ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA JUNTO AO MINISTÉRIO DA CULTURA
GABINETE

 

PARECER n. 00063/2023/CONJUR-MINC/CGU/AGU

 

NUP: 01400.005515/2023-51

INTERESSADOS: COORDENAÇÃO DE ACOMPANHAMENTO LEGISLATIVO E EMENDAS PARLAMENTARES COLEP/ASPAR/GM

ASSUNTOS: ATOS ADMINISTRATIVOS

 

EMENTA: 
I - Análise e manifestação acerca de projeto de lei em fase de sanção presidencial.
II - Projeto de Lei nº 256, de 2019, de autoria da Senhora Deputada Maria do Rosário, que "Reconhece as escolas de samba como manifestação da cultura nacional".
III. Pela viabilidade jurídica, no que concerne às competências deste Ministério da Cultura (pela "sanção total"). 

 

I. RELATÓRIO

 

Trata-se de expediente inaugurado a partir de missiva da Secretaria Especial para Assuntos Jurídicos da Casa Civil da Presidência da República - SAJ-CC (OFÍCIO CIRCULAR Nº 61/2023/CAP/SALEG/SAJ/CC/PR - doc SEI 1122360), dirigida a este Ministério da Cultura e outros Ministérios, em 12/04/2023, por conduto da qual solicita a manifestação sobre o Projeto de Lei nº 256, de 2019, de autoria da Senhora Deputada Maria do Rosário, que "Reconhece as escolas de samba como manifestação da cultura nacional", o qual "abrange pauta de natureza transversal, envolvendo assuntos de competência das pastas em epígrafe, salvo melhor juízo."

 

2. Arremata a SAJ-CC o seguinte no Ofício supra:

 

Tendo em vista que a Matéria já se encontra em fase de sanção, encareço seja encaminhado a esta Subchefia parecer do órgão técnico competente, com visto ministerial, em no máximo 10 (dez) dias, até o dia 24/04/23, conforme disposto no parágrafo único do art. 25 do Decreto nº 9.191, de 1º de novembro 2017, sem prejuízo de antecipação tão logo seja realizada, no intuito de colaborar com os trâmites e a urgência que a matéria requer.

 

3. Encaminhada a missiva supra à Assessoria Especial de Assuntos Parlamentares e Federativos deste Ministério, este órgão redireciona o pleito à Fundação Nacional de Arte - FUNARTE e a esta Consultoria Jurídica (DESPACHO Nº 1144066/2023, de 25/04/2023), solicitando manifestação, com a remessa posterior dos autos ao Gabinete da Exma. Ministra, o mais breve possível. 

 

4. O inteiro teor do PL encontra-se acostado aos autos do processo SEI (1122361) e a manifestação da FUNARTE no doc SEI 1144064.

 

5. É o relatório. Passo à análise.

 

II. ANÁLISE JURÍDICA

 

6. Preliminarmente, impende tecer breve consideração sobre a competência desta Consultoria Jurídica para manifestação no processo in casu.

 

7. Sabe-se que a Constituição de 1988 prevê as funções essenciais à Justiça em seu Título IV, Capítulo IV; contemplando na Seção II a advocacia pública. Essa essencialidade à justiça deve ser entendida no sentido mais amplo que se possa atribuir à expressão, estando compreendidas no conceito de essencialidade todas as atividades de orientação, fiscalização e controle necessárias à defesa dos interesses protegidos pelo ordenamento jurídico.

 

8. O art. 131 da Constituição, ao instituir em nível constitucional a Advocacia-Geral da União - AGU, destacou como sua competência as atividades de consultoria e assessoramento jurídico ao Poder Executivo, nos termos da lei complementar que dispuser sobre sua organização e funcionamento, in verbis:

 

Art. 131. A Advocacia-Geral da União é a instituição que, diretamente ou através de órgão vinculado, representa a União, judicial e extrajudicialmente, cabendo-lhe, nos termos da lei complementar que dispuser sobre sua organização e funcionamento, as atividades de consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo.
 

9. Nesta esteira, o art. 11, inciso I e V, da Lei Complementar n.º 73/1993 - Lei Orgânica da Advocacia-Geral da União -, estabeleceu, no que concerne à atividade de consultoria ao Poder Executivo junto aos Ministérios, a competência das Consultorias Jurídicas para assistir a autoridade assessorada no controle interno da constitucionalidade e legalidade administrativa dos atos a serem por ela praticados. Nesse sentido, veja-se:

 

Art. 11 - Às Consultorias Jurídicas, órgãos administrativamente subordinados aos Ministros de Estado, ao Secretário-Geral e aos demais titulares de Secretarias da Presidência da República e ao Chefe do Estado-Maior das Forças Armadas, compete, especialmente:
I - assessorar as autoridades indicadas no caput deste artigo;
(...)
III - fixar a interpretação da Constituição, das leis, dos tratados e dos demais atos normativos a ser uniformemente seguida em suas áreas de atuação e coordenação quando não houver orientação normativa do Advogado-Geral da União;
(...)
V - assistir a autoridade assessorada no controle interno da legalidade administrativa dos atos a serem por ela praticados ou já efetivados, e daqueles oriundos de órgão ou entidade sob sua coordenação jurídica;
 

10. Ressalte-se, por oportuno, que o controle interno da legalidade realizado por este órgão jurídico não tem o condão de se imiscuir em aspectos relativos à conveniência e à oportunidade da prática dos atos administrativos, que estão reservados à esfera discricionária do administrador público legalmente competente, tampouco examinar questões de natureza eminentemente técnica, administrativa e/ou financeira, conforme se extrai do Enunciado nº 7 do Manual de Boas Práticas Consultivas da Advocacia-Geral da União, que possui o seguinte teor:

 

A manifestação consultiva que adentrar questão jurídica com potencial de significativo reflexo em aspecto técnico deve conter justificativa da necessidade de fazê-lo, evitando-se posicionamentos conclusivos sobre temas não jurídicos, tais como os técnicos, administrativos ou de conveniência ou oportunidade, podendo-se, porém, sobre estes emitir opinião ou formular recomendações, desde que enfatizando o caráter discricionário de seu acatamento.

