ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA DA UNIÃO ESPECIALIZADA VIRTUAL DE PATRIMÔNIO
NÚCLEO JURÍDICO
PARECER n. 00456/2023/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU
NUP: 19739.124879/2023-82
INTERESSADOS: SUPERINTENDENCIA DO PATRIMONIO DA UNIAO EM SERGIPE - SPU/SE
ASSUNTOS: BENS PÚBLICOS
EMENTA:DIREITO ADMINISTRATIVO. LICITAÇÕES E CONTRATOS. CONSULTA FORMAL ACERCA DE LEGALIDADE DE COBRANÇA DE PAGAMENTO DE TARIFAS (PREÇO PÚBLICO) FORNECIMENTO DE ÁGUA. ANÁLISE JURÍDICA E RECOMENDAÇÕES.
Em cumprimento ao disposto no art. 131 da CRFB/88, no art. 11 da Lei Complementar nº 73/1993, no art. 8º-F da Lei nº 9.028/1995, no art. 19 do Ato Regimental AGU nº 05/2007 e no art. 1º da Portaria AGU nº 14/2020, o órgão em epígrafe encaminha a esta e-CJU/Patrimônio, via SAPIENS, autos que tramitam na forma exclusivamente eletrônica
Os autos foram distribuídos ao signatário no dia 31 de maio de 2023 e cuidam de consulta cerca da legalidade da cobrança de tarifa de fornecimento de água, cujo acesso aos autos foi possível mediante disponibilização de link SEI cujo rol de documentos encontram-se abaixo relacionados:
Numeração SEI | descrição |
34166501 | Anexo protocolo_EMSETUR |
34166508 | Anexo SPU |
34166518 | Anexo |
34166531 | Anexo SEI_28387693_Nota_Tecnica_44334 |
34166550 | Anexo SITE_DESO |
34166575 | Anexo SEI_28407281_Oficio_259513 |
34166601 | Anexo Of._Nº_02_1105_EDOC_8408.2023_SPU_cancelamento_de |
34166610 | Anexo Despacho Motivado 44.2023 |
34296988 | Ofício 47933 |
34454615 | Despacho |
Pelo que inferi pela leitura dos documentos anexados, em especial a_Nota_Tecnica_44334/ SEI_28387693 (SEI 34166575) o despacho Motivado 44.2023 SEI 34166610 elaborado em resposta a já referida nota técnica, a dinâmica dos fatos foi a seguinte:
A Secretaria de Coordenação e Governança do Patrimônio da União (SPU) consultou a SPU-SE a respeito dos débitos abertos na Companhia de Saneamento de Sergipe - DESO, a fim de esclarecer se tais débitos e os imóveis correspondentes são de responsabilidade da Superintendência.
Os débitos em questão são os seguintes:
Em relação à Unidade Consumidora Mat. 70556 - Inscrição nº 001.001.222.3062.000 - localizada na Rua Pacatuba, nº 193, Centro, Aracaju/SE, conclui-se que o débito é devido e encontra-se dentro do prazo para pagamento. Nesse sentido, recomenda-se à GRA-SE que instrua o processo para atestar a validade do débito junto à SPU-SE e proceda ao seu posterior pagamento. Em outras palavras, não há controvérsia jurídica em relação ao débito da referida unidade consumidora.
Já no que se refere à Unidade Consumidora Mat. 55573 - Inscrição nº 001.003.126.4050.000 - localizada na Rua Laranjeiras, 448, Centro, constata-se que a cobrança no valor de R$ 2.537,64 (dois mil quinhentos e trinta e sete reais e sessenta e quatro centavos) é indevida. A GRA-SE solicitou o desligamento dessa unidade consumidora por meio do OFÍCIO SEI Nº 307836/2021/ME (20420919), datado de 19 de novembro de 2021, e efetuou o pagamento da taxa de desligamento em 27 de dezembro de 2021, no âmbito do processo nº 10583.101060/2021-21. Portanto, conclui-se que a cobrança em questão é indevida, uma vez que a unidade consumidora foi devidamente desligada.
No que diz respeito aos demais débitos, conclui-se que são indevidos. Isso se deve ao fato de que a reversão da Orla de Atalaia para a União nunca ocorreu, sendo que a gestão da referida área foi transferida diretamente do Estado de Sergipe para o Município de Aracaju por meio do Termo de Adesão de Gestão de Praias - TAGP (5539503), ratificado pela Secretaria de Coordenação e Governança do Patrimônio da União em 02 de março de 2020, conforme extrato publicado no Diário Oficial da União - DOU (6737284). Portanto, não houve devolução do referido bem à União antes da transferência para o Município de Aracaju.
