ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA DA UNIÃO ESPECIALIZADA VIRTUAL DE PATRIMÔNIO
NÚCLEO JURÍDICO

PARECER n. 00482/2023/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU

 

NUP: 10154.177701/2020-98

INTERESSADOS: CELSO SANTOS FILHO

ASSUNTOS: LOCAÇÃO / PERMISSÃO / CONCESSÃO / AUTORIZAÇÃO / CESSÃO DE USO

 

EMENTA: FRACIONAMENTO DE RIP RELATIVO A IMÓVEL DA UNIÃO (MARINHA E ACRESCIDOS) OBJETO DE PARCELAMENTO EFETIVADO POR PARTICULAR EM 1967. VENDAS EFETIVADAS NA DÉCADA DE 1980. TRANSFERÊNCIA DA INSCRIÇÃO DE OCUPAÇÃO. APLICAÇÃO DA REGRA DO ART. 7º, § 7º DA LEI Nº 9.636/1998. OBSERVÂNCIA DO DISPOSTO NA IN SPU Nº 01/2018. RECOMENDAÇÕES ADICIONAIS.

 

I – Relatório.

                               

Trata-se de processo instaurado a partir de requerimento de fracionamento de imóvel da União datado de 01/10/2020, em nome de Ceslso Santos Filho, relativo ao RIP 7121000461080, com a indicação de desmembramento em 1065 unidades (SEI 10917742).

 

Em atendimento a recomendação constante da Nota Técnica SEI nº 12580/2023/MGI (SEI 33827135), o  processo foi encaminhado pela Superintendência do Patrimônio da União no Estado de São Paulo (SPU/SP) à respectiva Consultoria Jurídica,  por meio do OFÍCIO SEI Nº 39641/2023/MGI (SEI 33845160), que se limitou a indicar como assunto “parecer em relação a viabilidade para proceder as averbações de transferência de ocupação”.

 

Por equívoco gerado em razão da concomitante instrução dos autos com manifestação apresentada pelo Espólio de Celso Santos Filho (SEI 34251858), o Advogado da União Nelson Orlando de Alarcão Duccini exarou a COTA n. 049/2023/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU (SEI 34761867), de cujo inteiro teor se destaca:

 

(…)
2. Os autos forem entregues ao signatário para tecer considerações acerca das alegações da RESPOSTA AO OFÍCIO SEI Nº 38652/2023/MGI, encaminhado pelo Espólio de Celso Santos Filho.
3. Em apertada síntese,  o Espólio de Celso Santos Filho alega que não há área remanescente em seu nome e que as taxas de ocupação cobradas carecem de fundamento legal, não havendo obrigação de transferência para o nome do comprador para ultimar o ato, uma vez que a exigência nesse sentido não existia à época da alienação integral da área.
4. É importante destacar que, embora seja correto afirmar que uma lei nova não pode regular situações pretéritas, o ato jurídico, para ser válido, deve ter cumprido os requisitos previstos na legislação então em vigor.  Em questões de Direito Intertemporal prevalece a regra do "tempo rege o ato".
5. Portanto, é preciso avaliar se, à época da comunicação da transferência, o Espólio de Celso Santos Filho cumpriu o trâmite exigido pela legislação da SPU vigente à época.
6. Dessa forma, sugerimos a elaboração de uma nota técnica que contextualize as informações fáticas necessárias para a análise do caso. Solicitamos que sejam esclarecidas as seguintes questões:
a) Houve impugnação tempestiva às cobranças da taxa de ocupação? Em caso positivo, qual o período da impugnação? Houve decisão administrativa, pagamento e/ou inscrição em dívida ativa?
b) A partir de que data a SPU teve ciência da suposta "transferência" da ocupação e por quais meios? Se a ciência ocorreu por comunicação do próprio interessado, solicitamos que o órgão informe qual a legislação em vigor na época da comunicação e se era a mesma legislação exigida na ocasião da transferência.
c) Alternativamente: verificar se o trâmite exigido pela legislação da SPU, em vigor à época, foi cumprido pelo requerente. Caso contrário, apontar eventuais lacunas. Ressalta-se que o postulante teria levado cerca de quatro décadas para comunicar a transferência.
7. Por fim, solicitamos que quaisquer dúvidas jurídicas adicionais sejam apresentadas em forma de perguntas, para que possamos fornecer as devidas orientações e esclarecimentos pertinentes.
 

