ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA DA UNIÃO ESPECIALIZADA VIRTUAL DE PATRIMÔNIO
NÚCLEO JURÍDICO

PARECER n. 00383/2023/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU

 

NUP: 10154.184881/2020-64

INTERESSADOS: SPU/SC - SUPERINTENDÊNCIA DO PATRIMÔNIO DA UNIÃO EM SANTA CATARINA E OUTROS

ASSUNTOS: DOAÇÃO E OUTROS

 

EMENTA: Cessão gratuita para a FUNAI de imóvel para a formação da Terra Indígena Laklãnõ. Legalidade já apreciada. Sentença que determina a realização de cessão. Cumprimento da ordem judicial.
Considerações sobre o Usufruto Exclusivo.
Minuta contratual. Divergências geradas pela particularidade concreto.
Cláusulas impugnadas pelo MPF decorrem da opção pela cessão.

 

Relatório.

 

Trata-se de demanda encaminhada pela SPU/SC para nova análise do processo.

 

O r. Parecer n. 00019/2021/CJU-SC/CGU/AGU bem resumiu o objeto do processo:

 

1. Trata-se de remessa para análise da minuta do contrato de cessão de uso gratuita para a FUNAI (SEI17831940), nos termos do artigo 38, parágrafo único, da Lei 8.666/93, também impulsionada para cumprimento de decisão proferida na Ação Civil Pública nº 5000796-11.2021.4.04.7213.
2.O objeto é área de 8.607.268,91 m² (oito milhões, seiscentos e sete mil, duzentos e sessenta e oito metros quadrados e noventa e um decímetros quadrados), inseridos no local da Barragem Norte, no Município de José Boiteux/SC, incorporados ao patrimônio da União por força da Lei n° 8.029/90 que extinguiu o Departamento Nacional de Obras e Saneamento – DNOS, conforme descrições e imagem abaixo (SEI nº 17437365):

 

O r. Despacho 33651032 SEI 10154.184881/2020-64 / pg. 384, explicou com clareza o problema, sendo pertinente a transcrição:

 

Trata-se da cessão para a FUNAI de toda a área adquirida pelo extinto DNOS para a construção da Barragem Norte, em José Boiteux, hoje incorporada ao patrimônio da União (por força da Lei n° 8029/90), para a formação da terra indígena La-Klãnõ À EXCEÇÃO da ÁREA DE SEGURANÇA E OPERAÇÃO DA BARRAGEM, em processo de doação ao Governo do Estado de Santa Catarina já autorizada pela PORTARIA SPU-DEDES-CGDIN/ME Nº 5595, DE 11 DE MAIO DE 2021.
 
A União foi intimada a cumprir a decisão proferida na Ação Civil Pública nº 5000796-11.2021.4.04.7213 - NUP 10154.122870/2021-71 para a conclusão do processo até 14/08/2021.
 
A Portaria de autorização de cessão foi publicada no DOU (17773046) e, na sequência, o Extrato de Dispensa - Ratificada (17826391). A Minuta de Contrato 17831940 foi encaminhada para análise Juridica, ao tempo em que a FUNAI, ciente da Publicação da Portaria de Cessão 9224, solicitou o envio da minuta para análise jurídica daquele órgão.
 
A SPU/SC concedeu acesso externo do presente processo à FUNAI, solicitando o agendamento da assinatura do contrato, em razão da proximidade do prazo de cumprimento da Ação Civil Pública, conforme Ofício 217120 (18000556).
 
Em atendimento ao pedido da SPU/SC, a CJU emitiu o Parecer 00019/2021/CJU-SC/CGU/AGU(18098737), cujas alterações sugeridas seguem descritas resumidamente:
 
Outrossim, deverá ser utilizada como referência a Minuta Modelo de Contrato de Cessão de Uso Gratuita prevista no Anexo IV, da ON-SPU-GEAPN nº 002/2001, promovendo-se as adaptações necessárias à adequação ao caso concreto.
47. À luz dessa peça padrão e do que posto neste Parecer, recomenda-se exclusão cláusulas Sexta a Décima e Décima Terceira.
48. Quanto à Cláusula Quarta, Parágrafo único, que atribui à FUNAI o prazo de 24 meses para "a implantação da destinação de que trata o caput", qual seja, "usufruto da comunidade indígena local, atendendo as Políticas Públicas de promoção e proteção dos direitos dos povos indígenas", não nos parece adequada e também se recomenda exclusão. Isso porque não está clara qual seria essa ação concreta; se ela se refere ao processo de demarcação da terra indígena não caberia à União cedente interferir nisso e certamente a cessionária ou seu órgão de assessoramento jurídico (que, aliás, deveria ser consultado) não concordaria; por outro lado, do que consta, a área já estaria consolidada com ocupação e usufruto indígena (o que parece faltar seria o devido processo demarcatório).
 
Diante do citado Parecer, foi elaborada a Minuta de Contrato 18238583. Apesar das tratativas entre os gabinetes das partes, o Contrato de Cessão de Uso Gratuito de Imóvel 18242982 foi assinado somente pelo então representante da SPU/SC, Nabih Henrique Charaim, em 07/09/2021.
 
