ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA JUNTO AO MINISTÉRIO DA CULTURA

 

 

PARECER nº 74/2023/CONJUR-MINC/CGU/AGU

PROCESSO nº 01400.006188/2023-54

INTERESSADA: Ministra de Estado da Cultura

ASSUNTO: Ato normativo a ser submetido ao Presidente da República

 

EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO. ORÇAMENTO. LEI COMPLEMENTAR Nº 195/2022. 
I - Financiamento da cultura. Minuta de decreto presidencial que regulamenta a Lei complementar nº 195/2022 (Lei Paulo Gustavo), que dispõe sobre ações emergenciais destinadas ao setor cultural a serem adotadas em decorrência dos efeitos econômicos e sociais da pandemia da Covid-19. 
II - A regulamentação de sistema de financiamento da cultura constitui política estruturante do Sistema Nacional de Cultura (SNC), de que trata o art. 216-A da Constituição Federal. 
III - Proposta que trata das relações interfederativas relacionadas aos repasses de recursos da Lei Paulo Gustavo. Normas complementares ao Decreto nº 11.453/2023, que regulamentou a Lei Paulo Gustavo e outras leis de fomento à cultura no que se refere às relações entre Estado e sociedade.  
IV - Estabelecimento de regras para distribuição de recursos entre o setor audiovisual de demais áreas culturais, planejamento de ações a serem executadas em parcerias com a sociedade civil e avaliação de resultados pelo Ministério da Cultura, em consonância com a Lei Complementar nº 195/2022. Parecer favorável.

 

 

Cuidam os presentes autos de minuta de decreto e respectiva exposição de motivos com o objetivo de regulamentar a Lei Complementar nº 195/2022 (Lei Paulo Gustavo), que dispõe sobre ações emergenciais destinadas ao setor cultural a serem adotadas em decorrência dos efeitos econômicos e sociais da pandemia da Covid-19.

A proposta tem origem na Secretaria-Executiva, acompanhada do Parecer de Mérito nº 18/2023/GSE/SE/MinC (doc. SEI/MinC nº 1148804), que apresenta as justificativas para a regulamentação, seus objetivos, alcance e os impactos previstos.

Em linhas gerais, a proposta trata das relações interfederativas relacionadas aos repasses dos recursos da Lei Paulo Gustavo às ações emergenciais de enfrentamento aos efeitos da pandemia da Covid-19 no setor cultural. Neste sentido, consiste em normas complementares ao Decreto nº 11.453/2023, que regulamentou a Lei Paulo Gustavo e outras leis de fomento à cultura no que se refere às relações entre Estado e sociedade, uma vez que estabelece regras para (i) operacionalização da distribuição de recursos a diversas áreas culturais entre estados e municípios, (ii) planejamento de ações a serem executadas em parcerias com a sociedade civil e (iii) avaliação de resultados pelo Ministério da Cultura, condições necessárias para que se estabeleçam as parcerias entre poder público e agentes culturais da sociedade civil em momento posterior, com base no Decreto nº 11.453/2023 e normas específicas do Ministério da Cultura.

Conforme informado pela Secretaria-Executiva, a proposta é resultado de processo conduzido pelo Grupo de Trabalho instituído pela Portaria nº 2/2023/MinC, no qual mais de 6.000 pessoas entre gestores públicos e trabalhadores da cultura tiveram participação a partir de representações de diversos fóruns de secretários municipais e estaduais de cultura, de fóruns setoriais do audiovisual, de entidades da sociedade civil e do próprio Conselho Nacional de Política Cultural (CNPC). Assim pronuncia-se a Secretaria-Executiva no parecer de mérito que inaugura os autos:

38. A regulamentação da lei nacional é, portanto, medida urgente e necessária, de competência do Chefe do Poder Executivo, que no exercício do poder regulamentador, compete criar regras para fins de explicar a lei para sua fiel execução. (...)
40. Seus objetivos específicos dividem-se, conforme tópicos abaixo:
a) detalhar como deve ser realizada a distribuição de recursos de que tratam os arts. 5º e 8º, da Lei Complementar nº 195/2022;
b) dispor sobre o procedimento para recebimento de recursos e das transferências para os Estados, Distrito Federal e Municípios mediante utilização da plataforma eletrônica;
c) dispor sobre a necessidade de adequação orçamentária dos entes para recebimento dos recursos de que trata a Lei;
d) fortalecer o compromissos dos entes federados com o Sistema Nacional de Cultura;
e) fortalecer a participação social nos processos de elaboração de editais e regulamentos;
f) promover processos de simplificação e desburocratização nos processos seletivos, execução de recursos e prestação de contas nos termos do Decreto 11.453, de 23 de março de 2023;
g) implementar políticas afirmativas como meio de efetivação de direitos fundamentais e busca por equidade econômica e social;
h) fortalecer o direito das pessoas com deficiência na produção e fruição cultural em consonância com o disposto na  Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015;
i) estabelecer percentual máximo de recursos que podem ser utilizados pelos entes federativos para operacionalização das ações previstas na Lei;
j) estabelecer regras para remanejamento e devolução de recursos não utilizados pelos entes;
k) estabelecer fluxo e procedimentos de prestação de informações pelos entes à União por meio do Relatório de Gestão Final;
l) estabelecer materiais de orientação e padronização que podem ser utilizados pelos entes federados na execução da Lei.
 

