ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA DA UNIÃO ESPECIALIZADA VIRTUAL DE PATRIMÔNIO
NÚCLEO JURÍDICO
PARECER n. 00467/2023/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU
NUP: 10154.114068/2022-99.
INTERESSADOS: UNIÃO (MINISTÉRIO DA GESTÃO E DA INOVAÇÃO EM SERVIÇOS PÚBLICOS/SECRETARIA DO PATRIMÔNIO DA UNIÃO/SUPERINTENDÊNCIA DO PATRIMÔNIO DA UNIÃO NO ESTADO DE SÃO PAULO - MGI/SPU/SPU-SP) E ANTÔNIO JOSÉ MARCOMINI (LOTEAMENTO "VISTA DO VALE RIO SAPUCAÍ").
ASSUNTOS: PROCESSO ADMINISTRATIVO. BENS PÚBLICOS. BEM IMÓVEL DE DOMÍNIO DA UNIÃO. TERRENO MARGINAL A RIO FEDERAL. AUTORIZAÇÃO DE OBRA(S). IMPLANTAÇÃO DE TUBULAÇÃO. ASSESSORAMENTO JURÍDICO. CONSULTA FORMULADA. ORIENTAÇÃO JURÍDICA.
EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO E OUTRAS MATÉRIAS DE DIREITO PÚBLICO. BENS PÚBLICOS. GESTÃO E GOVERNANÇA DO PATRIMÔNIO IMOBILIÁRIO DA UNIÃO. ÁREA DE DOMÍNIO DA UNIÃO. AUTORIZAÇÃO DE OBRA(S). IMPLANTAÇÃO DE TUBULAÇÃO. PASSAGEM EM TERRENO MARGINAL A RIO FEDERAL. PORÇÃO DE TERRA QUE SE ESTENDE ATÉ A DISTÂNCIA DE 15 METROS, MEDIDA HORIZONTALMENTE PARA A PARTE DA TERRA, CONTADOS A PARTIR DA LINHA MÉDIA DE ENCHENTES ORDINÁRIAS (LMEO). SANEAMENTO BÁSICO. SERVIÇOS DE DRENAGEM E MANEJO DE ÁGUAS PLUVIAIS URBANAS. INFRAESTRUTURA E INSTALAÇÕES OPERACIONAIS. ASSESSORAMENTO JURÍDICO. CONSULTA FORMULADA. ORIENTAÇÃO JURÍDICA.
I. Consulta sobre a possibilidade de autorização para que empreendedor privado proceda à implantação de tubulação com passagem em terreno marginal ao Rio Sapucai, área de domínio da UNIÃO.
II. Drenagem de águas pluviais oriundas da futura construção do Loteamento "Vista do Vale Rio Sapucaí".
III. Terrenos marginais. Propriedade da União quando forem contíguos a rios ou quaisquer correntes de águas federais.
IV. Terreno marginal ao Rio Sapucaí, estendendo-se até a distância de 15 metros medida horizontalmente para a parte da terra contados a partir da Linha Média de Enchentes Ordinárias (LMEO).
V. Autorização de obra(s). Realização de intervenções em áreas de uso comum do povo que não alterem essa característica.
VI. Necessidade de que a SPU-SP ateste expressamente se a implantação, pelo proprietário do Loteamento "Vista do Vale do Rio Sapucaí", de infraestrutura (tubulação) em terreno marginal ao Rio Sapucaí (área de domínio da União) para a drenagem e manejo de águas pluviais não compromete o uso comum do povo e nem altera a sua natureza, além de não impedir ou restringir/limitar o acesso da população.
VII. Tratando-se de empreendimento que resulte na alteração da natureza do bem (uso comum do povo) acarretando seu uso exclusivo por uma pessoa ou por um determinado grupo, deve ser utilizada a cessão de uso prevista no artigo 18 da Lei Federal nº 9.636/98.
VIII. Observação da(s) recomendação(ões) sugerida (s) nesta manifestação jurídica.
I - RELATÓRIO
O Superintendente do Patrimônio da União no Estado de São Paulo, por intermédio do OFÍCIO SEI nº 57513/2023/MGI, de 13 de junho de 2023, assinado eletronicamente na mesma data (SEI nº 34784777), disponibilizado a e-CJU/PATRIMÔNIO o link de acesso ao Sistema Eletrônico de informações (SEI) em 07 de fevereiro de 2023, encaminha o processo para análise e manifestação, nos termos do artigo 11, inciso VI, alínea “b”, da Lei Complementar Federal nº 73, de 10 de fevereiro de 1993, que instituiu a Lei Orgânica da Advocacia-Geral da União e do artigo 19, incisos I e II, do Ato Regimental AGU nº 5, de 27 de setembro de 2007.
Trata-se de solicitação de assessoramento jurídico (orientação jurídica) referente a consulta envolvendo dúvida sobre a possibilidade de autorização para que empreendedor privado proceda à instalação de tubulação com passagem em área de domínio da UNIÃO caracterizada como terreno marginal ao Rio Sapucaí, estendendo-se até a distância de 15 metros medida horizontalmente para a parte da terra contados a partir da Linha Média de Enchentes Ordinárias (LMEO), visando a drenagem de águas pluviais oriundas da futura construção do Loteamento "Vista do Vale Rio Sapucaí", com área de 372.042,00 m² (Trezentos e setenta e dois mil metros e quarenta e dois decímetros quadrados), localizado na Estrada Municipal NUP-122, Zona Urbana do Município de Nuporanga, Estado de São Paulo.
O processo está instruído com os seguintes documentos:
PROCESSO/DOCUMENTO | TIPO | |||
---|---|---|---|---|
23414250 | Anexo | |||
23414254 | Anexo | |||
23414256 | Anexo | |||
23414259 | Anexo | |||
23414261 | Anexo | |||
23414263 | Anexo | |||
23414270 | Anexo | |||
23414274 | Anexo | |||
23414276 | Anexo | |||
23414278 | Anexo | |||
23414281 | Anexo | |||
23414283 | Anexo | |||
23414286 | Anexo | |||
23414289 | Anexo | |||
23414292 | Anexo | |||
23414296 | Anexo | |||
23414297 | Anexo | |||
23414299 | Anexo | |||
23414301 | Requerimento | |||
29274986 | Despacho | |||
29305433 | ||||
29351200 | ||||
29351962 | Anexo 1 | |||
29352005 | Anexo 2 | |||
29352112 | Anexo 3 | |||
29354412 | Despacho | |||
29373581 | ||||
30380601 | ||||
30380631 | Anexo 1 | |||
30380670 | Anexo 2 | |||
30380719 | Anexo 3 | |||
30380742 | Anexo 4 | |||
30380772 | Anexo 5 | |||
34558659 | Nota Técnica 17174 | |||
34784777 | Ofício 57513 | |||
34785755 | Despacho |
II – PRELIMINARMENTE – FINALIDADE E ABRANGÊNCIA DO PARECER
A presente manifestação jurídica tem o escopo de assessorar a autoridade competente para a prática do ato, para que dele não decorra nenhuma responsabilidade pessoal a ela, e também para que seja observado o princípio da legalidade e os demais que norteiam a atuação da Administração.