Em fevereiro de 2022, a FUNAI enviou o Ofício 138 2022 PRES FUNAI (22221530), pelo qual encaminhou sua análise e ajuste da Minuta do Contrato de Cessão de Uso Gratuito. Cabe ressaltar que a análise foi realizada sobre Minuta de Contrato 17831940, a mesma encaminhada à CJU pela SPU/SC.
 
A Procuradoria Federal Especializada junto à FUNAI se manifestou por meio da Nota n. 001142021COADPFEPFE-FUNAIPGFAGU (22221634) e Nota JURIDICA n. 000182021MCCF-PFEPFEFUNAIPGFAG (22221645), resultando nas seguintes proposições de ajustes:
 
(...)
Desta forma, recomenda-se a alteração das Cláusulas Sexta e Sétima de forma que a FUNAI somente se responsabilize pelos danos e obrigações por ela diretamente causados/assumidos com a finalidade. Deve-se acrescentar, por sua vez, que os danos causados e obrigações assumidas pela comunidade indígena frente a terceiros em decorrência do usufruto previsto na Cláusula Quarta, serão de responsabilidade da referida comunidade. Sugere-se inclusive,por relevante, que deve ficar consignado que a FUNAI não poderá se responsabilizar pelo pagamento de energia elétrica pelos indígenas.
Diante das recomendações acima lançadas, recomenda-se pertinente a assinatura do CONTRATO DE CESSÃO DE USO GRATUITA também por um representante da Comunidade Indígena.
 
Também foram objeto de sugestão de modificações as Cláusulas Nona, Décima e Décima primeira:
 
Quanto à Cláusula Nona (...) propõe-se a adequação da referida cláusula de forma que se adeque à realidade e responsabilidade da FUNAI, inclusive com a indicação dos recursos orçamentários necessários ao adimplemento das obrigações aderidas.
No mesmo seguimento, há que se destacar a impossibilidade de assunção do compromisso contido na cláusula décima, alínea "d" quanto a taxas e preços referentes a serviços prestados a terceiros, incluindo a comunidade indígena usufrutuária. Assim, sugere-se ainserção de ressalva neste sentido, de maneira que a comunidade indígena usufrutuária responda pelas taxas e preços dos serviços a ela prestados.
No que tange à Cláusula Décima Primeira, recomenda-se que na alínea "d" inserir após "qualquer obra ou alteração do imóvel cedido" o trecho "a ser realizada ou anuída pela FUNAI", considerando-se que a FUNAI não pode ser capaz de fiscalizar a realização de toda ou qualquer obra no imóvel, inclusive as realizadas pela própria comunidade indígena que terá o usufruto da terra. No que diz respeito à alínea "e" também deve ser ressaltada a impossibilidade de a FUNAI responsabilizar-se exclusiva e integralmente pela manutenção, reparação, restauro e reformas de imóvel que se destina ao usufruto da comunidade indígena, cabendo a esta a assunção destas obrigações. (grifos nossos).
 
Após a análise jurídica da FUNAI, sua área técnica foi instada a se manifestar, produzindo a Informação Técnica n 64 2021 CORI CGAF DPT FUNAI2 2( 221554) que propôs a exclusão da alínea d, relativamente à Cláusula Décima Segunda: "se a outorgada cessionária renunciar à cessão, deixar de exercer suas atividades específicas ou ser extinto", pois entende que, mesmo que a FUNAI deixe de exercer suas funções ou seja extinta, a comunidade indígena não deixará de existir, e, portanto o imóvel deve continuar a ser utilizado pela mesma. Outra sugestão proposta foi a retificação deste item, fazendo constar que será transferida a cessão gratuita ao órgão que vier a administrar os imóveis cedidos à FUNAI.
 
Buscando reunir os entendimentos das consultorias jurídicas dos dois órgãos, temos esta breve visão:
 
[vide tabela no original]
 
A FUNAI verificou ainda, que após a publicação da Portaria 9494 (17773046), o Ministério Público Federal protestou novo requerimento, discordando do conteúdo da Portaria que trata da temporalidade da Cessão de Uso Gratuita pelo prazo de 20 anos, conforme Ofício n. 007642021NAP-AERFIN-PRF4 PGF AGU (22221614):
 
Do contido na Portaria 9.294, de 3 de agosto de 2021, verificam-se três situações incompatíveis com a finalidade da cessão, destinada à ocupação por aldeamento indígena: a existência de um prazo máximo de cessão de 20 anos - no art. 3º - a existência de uma cláusula resolutiva expressa ao fim desse período - no art. 4º, I - e a disposição albergada no Inciso VI do art. 4º, a versar a reversão automática do imóvel ao patrimônio da União se, em qualquer época, a Outorgante Cedente necessitar do imóvel cedido para seu uso próprio.
 
