ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA JUNTO AO MINISTÉRIO DA CULTURA
COORDENAÇÃO-GERAL DE APOIO JURÍDICO PARA PARCERIAS COM A SOCIEDADE CIVIL E COOPERAÇÃO FEDERATIVA

 

 

PARECER n. 00056/2023/CONJUR-MINC/CGU/AGU

 

NUP: 01400.003609/2023-95

 

INTERESSADA: SECRETARIA DE FORMAÇÃO, LIVRO E LEITURA 

ASSUNTO: Edital - Prêmio Carolina Maria de Jesus de Literatura Produzida por Mulheres 2023. Retificação.

 

EMENTA: I – Direito Administrativo. Seleção pública. II -  Edital Prêmio Carolina Maria de Jesus de Literatura Produzida por Mulheres 2023. III – Retificação e esclarecimentos. IV – Recomendações.

 

 

RELATÓRIO

 

1.  Tratam os autos do Edital que institui o Prêmio Carolina Maria de Jesus de Literatura Produzida por Mulheres 2023 (SEI 1100577), publicado (em extrato) no Diário Oficial da União de 5 de abril de 2023 (1102137).

 

2. O Edital foi oportunamente analisado por esta Consultoria Jurídica por meio do PARECER n. 00020/2023/CONJUR-MINC/CGU/AGU (1060179), complementado pela NOTA n. 00017/2023/CONJUR-MINC/CGU/AGU (1067522).

 

3. Após a publicação do Edital, a Diretoria de Livro, Leitura, Literatura e Bibliotecas – DLLLB recebeu diversos questionamentos do público interessado, motivo pelo qual entende necessária a retificação do Edital e alguns esclarecimentos adicionais, a serem divulgados por meio do documento SEI 1125981, conforme exposto na NOTA TÉCNICA Nº 8/2023 (1125698).

 

4. Por meio do Ofício nº 82/2023/SEFLI/GAB/SEFLI/GM/MinC (1131366), o Secretário de Formação, Livro e Leitura submete à análise desta Consultoria Jurídica as alterações propostas pela Nota Técnica nº 8/2023 (1125698).

 

 

ANÁLISE JURÍDICA

 

5. A Consultoria Jurídica procede à análise com fundamento no art. 11 da Lei Complementar nº 73/93, subtraindo-se do âmbito da competência institucional deste Órgão Jurídico, delimitada em lei, análises que importem em considerações de ordem técnica, financeira ou orçamentária, nos termos do Enunciado de Boas Práticas Consultivas AGU nº 7:

 

“A manifestação consultiva que adentrar questão jurídica com potencial de significativo reflexo em aspecto técnico deve conter justificativa da necessidade de fazê-lo, evitando-se posicionamentos conclusivos sobre temas não jurídicos, tais como os técnicos, administrativos ou de conveniência ou oportunidade, podendo-se, porém, sobre estes emitir opinião ou formular recomendações, desde que enfatizando o caráter discricionário de seu acatamento”.
(Manual de Boas Práticas Consultivas. 4.ed. Brasília: AGU, 2016, página 32).

 

6. Nesse mister, a presente análise restringe-se a apontar possíveis riscos sob o ponto de vista jurídico e recomendar providências, para salvaguardar a autoridade assessorada, a quem compete avaliar a real dimensão do risco e a necessidade de se adotar ou não a precaução recomendada.

 

7. Os autos vêm a esta Consultoria Jurídica para análise sobre a possibilidade de alteração do Edital Prêmio Carolina Maria de Jesus de Literatura Produzida por Mulheres 2023 (SEI 1100577), recém lançado por este Ministério, tendo em vista os diversos questionamentos recebidos do público interessado.

 

8. Inicialmente, segundo informa a NOTA TÉCNICA Nº 8/2023 (1125698), a DLLLB recebeu carta reivindicatória de representantes dos povos originários, alertando para a revogação da Resolução n° 4/2021 da Fundação Nacional dos Povos Indígenas – FUNAI, que apresentava critérios de heteroidentificação para avaliar a autodeclaração de identidade dos povos originários.  A referida Resolução FUNAI n. 4/2021 estabelecia:

 

Art. 1º Definir novos critérios específicos de heteroidentificação que serão observados pela FUNAI, visando aprimorar a proteção dos povos e indivíduos indígenas, para execução de políticas públicas.
Art. 2º Deverão ser observados os seguintes critérios:
I - Vínculo histórico e tradicional de ocupação ou habitação entre a etnia e algum ponto do território soberano brasileiro;
II - Consciência íntima declarada sobre ser índio;
III - Origem e ascendência pré-colombiana;
Parágrafo único. Existente o critério I, haverá esse requisito aqui assinalado, uma vez que o Brasil se insere na própria territorialidade pré-colombiana;
IV - Identificação do indivíduo por grupo étnico existente, conforme definição lastreada em critérios técnicos/científicos, e cujas características culturais sejam distintas daquelas presentes na sociedade não índia.
 