Em resposta, foi exarada a Nota Técnica SEI nº 18660/2023/MGI (SEI 34786870), que aponta o “mal-entendido”, que teria como resultado a análise, pela COTA n. 049/2023/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU, de “um tema que não era o objeto dos questionamentos”. De acordo com referida Nota Técnica, o processo teria sido encaminhado à respectiva Consultoria Jurídica para aprovar os seguintes “entendimentos dos técnicos”:

 

a) Entendemos ser plenamente possível a averbação das primeiras transferências já que constava a possibilidade de que o imóvel estivesse inserido em terrenos de marinha e acrescido, nos Compromissos de Compra e Venda originais (Entre itens III e IV), com conhecimento dos primeiros compradores.
b) Nos casos das demais transferências, após as notificações administrativas da SPU, que deram conhecimento aos atuais ocupantes, com abertura de prazo para ampla defesa, não havendo contestação, é possível a transferência de ocupação. Além disso, existia a possibilidade de averbação dos compromissos de compra e venda iniciais (averbados, em alguns casos levantados), fato que demonstraria aos demais compradores a necessidade de regularização do imóvel perante a SPU.

 

Pois bem. O acesso do processo no SEI foi disponibilizado pelo link https://sei.economia.gov.br/sei/processo_acesso_externo_consulta.php?id_acesso_externo=2741453&infra_hash=bdbf3318b8ca38d53898750c52ec87d0, e do seu inteiro teor se destacam, além dos documentos já indicados, os seguintes:

 

SEI 10917728: Documentos datados de 1967 relativos ao registro do loteamento denominado CIDADE NÁUTICA DE SÃO VICENTE, com área de 3.263.3836 m², situada na então Fazenda Barreiros, que fazem referência às matrículas nº 17.654 e nº 15.256;

 

SEI 10917731: Petição que detalha o requerimento de fracionamento do RIP 71210004610-80, de cujo inteiro teor se destaca:

 

É importante esclarecer que o loteamento abrangia a integralidade da área de propriedade do Executado, ou seja, 3.263.836,00 m2, dos quais apenas 1.350.000,00 m2 refere-se à terreno de marinha que está cadastrado junto à Secretaria de Patrimônio da União sob RIP nº 71210004610-80.
4- Da referida área de terreno de marinha (1.350.000,00 m2) que era de propriedade do Requerente, a SPU excluiu as seguintes áreas:
a) 488.000,00 m2 referentes aos logradouros públicos (ruas, canais e sistema de recreio do loteamento);
b) 10.316,00 m2 - referente a venda dos lotes 1 a 33 da quadra 124 à Fundação Cosipa de Seguridade Social – FENCO objeto da matrícula 58.890 – doc. anexo;
c) 323,80 m2 – referente a venda dos lotes 1 a 23 da quadra 125 à Fundação Cosipa de Seguridade Social – FENCO objeto da matrícula 58.891 - doc. anexo;
d) 30.359,00 m2 – referente a venda da área reservada 2 à Fundação Cosipa de Seguridade Social – FENCO em 1.980 - matrícula 58.896 – doc. anexo;
e) 167.549 m2 – referente a venda de parte da área reservada nº 1 à Fundação Cosipa de Seguridade Social – FENCO em 1.980 - matrícula nº 58.895 – doc. anexo e, por fim,
f) 259.638,12 – referente a venda de parte da área reservada nº 1 ao Banco Nacional da Habitação em 1.981 - matrícula nº 67.676 – doc. anexo.
(…)
Apesar de ter conhecimento do loteamento, ante a exclusão das áreas supra referidas, acredita-se que a SPU não tenha desmembrado a área remanescente de 393.814,08 m2 em lotes para que seja possível transferi-los aos adquirentes que estão na posse desses lotes há mais de 30 anos.
5- Conforme informado acima, após a aprovação do loteamento Cidade Náutica São Vicente em 1968, o Requerente comercializou toda a área.
6- No entanto, as áreas abaixo informadas não foram excluídas do cadastro constante na SPU:
a) doação da área de 20.000,00m2 da área reservada nº 1 ao Lar de Assistência ao Menor (LAM) no ano de 1971transcrição 32.419 do RI de São Vicente (doc. anexo);
b) da área total de lotes (1.447.415,00 m2) totalmente vendidos à terceiros consta a área aproximada de 321.000,00 m2 situados em área de marinha (v. planta anexa do loteamento com a marcação do limite dos terrenos da marinha – grifada em amarelo – onde estão situados aproximadamente 1.100 lotes ou parte deles) – doc. anexo.
Referidos lotes situados em área de marinha foram todos vendidos pelo Executado entre as décadas de 1970 e 1990, ou seja, estão na posse de terceiros há, pelo menos, 30 anos (relação dos nomes com as escrituras e compromisso de venda e compra anexos).
Além disso, nos anos de 1974 e 1975 uma área de 52.509,60 m2 grande parte situada na área reservada nº 1 (portanto, em terreno de marinha) foi desapropriada, com processo judicial, pela DERSA para a construção da Rodovia dos Imigrantes (doc. anexo).
A venda dos lotes e a desapropriação não foram consideradas pela SPU que continua a taxar a área como um todo pertencente ao Requerente.
(…)
8 – Importante esclarecer que em 1981 o Requerente já havia comunicado a SPU que não era mais proprietário de nenhuma área do Loteamento Cidade Náutica de São Vicente, cujo imóvel estava cadastrado no RIP 7121.0004610-80 (doc anexo).
Inclusive, posteriormente àquela data, foram realizados, ao menos, mais dois requerimentos no mesmo sentido, todos ignorados pela órgão competente (SPU)-doc anexo.
Diante do exposto e de toda documentação anexa, requer sejam desmembrados todos os lotes situados em área de marinha e devidamente transferidos aos adquirentes, cancelando-se as cobranças de taxa de ocupação desde 1981, bem como cessando qualquer lançamento ou cobrança futura sobre o imóvel cadastrado pelo RIP 71210004610-80, em razão de não mais pertencer ao Espolio Requerente há mais de 30 anos, conforme anteriormente comunicado à SPU.