Assim, o requerimento do MPF trás o seguinte teor:
(....)
b) a intimação da União e da FUNAI para promoverem as adequações aventadas na presente manifestação ministerial, extirpando da cessão a temporalidade e demais consectários, notadamente, a cláusula resolutiva e a possibilidade de reversão a qualquer tempo, tal como se tem na minuta da Portaria 9492/2021.
Diante do entendimento diverso das duas consultorias jurídicas, propomos o encaminhamento da questão à CJU para dar um entendimento final sobre a Minuta do Contrato de Cessão de Uso gratuito, lembrando que a Minuta inicial analisada foi o Doc. SEI1 7831940 e a SPU já gerou uma Minuta (18238583) resultante do parecer encaminhado pela CJU. Destacamos que os dados dos Despacho 33651032 SEI 10154.184881/2020-64 / pg. 387 representantes das instituições serão atualizados para a confecção do Contrato definitivo.
Adicionalmente, solicitamos a manifestação da CJU sobre a manifestação do MPF discordando do teor da Portaria 9294/2021, intimando a SPU/SC e FUNAI a promoverem alterações.

 

Tudo lido a analisado, é o relatório necessário.

 

Parecer.

 

Normas e precedentes relacionados com o imóvel.

 

A Constituição Federal determina:

 

Art. 20. São bens da União:
(...)
XI - as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios.
 
(...)
 
Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.
§ 1º São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições.
§ 2º As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se a sua posse permanente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes.
§ 3º O aproveitamento dos recursos hídricos, incluídos os potenciais energéticos, a pesquisa e a lavra das riquezas minerais em terras indígenas só podem ser efetivados com autorização do Congresso Nacional, ouvidas as comunidades afetadas, ficando-lhes assegurada participação nos resultados da lavra, na forma da lei.
§ 4º As terras de que trata este artigo são inalienáveis e indisponíveis, e os direitos sobre elas, imprescritíveis.
§ 5º É vedada a remoção dos grupos indígenas de suas terras, salvo, "ad referendum" do Congresso Nacional, em caso de catástrofe ou epidemia que ponha em risco sua população, ou no interesse da soberania do País, após deliberação do Congresso Nacional, garantido, em qualquer hipótese, o retorno imediato logo que cesse o risco.
§ 6º São nulos e extintos, não produzindo efeitos jurídicos, os atos que tenham por objeto a ocupação, o domínio e a posse das terras a que se refere este artigo, ou a exploração das riquezas naturais do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes, ressalvado relevante interesse público da União, segundo o que dispuser lei complementar, não gerando a nulidade e a extinção direito a indenização ou a ações contra a União, salvo, na forma da lei, quanto às benfeitorias derivadas da ocupação de boa fé.
§ 7º Não se aplica às terras indígenas o disposto no art. 174, § 3º e § 4º.
 Art. 232. Os índios, suas comunidades e organizações são partes legítimas para ingressar em juízo em defesa de seus direitos e interesses, intervindo o Ministério Público em todos os atos do processo.

 

Como se vê, o próprio texto Constitucional fixa o proprietário (União) e a destinação (usufruto exclusivo) dos imóveis ocupados pelos índios.

 

A Lei 6.001, de 19 de dezembro de 1973 dispõe:

 

Art. 22. Cabe aos índios ou silvícolas a posse permanente das terras que habitam e o direito ao usufruto exclusivo das riquezas naturais e de todas as utilidades naquelas terras existentes.
Parágrafo único. As terras ocupadas pelos índios, nos termos deste artigo, serão bens inalienáveis da União (artigo 4º, IV, e 198, da Constituição Federal).
Art. 23. Considera-se posse do índio ou silvícola a ocupação efetiva da terra que, de acordo com os usos, costumes e tradições tribais, detém e onde habita ou exerce atividade indispensável à sua subsistência ou economicamente útil.
Art. 24. O usufruto assegurado aos índios ou silvícolas compreende o direito à posse, uso e percepção das riquezas naturais e de todas as utilidades existentes nas terras ocupadas, bem assim ao produto da exploração econômica de tais riquezas naturais e utilidades.
§ 1° Incluem-se, no usufruto, que se estende aos acessórios e seus acrescidos, o uso dos mananciais e das águas dos trechos das vias fluviais compreendidos nas terras ocupadas.
§ 2° É garantido ao índio o exclusivo exercício da caça e pesca nas áreas por ele ocupadas, devendo ser executadas por forma suasória as medidas de polícia que em relação a ele eventualmente tiverem de ser aplicadas.
Art. 25. O reconhecimento do direito dos índios e grupos tribais à posse permanente das terras por eles habitadas, nos termos do artigo 198, da Constituição Federal, independerá de sua demarcação, e será assegurado pelo órgão federal de assistência aos silvícolas, atendendo à situação atual e ao consenso histórico sobre a antigüidade da ocupação, sem prejuízo das medidas cabíveis que, na omissão ou erro do referido órgão, tomar qualquer dos Poderes da República.
 

