da Mata, ora submetido ao apreço, não trata de matéria inserta nas competências legais deste Ministério da Cultura.

 

16. Encaminhem-se os autos, via SEI, à Assessoria Especial de Assuntos Parlamentares e Federativos deste Ministério, em resposta ao Ofício nº 57/2023/COLEP/ASPAR/GM/MinC.

 

Brasília, 10 de abril de 2023.

 

 

(assinado eletronicamente)

SOCORRO JANAINA M. LEONARDO

Advogada da União

Consultora Jurídica Substituta

 

 

 


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Notas

  1. ^ Disponível em https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=2079921&filename=Tramitacao-PL%203322/2021 . Acesso em 10/04/2023. 



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