ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA JUNTO AO MINISTÉRIO DA CULTURA
GABINETE

 

PARECER n. 00047/2023/CONJUR-MINC/CGU/AGU

 

NUP: 72031.002940/2023-81

INTERESSADOS: GABINETE DO MINISTRO (MINISTÉRIO DA CULTURA) - GM/MINC

ASSUNTOS: ATOS ADMINISTRATIVOS

 

EMENTA: 
I - Análise e manifestação acerca de projeto de lei em fase de sanção presidencial.
II - Projeto de Lei nº 943/2019, que “Reconhece as festas juninas como manifestação da cultura nacional.”, de autoria do Deputado Fábio Mitidieri.
III. Pela viabilidade jurídica da proposta

 

I. RELATÓRIO

 

Trata-se de expediente inaugurado a partir de missiva da Secretaria Especial para Assuntos Jurídicos da Casa Civil da Presidência da República - SAJ-CC (OFÍCIO CIRCULAR Nº 51/2023/CAP/SALEG/SAJ/CC/PR - doc SEI 1104174), dirigida a este Ministério da Cultura e outros Ministérios, em 05/04/2023, por conduto da qual solicita a manifestação sobre o Projeto de Lei nº 943, de 2019, de autoria do Senhor Deputado Fábio Mitidieri, que "Reconhece as festas juninas como manifestação da cultura nacional​”, o qual abrange pauta de natureza transversal.

 

2. Arremata a SAJ-CC o seguinte no Ofício supra:

 

Tendo em vista que a Matéria já se encontra em fase de sanção, encareço seja encaminhado a esta Subchefia parecer do órgão técnico competente, com visto ministerial, em no máximo 10 (dez) dias, até o dia 14/04/23, conforme disposto no parágrafo único do art. 25 do Decreto nº 9.191, de 1º de novembro 2017, sem prejuízo de antecipação tão logo seja realizada, no intuito de colaborar com os trâmites e a urgência que a matéria requer.

 

3. Instada a se manifestar, a Secretaria de Cidadania e Diversidade Cultural emitiu a manifestação no doc. SEI 1110602. 

 

4. Ato contínuo, a Assessoria Especial de Assuntos Parlamentares e Federativos deste MinC exara o Despacho nº 1114784/2023, encaminhando os autos a esta Consultoria Jurídica, em 11/04/2023, para emissão de parecer, solicitando a remessa posterior dos autos ao Gabinete da Exma. Ministra, até dia  14/04/2023.

 

5. O inteiro teor da minuta encontra-se acostado aos autos do processo SEI (1104181).

 

6. É o relatório. Passo à análise.

 

II. ANÁLISE JURÍDICA

 

7. Preliminarmente, impende tecer breve consideração sobre a competência desta Consultoria Jurídica para manifestação no processo in casu.

 

8. Sabe-se que a Constituição de 1988 prevê as funções essenciais à Justiça em seu Título IV, Capítulo IV; contemplando na Seção II a advocacia pública. Essa essencialidade à justiça deve ser entendida no sentido mais amplo que se possa atribuir à expressão, estando compreendidas no conceito de essencialidade todas as atividades de orientação, fiscalização e controle necessárias à defesa dos interesses protegidos pelo ordenamento jurídico.

 

9. O art. 131 da Constituição, ao instituir em nível constitucional a Advocacia-Geral da União - AGU, destacou como sua competência as atividades de consultoria e assessoramento jurídico ao Poder Executivo, nos termos da lei complementar que dispuser sobre sua organização e funcionamento, in verbis:

 

Art. 131. A Advocacia-Geral da União é a instituição que, diretamente ou através de órgão vinculado, representa a União, judicial e extrajudicialmente, cabendo-lhe, nos termos da lei complementar que dispuser sobre sua organização e funcionamento, as atividades de consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo.
 