A Lei 5.371 de 05 de dezembro de 1967, que criou a FUNAI, determina:

 
Art. 1º Fica o Govêrno Federal autorizado a instituir uma fundação, com patrimônio próprio e personalidade jurídica de direito privado, nos têrmos da lei civil, denominada "Fundação Nacional do Índio", com as seguintes finalidades:
(...)
II - gerir o Patrimônio Indígena, no sentido de sua conservação, ampliação e valorização;

 

A Portaria nº 1.128, de 13 de agosto de 2003, do Ministro da Justiça, declarou:

 

Art. 1 Declarar de posse permanente dos grupos indígenas Xokleng, Kaingang e Guarani a Terra Indígena IBIRAMA-LA KLÃNÕ, com superfície aproximada de 37.108 ha (trinta e sete mil cento e oito hectares) e perímetro também aproximado de 110 km (cento e dez quilômetros), assim delimitada:

 

Tal Portaria é objeto da Ação Civil Originária (ACO) 1100/SC, onde foi deferida medida cautelar:

 

(...) Portanto, diante de todas as considerações acima expostas, concedo em parte a tutela provisória incidental requerida, a fim de suspender todos os efeitos do Parecer n.º 001/2017/GAB/CGU/AGU, juntado a estes autos pela União em sede de Alegações Finais, em relação à Terra Indígena Ibirama La-Klaño, até o final julgamento de mérito do feito . Remeta-se o feito à Procuradoria-Geral da República, para que apresente manifestação, no prazo de dez dias.

 

O mencionado Parecer n.º 001/2017/GAB/CGU/AGU (https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/AGU/PRC-GMF-05-2017.htm) não trata diretamente da Portaria acima, mas fixa as condicionantes para demarcação de terras indígenas:

 

Portanto, nos processos de demarcação de terras indígenas, os órgãos da Administração Pública Federal, direta e indireta, deverão observar as seguintes condições:
(I) o usufruto das riquezas do solo, dos rios e dos lagos existentes nas terras indígenas (art. 231, § 2º, da Constituição Federal) pode ser relativizado sempre que houver, como dispõe o art. 231, § 6º, da Constituição, relevante interesse público da União, na forma de lei complementar;
(II) o usufruto dos índios não abrange o aproveitamento de recursos hídricos e potenciais energéticos, que dependerá sempre de autorização do Congresso Nacional;
(III) o usufruto dos índios não abrange a pesquisa e lavra das riquezas minerais, que dependerá sempre de autorização do Congresso Nacional, assegurando-se-lhes a participação nos resultados da lavra, na forma da lei;
(IV) o usufruto dos índios não abrange a garimpagem nem a faiscação, devendo, se for o caso, ser obtida a permissão de lavra garimpeira;
(V) o usufruto dos índios não se sobrepõe ao interesse da política de defesa nacional; a instalação de bases, unidades e postos militares e demais intervenções militares, a expansão estratégica da malha viária, a exploração de alternativas energéticas de cunho estratégico e o resguardo das riquezas de cunho estratégico, a critério dos órgãos competentes (Ministério da Defesa e Conselho de Defesa Nacional), serão implementados independentemente de consulta às comunidades indígenas envolvidas ou à FUNAI;
(VI) a atuação das Forças Armadas e da Polícia Federal na área indígena, no âmbito de suas atribuições, fica assegurada e se dará independentemente de consulta às comunidades indígenas envolvidas ou à FUNAI;
(VII) o usufruto dos índios não impede a instalação, pela União Federal, de equipamentos públicos, redes de comunicação, estradas e vias de transporte, além das construções necessárias à prestação de serviços públicos pela União, especialmente os de saúde e educação;
(VIII) o usufruto dos índios na área afetada por unidades de conservação fica sob a responsabilidade do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade;
(IX) o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade responderá pela administração da área da unidade de conservação também afetada pela terra indígena com a participação das comunidades indígenas, que deverão ser ouvidas, levando-se em conta os usos, tradições e costumes dos indígenas, podendo para tanto contar com a consultoria da FUNAI;
(X) o trânsito de visitantes e pesquisadores não-índios deve ser admitido na área afetada à unidade de conservação nos horários e condições estipulados pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade;
(XI) devem ser admitidos o ingresso, o trânsito e a permanência de não-índios no restante da área da terra indígena, observadas as condições estabelecidas pela FUNAI;
(XII) o ingresso, o trânsito e a permanência de não-índios não pode ser objeto de cobrança de quaisquer tarifas ou quantias de qualquer natureza por parte das comunidades indígenas;
(XIII) a cobrança de tarifas ou quantias de qualquer natureza também não poderá incidir ou ser exigida em troca da utilização das estradas, equipamentos públicos, linhas de transmissão de energia ou de quaisquer outros equipamentos e instalações colocadas a serviço do público, tenham sido excluídos expressamente da homologação, ou não;
(XIV) as terras indígenas não poderão ser objeto de arrendamento ou de qualquer ato ou negócio jurídico que restrinja o pleno exercício do usufruto e da posse direta pela comunidade indígena ou pelos índios (art. 231, § 2º, Constituição Federal, c/c art. 18, caput, Lei nº 6.001/1973);
(XV) é vedada, nas terras indígenas, a qualquer pessoa estranha aos grupos tribais ou comunidades indígenas, a prática de caça, pesca ou coleta de frutos, assim como de atividade agropecuária ou extrativa (art. 231, § 2º, Constituição Federal, c/c art. 18, § 1º, Lei nº 6.001/1973);
(XVI) as terras sob ocupação e posse dos grupos e das comunidades indígenas, o usufruto exclusivo das riquezas naturais e das utilidades existentes nas terras ocupadas, observado o disposto nos arts. 49, XVI, e 231, § 3º, da CR/88, bem como a renda indígena (art. 43 da Lei nº 6.001/1973), gozam de plena imunidade tributária, não cabendo a cobrança de quaisquer impostos, taxas ou contribuições sobre uns ou outros;
(XVII) é vedada a ampliação da terra indígena já demarcada;
(XVIII) os direitos dos índios relacionados às suas terras são imprescritíveis e estas são inalienáveis e indisponíveis (art. 231, § 4º, CR/88); e
(XIX) é assegurada a participação dos entes federados no procedimento administrativo de demarcação das terras indígenas, encravadas em seus territórios, observada a fase em que se encontrar o procedimento.
 

