ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA JUNTO AO MINISTÉRIO DA CULTURA

 

 

PARECER nº 69/2023/CONJUR-MINC/CGU/AGU

PROCESSO nº 01400.003502/2020-02

INTERESSADA: Subsecretaria de Gestão de Prestação e Tomada de Contas

ASSUNTO: Pronac. Incentivo fiscal. Projeto em fase de prestação de contas.

 

EMENTA: ADMINISTRATIVO. FOMENTO À CULTURA. PRONAC.
I - Programa Nacional de Apoio à Cultura. Projeto cultural aprovado no mecanismo de incentivos fiscais da Lei nº 8.313/1991. Denúncia de violação das condições de aprovação, no aspecto relacionado ao plano de distribuição de ingressos gratuitos.
II - Bloqueio de contas do projeto e inabilitação cautelar do proponente aplicada após o início do prazo de captação. 
III - A impossibilidade de apresentar pedido de readequação do plano de distribuição do projeto em momento oportuno por impossibilidade técnica do sistema Salic constitui fato da administração e isenta o proponente de responsabilidade especificamente no que tange à intempestividade do pedido.
IV - Caracterizado o fato da administração, é possível restaurar o processo à fase em que se encontrava quando o pedido de readequação do projeto foi realizado, a fim de que tenha seu mérito analisado pela área técnica. Tal análise não implica, per se, em levantamento das sanções vigentes ou reconhecimento do pedido de readequação do plano de distribuição do projeto, o qual deverá ser analisado pela área técnica.

 

 

Sra. Consultora Jurídica,

 

Os autos em epígrafe tratam de denúncia apresentada contra o projeto Pronac nº 203511, intitulado ROCK BRASIL 40 ANOS - FESTIVAL DE MÚSICA E ARTES DOS ANOS 80.

O projeto não chegou a ser aprovado na forma da Instrução Normativa nº 1/2019 do Ministério da Cidadania, então vigente e aplicável ao caso, tendo recebido apenas a "homologação para captação de recursos" por meio da Portaria de Homologação de Captação nº 533/2020, publicada em 28/08/2020.

Conforme informado na Nota Técnica nº 10/2023 (SEI/Minc 1086499), a denúncia diz respeito ao descumprimento do plano de distribuição do projeto, que previa apenas distribuição gratuita de ingressos, sendo que o proponente reconhece ter realizado cobrança de ingressos em variados eventos do projeto. Segundo a nota técnica, o proponente alega que tal inconformidade deveu-se à falta de oportunidade processual para solicitar a adequação do projeto à realidade que lhe impôs realinhamento de contratos com fornecedores. Porém, segundo a Coordenação de Execução, o projeto estaria na fase apropriada para receber pedidos de readequação desde 12/11/2021, quando passou para a fase E90 (projeto liberado para adequação à realidade de execução) no sistema Salic, sendo que o proponente sempre confirmou a realização do projeto conforme os termos inicialmente propostos, apenas requerendo readequação após a ocorrência da denúncia.

A denúncia apresentada, somada às manifestações do proponente, resultou em inabilitação cautelar do proponente, com bloqueio das contas do projeto, situação que impede o prosseguimento de sua execução e obriga à prestação de contas imediata das ações do projeto que já tenham sido executadas durante a fase de captação homologada.

No entanto, diante do requerimento do proponente de levantamento do bloqueio cautelar, sob a alegação de que o objeto principal do projeto já foi integralmente executado, restando apenas a finalização de parte de sua execução financeira, e considerando sua alegação de que teve impedimento técnico de protocolar no sistema Salic em tempo oportuno o pedido de readequação do plano de distribuição, foram os presentes autos encaminhados a esta Consultoria Jurídica pela área Coordenação-Geral de Avaliação e Prestação de Contas para avaliar se "é possível que a Secretaria de Fomento e Incentivo à Cultura analise o novo Plano de Distribuição, ainda que seja, neste caso, de forma extemporânea - visto que o projeto já foi executado". E, em sendo possível tal medida, questiona se seria cabível a retirada da inabilitação cautelar com o consequente desbloqueio das contas, para que o proponente possa finalizar pagamentos pendentes na execução financeira do projeto.

É o relatório, Passo à análise.

Preliminarmente, é necessário contextualizar o projeto no arcabouço normativo vigente à época dos fatos e aplicável ao projeto em questão.

Nos termos da Instrução Normativa nº 2/2019, do Ministério da Cidadania, que vigorou entre 23/04/2019 e 03/02/2022, os projetos apresentados à Secretaria Especial de Cultura (atual Ministério da Cultura), com vistas à aprovação no Pronac (Programa Nacional de Apoio à Cultura) na forma do art. 19 da Lei Rouanet, devem passar por um exame de admissibilidade previamente à sua aprovação definitiva pela unidade técnica competente. Neste exame de admissibilidade, a referida instrução normativa estabelece que o projeto deve ser analisado apenas em relação ao enquadramento tributário do benefício a que fará jus (art. 18 ou 26 da Lei Rouanet) e em relação à sua natureza cultural, a fim de verificar o atendimento das finalidades e objetivos do Pronac.