 

SEI 10917732: Certidão de inteiro teor da Transcrição nº 17654 no Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de São Vicente;

 

SEI 10917734: Cópias de documentos diversos, dentro os quais se destacam os pedidos de transferência de ocupação datados de 01/1980, que fazem referência ao RIP 7121.0104610-16 (p. 14/16);

 

SEI 10917735: pedido de transferência de ocupação datado de 18/03/1981, que faz referência ao RIP 7121.0104610-16 (matrícula nº 67.676);

 

SEI 10917737: tabela referente ao loteamento Cidade Náutica em que consta a indicação das vendas realizadas por quadra e outros dados.

 

SEI 10917738: petição datada de 28/04/1981, que faz referência a DARF relativa ao imóvel cadastrado sob RIP 7121.0104610-16, e a abrangência de “áreas já não pertencentes ao requerente”;

 

SEI 10917739: requerimento de cancelamento de taxas de ocupação, datado de 10/06/2013, que se reporta ao NUP 04988.006821/2013-04 e ao RIP 7121.0004610-80, e aduz que “a cobrança é indevida visto que as escrituras, registros, alvarás de transferência já foram todos apresentados nos anos em que ocorreram as vendas dos imóveis e não existe mais áreas no imóvel correspondentes ao RIP acima, de propriedade do requerente”;

 

SEI 3 10917740 e 10917741: Certidão de Óbito de Celso Santos Filho em 19/06/2018 e decisão que nomeia Maria Cecília Amaral Santos a inventariante;

 

SEI 14675684: Dados relativos ao RIP 7121.0004610-80 (área de 393.814,08 m²) extraídos do SIAPA EM 29/03/2021, com indicação do antigo RIP 7121.04610.000-5;

 

SEI 14675717: Relação de débitos do RIP 7121.0004610-80, com indicação de envio para DAU;

 

SEI 18773707: Planta que faz referência ao presente NUP e ao NUP 0880.012640/81-98, ao desmembrametno do RIP 7121.0004610-80, contendo a indicação das áreas já destacadas (com RIP individualizado – RIP 7121.0006638-99/matrícula 67.676, RIP 7121.0006589-76/matrícula 58.895, RIP 7121.0006591-90/ matrícula58.890, RIP 7121.0006700-89/matrícula 58.891, RIP 7121.0006590-00/matrícula 58.896;

 

SEI 23219113: petição apresentada pelo Espólio de Celso Santos Filho em 14/03/2022, em que solicita a “juntada das escrituras e informa que está sendo providenciada a cartografia da área”;

 

SEI 29264730: petição apresentada pelo Espólio de Celso Santos Filho em 31/10/2022 por meio da qual informa que “por ocasião da venda dos lotes, foram vendidos apenas os terrenos, sem qualquer benfeitoria”;

 

SEI 31394465 e 32919180: Ofícios apresentados pelo Cartório de Registro de Imóveis de São Vicente, por meio dos quais informa a existência de matrículas já abertas, referentes a lotes integrantes do loteamento Cidade Náutica;

 

SEI 33783046 e 33804002: petição apresentada pelo Espólio de Celso Santos Filho em 04/05/2023, que faz referência às execuções fiscais em curso para cobrança de taxas de ocupação e à penhora efetuada;

 

SEI 33787388: OFÍCIO SEI Nº 38652/2023/MGI, com o seguinte teor:

 