Como bem esclarecido no Parecer 00019/2021/CJU-SC/CGU/AGU (18098737) SEI 10154.184881/2020-64 / pg. 199:

 

A cessão de uso gratuita tem sua previsão legal no Art. 79, §3º, do Decreto- Lei nº 9.760/1946, regulamentado pelo art. 11, §2º, do Decreto nº 3.725/2001,no art. 18, inciso I e II, da Lei nº 9.636/1998 e noart. 2º, inciso I, alínea a da Portaria SPU nº144/2001,abaixo transcritos (grifos nossos):
 
Decreto- Lei nº 9.760/1946
Art. 79. A entrega de imóvel para uso da Administração Pública Federal direta compete privativamente àSecretaria do Patrimônio da União – SPU (redação dada pela Lei nº 9.636, de 1998).§
3° - Havendo necessidade de destinar imóvel ao uso de entidade da Administração Pública Federal indireta, a aplicação se fará sob o regime acessão de uso(Incluído pela Lei nº 9.636, de 1998).
 
Decreto nº 3.725/2001
Art. 11. A entrega de imóvel para uso da Administração Pública Federal, nos termos do art. 79 do Decreto-lei nº9.760, de 5 de setembro de 1946, compete privativamente à Secretaria do Patrimônio da União.
(...)
§ 2º Havendo necessidade de destinar imóvel para uso de entidade da Administração Federal indireta, a aplicação far-se-á sob o regime de cessão de uso.Lei nº 9.636/1998.
Art. 18. A critério do Poder Executivo poderão ser cedidos, gratuitamente ou em condições especiais, sob qualquer dos regimes previstos no Decreto-Lei no 9.760, de 1946, imóveis da União a:I -Estados, Distrito Federal, Municípios e entidades sem fins lucrativos das áreas de educação, cultura,assistência social ou saúde; (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007)
II - pessoas físicas ou jurídicas, em se tratando de interesse público ou social ou de aproveitamento econômico de interesse nacional. (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007)
 
Portaria SPU nº 144/2001
Art. 2º As cessões de uso gratuito ou em condições especiais de imóveis da União deverão observar as seguintes destinações:
I - ao uso no serviço público, para os seguintes fins:
a) a fundações e autarquias que integrem a Administração Pública Federal;
b) a empresas públicas e sociedades de economia mista com controle acionário majoritário da União, paraafetação aos seus fins institucionais;
 
(...)

 

39. Ressalva-se, todavia, que na melhor técnica e sem maiores incursões no Direito Indigenista, segundo a menção na Ação, a localidade se enquadraria como Reserva indígena e não terra tradicional no extrato constitucional; conforme se extrai do site da FUNAI (http://www.funai.gov.br/index.php/2014-02-07-13-24-32):
 
Terra Indígena (TI) é uma porção do território nacional, a qual após regular processo administrativo de demarcação, conforme os preceitos legais instituídos, passa, após a homologação por Decreto Presidencial para a propriedade da União, habitada por um ou mais comunidades indígenas, utilizada por estes em suas atividades produtivas, culturais, bem-estar e reprodução física. Assim sendo,se trata de um bem da União, e como tal é inalienável e indisponível, e os direitos sobre ela são imprescritíveis.
Nos termos da legislação vigente (CF/88, Lei 6001/73 – Estatuto do Índio, Decreto n.º 1775/96),as terras indígenas podem ser classificadas nas seguintes modalidades:
Terras Indígenas Tradicionalmente Ocupadas: São as terras indígenas de que trata o art. 231 da Constituição Federal de 1988, cujo processo de demarcação é disciplinado pelo Decreto n.º 1775/96.
Reservas Indígenas: São terras doadas por terceiros, adquiridas ou desapropriadas pela União, que se destinam à posse permanente dos povos indígenas. São terras que também pertencem ao patrimônio da União, mas que não se confundem com as terras de ocupação tradicional. Além disso, vale destacar que existem reservas indígenas, que foram reservadas pelos Estados-membros, principalmente durante a primeira metade do século XX, mas que hoje são reconhecidas como de ocupação tradicional.
Terras Dominiais: São as terras de propriedade das comunidades indígenas, havidas, por qualquer das formas de aquisição do domínio, nos termos da legislação civil.
Dessa forma, são estas as três modalidades de terras indígenas, nos termos da legislação vigente (CF/88, Lei 6001/73 – Estatuto do Índio, Decreto n.º 1775/96). Apesar disso, vale destacar também o instrumento administrativo de interdição de áreas (terras interditadas), instrumento este, o qual não deve ser entendido como modalidade de terra indígena, mas tão somente como instrumento administrativo utilizado para assegurar a proteção de comunidades ou grupos indígenas que vivem em situação de isolamento com o estabelecimento de restrição de ingresso e trânsito de terceiros na área, mas que não se trata de área, quando isoladamente considerada e ceteris paribus, sob domínio da União, antes, se trata de instrumento para assegurar a proteção das comunidades ou grupos indígenas isolados.
 