9. De acordo com notícia divulgada no sítio eletrônico da FUNAI [1], a revogação da Resolução n. 4/2021 se deu pelos seguintes motivos:

 

Para Joenia Wapichana, presidenta da Funai, a resolução, além de restringir a identidade indígena com base em critérios vinculados ao território, o que contraria a Constituição Federal e a Convenção 169 da OIT, da qual o Brasil é signatário, também excluía os Povos Indígenas do acesso a políticas públicas. “A nossa constituição supera esse caráter de tutela existente da Funai para os Povos Indígenas. Quem define quem é ou não indígena é o próprio grupo, a própria comunidade indígena”, afirmou.
A alta cúpula da Funai entendeu que, com a resolução, o órgão indigenista extrapolava seus limites legais de atuação ao elaborar critérios jurídicos para definir quem é ou não indígena, deixando de consultar os indígenas, que são os maiores interessados e impactados com a matéria.
Para o procurador Federal da Funai, Matheus Antunes de Oliveira, “a revogação da Resolução nº 4/2022 garante que os povos indígenas, no exercício de sua autonomia, apresentem seus próprios elementos de identidade, bem como demonstra o compromisso da Funai com o respeito à organização social e aos costumes dos Povos Indígenas, nos termos do artigo 231 da Constituição”.

 

10. Essa mudança de orientação ocorreu justamente na data de lançamento do Edital, motivo pelo qual faz-se necessária a alteração deste, para refletir a visão da nova gestão sobre a identidade indígena.

 

11. Nesse sentido, avaliou-se pertinente a modificação do item 7.6 do Edital [2], a fim de adequá-lo à nova realidade normativa e ao disposto na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho - OIT sobre Povos Indígenas e Tribais, da qual o Brasil é signatário, a qual dispõe em seu Artigo 2:

 

A consciência de sua identidade indígena ou tribal deverá ser considerada como critério fundamental para determinar os grupos aos que se aplicam as disposições da presente Convenção”. 

 

12. Nesses termos, a DLLLB sugere que o item 7.6 do Edital passe a ter a seguinte redação:

 

A candidata indígena deverá apresentar a Autodeclaração Étnico-Racial (Anexo III) conforme quesito cor ou raça utilizado pelo IBGE.” 

 

13. Sobre este ponto, nada há a opor à retificação proposta, considerando a mudança de orientação da FUNAI, e tendo em vista que a Convenção/OIT n. 169, de 1989 [3], continua sendo um dos mais importantes marcos no reconhecimento dos direitos dos povos indígenas no Brasil.

 

14. A DLLLB questiona, ainda, sobre a necessidade de inclusão das escritoras indígenas no item 7.5 do Edital [4], tendo em vista que, sendo a autodeclaração a única maneira de identificação das candidatas que concorrerão à reserva de vagas para indígenas, a regra se equipararia à das candidatas negras, sendo, portanto, passíveis de submissão à Comissão de Heteroidentificação quando da seleção. Nesse caso, o texto do item 7.5 passaria a ser:

 

As candidatas negras e indígenas selecionadas poderão ter sua Autodeclaração Étnico-Racial (Anexo III) submetida à Comissão de Heteroidentificação, nos termos deste Edital”.

 

15. Nada se opõe a essa alteração também. Apesar de a Portaria Normativa MPDG nº 4, de 6 de abril de 2018, mencionada no item 12.2 do Edital, referir-se unicamente à autodeclaração de candidatos negros em concursos públicos, sua lógica pode ser adaptada, por analogia, às candidatas indígenas no presente Edital.

 

16. Nesse ponto, vale mencionar que os Editais de seleção pública estão jungidos aos princípios que regem a Administração Pública, já mencionados no PARECER n. 00020/2023/CONJUR-MINC/CGU/AGU (1060179). Entre esses princípios, destaca-se o da vinculação ao instrumento convocatório.