Desta forma, cercando-se a autoridade de todas as cautelas para a prática do ato, e documentando-as nos autos, a princípio cessa a sua responsabilidade pessoal por eventuais decorrências não satisfatórias.
A atribuição da e-CJU/PATRIMÔNIO é justamente apontar possíveis riscos do ponto de vista jurídico e recomendar alguma providência para salvaguardar a autoridade assessorada, a quem, em seu juízo discricionário, compete avaliar a real dimensão do risco e a necessidade de se adotar ou não a cautela recomendada.
Disso se conclui que a parte das observações aqui expendidas não passam de recomendações, com vistas a salvaguardar a autoridade administrativa assessorada, e não vinculá-la. Caso opte por não acatá-las, não haverá ilegalidade no proceder, mas simples assunção do risco. O acatamento ou não das recomendações decorre do exercício da competência discricionária da autoridade assessorada.
Já as questões que envolvam a legalidade,[1] de observância obrigatória pela Administração, serão apontadas, ao final deste parecer, como óbices a serem corrigidos ou superados. O prosseguimento do feito, sem a correção de tais apontamentos, será de responsabilidade exclusiva do órgão, por sua conta e risco.
Por outro lado, é certo que a análise dos aspectos técnicos da demanda sob análise não está inserido no conjunto de atribuições/competências afetas a e-CJU/PATRIMÔNIO, a qual não possui conhecimento específico nem competência legal para manifestar-se sobre questões que extrapolam o aspecto estritamente jurídico.
III - FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
Para melhor contextualização e compreensão da consulta submetida a apreciação da e-CJU/PATRIMÔNIO, unidade de execução da Consultoria-Geral da União (CGU), Órgão de Direção Superior da Advocacia-Geral da União (AGU), reputo relevante transcrever fragmento da Nota Técnica SEI nº 17174/2023/MGI (SEI nº 34558659), elaborada pela Seção de Destinação Patrimonial da Superintendência do Patrimônio da União no Estado de São Paulo (SPU-SP), na qual há um relato da situação fática e do(s) questionamento(s) formulado(s), verbis:
(...)
SUMÁRIO EXECUTIVO
1. O objetivo deste questionamento é definir a forma mais adequado de autorização por parte da União, nos casos de passagens de tubulações de águas pluviais sob imóveis da União, nas áreas caracterizadas como LMEO - Linha Média da Enchentes Ordinárias.
2. O Projeto do Loteamento Vista do Vale Rio Sapucaí, a ser implantado no município de Nuporanga – SP, em atendimento ao requerimento DOC SEI 23414301, onde o requerente Sr ANTONIO JOSE MARCOMINI, solicita DECLARAÇÃO DE ANUÊNCIA para a passagem de tubulação de água pluvial, em imóvel confrontante com as margens do Rio Sapucaí (área da União), conforme planta e memorial descritivo apresentados (DOC SEI 23414296 e 23414259).
3. A dúvida para o caso em tela recai sobre a possibilidade de autorizar o empreendedor a passar com tubulação de drenagem (poderia ser água, ou esgoto) em imóvel da União. Segundo o PARECER n. 01323/2019/CJU-SP/CGU/AGU, para caso de obra realizada pelo poder público, a alternativa da autorização de obra foi tida como correta.
ANÁLISE
4. O empreendimento denominado “Loteamento Vista do Vale Rio Sapucaí” apresenta área total de 372.042 m² e está localizado na Estrada Municipal NUP-122. O desenho abaixo apresenta o empreendimento e a confrontação com o Rio Sapucaí:
5. Toda a documentação necessária foi acostada ao processo em epígrafe: Documento de identificação (23414250)
a) CETESB - licença (DOC 30380670)
b) Secretaria de habitação - aprovação (DOC 30380631)
c) Prefeitura - aprovação do Loteamento (DOC 23414289)
d) Autorização do DAEE (DOC 23414263)
6. Pela leitura dos documentos acostados, haveria condições de atendimento da autorização de obra, ou uma mera anuência por parte da SPU, já que a CETESB, órgão licenciador, já forneceu a licença ambiental. Provavelmente, a CETESB teve acesso a todo o projeto do empreendimento, que inclui a drenagem.
7. Ocorre que, este tipo de solicitação é comum na SPU, e existe algum tipo de discussão interna, se caberia uma mera anuência administrativa ou autorização de obra nos casos de passagem de tubulação por áreas caracterizadas como LMEO.
(...)
16. Em relação a obras de águas pluviais, já existe o PARECER n. 01323/2019/CJU-SP/CGU/AGU, que possibilitou a autorização de obra para empreendimento público.
17. A novidade, do caso em tela, é a execução da drenagem pelo empreendedor privado, o que causa dúvidas em relação a possibilidade de autorização de obra. Em tese, o empreendedor está fazendo o trabalho do Estado, em relação a disposição final das águas pluviais, mas temos dúvidas em relação a esse entendimento.
18. Neste processo, o imóvel da União, LMEO, está localizado entre o Rio e o empreendimento privado.
19. Sugiro o encaminhamento a CJU para verificar a possibilidade de Autorização de Obra gratuita, para o caso de passagem de tubulações por imóvel da União, por empreendedor privado.
CONCLUSÃO
20. Encaminhar a CJU para verificar a possibilidade de utilização da Autorização de Obra, nos casos em que o empreendedor necessita passar com tubulação de águas pluviais em imóvel da União, e, se for o caso, extrapolar para outros tipos de tubulações.
RECOMENDAÇÃO
21. Encaminhar a CJU para dirimir a dúvida em relação a adequação da autorização de obras."
Considerando o anteriormente exposto, procederei a análise da solicitação de assessoramento jurídico (orientação jurídica) relacionada à seguinte questão aduzida:
a) Sugiro o encaminhamento a CJU para verificar a possibilidade de Autorização de Obra gratuita, para o caso de passagem de tubulações por imóvel da União, por empreendedor privado.
III.1 - TERRENOS MARGINAIS. PORÇÃO DE TERRA BANHADA PELAS CORRENTES NAVEGÁVEIS FORA DO ALCANCE DAS MARÉS.
Quanto aos "terrenos marginais", o artigo 4º, do Decreto-Lei Federal nº 9.760, de 5 de setembro de 1946, os conceitua como aqueles banhados pelas correntes navegáveis, fora do alcance das marés, até a distância de 15 (quinze) metros, medidos horizontalmente para a parte da terra, contados desde a linha média das enchentes ordinárias.
Para melhor compreensão do conteúdo e alcance da expressão "terrenos marginais", reputo conveniente citar o conceito existente no Manual de Fiscalização do Patrimônio da União 2018, páginas 20/21, verbis:
(...)