É importante ressaltar que a Superintendência do Patrimônio em Sergipe (SPU) requereu o cancelamento dos débitos em nome da União referentes às faturas de novembro de 2020 a setembro de 2022, das matrículas 665550, 1193287, 4408438 e 4657934, situadas na Orla da Atalaia. A SPU entende que a responsabilidade pelo pagamento desses valores não recai sobre a União. Em resposta à Companhia de Saneamento de Sergipe - DESO, por meio do despacho motivado 044, entendeu-se que os débitos referentes ao período de janeiro a março de 2020 seriam de responsabilidade da União, amparando-se em uma pretensa renúncia realizada pelo Estado de Sergipe.
Além disso, o presente parecer jurídico não adentrará na análise em questões de higidez dos cálculos apresentados nos débitos mencionados. Essa questão, de natureza técnico-contábil, foge ao escopo jurídico da presente manifestação. Recomenda-se, portanto, que seja realizada uma análise específica por profissionais especializados nessa área, a fim de verificar a exatidão dos valores envolvidos.
Por derradeiro, aponto a ausência de documentos que, apesar de mencionados na Nota Técnica e no despacho motivado nº44 podem ser relevantes ao desenlace da controvérsia, são eles:
Ressalto que elaborei o parecer com base nas referências a estes dois documentos citadas nos documentos juntados e entendi que seria possível concluir o parecer sem que os documentos mencionados acima fossem juntados, pela curial razão de suas redações são padronizadas, todavia, acaso autoridade entenda haver descompasso entre o conteúdo daqueles e o entendimento expressado neste parecer, fica facultada/recomenda nova consulta.
É importante salientar que a presente manifestação tem por objetivo fornecer orientações jurídicas acerca da responsabilidade da Superintendência do Patrimônio em Sergipe (SPU-SE) em relação aos imóveis e débitos mencionados, buscando uma compreensão clara e precisa das questões legais envolvidas.
É a síntese do necessário, passo a analisar:
A presente manifestação jurídica tem o escopo de assessorar a autoridade competente para a prática do ato, para que dele não decorra nenhuma responsabilidade pessoal a ela, e também para que seja observado o princípio da legalidade e os demais que norteiam a atuação da Administração.
Desta forma, cercando-se a autoridade de todas as cautelas para a prática do ato, e documentando-as nos autos, a princípio cessa a sua responsabilidade pessoal por eventuais decorrências não satisfatórias.
Nossa atribuição é justamente apontar possíveis riscos do ponto de vista jurídico e recomendar alguma providência para salvaguardar a autoridade assessorada, a quem, em seu juízo discricionário, compete avaliar a real dimensão do risco e a necessidade de se adotar ou não a cautela recomendada.
Disso se conclui que parte das observações aqui expendidas não passam de recomendações, com vistas a salvaguardar a autoridade administrativa assessorada, e não vinculá-la. Caso opte por não acatá-las, não haverá ilegalidade no proceder, mas simples assunção do risco. O acatamento ou não das recomendações decorre do exercício da competência discricionário da autoridade assessorada.
Já as questões que envolvam a legalidade, de observância obrigatória pela Administração, serão apontadas, ao final deste parecer, como óbices a serem corrigidos ou superados. O prosseguimento do feito, sem a correção de tais apontamentos, será de responsabilidade exclusiva do órgão, por sua conta e risco.
Por outro lado, é certo que a análise dos aspectos técnicos (não jurídicos) não está inserida no conjunto de atribuições/competências afetas a esta Consultoria especializada, a qual não possui conhecimento específico nem competência legal para manifestar-se acerca de questões outras que aquelas de cunho estritamente jurídico, cabendo à SPU consulente a responsabilidade pela aferição do imóvel ocupado e sua avaliação, pelo exame dos documentos cartoriais referentes a ocupação primitiva, a cadeia sucessória e a detenção física nas hipóteses demandadas, atestando a satisfatoriedade da documentação exibida, anexando aos autos as comprovações pertinentes, de acordo com o preceituado no Enunciado nº 07 do MANUAL DE BOAS PRÁTICAS CONSULTIVAS DA CGU/AGU, no sentido de que o Órgão Consultivo deve evitar "(...) posicionamentos conclusivos sobre temas não jurídicos, tais como os técnicos, administrativos ou de conveniência ou oportunidade".
A eficiência na gestão dos bens públicos é um tema de extrema relevância, uma vez que busca assegurar que esses recursos sejam utilizados da melhor maneira possível, atendendo de forma eficaz às necessidades da sociedade. Engloba a alocação adequada dos recursos, a maximização dos benefícios para a população e a minimização dos custos associados.
Para atingir a eficiência na administração dos bens públicos, é crucial considerar aspectos como a utilização racional dos recursos, a transparência na tomada de decisões, a avaliação constante dos resultados e a busca por parcerias e mecanismos de participação social. Nesse contexto, destaca-se a categoria específica da cessão de uso, que consiste na transferência temporária e gratuita da posse de um bem público de um órgão cedente para outro órgão ou entidade, com a finalidade de possibilitar sua utilização para fins institucionais ou de interesse público.