1. Informamos que estamos procedendo ao fracionamento do RIP 7121.0004610-80, a partir da documentação enviada e da verificação das parcelas dos lotes inseridos em áreas da União. Até o presente momento já foram efetuados 114 desmembramentos, que inclui a notificação dos ocupantes, tanto para constar que o imóvel está inserido em terrenos de marinha e acrescidos, como para informar sobre débitos patrimoniais.
2. Este procedimento necessita de tempo, já que é fundamental a abertura de prazo administrativo para contestação.
3. Além disso, os contratos foram entregues a SPU durante o ano de 2022 e ainda restam alguns documentos a serem entregues.
4. Cabe destacar que, as transações do Loteamento Cidade Náutica foram iniciadas na década de 1980 e apenas agora, 4 (quatro) décadas depois, estão sendo entregues os documentos necessários para efetivação da transferência. De acordo com o Art. 132-A, do Decreto-Lei 9760/46 é de responsabilidade do antigo ocupante a apresentação de documentos para efetivação das transferências:
Art. 132-A. Efetuada a transferência do direito de ocupação, o antigo ocupante, exibindo os documentos comprobatórios, deverá comunicar a transferência à Superintendência do Patrimônio da União, no prazo de até sessenta dias, sob pena de permanecer responsável pelos débitos que vierem a incidir sobre o imóvel até a data da comunicação. (Incluído pela Lei nº 13.465, de 2017)
5. Independente disso, estamos efetuando todos os trabalhos necessários para regularização da ocupação com a urgência devida, em conjunto com todas as outras demandas existentes na SPU-SP.
6. Em janeiro deste ano, 2023, foi solicitado através do Ofício SEI Nº 6541/2023/ME ao Cartório de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos, Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de São Vicente, averbação dos RIPs já fracionados nas matrículas individualizadas dos imóveis, parte integrante do procedimento de regularização da área. Até o dado momento, não obtivemos retorno a tal solicitação.
7. Informamos ainda que o cancelamento dos débitos será realizado após a regularização dos RIPs individualizados, a partir da data de conhecimento, pela SPU, das transações de vendas dos lotes.

 

SEI 33802343: Nota de Exigência e Devolução apresentada pelo Cartório de Registro de Imóveis de São Vicente em 01/2023, referente a pedido da SPU/SP de averbação de RIPS nas matriculas indicadas, de cujo inteiro teor se destaca:

 

Nesta toada, do ponto de vista administrativo, para que as averbações sejam levadas a cabo o requerimento deve ser subscrito por todos os titulares de direitos reais dos imóveis atingidos, comfirmas reconhecidas, reconhecendo-se, assim, que estes teriam ciência do ato praticado, não sendo suficienteo ato unilateral da SPU.
Não sendo o caso, para as averbações pretendidas, deve ser apresentado pela SPU o título por intermédio do qual foi feita a demarcação dos referidos terrenos de marinha, do qual seja evidenciado que os atuais titulares tabulares dos imóveis tenham sido notificados da atual situação jurídica dos referidos imóveis, acompanhado das respectivas plantas, nos termos do que estabelece o Decreto-Lei nº 9.760/1946.

 

SEI 33827135: Nota Técnica SEI nº 12580/2023/MGI, de cujo inteiro teor se destacam as seguintes informações:

 