40. De todo modo e dadas as informações do processo judicial em especial, trata-se de terra indígena na sua acepção genérica e fática de ocupação. Não parece ainda ter havido a devida demarcação, que, salvo melhor juízo, não dependeria de uma prévia e formal cessão de uso à FUNAI, até porque as terras continuam e sempre serão da União por força constitucional (artigo 20, XI, e 231) como se extrai das etapas de um processo demarcatório. Toda atuação da FUNAI independeria de cessão da terra indígena a si, a nosso ver:
 
Como é realizada a demarcação das terras indígenas?
O processo de demarcação, regulamentado pelo Decreto nº 1775/96, é o meio administrativo para identificar e sinalizar os limites do território tradicionalmente ocupado pelos povos indígenas.
Nos termos do mesmo Decreto, a regularização fundiária de terras indígenas tradicionalmente ocupadas compreende as seguintes etapas, de competência do Poder Executivo:
i) Estudos de identificação e delimitação, a cargo da Funai;
ii) Contraditório administrativo;
iii) Declaração dos limites, a cargo do Ministro da Justiça;
iv) Demarcação física, a cargo da Funai;
v) Levantamento fundiário de avaliação de benfeitorias implementadas pelos ocupantes não-índios, a cargo da Funai, realizado em conjunto com o cadastro dos ocupantes não-índios, a cargo do Incra;
vi) Homologação da demarcação, a cargo da Presidência da República;
vii) Retirada de ocupantes não-índios, com pagamento de benfeitorias consideradas de boa-fé, a cargo da Funai,e reassentamento dos ocupantes não-índios que atendem ao perfil da reforma, a cargo do Incra;
viii) Registro das terras indígenas na Secretaria de Patrimônio da União, a cargo da Funai; e
ix) Interdição de áreas para a proteção de povos indígenas isolados, a cargo da Funai.

 

As normas e precedentes são relevantes para a presente análise, como tratado a seguir.

 

Da legalidade da cessão já analisada no PARECER n. 01030/2018/ACS/CGJPU/CONJUR-MP/CGU/AGU. Considerações sobre o usufruto exclusivo.

 

Diante do arcabouço acima delineado, parece-nos que a cessão não é o instrumento de destinação mais adequado para a regularização do uso do imóvel.

 

Se a finalidade almejada é "o usufruto da comunidade indígena local", salvo melhor juízo, o correto seria destinar o imóvel diretamente ao usufrutuário final através do instrumento usufruto exclusivo, conforme "Matriz dos critérios de Destinação" (pg. 28 das Orientações para a Destinação do Patrimônio da União, veiculada no Memorando SPU nº 90/2010 (disponível em https://www.gov.br/economia/pt-br/assuntos/patrimonio-da-uniao/legislacao/arquivos-anteriores/arquivos/2016/cartilha-memo-90-destinacao-orientacoes-para-a-destinacao-do-patrimonio-da-uniao.pdf/view). Cópia anexa.

 

A sentença proferida na ACP Nº 2003.72.05.006252-5/SC (referida no Ofício 399-DC-GABC-2021 (17328975) SEI 10154.184881/2020-64 / pg. 119) relata o seguinte histórico:

 

A construção da Barragem Norte teve início com o Decreto nº 76.392, de 06-10- 1975 (fl. 1026 do volume "V" em apenso - capa amarela)
 
"Art. 1º Fica declarada de utilidade pública, para fins de desapropriação pelo Departamento Nacional de Obras de Saneamento, Autarquia vinculada ao Ministério do Interior, uma área de terreno titulada a diversos particulares, com aproximadamente .... 14.000.000m2 (quatorze milhões de metros quadrados), com benfeitorias, situada no Município de Ibirama, no Estado de Santa Catarina, necessária à construção da Barragem Norte e obras complementares, inclusive áreas para explorações de jazidas de materiais, e faixa para implantação de nova estrada de contorno. A bacia hidráulica, destinada à contenção de cheias, terá o seu perímetro limitado pela curva de nível de valor 306,50m (trezentos e seis metros e cinqüenta centímetros), (cota arbitrária), podendo variar em cada caso particular, com formato irregular, relativa à planta nº 1.478 - 11ª DRS, constante do processo nº 12.050-MI-75, devidamente rubricada pelo Secretário Geral do Ministério do Interior.
Art. 2º Excetuam-se desta declaração de utilidade pública, as áreas existentes na região, que constituem Reservas Indígenas.
Art. 3º A desapropriação, a que se refere o presente Decreto, é considerada de urgência, para os efeitos do artigo 15, do Decreto-lei nº 3.365, de 21 de junho de 1941, modificado pela Lei nº 2.786, de 21 de maio de 1956.
Art. 4º O Departamento Nacional de Obras de Saneamento fica autorizado, com os seus próprios recursos, a promover e executar, amigável e judicialmente, apresente desapropriação.
Art. 5º Este Decreto entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário."
 