 

11. Elaboradas essas considerações preliminares, passa-se à análise da proposta, a qual já percorreu o trâmite legislativo no âmbito do Congresso Nacional, tendo sido enviado para sanção ou veto do Exmo. Presidente da República, nos termos do art. 66 da Constituição Federal.

 

12. Adentrando-se a leitura de seu teor, verifica-se que a proposta visa reconhecer as escolas de samba como manifestação da cultura nacional. Veja-se o teor da proposta:

 

Art. 1 º São reconhecidas as escolas de samba - seus desfiles, sua música, suas práticas, suas tradições - como manifestação da cultura nacional.
Art. 2° Compete ao poder público garantir a livre atividade das escolas de samba e a realização de seus desfiles carnavalescos.

 

13. Sobre o tema, a FUNARTE emitiu a seguinte manifestação in verbis:

 

Somos favoráveis à sanção do referido projeto de Lei por entender que a legislação proposta não só valoriza uma importante manifestação da cultura brasileira como também contribui para a sua continuidade, de modo a garantir a livre atividade das agremiações de samba e a realização de seus desfiles no carnaval.
Vale registrar, ainda, que o reconhecimento em pauta é relevante para o país, por se tratar de tema relativo à identidade cultural brasileira, e é especialmente importante para as pessoas que mantém viva a tradição das escolas de samba durante todo o ano.
 

14. Nessa mesma linha, em consulta ao sítio eletrônico da Câmara dos Deputados[1], verifica-se o seguinte na justificativa apresentada pela autora da proposta:

 
As escolas de samba são de inegável importância cultural e social, mas também econômica. São milhares de empregos gerados nas oficinas dos barracões, nos ateliers de costura, no segmento de música e sonorização, entre tantos outros, refletindo também no comércio, na hotelaria e no conjunto do setor de serviços. Seus efeitos positivos sobre a economia, tanto do carnaval de escolas de samba quanto o de blocos de rua, são atestados em números. Por exemplo, no ano de 2018, o impacto gerado no Rio de Janeiro foi de R$ 3 bilhões, segundo estudo do Ministério da Cultura/Fundação Getúlio Vargas2 . Em São Paulo, de acordo com pesquisa da Fecomércio/SP3 , o carnaval movimentou R$ 400 milhões no mesmo ano.
(...)
Não há dúvidas de que é necessário reforçar a garantia dos direitos culturais do povo brasileiro, em especial naquela que é a mais brasileira de suas manifestações artístico-culturais. 

 

15.  Sabe-se que a defesa e a valorização do patrimônio cultural se constitui em um dos objetivos que devem ser almejados em se tratando de desenvolvimento das ações culturais, o que deve ser estimulado pelo próprio Estado em seu dever de fomentar a cultura. 

 

​16. Ademais, a Constituição determina, em seu art. 215, que "o Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais", de modo que o reconhecimento das escolas de samba vai ao encontro de preceito constitucional, consubstanciando-se em manifestação cultural de caráter nacional.  

 

17. Ainda nesse contexto, o art. 2º da proposta atribui ao "poder público" a competência para garantir a livre atividade das escolas de samba e a realização de seus desfiles carnavalescos - de onde se deduz tratar-se de lei de caráter nacional, a abranger todas as unidades federativas, no seu dever de "proporcionar os meios de acesso à cultura", conforme o disposto no art. 23 da Constituição Federal:

Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios:
(...)
V - proporcionar os meios de acesso à cultura, à educação, à ciência, à tecnologia, à pesquisa e à inovação;    (grifos nossos)

 

18. Depreende-se, pois, que a proposta se coaduna com preceitos constitucionais, razão pela qual é de se concluir por sua viabilidade jurídicano que concerne às competências deste Ministério da Cultura.

 

19. Quanto aos aspectos estritamente formais, insta ponderar que ao Projeto de Lei se aplicam as regras encartadas pela Lei Complementar nº 95, de 26 de fevereiro de 1998, que dispõe sobre a elaboração, a redação, a alteração e a consolidação das leis, conforme determina o parágrafo único do art. 59 da Constituição.

 

III. CONCLUSÃO

 

20. Diante do exposto, sem adentrar nos valores de conveniência e oportunidade na criação de mecanismos institucionais, não sujeitos ao crivo desta CONJUR, opina-se pela viabilidade jurídica do Projeto de Lei nº 256, de 2019, de autoria da Senhora Deputada Maria do Rosário, que "Reconhece as escolas de samba como manifestação da cultura nacional", de modo que, no que concerne às competências legais deste Ministério da Cultura, o projeto encontra-se apto a ser submetido à sanção presidencial.

 

21. Encaminhem-se os autos, via SEI, ao Gabinete da Exma. Ministra da Cultura, conforme solicitação da ASPAR no DESPACHO Nº 1144066/2023, em prosseguimento.

 

 

 

Brasília, 26 de abril de 2023.

 

 

(assinado eletronicamente)

SOCORRO JANAINA M. LEONARDO

Advogada da União

Consultora Jurídica Substituta

 

 

 


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Notas

  1. ^ Disponível em: https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1707053&filename=PL%20256/2019 . Acesso em 26/04/2023.



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