SUMÁRIO EXECUTIVO
1. Trata o presente de regularização cadastral do Loteamento Cidade Náutica, localizado no município de São Vicente, parcialmente afetada por terrenos de marinha e acrescido, constando como ocupante original Celso Santos Filho, (RIP) 7121.0004610-80.
2. Durante 4 (quatro) décadas o ocupante não apresentou os documentos necessários para averbação das transferências de ocupação. Apenas nos últimos dois anos, os representantes do espólio começaram a apresentar os documentos necessários para efetivação das transferências, de acordo com a Legislação Patrimonial.
3. Ocorre que, neste caso, várias transações foram efetuadas à revelia da União e, por cautela, é importante manifestação da Consultoria Jurídica da União sobre eventual óbice no início das transferências, mesmo com a situação cartorial dos desmembramentos ainda em discussão. Além disso, pela demora em apresentação dos títulos para transferência, gerarão multas com valores significativos (Em torno de R$ 17.000,00 - dezessete mil reais).
4. Além disso, por serem centenas de imóveis, é prudente que a SPU inicie os procedimentos de forma bem definida.
ANÁLISE
(…)
8. Neste ponto reforçamos que, dos contratos e aberturas de matrículas residenciais, deveria constar a informação de terrenos afetados, ou parcialmente afetados por área da União, porém em sua origem (criação das Matrículas individualizadas, não o foram). Informação esta que por meio de Ofício solicitamos a autorização para que fosse inserida na documentação cartorial atualizada dos imóveis.
9. Outros exemplos do conhecimento da existência dos terrenos de marinha e acrescidos, podem ser observados a partir dos contratos individualizados de Compra e Venda entre Espólio de Celso Santos Filho e os adquirentes dos lotes. A comprovação de que o então titular da área maior tinha conhecimento que o loteamento Cidade Náutica estava parcialmente em área da União pode ser notada junto ao Contrato de Compra e Venda (1976) - Lote 04 Quadra 02 (FL 02) (doc. 30421375) e Contrato de Compra e Venda (2006) - Lote 03 Quadra 170 (FL 06) (doc. 30421713).
10. naquele momento, nem o Registro de Imóveis, nem o comprador tomaram o cuidado de questionar a situação do imóvel em relação aos terrenos de marinha, apesar dos contratos mencionarem a situação.
11. Esse "equívoco", que ocorreu desde o titular vendedor da área, fez com que não houvesse o devido direcionamento ao desmembramento da área maior junto à SPU, o que proporcionaria desde a primeira venda, a transferência devida e correta para cada respectivo comprador, que teriam conhecimento sobre a informação para tratos administrativos,  quitação de débitos, e eliminaria o desconforto gerado aos compradores futuros, que atualmente, não têm a informação, junto aos documentos cartoriais dos respectivos imóveis, que os mesmos se encontram em áreas de Marinha e Acrescidos.
12. Mesmo não tendo a informação sobre a dominialidade da União junto a seus respectivos registros, os lotes que estão nestas áreas poderão receber Registros Imobiliários Individualizados (RIPs) por meio do desmembramento do RIP primitivo 7121.0004610-80, criando os chamados RIPs derivados. Estes lotes derivados, foram transacionados, já vendidos, não mais pertencentes ao Espólio de Celso Santos Filho e, desse modo, necessitarão serem atualizados em sua cadeia de posse.
13. A possibilidade de regularização pela SPU é normativa, uma vez que, para averbação das transferências em áreas de Regime de Ocupação, não é necessário apresentação da matrícula do imóvel, sendo possível a comprovação documental para transferência, apenas com o Instrumento de Venda e Compra, conforme Instrução Normativa n° 1, de 9 de março de 2018:
(…)
16. Nos Compromissos de Venda e Compra apresentados, como exemplo o inserido no documento SEI 33839838, o vendedor repassa essa responsabilidade ao ocupante, conforme pode ser visto entre os itens III e IV. Ocorre que tais compradores não apresentaram os títulos à SPU e, além disso, o Cartório de Registro de Imóveis de São Vicente, não averbou a propriedade da União nas matrículas individualizadas dos lotes.
Compromisso de Compra e Venda
III
(...)
Nos casos em que os "lotes" de terreno deste arruamento da "CIDADE NÁUTICA DE SÃO VICENTE" se acharem localizados em "terrenos de marinha", os pagamentos dos respectivos foros, laudêmios, taxas, e cotas em geral, deverão ser efetuados pelo "compromissário" comprador do "terreno" sobre os quais as mesmas recaírem, ficando ainda obrigado a respeitar as leis relativas a tais imóveis da União.
17. Desta forma, não se pode alegar desconhecimento, dos primeiros compradores, de que o imóvel poderia estar inserido em terrenos de marinha e acrescidos.

 

SEI 34251858 e 34254540: petição apresentada pelo Espólio de Celso Santos Filho em 19/05/2023, em resposta ao OFÍCIO SEI Nº 38652/2023/MGI, que faz referência ao NUP 0880.012640/81-98;

 

SEI 34803715: OFÍCIO SEI Nº 57913/2023/MGI, de encaminhamento dos autos em epígrafe, que dessa vez faz referência à “Nota Técnica 18660 - SEI 34786870”.

 

É o relatório.

 

II – Análise.

 

Inicialmente, incumbe-nos consignar a necessidade de o consulente, em procedimentos como o presente, apontar, no ofício de encaminhamento à respectiva Consultoria Jurídica, a questão específica sob a qual pretende o assessoramento jurídico, a fim de evitar novos equívocos, que me nada contribuiem para a efetividade processual.

 

Conforme relatado, por meio da Nota Técnica SEI nº 18660/2023/MGI (SEI 34786870), que repete os termos da Nota Técnica SEI nº 12580/2023/MGI (SEI 33827135), restou esclarecido que o presente processo foi encaminhado à respectiva Consultoria Jurídica para aprovar os seguintes “entendimentos dos técnicos”:

 

a) Entendemos ser plenamente possível a averbação das primeiras transferências já que constava a possibilidade de que o imóvel estivesse inserido em terrenos de marinha e acrescido, nos Compromissos de Compra e Venda originais (Entre itens III e IV), com conhecimento dos primeiros compradores.
b) Nos casos das demais transferências, após as notificações administrativas da SPU, que deram conhecimento aos atuais ocupantes, com abertura de prazo para ampla defesa, não havendo contestação, é possível a transferência de ocupação. Além disso, existia a possibilidade de averbação dos compromissos de compra e venda iniciais (averbados, em alguns casos levantados), fato que demonstraria aos demais compradores a necessidade de regularização do imóvel perante a SPU.

