ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA DA UNIÃO ESPECIALIZADA VIRTUAL DE PATRIMÔNIO
NÚCLEO JURÍDICO

PARECER n. 00387/2023/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU

 

NUP: 10154.115842/2023-60

INTERESSADOS: COMPANHIA DOCAS DE IMBITUBA S A E OUTROS

ASSUNTOS: USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIA E OUTROS

 

EMENTA: REVERSÃO DE IMÓVEL AO PATRIMÔNIO DA UNIÃO EM FACE DE EXTINÇÃO DO CONTRATO DE CONCESSÃO. DIREITO IRRENUNCIÁVEL DECORRENTE DE IMPOSIÇÃO DE ORDEM LEGAL. ARTS 11 E 12 DO DECRETO Nº 24.559/34. CLÁUSULA XXX DECRETO 7.842/41. RECOMENDAÇÃO DE MEDIDAS ADMINISTRATIVAS NOS TERMOS DA IN Nº 22/2007.

 

 

I - RELATÓRIO

 

Os autos oriundos da Superintendência do Patrimônio da União no Estado de Santa Catarina - SPU/SC trata, em síntese, de Ação Judicial de Usucapião Extraordinária promovida por Zilda Joaquim Lima relativamente ao imóvel de matrícula nº 13.947, caracterizado como lote de terreno urbano situado na cidade de Imbituba, área G, medindo área total de 1.800 m2, localizado na Avenida Doutor João Rimsa, Centro, Imbituba/SC.

Segundo informação constante do Despacho do Serviço de Caracterização da SPU/SC, referido bem imóvel  integra o patrimônio da Companhia Docas de Imbituba, fazendo parte do Capital Inicial e Adicional do Porto de Imbituba, condição que se constata também através das Certidões do Registro de Imóveis.

Diante de tais circunstâncias e mediante solicitação da Comarca de Imbituba acerca da efetiva Reversão do Imóvel à União, a SPU/SC concluiu primeiramente "que não encontrou registros sobre a reversão dos bens da Companhia Docas de Imbituba para a União Federal" (SEI 33466304) e posteriormente, "que não houve a reversão do imóvel de Matrícula nº 13.947 do Registro de Imóveis da Comarca de Imbituba, situado na Av. Dr. João Rimsa, com 1.800,00 m² ao Poder Público Federal". (SEI 33474241).

Acrescenta por fim a seguinte consulta: "recomendo ao Sr. Superintendente encaminharmos o processo à Consultoria Jurídica da União para que informem o procedimento que deve ser adotado para a reversão dos bens à União Federal ou, se a reversão torna-se automática finalizado o contrato de concessão." (Nota Técnica SEI nº 10465/2023/MGI - SEI 33474241).

A instrução processual compõe-se de cópia integral do Processo Judicial de Usucapião, Certidões do Cartório do Registro de Imóveis, Nota Técnica, Despachos e Ofícios.

É o importante a relatar.

 

II - ANÁLISE E FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA

 

A competência desta unidade jurídica consultiva para manifestação em processos cuja matéria trate de Patrimônio da União, se dá por força do contido no art. 11, inciso V, da Lei Complementar nº 73/93, que trata da Lei Orgânica da Advocacia Geral da União - AGU e dá outras providências, c/c art. 1º, V, § 5º, da Portaria AGU nº 14, de 23 de janeiro de 2020.

Passando de forma objetiva à resposta da consulta formulada impende destacar inicialmente que não consta nos autos cópia do Processo ou especificamente do Contrato de Concessão celebrado entre a União e a Companhia Docas de Imbituba, cuja cláusula específica deveria trazer expressamente a questão da reversão automática ou não do imóvel ao domínio peno da União.

De outra banda, porém, é de fundamental relevância mencionar o que expressamente estabelece o Decreto nº 24.599, de 6 de julho de 1934, ao autorizar a concessão de obras e melhoramentos dos portos nacionais, conforme art. 1º, senão vejamos:

 

"Art. 1º Fica o Governo Federal autorizado a contratar, com a observância das condições estabelecidas neste decreto, o melhoramento e a exploração comercial dos portos nacionais, outorgando concessão para esse fim, aos Estados, em cujo território se encontrem aqueles postos, ou a entidades privadas, de reconhecida idoneidade técnica e capacidade financeira."
"Parágrafo único: o prazo de concessão será fixado de acordo com as dificuldades de execução das obras de melhoramento dos portos a conceder, mas em caso algum excederá de 70 anos."