"OS TERRENOS MARGINAIS
Terreno marginal é a porção de terra banhada pelas correntes navegáveis, fora do alcance da influência das marés, que se estende até a distância de 15 metros, medidos horizontalmente para a parte da terra, contados a partir da Linha Média das Enchentes Ordinárias (LMEO).
A Linha Média das Enchentes Ordinárias (LMEO) é uma linha fictícia, definida a partir da média das enchentes do rio.
Os terrenos marginais só serão propriedade da União quando seguirem lagos, rios ou quaisquer correntes de águas federais.
Os terrenos marginais são aqueles situados fora da influência de maré. Portanto, somente terrenos localizados ao lado de águas doces podem ser considerados terrenos marginais.
Por fim, cabe destacar que a regra para definir a titularidade das praias fluviais é a mesma que se aplica aos terrenos marginais, ou seja, segue a titularidade do rio onde estão situadas". (os grifos não constam do original)
Neste sentido entendo oportuno transcrever o magistério de José dos Santos Carvalho Filho:[2]
(...)
16
Bens Públicos
(...)
"XI. Águas Públicas
Águas públicas são aquelas de que se compõem os mares, os rios e os lagos do domínio público.
De acordo com o Código de Águas (Decreto nº 24.643, de 10.7.1934), existem três categorias de águas: (a) águas públicas (pertencentes ao Poder Público); (b) águas privadas (nascidas e localizadas em terrenos particulares, quando não estejam em categoria diversa); (c) águas comuns (correntes não navegáveis ou flutuáveis e que não criem tais correntes).[3]
As águas públicas, por sua vez, dividem-se em águas de uso comum e águas dominicais.
As águas públicas de uso comum, em toda a sua extensão, são as águas dos lagos, bem como dos cursos d’água naturais que, em algum trecho, sejam flutuáveis ou navegáveis por um tipo qualquer de embarcação (art. 2º do Código de Águas).
São águas públicas dominicais todas as situadas em terrenos também dominicais, quando não se configurarem como águas públicas de uso comum ou não se qualificarem como águas comuns (art. 6º do Código de Águas).
Segundo alguns especialistas, em virtude do crescente processo de publicização das águas e pelo texto sobre águas previsto na vigente Constituição, teria sido extinta a categoria de águas privadas, prevista no Código de Águas, fato que teria sido reforçado pelo art. 1º, I, da Lei no 9.433/1997, sobre recursos hídricos, segundo o qual a água é um bem de domínio público.[4] Com a devida vênia, ousamos discordar desse entendimento. A uma, porque não vislumbramos no texto constitucional tal desiderato; a duas, porque a norma da Lei no 9.433 deve ser interpretada em relação às águas que são efetivamente públicas. As águas formadas em áreas privadas – tanques, pequenos açudes e lagos, locais de armazenamento de águas da chuva – são bens privados, ainda que eventualmente tenham sido captados de águas públicas. Por conseguinte, concordamos em que as águas, em sua maioria, sejam bens públicos, mas isso não afasta a possibilidade da existência de águas privadas.[5]
A Constituição apresenta partilha de águas entre a União e os Estados. Assim, são do domínio da União os lagos, rios e quaisquer correntes de água que:
a) estejam em terrenos de seu domínio;
b) banhem mais de um Estado;
c) façam limites com outros países; e
d) se estendam a território estrangeiro ou dele provenham (art. 20, III, CF).
Aos Estados pertence o domínio das demais águas públicas. Segundo o texto constitucional, pertencem-lhes “as águas superficiais ou subterrâneas, fluentes, emergentes e em depósito”, ressalvando-se, nesse caso, as que decorram de obras da União (art. 26, I, CF).
Nenhuma referência foi feita na Constituição sobre o domínio do Município sobre águas públicas. Como a divisão constitucional abrangeu todas as águas, é de considerar-se que não mais tem aplicação o art. 29 do Código de Águas, quando admitiu pertencerem aos Municípios as águas situadas em seus territórios
(...)
4. TERRENOS RESERVADOS
Terrenos reservados, também chamados terrenos marginais, são aqueles que, banhados pelas correntes navegáveis, fora do alcance das marés, se estendem até a distância de 15 metros para a parte da terra, contados desde a linha média das enchentes ordinárias. A expressão terrenos reservados é empregada pelo Código de Águas, ao passo que terrenos marginais foi a utilizada no Decreto-lei nº 9.760/1946. A conceituação é idêntica em ambos os diplomas, razão por que se consideram com o mesmo sentido.[6] (destacou-se)
Lavra grande controvérsia sobre o domínio dos terrenos reservados. Entendemos que o ponto nodal para análise é o art. 31 do Código de Águas, pelo qual pertencem aos Estados os terrenos reservados às margens das correntes e lagos navegáveis, isso se, por algum título, não estiverem no domínio federal, municipal ou particular. Diante desse texto legal, ter-se-á que considerar, no concernente aos rios navegáveis, que a regra é que tais terrenos pertençam aos Estados, só não lhes pertencendo se forem federais, municipais ou particulares, estes provando a propriedade por título que indique sua transferência pelo Poder Público, como, por exemplo, as concessões de domínio. Em relação aos rios não navegáveis, dispõe o art. 12 do Código de Águas que, dentro de faixa de 10 metros, fica estabelecida servidão de trânsito para os agentes da Administração, quando em execução de serviço.
A Súmula 479 do STF, a seu turno, averba que “as margens dos rios navegáveis são de domínio público, insuscetíveis de expropriação e, por isso mesmo, excluídas de indenização”. Pelo entendimento da mais alta Corte do país, foi considerada a antiga tradição do Direito brasileiro de considerar do domínio público os terrenos marginais. Deve interpretar-se a posição do STF, todavia, excluindo de sua abrangência as áreas marginais “que houverem sido legitimamente transferidas pelo Poder Público ao domínio privado”.[7] Entretanto, se o proprietário ribeirinho não dispuser de título legítimo que prove o domínio privado, os terrenos reservados pertencerão realmente ao domínio público. Conclui-se, por conseguinte, que os terrenos marginais podem ser do domínio público, que é a regra geral, ou do domínio privado, quando provada a transmissão legítima da área. A orientação da Súmula foi reafirmada pela Corte.[8] Ressalve-se, no entanto, que há interpretação no sentido de as referidas áreas pertencerem ao domínio privado, sendo, pois, suscetíveis de desapropriação e indenização.[9]
Sobre o tema preleciona Maria Sylvia Zanella Di Pietro[10] o seguinte:
(...)
"16.8 BENS PÚBLICOS EM ESPÉCIE
(...)
16.8.2 Terrenos reservados
Quanto às margens dos rios não navegáveis, eram oneradas, em uma faixa de 10 metros, com servidão de trânsito, em benefício dos agentes da administração em execução de serviços (art. 12 do Código de Águas).