Autos encaminhados a esta Consultoria Jurídica por meio do Ofício nº 2251/2023/GSE/SE/MinC (SEI/MinC 1171483), para parecer jurídico na forma do art. 31 do Decreto nº 9.191/2017. 

É o breve relatório. Passo à análise.

Nos termos do art. 84, inciso IV, da Constituição Federal, a competência para expedir decretos e regulamentos para fiel execução das leis é do Presidente da República. Logo, em se tratando de regulamentação de lei complementar, afigura-se competente a autoridade signatária do ato, e pertinente a via normativa eleita, visto que o decreto é instrumento jurídico adequado para a exteriorização dos atos emanados do chefe do poder executivo.

A justificativa do ato, bem como a finalidade a que se propõe, encontram-se evidenciadas na exposição de motivos e no parecer de mérito juntado aos autos e acima transcrito. O objeto é lícito e possível, não havendo restrições de índole constitucional ou legal que impeçam a regulamentação da matéria. 

Em se tratando de regulamentação de sistema de financiamento da cultura que, a despeito de seu caráter emergencial, dialoga com os demais mecanismos de fomento no que tange ao regime jurídico aplicável a seus instrumentos de parceria com estados, municípios e sociedade civil, a proposta caracteriza-se como política estruturante do Sistema Nacional de Cultura (SNC) previsto no art. 216-A da Constituição Federal, na medida em que trata das relações interfederativas relacionadas aos repasses dos recursos da Lei Paulo Gustavo.

Conforme bem apontado na minuta de exposição de motivos juntada aos autos, a regulamentação em exame não não implica em renúncia de receita nem criação ou aumento de despesas à Administração, limitando-se a regular a distribuição de recursos já empenhados, e com nota de empenho emitida para execução até 31/12/2023, em atendimento à decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal na Ação Direta de  Inconstitucionalidade nº 7232.

Atendendo a sua finalidade, a minuta estabelece os montantes a serem distribuídos a cada área cultural e ações em que os recursos deverão ser aplicados. Estabelece também as regras e prazos para vinculação dos entes beneficiados a compromissos de adesão ao SNC e sua efetiva implementação. Estabelece critérios para distribuição proporcional de recursos entre estados e municípios. E estabelece regras de interação com as disposições já estabelecidas no Decreto nº 11.453/2023, relativas aos repasses de recursos aos executores das ações, agentes culturais do setor público ou privado, e suas formas de aplicação, fixando alguns parâmetros específicos para os recursos da Lei Paulo Gustavo, a fim de possibilitar o monitoramento das ações e a posterior avaliação de resultados da política pública emergencial em questão. Entre estas últimas, o decreto avança em diversas regras de acessibilidade e ações afirmativas a serem implementadas quando da execução dos recursos na política cultural, atendendo a requisitos de legislação específica, bem como do próprio Decreto nº 11.453/2023

Ainda sobre a operacionalização dos repasses da União aos entes subnacionais, a proposta reserva até 5% dos valores destinados às ações emergenciais da lei para despesas operacionais, inclusive por meio de execução indireta de serviços pelas administrações locais. O percentual adotado teve como parâmetro a Lei nº 14.399/2022 (Política Nacional Aldir Blanc), cujo art. 5º, parágrafo único, inciso II, ressalva a possibilidade de utilização, até o limite de 5% do total do valor recebido pelo ente federativo para "atividades de consultoria, de emissão de pareceres e de participação em comissões julgadoras de projetos, de ações, de iniciativas e de candidatos a prêmios e a bolsas em editais e congêneres". Na regulamentação ora em exame, este percentual sujeita-se ainda a um teto nominal de R$ 6 milhões de reais, de modo a resguardar o cumprimento das finalidades da lei focadas na aplicação, efetiva e eficiente, em ações culturais.

O procedimento de redistribuição de recursos idealizado na minuta não conflita com as disposições da Lei Paulo Gustavo. Ao contrário, contribui para sua efetivação uma vez que cria mecanismos para prevenir a não realização de despesas por falta de adesão de municípios beneficiados da lei, promovendo eficiência na execução dos recursos e incremento de ações em municípios potencialmente interessados e com capacidades institucionais para executar ações culturais com repasses adicionais aos originalmente previstos.

No que tange aos aspectos formais, observo ainda a necessidade de que a minuta da proposta seja submetida a uma revisão final de redação para adequação às exigências formais do art. 15 do Decreto nº 9.191/2017, o que poderá ser feito a qualquer momento da tramitação do processo antes da chancela presidencial, ainda que já concluída a referenda ministerial, desde que não haja modificação no conteúdo da proposta. Quando aos requisitos do art. 30 do Decreto nº 9.191/2017, encontram-se atendidos pela documentação acostada aos autos, particularmente o Parecer de mérito nº 18/2023/SE/MinC (SEI/MinC nº 1171423), que apresenta as justificativas técnicas para a regulamentação em apreço.

E, sendo estas as considerações, concluo pela constitucionalidade, legalidade e técnica legislativa da proposta em apreço, nada obstando o prosseguimento do feito, com a referenda da Ministra de Estado da Cultura e encaminhamento da proposta via SIDOF (Sistema de Geração e Tramitação de Documentos Oficiais) à Casa Civil da Presidência da República para os trâmites pertinentes, a fim se que seja finalmente submetida ao Presidente da República.

 

À consideração superior.

 

Brasília, 9 de maio de 2023.

 

(assinado eletronicamente)

OSIRIS VARGAS PELLANDA

Consultor Jurídico

Substituto

 


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