 

No mesmo dispositivo legal, resta expresso nos artigos 11 e 12:

 

"Art. 11. O concessionário, para compensar o capital que empregar na realização das instalações portuárias do respectivo porto, que reverterão ao Governo Federal, findo o prazo da concessão, constituirá pela capitalização de quotas anuais, retiradas da renda líquida que auferir, os seguintes fundos:"  

 

Note-se que a norma legal estabelece de forma taxativa a reversão das instalações portuárias à União encerrando-se o prazo da concessão.

Na mesma linha, o art. 12 do Decreto traz a seguinte previsão:

 

"Art. 12. Findo o prazo da concessão, reverterão ao domínio da União, as instalações portuárias do porto concedido, mediante o pagamento que o Governo fará, ao concessionário, em apólices da Dívida Pública Federal, pela cotação que então tiverem na Bolsa de Títulos do Rio de Janeiro, de parte de cada uma das parcelas do capital adicional, que nessa data não estiver ainda compensada pelo referido fundo. Ao mesmo tempo, o concessionário incorporará a seu patrimônio as importâncias dos fundos de compensação constituídos ou em constituição."

 

Vê-se, portanto, que a norma além de assegurar a reversão das instalações à União, estabelece, inclusive, a forma de compensação, não pela simples devolução das instalações portuárias, mas por eventuais investimentos e capital aplicado pela concessionária.

Neste sentido é importante observar o que estabelece o Decreto nº 7.842, de 13 de setembro de 1941, na Cláusula I, quando trata dos objetivos e prazos:

 

"É concedida à Companhia Docas de Imbituba, nos termos do decreto nº 24.599, de 6 de julho de 1934, autorização para realizar as obras e o aparelhamento do porto de Imbituba, bem como para a exploração do tráfego desse porto, durante o prazo de setenta (70) anos, a contar da data em que o Tribunal de Contas ordenar o registro do contrato que s celebrar em virtude deste decreto, e que só então entrará em vigor. Não caberá nenhuma responsabilidade à União no caso de ser denegado o registro."

 

Verifica-se evidente o fato da compensação mencionada no art. 12, do Decreto nº 24.559/34, haja vista, a autorização para realização de obras e aparelhamento das instalações constantes da cláusula I, do Decreto nº 7.842/41.

O Parágrafo único da cláusula III do mesmo Decreto estabelece ainda que "os terrenos e benfeitorias adquiridos ou desapropriados, cujo custo tenha sido levado à conta do capital do porto, constituirão parte integrante do patrimônio do mesmo durante o prazo da concessão." 

 

Por sua vez, a cláusula XXX do mesmo Decreto, estabelece de modo específico acerca da reversão:

 

"Findo o prazo do contrato, reverterão ao domínio da União as obras, o aparelhamento, terrenos, instalações diversas e tudo mais que constituir o acervo da concessão..."

 

Portanto, inequívoco, primeiro, o fato da reversão do patrimônio que compõe o imóvel à União, segundo, que a condição primordial definida na norma legal que arregimenta a espécie é o encerramento do contrato.

Conclusão que se sobrepõe sobre qualquer outra que se venha argumentar, é que nos casos de contratos administrativos em que a reversão é uma imposição legal, qualquer documento emanado por terceiros estranhos à avença, não tem o condão de modificar o status legal ou contratual estabelecido em sua gênese, notadamente, de comprometer a reversão.

No presente caso, embora sem acesso ao contrato de concessão, eis que o mesmo não foi acostado aos autos pelo órgão consulente, é de se presumir que o contrato se adeque ao que estabelece as normas autorizativas da concessão no que tange à reversão do bem imóvel ao patrimônio da União.

Por outro lado, não se pode desprezar o fato informado pela SPU/SC da inexistência de registro da reversão ou até mesmo na afirmativa de que esta não ocorreu.

Evidentemente que o órgão está a se referir à celebração de ato formal registrado nos assentamentos internos próprios, contudo, não pode negar a reversão em face da expressa disposição de ordem legal.