Na jurisprudência, ficou assentado, pela Súmula nº 479, do STF, que “as margens dos rios navegáveis são de domínio público, insuscetíveis de expropriação e, por isso mesmo, excluídas de indenização”. A súmula indica, como referência, os acórdãos proferidos nos Recursos Extraordinários nºs 10.042, de 29-4-46, 59.737, de 24-9-68, e 63.206, de 1º-3-68.
Em todos esses julgados parte o STF do pressuposto de que, na tradição do nosso direito, os terrenos marginais sempre foram do domínio público, de modo que o único título hábil para a sua transferência para o domínio privado é a concessão pelo poder público. Qualquer outro título seria inábil para esse fim.
Partindo do pressuposto de que, quando da descoberta do Brasil, todos os bens eram públicos, do domínio da coroa, e que os mesmos foram passando para o domínio privado mediante concessões, vendas e doações, a conclusão lógica era a de que os únicos títulos que legitimavam a propriedade de particulares sobre os terrenos reservados seriam aqueles filiados a aquisições feitas pelo Poder Público, conforme demonstrou Oswaldo Aranha Bandeira de Mello (in RDA 6/24-40), com base nas leis imperiais e na doutrina.
A Súmula nº 479 refere-se a julgados em que os pretensos proprietários dos imóveis apresentavam títulos de aquisição não emanados do Poder Público e, por isso mesmo, considerados bens públicos insuscetíveis de desapropriação. No entanto, nos casos em que os títulos são legítimos, porque representados por concessão feita pelo Poder Público, a referida súmula não tem aplicação, de modo que, se o bem for desapropriado, a indenização deverá abranger a faixa correspondente aos chamados terrenos reservados, que estavam no domínio útil do particular.
Verifica-se, portanto, que os terrenos reservados podiam ser bens públicos ou bens particulares.
Há uma presunção em favor da propriedade pública, devido à própria história das terras no Brasil: todas pertenciam à coroa. Essa presunção se desfazia nos casos concretos em que particulares demonstrassem que tinham recebido essas terras por concessão (aforamento) do Poder Público. Nesse caso, seriam bens particulares: se a concessão tivesse sido feita antes da Lei nº 1.507, de 1867, tais terrenos estariam livres de servidão; se a concessão tivesse sido feita posteriormente, estariam onerados com a servidão de trânsito instituída por essa lei, visando ao aproveitamento industrial das águas e de energia hidráulica, bem como utilização da navegação do rio (cf. Di Pietro, 1978:117-128).
Uma parte dos terrenos reservados, chamada terrenos marginais, é de propriedade da União, por força do artigo 1º, b e c, do Decreto-lei nº 9.760, de 5-9-46; de acordo com esse dispositivo, incluem-se entre os bens imóveis da União:
a) os terrenos marginais dos rios navegáveis, em Territórios Federais se, por qualquer título legítimo, não pertencerem a particular;
b) os terrenos marginais de rios e ilhas nestes situadas, na faixa da fronteira do território nacional e nas zonas onde se faça sentir a influência das marés.
E o artigo 4º define os terrenos marginais como os que, banhados pelas correntes navegáveis, fora do alcance das marés, vão até a distância de 15 metros medidos horizontalmente para a parte da terra, contados desde a linha média das enchentes ordinárias. O conceito é idêntico ao de terreno reservado, contido no artigo 14 do Código de Águas, já transcrito, do que se deduz que as expressões são sinônimas. Combinando-se as disposições dos artigos 11 e 31 do Código de Águas e 1º e 4º do Decreto-lei nº 9.760/46, chegava-se à conclusão de que os terrenos reservados pertenciam, em regra, aos Estados, salvo os terrenos marginais que se situassem nos Territórios Federais e na faixa de fronteira (que pertencem à União) e os que se encontrassem em poder dos particulares, por título legítimo (aforamento).
Ocorre que a Constituição de 1988 trouxe inovação que implicou em revogação tácita de dispositivos do Código de Águas. Com efeito, no artigo 20, III, inclui os terrenos marginais no domínio da União. Com isso, deixaram de existir terrenos marginais de propriedade dos Municípios ou dos particulares, como deixaram de existir águas particulares. Todos os lagos, rios e quaisquer correntes de água em terrenos de domínio da União ou que banhem mais de um Estado, sirvam de limites com outros países, ou se estendam a território estrangeiro ou dele provenham, bem como os terrenos marginais e as praias fluviais, se incluem entre os bens da União, conforme consta expressamente do referido dispositivo constitucional. (os destaques não constam do original)
Ficaram no domínio dos Estados, conforme artigo 26, inciso III, “as águas fluviais e lacustres não pertencentes à União”.
Na lição de José Afonso da Silva (2005:256), “todas as correntes de água são públicas, de sorte que a Constituição reparte o domínio das águas entre a União e os Estados, modificando profundamente o Código de Águas, eliminando as antigas águas municipais, as comuns e as particulares. Logo os terrenos reservados, que são sempre os banhados por correntes navegáveis, serão de domínio público da União se a corrente navegável a ela pertencer, ou de domínio público do Estado a que pertencer a corrente navegável”.
Trata-se de hipótese em que a aquisição de bens pelo Poder Público decorre diretamente de lei; no caso específico, decorre da própria Constituição, caracterizando o que Diogo de Figueiredo Moreira Neto (2006:358) chama de “expropriação constitucional, de natureza confiscatória”, já que feita sem qualquer indenização aos proprietários.
No mesmo sentido é o entendimento adotado por Marcos Luiz da Silva em trabalho específico sobre os terrenos marginais,[11] no qual ele afirma que “a titularidade do imóvel da União se dá em face de determinação constitucional, de modo que o ato de demarcação da área do Poder Público é meramente declaratório da propriedade, conforme já dito alhures, e independe de qualquer ato posterior para constituir-se validamente. O registro em cartório teria o condão de dar a devida publicidade ao título da União, com o fito de evitar que negócios jurídicos sejam entabulados tendo como objeto tais imóveis, e, por conseguinte, pessoas de boa-fé sejam prejudicadas em tais transações”. Em favor de seu posicionamento, cita acórdão do Superior Tribunal de Justiça, proferido a respeito dos terrenos de marinha que é inteiramente aplicável aos terrenos reservados (RE-624.746/RS).
III.2 - FINALIDADE (ESCOPO) DE UTILIZAÇÃO DA AUTORIZAÇÃO DE OBRA(S).
Preliminarmente é necessário esclarecer o escopo da utilização da autorização de obra. Tal instrumento, apesar de não estar previsto de forma expressa pela legislação patrimonial, decorre da interpretação do artigo 6º, parágrafo 1º, do Decreto-Lei Federal nº 2.398, de 21 de dezembro de 1987, que dispõe sobre foros, laudêmios e taxas de ocupação relativas a imóveis de propriedade da União:
(...)