 

17. Uma decorrência desse princípio é que as alterações realizadas sobre determinado Edital que importem em alteração das condições de concorrência implicam a reabertura do prazo de inscrições, nos termos do art. 21, § 4o, da Lei n. 8.666/1993 (art. 55, § 1º, da Lei n. 14.133/2021), aplicável subsidiariamente ao presente certame:

 

§ 4o  Qualquer modificação no edital exige divulgação pela mesma forma que se deu o texto original, reabrindo-se o prazo inicialmente estabelecido, exceto quando, inqüestionavelmente, a alteração não afetar a formulação das propostas.

 

18. A alteração da forma de autodeclaração das candidatas indígenas parece não alterar a formulação das propostas (ou as condições de concorrência), sendo apenas uma retificação decorrente do novo entendimento estabelecido pelo órgão competente, automaticamente aplicável a todos os casos que nele se enquadrem. Portanto, a alteração é possível, por meio de Portaria simples, não havendo forma específica para tanto indicada em lei.

 

19. Como a consulta não foi instruída com a minuta de portaria correspondente, recomenda-se a adoção da minuta anexa a este Parecer, a ser assinada pelas mesmas autoridades signatárias do Edital, e publicada no Diário Oficial da União, a fim de garantir a mesma publicidade conferida ao certame.

 

20. Em seguida, a DLLLB propõe ajustes na redação do Edital a fim de sanar dúvidas recebidas das interessadas, e também pequenas alterações consideradas pertinentes a fim de alagar o acesso das escritoras ao Edital, a saber: 

 

3.3. Solicitamos a retificação do item 17.16: “As obras poderão ser indicadas, citadas, descritas, transcritas ou utilizadas pelo Ministério da Cultura, total ou parcialmente, em expedientes, publicações internas ou externas, cartazes ou quaisquer outros meios de promoção e divulgação, incluídos os devidos créditos sem que caiba ao seu autor pleitear a recepção de qualquer valor, inclusive a título autoral”. 
3.4. Sugerimos que ele seja redigido da seguinte maneira: “As obras premiadas poderão ser indicadas, citadas, descritas, transcritas ou utilizadas pelo Ministério da Cultura, total ou parcialmente, em expedientes, publicações internas ou externas, cartazes ou quaisquer outros meios de promoção e divulgação, incluídos os devidos créditos sem que caiba ao seu autor pleitear a recepção de qualquer valor, inclusive a título autoral”. 
3.5. Solicitamos também a retificação do item 17.17, que diz: “É obrigatória a menção ao Ministério da Cultura nas obras publicadas com os recursos deste Edital e em toda e qualquer ação, promocional ou não, relacionada à premiação, bem como menção ao apoio recebido em entrevistas e outros meios de comunicação disponíveis à beneficiada.”  
3.6. O texto agora sugerido para esse item é: “É obrigatória a menção ao Ministério da Cultura nas obras premiadas em toda e qualquer ação, promocional ou não, relacionada à premiação, bem como menção ao apoio recebido em entrevistas e outros meios de comunicação disponíveis à beneficiada.”.   
3.7. Solicitamos também a retificação do item 2.2 que diz: “Para ser considerada inédita, a obra não pode ter sido objeto de qualquer tipo de apresentação, veiculação ou publicação parcial ou integral (inclusive em sites, blogs e redes sociais da internet), antes da inscrição no concurso e até a divulgação do resultado e entrega dos prêmios aos vencedores”. 
3.8. O texto sugerido para esse item é: “Para ser considerada inédita, a obra não pode ter sido objeto de qualquer tipo de apresentação, veiculação ou publicação integral (inclusive em sites, blogs e redes sociais da internet), antes da inscrição no concurso e até a divulgação do resultado e entrega dos prêmios aos vencedores”.  
3.9. Solicitamos a retificação do item 6.8, letra “a” que diz: “o texto deverá ser digitado, preferencialmente, em fonte Times New Roman, tamanho 12, estilo normal, na cor preta; parágrafo de alinhamento justificado; espaço entrelinhas 1,5 cm; 3,0 cm nas margens superior e esquerda e, nas margens inferior e direita, 2,0 cm, de acordo com as normas da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas), em formato A4, orientação retrato”. 
3.10. O texto sugerido para esse item é: “o texto deverá ser digitado, preferencialmente, em fonte Times New Roman, tamanho 12, estilo normal, na cor preta; parágrafo de alinhamento justificado; espaçamento entrelinhas 1,5 cm; 3,0 cm nas margens superior e esquerda e, nas margens inferior e direita, 2,0 cm, de acordo com as normas da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas), em formato A4, orientação retrato”. 
 