10. Nesta esteira, o art. 11, inciso I e V, da Lei Complementar n.º 73/1993 - Lei Orgânica da Advocacia-Geral da União -, estabeleceu, no que concerne à atividade de consultoria ao Poder Executivo junto aos Ministérios, a competência das Consultorias Jurídicas para assistir a autoridade assessorada no controle interno da constitucionalidade e legalidade administrativa dos atos a serem por ela praticados. Nesse sentido, veja-se:

 

Art. 11 - Às Consultorias Jurídicas, órgãos administrativamente subordinados aos Ministros de Estado, ao Secretário-Geral e aos demais titulares de Secretarias da Presidência da República e ao Chefe do Estado-Maior das Forças Armadas, compete, especialmente:
I - assessorar as autoridades indicadas no caput deste artigo;
(...)
III - fixar a interpretação da Constituição, das leis, dos tratados e dos demais atos normativos a ser uniformemente seguida em suas áreas de atuação e coordenação quando não houver orientação normativa do Advogado-Geral da União;
(...)
V - assistir a autoridade assessorada no controle interno da legalidade administrativa dos atos a serem por ela praticados ou já efetivados, e daqueles oriundos de órgão ou entidade sob sua coordenação jurídica;
 

11. Ressalte-se, por oportuno, que o controle interno da legalidade realizado por este órgão jurídico não tem o condão de se imiscuir em aspectos relativos à conveniência e à oportunidade da prática dos atos administrativos, que estão reservados à esfera discricionária do administrador público legalmente competente, tampouco examinar questões de natureza eminentemente técnica, administrativa e/ou financeira, conforme se extrai do Enunciado nº 7 do Manual de Boas Práticas Consultivas da Advocacia-Geral da União, que possui o seguinte teor:

 

A manifestação consultiva que adentrar questão jurídica com potencial de significativo reflexo em aspecto técnico deve conter justificativa da necessidade de fazê-lo, evitando-se posicionamentos conclusivos sobre temas não jurídicos, tais como os técnicos, administrativos ou de conveniência ou oportunidade, podendo-se, porém, sobre estes emitir opinião ou formular recomendações, desde que enfatizando o caráter discricionário de seu acatamento.

 

12. Elaboradas essas considerações preliminares, passa-se à análise da proposta.

 

13. O Projeto de Lei em comento já percorreu o trâmite legislativo no âmbito do Congresso Nacional, tendo sido enviado para sanção ou veto do Exmo. Presidente da República, nos termos do art. 66 da Constituição Federal[1].

 

14. Adentrando-se a leitura de seu teor, verifica-se que a proposta visa reconhecer as festas juninas como manifestação da cultura nacional. Sobre o tema, pronunciou-se a Secretaria de Cidadania e Diversidade Cultural deste Ministério:

 

As festas juninas formam uma das tradições mais ricas e seculares do nosso país. Marcadamente na região nordeste, onde encontram seu epicentro e eclodem em qualquer localidade, as festas em homenagem a São João, São Pedro e Santo Antônio já se transformaram em algo que transcende o mero calendário festivo brasileiro. É um dos eventos que mais movimentam a economia da região, principalmente nas tradicionais cidades do interior, que recebem dezenas de milhares de turistas.
O São João é uma festa que apresenta uma dinâmica espacial difusa, por mobilizar, com intensidades variáveis, um número significativo de municípios, principalmente os nordestinos. Com importância em todo o nordeste, as festas juninas formam uma das tradições mais ricas, seculares e alegres do país, e já se expandiram para outras regiões.
(...)
Na pluralidade de suas expressões e na diversidade de suas origens, as festas juninas demonstram a riqueza da cultura brasileira. Entre as mais populares festividades do país, a festa junina é completa, com danças, vestimentas, culinária, música, rituais e decorações próprias. É um resgate de nossas origens, perpetuado pelo interior do Brasil.
Do ponto de vista econômico, é um dos eventos que mais movimenta a economia principalmente da região nordeste, contribui para a geração de emprego e renda e, em consequência, propicia inclusão social. Nas artes populares, incluindo o artesanato, milhares de pessoas se dedicam à confecção de peças que são vendidas especialmente nesse período, sem contar a gastronomia, com suas comidas típicas, e as diversas formas de expressão artística e cultural, como a música, a dança e a moda dos trajes típicos.
Tão importante quanto a preservação dos prédios históricos, é a proteção das tradições brasileiras e das manifestações populares mais genuínas, inseridas na identidade e na construção do ideário nacional.
As Festas Juninas, conhecidas também como Festa de São João, já se constitui como patrimônio cultural brasileiro.
(...)