"Art. 6º Considera-se infração administrativa contra o patrimônio da União toda ação ou omissão que viole o adequado uso, gozo, disposição, proteção, manutenção e conservação dos imóveis da União. (Redação dada pela Lei nº 13.139, de 2015)
§ 1º Incorre em infração administrativa aquele que realizar aterro, construção, obra, cercas ou outras benfeitorias, desmatar ou instalar equipamentos, sem prévia autorização ou em desacordo com aquela concedida, em bens de uso comum do povo, especiais ou dominiais, com destinação específica fixada por lei ou ato administrativo." (grifou-se)
Sobre o escopo de aplicação da autorização de obra, reputo relevante trazer à colação fragmento do PARECER n. 00988/2015/MAA/CONJUR-MP/CGU/AGU (NUP: 04988.006735/2013-64) o qual alude ao entendimento consolidado no âmbito da Consultoria Jurídica junto ao Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (CONJUR/MPOG), atualmente Consultoria Jurídica junto ao Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (CONJUR/MGI):
(...)
"13. No Parecer MP/CONJUR/MAA nº 0137-5.12/2009, esta CONJUR fixou o escopo de aplicação da autorização de obra, diferenciando esse instrumento da cessão de uso. Naquela oportunidade, observamos que a autorização de obra volta-se à realização de intervenções em áreas de uso comum do povo que não alterem essa característica. Para empreendimentos que impliquem alteração da natureza do bem, acarretando seu uso exclusivo por uma pessoa ou por um determinado grupo, deve-se utilizar a cessão de uso, prevista no art. 18 da Lei 9.636/98.
14. Ou seja, para que determinado imóvel da União possa ser objeto de uma autorização de obra, faz-se necessário que se trate de bem de uso comum do povo e que, após a realização da obra autorizada, ele mantenha essa característica. Caso contrário, o instrumento adequado será a cessão de uso. (os destaques não constam do original)
(...)
16. A caracterização dos bens públicos como de uso comum do povo, de uso especial ou dominiais depende de sua afetação. Em alguns casos, a lei comina uma forma específica para que se possa promover a afetação ou desafetação dos bens públicos. Um exemplo é a constituição de unidades de conservação da natureza em áreas públicas. Uma área de floresta terá, em princípio, natureza de bem de uso comum do povo. Entretanto, caso um decreto venha a criar naquele espaço um parque nacional, ele passará a ser um bem de uso especial, eis que afetado a uma finalidade pública. Por outro lado, sua desafetação só poderá ser feita por lei, por força do art. 225, §1º, III, da Constituição Federal.
17. Na maioria das vezes, porém, a afetação e desafetação de bens públicos se dá pelo uso ao qual esses bens se destinam. Isso porque os bens públicos não são intrinsecamente de uso comum do povo, de uso especial ou dominicais. Esse enquadramento dependerá da destinação que a Administração der a cada um deles (afetação). Essa é a lição que se colhe da doutrina:
“Portanto, em relação a alguns bens públicos, verifica-se que, apesar de o Código Civil criar categorias jurídicas de bens públicos distintas e perfeitamente diferenciáveis, na prática, a qualificação de um bem como de uso comum ou especial depende de atos de afetação. Isso porque alguns bens públicos não são, ‘de per se’, de uso comum ou de uso especial; o mesmo bem pode transitar por essas categorias. O mesmo bem que hoje é de uso comum amanhã pode ser de uso especial e, depois, pode ser desafetado e recair na categoria dos dominicais.” (ABE, Nilma de Castro. Gestão do Patrimônio Público Imobiliário. Leme: Mizuno, 2006, p. 51.)
18. Para dar um exemplo semelhante ao anterior, suponhamos que aquela área de floresta, em princípio bem de uso comum do povo, venha a ser destinada ao Exército para fins de instrução militar. Para que isso ocorra, bastará a entrega do imóvel ao órgão castrense, que irá aplicá-lo em suas atividades finalísticas, convertendo-o em bem de uso especial. Na hipótese de não mais haver interesse no uso daquele imóvel, bastará o cancelamento do termo de entrega para promover sua desafetação, sendo a natureza do bem definida pela destinação ulterior que se lhe venha a dar.
19. Portanto, caso os terrenos de marinha e acrescidos tratados nos autos não estejam destinados ao uso no serviço público (bens de uso especial) ou não sejam explorados patrimonialmente pela União (bens dominiais), eles terão natureza de bens de uso comum do povo. Dessa forma, como a intervenção que se pretende realizar (construção de viaduto) manterá essa característica, será juridicamente viável a autorização de obra pleiteada."
Com fulcro no entendimento assentado pela CONJUR, vislumbra-se que a autorização de obra destina-se à realização de intervenções em áreas de uso comum do povo que não alterem essa característica. Tratando-se de empreendimentos que resulte na alteração da natureza do bem, acarretando seu uso exclusivo por uma pessoa ou por um determinado grupo, deve ser utilizada a cessão de uso prevista no artigo 18 da Lei Federal nº 9.636/98.
A Seção de Destinação Patrimonial da SPU-SP na Nota Técnica SEI nº 17174/2023/MGI (SEI nº 34558649) atestou que a instalação de tubulação para a drenagem de águas pluviais, devidamente autorizada pelos órgãos ambientais competentes, objetiva a universalização do acesso ao serviço público de saneamento básico, necessário à saúde pública e à segurança da vida e do patrimônio público e privado, conforme se depreende do artigos 2º, incisos I e IV e artigo 3º, inciso I, alínea "d", da Lei Federal nº 11.445, de 5 de janeiro de 2007, que estabelece as diretrizes nacionais para o saneamento básico:
(...)
"CAPÍTULO I
DOS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS
Art. 2º Os serviços públicos de saneamento básico serão prestados com base nos seguintes princípios fundamentais:
I - universalização do acesso e efetiva prestação do serviço; (Redação pela Lei nº 14.026, de 2020)
(...)
IV - disponibilidade, nas áreas urbanas, de serviços de drenagem e manejo das águas pluviais, tratamento, limpeza e fiscalização preventiva das redes, adequados à saúde pública, à proteção do meio ambiente e à segurança da vida e do patrimônio público e privado; (Redação pela Lei nº 14.026, de 2020)
(...)
Art. 3º Para fins do disposto nesta Lei, considera-se: (Redação pela Lei nº 14.026, de 2020)
I - saneamento básico: conjunto de serviços públicos, infraestruturas e instalações operacionais de: (Redação pela Lei nº 14.026, de 2020)
(...)
d) drenagem e manejo das águas pluviais urbanas: constituídos pelas atividades, pela infraestrutura e pelas instalações operacionais de drenagem de águas pluviais, transporte, detenção ou retenção para o amortecimento de vazões de cheias, tratamento e disposição final das águas pluviais drenadas, contempladas a limpeza e a fiscalização preventiva das redes;" (Redação pela Lei nº 14.026, de 2020) (grifou-se)
Considerando o entendimento firmado no PARECER n. 00988/2015/MAA/CONJUR-MP/CGU/AGU, a SPU-SP deverá atestar expressamente se a instalação de tubulação em terreno marginal ao Rio Sapucaí (área de domínio da União) para a drenagem e manejo de águas pluviais não compromete o uso comum do povo e nem altera a sua natureza, além de não impedir ou restringir/limitar o acesso da população.