O Decreto nº 76.392/75 não desapropriou as terras indígenas, até porque não poderia, uma vez que as terras indígenas pertencem à União (art. 4º, IV, da Constituição Federal de 1967, com a Emenda Constitucional de 1969).
 
Pelo que se vê do mapa de fl. 300 (mapa entre as fls. 20 e 21 do apenso "II" - capa verde), a Barragem não foi construída em área indígena, área esta que é de 14.084,88 ha. Apenas uma área de 817,4270 ha é atingida/alagada quando do fechamento das comportas (para conter a enchente).
 
Referida área alagada é a situada nas margens de rios (bacia de acumulação) - e corresponde a 5,8% do total da reserva indígena, percentual este muito pequeno considerando a totalidade da reserva.
(https://www.mpf.mp.br/atuacao-tematica/ccr6/dados-da-atuacao/acao-civil-publiva-1/empreendimentos-1/sentenca_acp_indenizacao_pela_construcao_da_barragem_norte_ti_ibirama.pdf)

 

Ou seja: parece que a barragem norte não está em terra indígena, mas parte dela  foi inundada. Se a área estivesse em terra indígena não poderia ser doada (CF, art. 231, § 4º) e mesmo a cessão (em sentido estrito) seria vedada (CF, art. 231, § 6º).

 

Mas no caso do imóvel em questão havia um acordo entre o DNOS e Comunidade Indígena Duque de Caxias onde:

 

"...restou expresso no item 1.1.7 do aludido documento que caberia ao DNOS elaborar um documento que garantisse "à comunidade indígena o uso de 754,5640 (rectius: 724,5640) hectares de terra localizada na bacia de acumulação de água da Barragem Norte..."
(fls. 392 do processo 04972.001632/2014-68, cópia disponível no sapiens)

 

A distinção é relevante porque alguns atos no processo original acabam misturando conceitos (Terras Indígenas Tradicionalmente Ocupadas e Reservas Indígenas). Por exemplo, a Nota Técnica 15279 (3642661) SEI 04972.001632/2014-68 / pg. 8 (anexa),

 

Portanto, aqui não se trata de terra indígena tradicional, mas sim de destinar imóvel da União para regularização de reserva indígena. A Cessão, a rigor, seria para "uso no serviço público" (Portaria SPU nº 144/2001, Art. 2º, I).

 

Assim, parece-nos que o melhor instrumento de destinação seria o usufruto exclusivo à comunidade interessada.

 

No entanto, a presente proposta de cessão foi fruto de um processo conflituoso, o que se observa melhor com a leitura do 04972.001632/2014-68, disponível parcialmente no sapiens (processo que antecedeu este, conforme: Despacho 14451966 SEI 10154.184881/2020-64 / pg. 60, Despacho 17279472 SEI 10154.184881/2020-64 / pg. 111 etc).

 

Após longa negociação com a comunidade indígena e dificuldades na identificação da área de segurança da barragem e definição do remanescente de propriedade da União, restou:

 

"...acordado que o instrumento seria feito com base no §3º , do art. 79,do Decreto Lei nº  9.760/46, conforme abaixo descrito: 
Art. 79 . ...........       
§ 3o Havendo  necessidade  de  destinar imóvel ao  uso  de  entidade  da Administração   Pública  Federal  indireta,  a   aplicação   se   fará   sob  o regime  da cessão  de  uso. (Incluído  pela  Lei nº  9.636 , de 1998".
(Despacho DECIP-SPU (3639520) SEI 04972.001632/2014-68/pg 12, seq 47, processo administrativo 1, pg. 12).

 

Após mais discussão, a cessão foi considerada licitamente adequada pelo r. PARECER n. 01030/2018/ACS/CGJPU/CONJUR-MP/CGU/AGU (Sapiens, seq 19, processo 04972.001632/2014-68), que tratou da primeira minuta de Portaria autorizadora da cessão. Entendimento corroborado pelo r. PARECER n. 00019/2021/CJU-SC/CGU/AGU (Parecer 00019/2021/CJU-SC/CGU/AGU (18098737) SEI 10154.184881/2020-64).

 

E ainda existe sentença determinando a cessão na Ação Civil Pública nº 5000796-11.2021.4.04.7213.

 

Portanto, não cabe reapreciar a matéria, mas pedimos vênia para consignar, que, ao nosso juízo, a melhor solução ao caso concreto seria alterar a destinação do imóvel para a modalidade usufruto exclusivo[1] em benefício da comunidade indígena interessada, sem prejuízo da gestão da FUNAI, conforme Lei 5.371/97, art. 1º, inciso II.

 

Assim, a legalidade da cessão já está sedimentada.

 

Da minuta contratual.