 

Como consignado nas aludidas Notas Técnicas, “por serem centenas de imóveis, é prudente que a SPU inicie os procedimentos de forma bem definida”. Desta feita, por meio da presente manifestação, não nos limitaremos a aprovar os “entendimentos dos técnicos” acima referidos, tecendo outras considerações que nos parecem relevantes para o escorreito direcionamento do presente processo.

 

Pois bem. A ineficácia do registro de propriedade particular de imóveis situados em terrenos da Marinha, e respectivas consequências jurídicas, foram objeto do PARECER n. 00162/2010/DECOR/CGU/AGU (NUP 00416.004400/2009-45), aprovado pelo Consultor-Geral da União em 11/11/2011, e de cujo inteiro teor se destaca:

 

CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. TERRENOS DE MARINHA. REGULARIZAÇÃO. REGISTRO EM NOME DE TERCEIROS. ORIGINALIDADE DO DOMÍNIO DA UNIÃO. INEFICÁCIA DO TITULO DO PARTICULAR. NECESSIDADE DE AUTORIZAÇÃO DO ENTE PÚBLICO E RECOLHIMENTO DO LAUDÊMIO PARA A TRANSFERÊNCIA DO DOMÍNIO ÚTIL. DESNECESSIDADE DE PROPOSITURA, PELA UNIÃO, DE AÇÃO ANULATÓRIA DO TITULO. DEVER DOS REGISTROS DE IMÓVEIS DE ATENDER ÀS DETERMINAÇÕES LEGAIS IMEDIATAMENTE. PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA.
(…)
9. Nesse contexto, é importante ressaltar que o procedimento de demarcação dos terrenos de marinha produz efeito meramente declaratório da propriedade da União sobre as áreas demarcadas, já estabelecida em função do comando constitucional consagrado no artigo 20, VII. De fato, essa é a posição adotada pelo E. Superior Tribunai de justiça em diversos julgados. Observe-se, exemplificativamente:
(…)
20. É exatamente em função do caráter declaratório do procedimento de demarcação, decorrente da originalidade do domínio da União, reconhecido por diversas vezes ao longo da história constitucional brasileira a partir de seu surgimento como instituto juridico, através da Ordem Régia de 21 de outubro de 1710, à época do Brasil-Coiônia, combinado com as presunções inerentes aos atos administrativos (legitimidade, imperatividade, exigibilidade e executoriedade), que a jurisprudência do E. STJ e a doutrina majoritária entendem que é desnecessário o ajuizamento de ação própria, pela União, para a anulação dos registros de propriedade dos ocupantes de terrenos de marinha.
21. Dessa forma, ainda que o particular possua título Iegitimador do que seria sua propriedade, e ainda que esse título diga respeito a momento anterior ao reconhecimento, pelo SPU, da dominialidade da União, compete a ele o ônus da prova de que o imóvel não se situa em área de terreno de marinha, e deve fazê-lo por meio da ação cabível. Nesse sentido, como ressaltado por José dos Santos Carvalho Filhol, “uma vez discriminados os terrenos de marinha no SPU, com base na legislação especifica, somente por ação judicial podem ser descaracterizados". E continua: ”por isso, o STJ considerou exigível a taxa de ocupação (e, por via de consequência, legítima a caracterização de área como terreno de marinha) mesmo diante de negócio jurídico de doação em que figurava como doador o Estado do Rio Grande do Sul e donatário o interessado que se julgava proprietário do imóvei". Finaliza concluindo que "o Tribunal considerou que a inscrição do título do registro de imóvel espelha presunção juris tanrum, não afastando, desse modo, a titularidade do imóvel em favor da União".
(…)
24. Nesse contexto, partindo-se do pressuposto que o procedimento seguido pela SPU na discriminação dos terrenos de marinha e seus acrescidos se deu em consonância com o disposto no Decreto-Lei nº 9.760/46 e com os ditames impostos pela jurisprudência - em especial a exigência de notificação pessoal ãqueies que figuram no registro público como proprietários dos imóveis -, a mera inscrição do bem no SPU torna integralmente aplicável o regime definido para os terrenos de marinha, tornando exigível o recolhimento de foro, além do pagamento de laudêmio e a apresentação da CAT por ocasião da transferência do domínio Útil através de contrato de compra e venda. Nesse sentido, atente-se ao entendimento do C. STJ, exarado no REsp 6878431ES, que retorna as principais questões referentes ao tema, já abordadas no presente parecer:
(…)
26. Dessa forma, se a inscrição do bem no registro de patrimônio da União é fator suficiente para tornar exigível o pagamento de foro, iaudêmio, e a apresentação da CAT, sendo desnecessária a propositura de ação anulatória de registro da propriedade, não se justifica a negativa de alguns dos Oficiais dos Registros de Imóveis em adotar tais procedimentos, condicionando-os ao registro da propriedade em nome da União no âmbito do Registro de Imóveis, ou a averbação que indique se tratar de imóvel cadastrado no SPU como terreno de marinha ou acrescido. De fato, ao se negarem a atuar da forma como foram instados a fazer através dos diversos ofícios remetidos pela PRU-4ª Região, os Oficiais suscitaram o teor de artigos da Lei 6015/73 e do Código Civil de 2002. Entretanto, os referidos diplomas normativos não se aplicam em sua totalidade aos imóveis de propriedade da União, mas o fazem de forma supletiva, apenas no que tange à matéria não regulada por normas especiais, como o Decreto-lei nº 9760/46 e a Lei nº 9636/98. Aplica-se, ao caso, o brocado Lex specialis derrogat generali.
(…)
28. Importante ressaltar que a negativa em proceder ao referido registro, acompanhada do descumprimento dos deveres de exigir a CAT e a comprovação do pagamento de laudêmio por ocasião da alienação do dominio útil pode gerar prejuizos patrimoniais ao ente público, ensejando a aplicação da Lei 8429/92 e, especialmente de seu artigo 10, que trata dos atos de improbidade administrativa que causam prejuízo ao Erário. Saliente—se que esta é a Única modalidade de ato de improbidade que não exige a caracterização da conduta dolosa do agente para sua configuração, consoante jurisprudência do E. STJ. Nesse sentido, observe-se o entendimento exarado no julgamento do REsp 875.163-RS, veiculado no Informativo nº 395/2009:
(…)
29. Ademais, a ação de ressarcimento ao Erário é imprescritível, nos termos do artigo 37, § 5º, da Constituição da República. Nesse sentido, reiterada e recente jurisprudência do C. STJ. Atente-se, exemplificativamente, ao seguinte julgado, veiculado no informativo de jurisprudência nº 406:
(…)
30. Ressalte-se, ainda, o teor do § 2º, do artigo Art. 3º, do Decreto Lei nº 2.398/87,que trata especificamente da questão, e estabelece a responsabilidade do titular do cartório:
(…)
31. Ante o exposto, percebe-se a existência de dever legal dos Registros de imóveis de reconhecer a titularidade da União no que tange a imóveis registrados como tal no S.P.U., com todos os coroiários que de tal situação derivam, especialmente a exigência de CAT para proceder à transferência de titularidade do domínio útil por escritura definitiva de compra e venda e de comprovação do pagamento de laudêrnio. Recomenda-se, portanto, o envio de cópia do presente parecer: 1) como recomendação, aos Cartórios de Registro de imóveis localizados no litoral norte do Rio Grande do Sul, área em que surgiram os problemas que deram origem ao PPC! nºlf2009, da PRU — 4ª Região; 2) ao Departamento de Probidade e Patrimônio da Procuradoria-Geral da União, para ciência,: 3) a PRU - 4ª Região, para ciência e adoção das providências cabíveis, especialmente o ajuizamento de ações de improbidade porventura cabíveis.
(…)