Certificando a SPU-SP a não ocorrência de comprometimento da utilização do terreno marginal ao Rio Sapucaí (área de domínio da União) como bem de uso comum do povo, assim como não advindo restrição/limitação ao acesso da população, a Autorização de Obra(s) demonstra ser o instrumento consentâneo/adequado para conretizar/consumar a aquiescência/anuência da União à implantação, pelo proprietário do Loteamento "Vista do Vale do Rio Sapucaí", da infraestrutura necessária (tubulação) para viabilizar a drenagem das águas pluviais.
Com efeito, reiterando a recomendação sugerida no item "18." desta manifestação quanto ao entendimento da Consultoria Jurídica junto ao Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (CONJUR/MPOG), atualmente Consultoria Jurídica junto ao Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (CONJUR/MGI), firmado no PARECER n. 00988/2015/MAA/CONJUR-MP/CGU/AGU (NUP: 04988.006735/2013-64), na hipótese da obra/construção implicar na alteração da natureza do bem, acarretando seu uso exclusivo por uma pessoa ou por um determinado grupo, deve ser utilizada a cessão de uso prevista no artigo 18 da Lei Federal nº 9.636/98.
III.3 - LICENCIAMENTO AMBIENTAL.
Consta da instrução o CERTIFICADO GRAPROHAB Nº 221/2018, expedido pelo GRUPO DE ANÁLISE E APROVAÇÃO DE PROJETOS HABITACIONAIS, com APROVAÇÃO DE PROJETO HABITACIONAL (SEI nº 23414261).
Constata-se o TERMO DE COMPROMISSO Nº 222/2018 (SEI nº 23414270) parte integrante do Certificado de Aprovação nº 221/2018, contendo as condicionantes de observância obrigatória pelo proprietário e responsável técnico do empreendimento.
O processo administrativo está instruído com a OUTORGA concedida pelo DEPARTAMENTO DE ÁGUAS E ENERGIA ELÉTRICA (DAEE) da SECRETARIA DE SANEAMENTO E RECURSOS HÍDRICOS DO ESTADO DE SÃO PAULO, na qual estão relacionados direitos, deveres e obrigações referentes ao(s) uso(s)/interferência(s) nos recursos hídricos de domínio do Estado (SEI nº 23414270).
Também consta da instrução processual Ofício GRAPROHAB PG 0507/20, de 27 de maio de 2020 (SEI nº 23414274) no qual o Presidente do GRUPO DE ANÁLISE E APROVAÇÃO DE PROJETOS HABITACIONAIS informa que o CERTIFICADO GRAPROHAB Nº 221/2018 foi revalidado, permanecendo válido por mais 2 (dois) anos contados a partir data do vencimento.
Consta da instrução AUTORIZAÇÃO concedida pela COMPANHIA AMBIENTAL DO ESTADO DE SÃO PAULO (CETESB) para intervenção em Área de Preservação Permanente (APP) do Rio Sapucaí, bem como para corte de indivíduos arbóreos nativos isolados para implantação do Loteamento "Vista do Vale do Rio Sapucaí" (SEI nº 23414278).
O processo administrativo também está instruído com o DECRETO MUNICIPAL APROVANDO (SEI nº 23414289), o loteamento denominado "VISTA DO VALE RIO SAPUCAÍ", nos termos da Lei Federal nº 6.766/79. Segundo o PREÂMBULO do aludido DECRETO, os projetos atendem as exigências das Leis Estaduais e Federais conforme CERTIFICADO GRAPROHAB Nº 221/2018, expedido em 19 de junho de 2018 pelo GRUPO DE ANÁLISE E APROVAÇÃO DE PROJETOS HABITACIONAIS.
De acordo com o PREÂMBULO DO DECRETO (SEI nº 23414289), o projeto referente ao parcelamento do solo, na modalidade loteamento, se enquadra nas exigências estabelecidas na Certidão de Diretrizes nº 0001/2017, no Decreto Municipal nº 066/2017 e nas normas da Lei Federal nº 6.766, de 19 de dezembro de 1979, que dispõe sobre o Parcelamento do Solo Urbano.
Segundo informação existente no PREÂMBULO, a área técnica do Departamento de Engenharia do Município analisou e concluiu que o loteamento em razão da localização e forma de acesso, ESTÁ APTO PARA APROVAÇÃO como loteamento (SEI nº 23414289).
Com efeito, o Licenciamento Ambiental consiste em instrumento da Política Nacional do Meio Ambiente, cujo regramento está definido na Lei Federal nº 6.938, de 31 de agosto de 1981.
A Resolução CONAMA nº 237, de 19 de dezembro de 1997, em seu artigo 1º, inciso I, define o Licenciamento Ambiental como o "procedimento administrativo pelo qual o órgão ambiental competente licencia a localização, instalação, ampliação e a operação de empreendimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais, consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras ou daquelas que, sob qualquer forma, possam causar degradação ambiental, considerando as disposições legais e regulamentares e as normas técnicas aplicáveis ao caso".
Já a Licença Ambiental é conceituada como o "ato administrativo pelo qual o órgão ambiental competente, estabelece as condições, restrições e medidas de controle ambiental que deverão ser obedecidas pelo empreendedor, pessoa física ou jurídica, para localizar, instalar, ampliar e operar empreendimentos ou atividades utilizadoras dos recursos ambientais consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras ou aquelas que, sob qualquer forma, possam causar degradação ambiental". (art. 1º, inc. II).
A Resolução CONAMA nº 237, de 19 de dezembro de 1997, no artigo 8º, preceitua que o Poder Público, no exercício de suas competência de controle, expedirá as seguintes licenças:
I - Licença Prévia (LP) - concedida na fase preliminar do planejamento do empreendimento ou atividade aprovando sua localização e concepção, atestando a viabilidade ambiental e estabelecendo os requisitos básicos e condicionantes a serem atendidos nas próximas fases de sua implementação;
II - Licença de Instalação (LI) - autoriza a instalação do empreendimento ou atividade de acordo com as especificações constantes dos planos, programas e projetos aprovados, incluindo as medidas de controle ambiental e demais condicionantes, da qual constituem motivo determinante;
III - Licença de Operação (LO) - autoriza a operação da atividade ou empreendimento, após a verificação do efetivo cumprimento do que consta das licenças anteriores, com as medidas de controle ambiental e condicionantes determinados para a operação.
Segundo o parágrafo único do artigo 8º, "as licenças ambientais poderão ser expedidas isolada ou sucessivamente, de acordo com a natureza, características e fase do empreendimento ou atividade".