 

Como bem relatado pela SPU no Despacho 33651032 SEI 10154.184881/2020-64 / pg. 384, ocorreram algumas divergências entre as manifestações das Consultorias Jurídicas.

 

Mas não é possível aqui fixar um entendimento final sobre o contrato, já que inexiste hierarquia ou subordinação entre PFE-FUNAI e CJU.

 

Resolver eventuais divergências não estaria na esfera de competência desta e-CJU, mas sim da douta CGU e/ou do Exmo. Advogado Geral da União, conforme art. 3º, inciso XVI da Portaria Normativa AGU nº 24, de 27 de setembro de 2021:

 

Art. 3º Compete à Consultoria-Geral da União:
(...)
XVI - elaborar manifestações jurídicas para uniformização de controvérsias entre os órgãos consultivos que lhe são subordinados e os órgãos jurídicos integrantes da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, da Procuradoria-Geral Federal, da Procuradoria-Geral do Banco Central, da Procuradoria-Geral da União, da Secretaria-Geral de Consultoria, da Secretaria-Geral de Contencioso e da Corregedoria-Geral da Advocacia da União, submetendo-as ao Advogado-Geral da União, se for o caso;

 

No entanto, como relatado no Despacho, CJU/SC e PFE/Funai analisaram a mesma minuta (Minuta de Contrato 17831940)", e ambas sugeriram alterações, o que não revela exatamente uma divergência jurídica.

 

Além disso a SPU já substituíu a  Minuta de Contrato 17831940 pela Minuta de Contrato 18238583, bem mais sintética e adequada aos termos do r. Parecer e consolidada no Contrato de Cessão de Uso Gratuito de Imóvel 18242982 SEI 10154.184881/2020-64 / pg. 220.

 

As cláusulas controvertidas já foram praticamente todas suprimidas. O que restou no  contrato 18242982 está em conformidade com o modelo da ON – GEAPN – 002 e todas as cláusulas são obrigatórias (art. 18 da Lei 9.636/98).

 

Assim, não havendo hierarquia entre CJU e PFE, parece-nos que a solução é encaminhar o contrato alterado para nova apreciação da FUNAI e da douta PFE.

 

Da manifestação do MPF.

 

Como relatado acima, o douto MPF discordou dois pontos da cessão: fixação de prazo e a possibilidade de reversão.

 

O problema aqui, ao nosso juízo, é o instrumento de destinação utilizado. Não deveria ser a cessão, que não a melhor opção para  destinar imóvel ao usufruto da comunidade indígena local.

 

Inclusive, tanto os problemas apontados pela PFE/FUNAI quanto pelo MPF parecem ter a mesma origem: o instrumento de destinação pouco usual para a criação da reserva, que foi fruto de uma necessidade diante do caso concreto de difícil solução.

 

Mas, tendo a Administração (e a sentença) optado pela cessão, não é possível excluir as cláusulas questionadas, porque são exigíveis em qualquer cessão, decorrendo de imposição legal conforme art. 18 a Lei 9.636/98 (transcrito acima). No mais, tratando-se de contrato, não pode ser fixado por prazo indeterminado, pois não se enquadra nas restritas hipóteses da Lei 14.133/21.

 

Além disso, nada obsta que, oportunamente, FUNAI e SPU alterem a destinação do imóvel, permanecendo este na propriedade da União com usufruto da comunidade.

 

CONCLUSÃO.

 

 

Ante o exposto:

  1. A legalidade da cessão já foi apreciada e não é objeto de discussão, sendo fruto de processo de negociação.
  2. Não cabe às CJU´s dar a última palavra sobre divergência com a PFE-FUNAI, inexistindo hierarquia entre os Órgãos. No entanto, neste caso a minuta objeto da suposta divergência foi substituída por outra bem mais sintética que suprimiu todos os, ou a maior parte dos, problemas apontados. Logo, a nova minuta deve ser submetida à análise da PFE-FUNAI.
  3. As cláusulas impugnadas pelo douto MPF são obrigatórias, vedada cessão por prazo indeterminado ou sem cláusula de reversão.
  4. Sugere-se avaliar, oportunamente, a mudança de destinação do imóvel para usufruto indígena (tipo de imóvel reserva), mantendo a gestão da FUNAI na forma da lei, providência que deve resolver os problemas apontados pelo douto MPF.

Dispensada a aprovação do Exmo. Coordenador, é o parecer.

 

Vitória, ES, 19 de maio de 2023.

 

 

LUÍS EDUARDO NOGUEIRA MOREIRA

ADVOGADO DA UNIÃO

 

 


Atenção, a consulta ao processo eletrônico está disponível em https://supersapiens.agu.gov.br mediante o fornecimento do Número Único de Protocolo (NUP) 10154184881202064 e da chave de acesso 7ecd2f47

Notas

  1. ^ No Espírito Santo, por exemplo, existem três Terras Indígenas registradas no SPIUnet: Terra Indígena de Combiois, Terra Indígena de Caieiras Velha I e II. RIP´s 5611000135004, 5611000145000 e 5611000205002. Todas com Regime de utilização "usufruto indígena", tipo de imóvel "reserva".



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