 

Como apontado na aludida manifestação, a inscrição do bem no cadastro da SPU “torna integralmente aplicável o regime definido” na legislação patrimonial da União, devendo-se perquerir, no presente caso, o tratamento a ser dado quanto ao desmembramento do RIP 7121000461080, ainda hoje cadastrado em nome de Celso Santos Filho.

 

Em sua redação original, previa o Decreto-Lei nº 9.760/1946, que:

 

SEÇÃO V
DA REGULARIZAÇÃO DA OCUPAÇÃO DE IMÓVEIS
PRESUMIDAMENTE DE DOMÍNIO DA UNIÃO
Art. 61. O S. P. U. exigirá de todo aquêle que estiver ocupando imóvel presumidamente pertencente à União, que lhe apresente os documentos e títulos comprobatórios de seus direitos sôbre o mesmo.
(…)
CAPÍTULO VI
Da ocupação
Art. 127. Os atuais ocupantes de terrenos da União, sem título outorgado por esta, ficam obrigados ao pagamento anual da taxa de ocupação.
§ 1º a taxa corresponderá a 1% (um por cento) sôbre o valor do domínio pleno do terreno.
§ 2º A importância da taxa será periòdicamente atualizada pelo S. P. U.
Art. 128. Para cobrança da taxa, o S.P.U. fará a inscrição dos ocupantes, ex-officio, ou à vista de declaração dêstes, notificando-os.
Parágrafo único. A falta de inscrição não isenta o ocupante da obrigação do pagamento da taxa, devida desde o início da ocupação.
Art. 129. O pagamento da taxa de ocupação deverá ser efetuado adiantadamente durante o primeiro quadrimestre de cada ano, sob pena de multa de 10% (dez por cento) sôbre o montante da dívida.
§ 1º A taxa de ocupação será cobrada em dôbro nos casos previstos nos artigos 110 e 121.
§ 2º No caso de não pagamento da taxa durante 2 (dois) anos consecutivos, o S. P. U. providenciará a cobrança executiva e promover as medidas de direito para a desocupação do imóvel.
Art. 130. A transferência onerosa dos direitos sobre as benfeitorias de terreno ocupado fica condicionada à prévia licença do S. P. U., que, cobrará o laudêmio de 5% (cinco por cento) sôbre o valor do terreno e das benfeitorias nêle existentes, desde que a União não necessite do mesmo terreno. 
 