Aprovado neste exame preliminar, o projeto já recebe autorização para captação de recursos, que se materializa por meio de Portaria de Homologação de Captação (IN 2/2019, art. 25). No entanto, a execução do projeto pelo proponente nesta fase é realizada por sua própria conta e risco, visto que o projeto ainda está sujeito a não ser aprovado pelas instâncias técnicas competentes, onde ele é avaliado segundo uma série de outros critérios, inclusive quanto ao plano de distribuição. Apenas após sua aprovação definitiva é que o projeto recebe autorização definitiva para sua execução, por meio de Portaria de Homologação de Execução (IN 2/2019, art. 28).

Neste sentido, o § 1º do art. 25 da IN 2/2019 ressalta a possibilidade do proponente ressarcir-se por despesas realizadas entre a Portaria de Homologação de Captação e a Portaria de Homologação de Execução, desde que obviamente o projeto venha a ser aprovado, visto que se trata de uma aprovação provisória e precária.

O projeto ora em exame (Pronac 203511) já tinha passado por esta aprovação precária e logrou êxito em captar os recursos necessários para iniciar sua execução por conta e risco do proponente, até que sobreviesse sua aprovação definitiva. Nesta situação, com ao menos 10% dos recursos captados, o proponente pode solicitar adequações no projeto, a fim de que sua execução possa ser realizada de acordo com os recursos efetivamente captados ou sua expectativa de captação, conforme previsto no art. 26 da IN 2/2019. Nesta fase, no sistema Salic, o projeto é classificado na situação E90 (código para projeto liberado para adequação à realidade de execução). 

Ocorre que, segundo informado na Nota Técnica nº 10/2023 (SEI/Minc 1086499), em nenhum momento o proponente solicitou qualquer adequação de projeto, até que o Ministério recebeu a denúncia de irregularidades na cobrança de ingressos.

No entanto, segundo o proponente, houve interposição de recurso no momento da Portaria de Homologação Captação questionando o enquadramento legal do projeto, e esta situação impediria no sistema qualquer pedido de adequação, mesmo que atingido o percentual mínimo de captação.

A impossibilidade de apresentar pedido de readequação do plano de distribuição do projeto em momento oportuno por impossibilidade técnica do sistema Salic, enquanto o projeto se encontrava provisoriamente autorizado e aguardava sua portaria de aprovação definitiva (homologação de execução), constitui fato da administração e isenta o proponente de responsabilidade especificamente no que tange à intempestividade do pedido.

Neste sentido, em resposta ao questionamento formulado pela área técnica, entende-se que, desde que caracterizado o fato da administração, isto é, desde que efetivamente caracterizada a impossibilidade técnica de apresentação de pedido de readequação de projeto na pendência de recurso sobre a Portaria de Homologação de Captação, fica demonstrada uma interferência concreta imprevista na relação jurídica entre as partes causada pelo poder concedente. E, nesta hipótese, é possível restaurar o processo à fase em que se encontrava quando o pedido de readequação do projeto foi realizado, a fim de que tenha seu mérito analisado pela área técnica.

Tal providência de regularização processual, contudo, não implica, per se, em reconhecimento do pedido de readequação do plano de distribuição do projeto, que deverá ser analisado pela área técnica competente na atual Secretaria de Economia Criativa e Fomento Cultural. Tampouco autoriza, de imediato, a reversão das sanções aplicadas (inabilitação cautelar e bloqueio de contas do projeto), tendo em vista que, na forma da legislação e regulamentos em vigor, a inabilitação é cabível em qualquer fase do projeto, ainda que apenas autorizado a captar recursos em caráter precário, e justifica-se no presente caso em virtude das evidências de que houve violação do plano de distribuição originalmente aprovado.

Isto posto, recomenda-se que seja avaliado o pedido de readequação do projeto formulado pelo proponente no que tange ao seu plano de distribuição, caso realmente identificado o fato da administração de que tratam os §§ 14 e 15 deste parecer, e, apenas em caso de acatamento de tal pedido, seja exarada Portaria de Homologação de Execução com efeitos retroativos à data de solicitação, hipótese em que poderá resultar em reversão das sanções aplicadas, se todas as irregularidades forem devidamente sanadas com tal decisão, e prosseguimento do projeto com finalização de despesas pendentes e encaminhamento da prestação de contas final.

 

À consideração superior.

 

Brasília, 3 de maio de 2023.

 

(assinado eletronicamente)

OSIRIS VARGAS PELLANDA

Advogado da União

Coordenador-Geral Jurídico de Políticas Culturais

 


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