No caso em análise, verifica-se que a União cedeu o uso de um bem de sua propriedade para o Estado de Sergipe, configurando-se, portanto, uma cessão de uso típica. Essa cessão de uso de bem público é um instituto de origem civil, sendo adotado no âmbito do direito administrativo para os órgãos públicos. Tal prática é amplamente utilizada, não apenas no Brasil, como forma de permitir o empréstimo temporário e gratuito de imóveis pertencentes a um órgão público para outro órgão ou entidade, possibilitando uma utilização institucional ou de interesse público.
Nesse sentido, a atuação da Superintendência do Patrimônio em Sergipe (SPU-SE), ao ceder o imóvel ao Estado de Sergipe, demonstra uma conduta de boa gestão patrimonial, uma vez que um bem público sem utilidade prática contraria os princípios da gestão eficiente. Ao possibilitar o uso do referido imóvel pelo estado, a SPU-SE conferiu-lhe uma destinação compatível com o interesse público, conferindo-lhe uma finalidade específica.
Com essa afetação, o bem deixou de ser considerado um bem dominical (sem destinação específica) e passou a integrar a categoria de bem de uso especial. Vale ressaltar que a afetação pode ocorrer por meio de ato administrativo, de lei ou de forma tácita, quando resulta de uma atuação direta da Administração.
No presente caso, a Companhia de Saneamento de Sergipe (DESO) sustenta a ocorrência de uma desafetação tácita, mediante renúncia do Estado, que teria implicado na devolução do bem para a União antes do término da cessão. Contudo, essa interpretação dos fatos não parece ser a mais adequada. Em primeiro lugar, a renúncia ou a denúncia unilateral de contratos por prazo determinado não se concretizam sem a anuência da contraparte. Além disso, não existe previsão de desafetação tácita no direito administrativo brasileiro. Por fim, mesmo que o Estado de Sergipe tivesse abdicado da posse do bem, ele não teria a prerrogativa de transferir a gestão do mesmo para o município por meio da adesão ao termo de gestão de praias.
Ademais, no âmbito do direito privado, a renúncia a um contrato por prazo determinado deve ser expressa e depende da anuência da contraparte para se tornar um ato jurídico perfeito. Antes disso, a contraparte tem o poder-dever de vistoriar o imóvel a fim de avaliar sua condição e verificar se existem obrigações pendentes ou execução imperfeita que possam acarretar penalidades contratuais, como multas decorrentes da antecipação do término do contrato ou de eventuais descumprimentos de obrigações.
A mesma lógica se aplica, com ainda mais rigor, no âmbito do direito público, uma vez que os atos administrativos, salvo exceções, devem ser formalizados por escrito, especialmente quando impõem ônus ou obrigações. Além disso, interpretar que ocorreu uma renúncia tácita por parte do Estado equivaleria a admitir uma desafetação tácita, o que não é procedente, pois é um princípio clássico do Direito Administrativo que não há "desafetação tácita de bem público". Uma vez que um bem público deixa de ser dominical, sua desafetação só pode ocorrer por meio de um ato formal e escrito.
CONCLUSÃO
Portanto, diante dos fatos apresentados, constata-se que a DESO está presumindo uma vontade do Estado que não se concretizou. Houve uma comunicação à SPU de que o cessionário (Estado de Sergipe) iria sub-rogar a cessão a outro ente federativo, no caso o município, por meio da adesão ao termo de gestão. Nesse contexto, a SPU, na qualidade de proprietária do bem, apenas anuiu com a cessão, porém, em nenhum momento, os imóveis retornaram à gestão da SPU. Isso implica dizer que a SPU não foi usuária dos serviços prestados no perído de janeiro a março de 2020, sendo indevida a cobrança.
Sugere-se que, caso a controvérsia persista, a autoridade consulente avalie a possibilidade de entabular um procedimento conciliatório perante a Câmara Local de Conciliação.
Pede-se especial atenção ao exposto no parágrafo 11 deste parecer.
É o parecer, de caráter opinativo, que prescinde de aprovação por força do art. 22 da PORTARIA NORMATIVA CGU/AGU Nº 10, DE 14 DE DEZEMBRO DE 2022 – Dispõe sobre a organização e funcionamento das Consultorias Jurídicas da União Especializadas Virtuais.
Ao protocolo da Consultoria Jurídica da União Especializada Virtual de Patrimônio (E-CJU/PATRIMÔNIO) para restituir o processo ao Órgão Consulente, para ciência deste, bem como para adoção da(s) providência(s) pertinente(s), com as considerações de estilo.
Parecer concluído na data de sua assinatura eletrônica
(assinado eletronicamente)
NELSON ORLANDO DE ALARCÃO DUCCINI
ADVOGADO DA UNIÃO
MATRÍCULA SIAPE 1311909 OAB/RJ 77.103
Atenção, a consulta ao processo eletrônico está disponível em https://supersapiens.agu.gov.br mediante o fornecimento do Número Único de Protocolo (NUP) 19739124879202382 e da chave de acesso a5a6bee4