  15. Nessa mesma linha, em consulta ao sítio eletrônico da Câmara dos Deputados[2], verifica-se o seguinte na justificativa apresentada pelo autor da proposta: 

 

O art. 215 da Constituição Federal de 1988, dispõe dos direitos culturais e acessos às fontes da cultura nacional apoiando e incentivando a valorização e a ampliação das manifestações culturais do Brasil. Nesse contexto, se inclui uma das celebrações populares mais apreciadas do país, as Festas Juninas, realizadas anualmente no mês de junho.
(...)
Além disso, as festas brasileiras prestam homenagem a três santos católicos: Santo Antônio, comemorado no dia 13; São João Batista celebrado no dia 24; e no dia 29 é a vez de São Pedro. Os formatos das fogueiras são diferenciados por homenagem a cada santo. Na festa de Santo Antônio, a fogueira tem formato quadricular; na de São Pedro, o formato é triangular; e a festa de São João possui uma fogueira com o formato arredondado na base, formando uma pirâmide. Como conta a lenda, os fogos de artifício eram usados para despertar São João e convidá-lo para comemorar seu aniversário. Assim como as fogueiras, o barulho das bombas e rojões eram usados para espantar os maus espíritos.
(...)
De acordo com dados do Ministério do Turismo, as comemorações juninas são as mais festejadas do país, ficando atrás somente do carnaval. Apesar das festas juninas ocorrerem nos quatro cantos do Brasil, elas ganharam maior expressão na região Nordeste.
(...)
A grandiosidade, magnitude, diversidade e peculiaridade das festas juninas no país as consagram como uma manifestação cultural nacional extremamente rica, tendo enorme potencial para se transformar e um produto turístico nivelado ao nosso carnaval.
 

16. Depreende-se, da leitura das manifestações supra, o alcance das celebrações das festas juninas em âmbito nacional, com repercussão não apenas de cunho econômico, mas, sobretudo, sobressaindo-se como autêntica expressão cultural nacional - de onde se pode deduzir que a propositura legislativa vai ao encontro de dispositivo constitucional que determina caber ao Estado o apoio e o incentivo à valorização e difusão das manifestações culturais, senão, veja-se:

 

Art. 215. O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais.

 

17. Quanto aos aspectos estritamente formais, insta ponderar que ao Projeto de Lei se aplicam as regras encartadas pela Lei Complementar nº 95, de 26 de fevereiro de 1998, que dispõe sobre a elaboração, a redação, a alteração e a consolidação das leis, conforme determina o parágrafo único do art. 59 da Constituição.

 

III. CONCLUSÃO

 

18. Diante do exposto, sem adentrar nos valores de conveniência e oportunidade na criação de mecanismos institucionais, não sujeitos ao crivo desta CONJUR, pode-se concluir pela viabilidade jurídica do Projeto de Lei nº 943, de 2019, de autoria do Senhor Deputado Fábio Mitidieri, que "Reconhece as festas juninas como manifestação da cultura nacional​”.

 

19. Encaminhem-se os autos, via SEI, ao Gabinete da Exma. Ministra da Cultura, conforme solicitação da ASPAR no Despacho nº 1114784/2023, em prosseguimento.

 

 

 

 

Brasília, 14 de abril de 2023.

 

 

(assinado eletronicamente)

SOCORRO JANAINA M. LEONARDO

Advogada da União

Consultora Jurídica Substituta

 

 

 


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Notas

  1. ^ Constituição Federal:Art. 66. A Casa na qual tenha sido concluída a votação enviará o projeto de lei ao Presidente da República, que, aquiescendo, o sancionará.
  2. ^ Disponível em: https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1712714&filename=Tramitacao-PL%20943/2019 . Acesso em 14/04/2023.



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