De acordo com o artigo 2º, inciso I, da Lei Complementar Federal nº 140, de 08 de dezembro de 20011, "o licenciamento ambiental consiste no procedimento administrativo destinado a licenciar atividade ou empreendimentos utilizadores de recursos ambientais, efetiva ou potencialmente poluidores ou capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental".
Para melhor compreensão do conceito de licenciamento ambiental como instrumento de política ambiental entendo pertinente transcrever o ensinamento de Édis Milarés:[12]
(...)
"SEXTA PARTE - A POLÍTICA AMBIENTAL BRASILEIRA NO CONTEXTO HISTÓRICO
TÍTULO XI - POLÍTICA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE
(...)
CAPÍTULO II - INSTRUMENTOS
(...)
"2. Conceito de licenciamento ambiental
O licenciamento, como instrumento de política ambiental, obedece a preceitos legais, normas administrativas e rituais claramente estabelecidos, sendo destinado a disciplinar a implementação de atividades ou empreendimentos que causem ou possam causar alterações do meio, com repercussões sobre a qualidade ambiental.
Deveras, a implementação de um determinado empreendimento ou atividade pode desencadear um impacto ambiental significativo (p. ex.: um terminal portuário, uma usina hidrelétrica, uma rodovia) ou mesmo um alto risco ambiental (p. ex.: uma usina eletronuclear), mas sua concretização não é aprioristicamente vedada pela legislação; caberá ao órgão estatal licenciador exigir do empreendedor a realização de estudos capazes de antever os possíveis impactos decorrentes da mencionada atividade ou empreendimento, bem como de subsidiar a eleição de medidas para evitar, mitigar ou compensar esses impactos, a fim de contribuir para uma decisão clara, técnica e pública acerca da viabilidade, ou não, do projeto proposto.[13]
(...)
Como veremos adiante, melhor seria dizer que se trata de processo administrativo por meio do qual se busca aferir a viabilidade ambiental de atividades ou empreendimentos supostamente causadores de degradação ambiental, como, aliás, assimilado pelo PL 3.729/2004, sobre o licenciamento ambiental e a avaliação ambiental estratégica".[14]
Neste aspecto preleciona Celso Antonio Pacheco Fiorillo em sua primorosa obra Curso de Direito Ambiental Brasileiro[15] o que se segue:
(...)
"CAPÍTULO VII
LICENCIAMENTO AMBIENTAL E ESTUDO PRÉVIO DE IMPACTO AMBIENTAL
1. LICENCIAMENTO AMBIENTAL E LICENÇA ADMINISTRATIVA
Inicialmente, faz-se necessário distinguir o licenciamento ambiental da licença administrativa. Sob a ótica do direito administrativo, a licença é espécie de ato administrativo "unilateral e vinculado, pelo qual a Administração faculta àquele que preencha os requisitos legais o exercício de uma atividade.[16] Com isso, a licença é vista como ato declaratório e vinculado.
O licenciamento ambiental, por sua vez, vinculado que está ao princípio constitucional ambiental da prevenção,[17] tendo por via de consequência gênese e natureza jurídica estruturadas diretamente na Constituição Federal, é um complexo de etapas que compõe procedimento administrativo próprio e peculiar, o qual objetiva a concessão de licença ambiental, sendo certo que "a Constituição não autoriza que um ato legislativo ingresse no domínio normativo atribuído pela Constituição aos órgãos administrativos para a execução de atividades relacionadas ao Poder de Polícia Ambiental".[18] Dessa forma, não é possível identificar isoladamente a licença ambiental, porquanto esta é uma das fases do procedimento.
(...)
Como veremos mais adiante, o licenciamento ambiental é dividido em três fase: a) licença prévia (LP); b) licença de instalação (LI); e c) licença de funcionamento (LF). Observaremos também que durante essas fase podem encontrar a elaboração do estudo prévio de impacto ambiental e o seu respectivo relatório (EIA/RIMA), bem como a realização de audiência pública, em que permite a efetiva participação da sociedade civil.
2. NATUREZA JURÍDICA DO LICENCIAMENTO AMBIENTAL E SUA GÊNESE CONSTITUCIONAL
Como determina o art. 9º , IV, da Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei n. 6.938/81), o licenciamento ambiental é um instrumento de caráter preventivo de tutela do meio ambiente, tendo gênese e natureza jurídica estruturadas diretamente na Constituição Federal, vinculado que está ao princípio ambiental constitucional da prevenção, conforma aduzido anteriormente.
O licenciamento ambiental não é ato administrativo simples, mas sim um encadeamento de atos administrativos, o que lhe atribui a condição de procedimento administrativo. Além disso, importante frisar que a licença administrativa constitui ato vinculado, o que denuncia uma grande distinção em relação à licença ambiental, porquanto esta é está, como regra, ato discricionário.[19]
(...)
4. PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO
Primeiramente, ressaltamos que todo o procedimento de licenciamento ambiental deverá ser elaborado de acordo com os princípios do devido processo legal, o que implica dizer que "dez aspectos principais estão ligados ao respeito pleno do "due process na área do EIA/RIMA: a) um órgão neutro; b) notificação adequada da ação proposta e de sua classe; c) oportunidade para a apresentação de objeções ao licenciamento; d) o direito de produzir e apresentar provas, aí incluindo-se o direito de apresentar testemunhas; e) o direito de conhecer a prova contrária; f) o direito de contradita testemunhas; g) uma decisão baseada somente nos elementos constantes da prova produzida; h) o direito de se fazer representar; i) o direito à elaboração de autos escritos para o procedimento; j) o direito de receber do Estado auxílio técnico e financeiro; l) o direito a uma decisão escrita motivada".
Com isso, podemos afirmar que o licenciamento ambiental será regido pelo princípio da moralidade ambiental, legalidade ambiental, publicidade, finalidade ambiental, princípio da supremacia do interesse difuso sobre o privado, princípio da indisponibilidade do interesse público, entre outros.
4.1. ETAPAS DO LICENCIAMENTO
O licenciamento ambiental é feitos em três etapas distintas e insuprimíveis: a) outorga da licença prévia; b) outorga da licença de instalação; e c) outorga da licença de operação. Ressalta-se que entre uma etapa e outra podem-se fazer necessário o EIA/RIMA e a audiência pública.
4.1.1. Licença prévia
A licença prévia vem enunciada no art. 8º, I, da Resolução Conama n. 237/97 como aquela concedida na fase preliminar do planejamento da atividade ou empreendimento, aprovando a sua localização e concepção, atestando a viabilidade ambiental e estabelecendo os requisitos básicos e condicionantes a serem atendidos nas próximas fases de implementação.
Importante verificar que a licença prévia tem prazo de validade de até cinco anos, conforme dispõe o art. 18, I, da mesma resolução.