21. Sobre estes pontos específicos, entendemos não ser necessária a retificação do Edital, mas apenas a publicação de esclarecimentos às interessadas por meio de documento como o juntado ao SEI  1125981, a ser divulgado no sítio oficial do Ministério, tendo em vista que não se trata propriamente de alterações, mas de interpretação dos itens indicados, que geraram dúvidas.

 

22. Sobre o documento 1125981, sugiro que sejam incluídas as questões acima mencionadas e que, na primeira questão (sobre a inscrição de servidoras públicas) sejam mencionadas as servidoras, estagiárias, prestadoras de serviços terceirizadas e pesquisadoras vinculadas ao Ministério da Cultura, na forma do item 8.1/c, do Edital. 

 

 

CONCLUSÃO

 

23. Face ao exposto, entende-se pertinente a retificação do Edital no que se refere à autodeclaração das candidatas indígenas, que poderá ser feita conforme minuta de Portaria anexa ao presente Parecer, e, quanto às demais alterações propostas, conclui-se não ser necessária a retificação, mas apenas esclarecimentos às interessadas, publicados no sítio eletrônico do Ministério.

 

24. Isso posto, submeto a presente Nota à consideração superior, recomendando o seu encaminhamento à SECRETARIA DE FORMAÇÃO, LIVRO E LEITURA, para as providências cabíveis.

 

Brasília/DF, 20 de abril de 2023.

 

 

DANIELA GUIMARÃES GOULART

Advogada da União

Coordenadora-Geral

 

 

NOTAS

 

[1] https://www.gov.br/funai/pt-br/assuntos/noticias/2023/funai-revoga-resolucao-da-heteroidentificacao

 

[2] O item 7.6 do Edital atualmente dispõe: “A candidata indígena poderá apresentar registro civil como indígena. Não sendo registrada civilmente como indígena, poderá apresentar Registro Administrativo de Nascimento Indígena - RANI, expedido pelo Fundação Nacional dos Povos Indígenas. Não tendo o RANI, deverá apresentar carta de liderança indígena, juntamente com a Autodeclaração Étnico-Racial (Anexo III).

 

[3] A Convenção OIT n. 169 foi promulgada por meio do Decreto nº 5.051, de 19 de abril de 2004, posteriormente revogado para consolidação com reprodução integral do texto no Decreto nº 10.088, de 5 de novembro de 2019.

 

[4] O item 7.5 do Edital atualmente dispõe:A candidata negra selecionada poderá ter sua Autodeclaração Étnico-Racial (Anexo III) submetida à Comissão de Heteroidentificação, nos termos deste Edital

 

 

 

 

ANEXO - MINUTA DE PORTARIA

 

PORTARIA N._________/2023

 

O MINISTÉRIO DA CULTURA, por intermédio da SECRETARIA DE FORMAÇÃO, LIVRO E LEITURA, tendo em vista a fundamentação exposta na Nota Técnica n 8/2023 e no Parecer jurídico n. 00056/2023/CONJUR-MINC/CGU/AGU, nos autos do Processo n. 01400.003609/2023-95, acerca do Edital de Seleção Pública MINC nº 1, de 4 de abril de 2023, que institui o Prêmio Carolina Maria de Jesus de Literatura Produzida por Mulheres 2023, publicado em extrato no Diário Oficial da União de 5 de abril de 2023, seção 3, p. 12, RESOLVE:

 

Art. 1º Os itens 7.5 e  7.6 do Edital Prêmio Carolina Maria de Jesus de Literatura Produzida por Mulheres 2023 passam a constar com a seguinte redação:

 

“7.5 As candidatas negras e indígenas selecionadas poderão ter sua Autodeclaração Étnico-Racial (Anexo III) submetida à Comissão de Heteroidentificação, nos termos deste Edital”.

 

“7.6. A candidata indígena deverá apresentar a Autodeclaração Étnico-Racial (Anexo III) conforme quesito cor ou raça utilizado pelo IBGE.” (NR)

Art. 2º  Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação.

 

 

 

 


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