Note-se que não há necessidade de novo registro para que o imóvel volte ao patrimônio da União, pois não se trata de novo negócio e sim, de restauração da situação anterior, necessitando apenas de simples averbação do cancelamento do registro.

Tal necessidade se se impõe no entanto, em razão do que consta no Registro do Cartório de Imóveis daquela Comarca, aplicando-se, portanto, o dispostos no § 1º, do art. 168, da Lei nº 6.015/73:

 

Art. 168. No Registro de imóveis serão feitas:
(...)
III - averbação
(...)
b) por cancelamento da extinção dos direitos reais;
(...)
§ 1º No registro de imóveis serão feitas, em geral, a "transcrição", a "inscrição" e a "averbação" dos títulos ou atos constitutivos, declaratórios, translativos e extintivos de direitos reais sobre imóveis, reconhecidos em lei inter vivos e causa mortis, quer para sua constituição, transferência e extinção, quer para sua validade em relação a terceiros, quer para sua disponibilidade."

 

Neste sentido a Secretaria do Patrimônio da União, dispõe da Instrução Normativa nº 22, de 22 de fevereiro de 2017, que disciplina os procedimentos para a aquisição, a incorporação e a regularização patrimonial de bens imóveis em nome da União, previsto no art. 52:

 

"Art. 52 A formalização e a efetivação da reversão dar-se-ão pelo cancelamento do registro anterior, a ser requerido ao Oficial de Registro de Imóveis competente.
§1º O requerimento a que se refere o caput, firmado pelo Superintendente do Patrimônio da União, deverá ser instruído com os seguintes elementos, sem prejuízo de outros documentos:
I - contrato original; II - portaria do Superintendente do Patrimônio da União autorizando a reversão, se decorrente de doação;
III - ato pelo qual a União retomar o direito real limitado;
IV - comprovação da notificação do donatário ou concessionário de direito real limitado quanto às condições de resolução.
§2º Para elaboração da portaria a que se refere o inciso II do parágrafo precedente, deverá ser utilizado o modelo constante do Anexo XXXII desta IN.
§3º A instrução processual da reversão de imóvel ao patrimônio da União dar-se-á no âmbito do processo administrativo correspondente ao respectivo contrato resolvido.” 

 

É importante atentar que embora o procedimento acima mencionado destine-se apenas à reversão de imóveis ao Patrimônio da União, não afasta a possibilidade da concessionária segui-lo no modo transverso, tomando por substituição à SPU, eis que esta era a detentora do direito real limitado.

 

III - CONCLUSÃO

 

Isto posto, conclui-se para o fim de responder objetivamente ao questionamento formulado que, a informação solicitada pela autoridade judicial é no sentido da efetiva ocorrência de reversão do imóvel à União.

Embora o Despacho e a Nota Técnica do órgão consulente expressem negativamente esta ocorrência, o que já responderia objetivamente ao questionamento direto da autoridade judicial, é de fundamental importância que em sua resposta o órgão esclareça que a reversão se dá de modo automático em face de disposição expressa de lei, conforme explicitado nos parágrafo 9 a 19 deste opinativo.

Deve ainda detalhar o fato de que na ausência da reversão anotados nos registros internos do órgão, a SPU/SC adotará todos os procedimentos administrativos relativos à espécie, conforme sugerido nos parágrafos 21 a 26 deste parecer.

É de se reconhecer a necessidade que órgão envide esforços no sentido da localização do contrato de concessão, o qual poderá trazer maior ênfase quanto à automaticidade da reversão já prevista na lei autorizativa da concessão.

Ademais, referido contrato, bem como os Decretos nº 24.599/34 e 7.842/41 são fundamentais subsídios a constituir argumentos favoráveis em eventual defesa da União.

Deverá o órgão consulente adotar as medidas necessárias para a formalização administrativa da reversão nos termos propostos, na hipótese de ainda não tê-lo feito.

É o parecer smj.

 

Boa Vista-RR, 18 de maio de 2023.

 

 

SILVINO LOPES DA SILVA

Advogado da União em Roraima-CJU-RR/CGU/AGU

 

 


Atenção, a consulta ao processo eletrônico está disponível em https://supersapiens.agu.gov.br mediante o fornecimento do Número Único de Protocolo (NUP) 10154115842202360 e da chave de acesso ec385aeb

 




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