4.1.2. Licença de instalação
A licença de instalação, obrigatoriamente precedida pela licença prévia, é aquela que "autoriza a instalação do empreendimento ou atividade de acordo com as especificações constantes dos planos, programas e projetos aprovados, incluindo as medidas de controle ambiental e demais condicionantes, da qual constituem motivo determinante", conforme preceitua o art. 8º, II, da Resolução Conama n. 237/97.[20]
Assim como a prévia, a licença de instalação também possuir prazo de validade, que não poderá superar seis anos, conforme dispõe o art. 18, II, da resolução.
4.1.3. Licença de operação
A licença de operação, também chamada de licença de funcionamento, sucede a de instalação e tem por finalidade autorizar a "operação da atividade ou empreendimento, após a verificação do efetivo cumprimento do que consta das licenças anteriores, com as medidas de controle ambiental e condicionantes determinados para a operação", conforme dispõe o art. 8º, III, da Resolução Conama n. 237/97". (os destaques não constam do original)
É oportuno salientar que o artigo 6º, parágrafo 1º, da Lei Federal nº 6.938, de 31 de agosto de 1981, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, confere ao Estados, na esfera de suas competências e nas áreas de sua jurisdição, a competência para elaboração de normas supletivas e complementares e padrões relacionados com o meio ambiente, observados os que forem estabelecidos pelo CONAMA (Conselho Nacional do Meio Ambiente).
Com o advento da Lei Complementar Federal nº 140, de 08 de dezembro de 2011, foram estabelecidas as normas de cooperação entre a União, os Estados e Municípios, relativamente ao exercício da competência prevista nos incisos III, VI e VII do artigo 23 da Constituição Federal, dentre elas a de Licenciamento Ambiental, conforme tipologia definida pelos respectivos Conselhos Estaduais de Meio Ambiente, considerados os critérios de porte, potencial poluidor e natureza da atividade.
Sobre o Federalismo cooperativo nas ações de gestão ambiental consagrado na Lei Complementar Federal nº 140/2011, reputo conveniente citar novamente a lição de Édis Milaré:[21]
(...)
"4. Federalismo cooperativo nas ações de gestão ambiental
A Constituição de 1988, ao tempo em que desenhou um modelo de Estado Democrático de Direito (caput do art. 1º) e proclamou a autonomia dos diversos entes da Federação (arts. 1º e 18, caput), recepcionou a Lei 6.938/1981 e deixou claro que as Entidades Federativas, em consonância com a estrutura de federalismo cooperativo então adotado, deveriam compartilhar responsabilidades sobre a condução das questões ambientais, tanto no que tange à competência legislativa concorrente/suplementar (arts. 24 e 30, II) quanto no que se refere à competência administrativa comum, também dita material ou implementadora (art. 23), inscrevendo, no que é de interesse, que:
“Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios:[...]III – proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos;[...]VI – proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas;VII – preservar as florestas, a fauna e a flora;[...]Par. único. Leis complementares fixarão normas para a cooperação entre a União e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional” (Redação dada pela EC 53/2006 ).
Destarte, a LC 140, de 02.12.2011 , que acabou por regulamentar os sobreditos incisos do art. 23 da CF, representa, a bem ver, pagamento de promessa solenemente materializada no referido par. único do art. 23 da Lei Máxima, em ordem a fixar normas para a cooperação entre a União e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios no exercício da competência comum em matéria ambiental e a evitar a excessiva cultura centralizadora, em detrimento do que se vem chamando de federalismo cooperativo ecológico, materializado pela integração dos arts. 18, 23, VI e VII, 24, VI e 225 da CF e pela LC 140/2001 , que incorporou o princípio da cooperação ao ordenamento jurídico nacional."
Destaco que a análise aqui empreendida circunscreve-se aos aspectos legais envolvidos, não incumbido a esta unidade jurídica imiscuir-se no exame dos aspectos de economicidade, oportunidade, conveniência, assim como os aspectos técnicos envolvidos, conforme diretriz inserta na Boa Prática Consultiva (BPC) nº 7.[22]
Tal entendimento está lastreado no fato de que a prevalência do aspecto técnico ou a presença de juízo discricionário determinam a competência e a responsabilidade da autoridade administrativa pela prática do ato.
Neste sentido, a Boa Prática Consultiva (BPC) nº 7, cujo enunciado é o que se segue:
"Enunciado
A manifestação consultiva que adentrar questão jurídica com potencial de significativo reflexo em aspecto técnico deve conter justificativa da necessidade de fazê-lo, evitando-se posicionamentos conclusivos sobre temas não jurídicos, tais como os técnicos, administrativos ou de conveniência ou oportunidade, podendo-se, porém, sobre estes emitir opinião ou formular recomendações, desde que enfatizando o caráter discricionário de seu acatamento." (grifou-se)
IV - CONCLUSÃO
Em face do anteriormente exposto, observado a(s) recomendação(ões) sugerida(s) no(s) item(ns) "18.", "20.", "21.", "22." e "42." desta manifestação jurídica, abstraídos os aspectos de conveniência e oportunidade do Administrador, nos limites da lei, e as valorações de cunho econômico–financeiro, ressalvadas, ainda, a manutenção da conformidade documental com as questões de ordem fática, técnica e de cálculo, ínsitas à esfera administrativa, essenciais até mesmo para a devida atuação dos órgãos de controle, o feito está apto para a produção dos seus regulares efeitos, tendo em vista não conter vício insanável com relação à forma legal que pudesse macular o procedimento.
Em razão do advento da PORTARIA NORMATIVA CGU/AGU Nº 10, de 14 de dezembro de 2022, publicada no Suplemento "A" do Boletim de Serviço Eletrônico (BSE) nº 50, de 14 de dezembro de 2022, que dispõe sobre a organização e funcionamento das Consultorias Jurídicas da União Especializadas Virtuais (e-CJUs), convém ressaltar que as manifestações jurídicas (pareceres, notas, informações e cotas) não serão objeto de obrigatória aprovação pelo Coordenador da e-CJU, conforme estabelece o artigo 22, caput, do aludido ato normativo.
Feito tais registros, ao Núcleo de Apoio Administrativo da Consultoria Jurídica da União Especializada Virtual de Patrimônio (e-CJU/PATRIMÔNIO) para restituir o processo a Superintendência do Patrimônio da União no Estado de São Paulo (SPU-SP) para ciência desta manifestação jurídica, mediante disponibilização de chave (link) de acesso externo como usuário externo ao Sistema AGU SAPIENS 2.0., bem como para adoção da(s) providência(s) que entender pertinente(s).
Vitória-ES., 26 de junho de 2023.
(Documento assinado digitalmente)
Alessandro Lira de Almeida
Advogado da União
Matrícula SIAPE nº 1332670
Atenção, a consulta ao processo eletrônico está disponível em https://supersapiens.agu.gov.br mediante o fornecimento do Número Único de Protocolo (NUP) 10154114068202299 e da chave de acesso 1d14b46c
Notas