Ditos dispositivos foram bastante alterados pela legislação subsequente, tendo o citado art. 130 sido revogado pelo Decreto-lei nº 2.398/1987, que se limitou a prever, em sua redação original que:

 

Art. 1º A taxa de ocupação de terrenos da União, calculada sobre o valor do domínio pleno do terreno,
I - 2% (dois por cento) para as ocupações já inscritas e para aquelas cuja inscrição seja requerida, ao SPU, até 31 de março de 1988; e
II - 5% (cinco por cento) para as ocupações cuja inscrição seja requerida ou promovida ex officio, a partir de 1° de abril de 1988.
Art. 2º O Ministro da Fazenda, mediante portaria estabelecerá os prazos para o recolhimento de foros e taxas de ocupação relativos a terrenos da União, podendo autorizar o parcelamento em até oito cotas mensais.
Art. 3° Dependerá do prévio recolhimento do laudêmio, em quantia correspondente a 5% (cinco por cento) do valor atualizado do domínio pleno e das benfeitorias, a transferência onerosa, entre vivos, do domínio útil de terreno da União ou de direitos sobre benfeitorias neles construídas, bem assim a cessão de direito a eles relativos.      
§ 1° As transferências parciais de aforamento ficarão sujeitas a novo foro para a parte desmembrada.
§ 2° Os Registros de Imóveis, sob pena de responsabilidade do respectivo titular, não registrarão escrituras relativas a bens imóveis de propriedade da União ou que contenham, ainda que parcialmente, terreno da União:
a)sem prova do pagamento do laudêmio;
b) se o imóvel estiver situado em zona que houver sido declarada de interesse do serviço público em portaria do Diretor-Geral do Serviço do Patrimônio da União; e
c)sem a observância das normas estabelecidas em regulamento.
§ 3° O Serviço do Patrimônio da União (SPU) procederá à revisão do cálculo do valor recolhido e, apurada diferença a menor, notificará o interessado para recolhê-la, no prazo de 30 (trinta) dias, devolvendo o valor da eventual diferença a maior.
§ 4° O recolhimento da diferença a menor e a devolução da diferença a maior serão feitas pelos respectivos valores monetariamente atualizados pelo índice de variação de uma Obrigação do Tesouro Nacional (OTN).
§ 5° O não recolhimento de diferença a menor, no prazo fixado no parágrafo anterior, acarretará a sua cobrança com os acréscimos previstos nos arts. 15 e 16 do Decreto-lei n° 2.323, de 26 de fevereiro de 1987, com a redação dada pelo Decreto-lei n° 2.331, de 28 de maio de 1987.      

 

A regra do citado art. 3º do Decreto-lei nº 2.398/1987, foi regulamentada pelo Decreto nº 95.760/1988, que em seu art. 2º expressamente previu que “o alienante, foreiro ou ocupante, regularmente inscrito efetuará a transferência, sem a prévia autorização do Serviço do Patrimônio da União - SPU, desde que cumpridas” as formalidade arroladas.

 

Desta feita, tem-se que, ex vi  do disposto no art. 130 do Decreto-Lei nº 9.760/1946, estava o Sr. Celso Santos Filho obrigado a obter a prévia licença da SPU (e recolher o respectivo laudêmio) para as transferências dos lotes integrantes do RIP 7121000461080, operadas entre as decádas de 70 e 90, e cujo desmembramento ora pleiteia. Com efeito, apenas para as transferências efetuadas após 02/03/1988 (quando da publicação do Decreto nº 95.760/1988) não há que se exigir a comprovação da prévia licença da SPU, que, no entanto, deveria ser comunicada na forma do art. 4º do Decreto nº 95.760/1988, verbis:

 

Art. 4° O requerimento de transferência das obrigações enfitêuticas ou relativas à ocupação será remetido ao SPU por via postal, com aviso de recebimento, ou entregue pessoalmente, devendo ser instruído com os documentos referidos no item II do art. 2°, autenticados pelo Cartório de Notas, e, se for o caso, a certidão do registro de imóveis.
Parágrafo único. Na formalização da transferência perante o SPU, observar-se-ão o prazo e demais termos do art. 116 do Decreto-lei n° 9.760, de 5 de setembro de 1946.

 

E mais: com o advento da Lei nº 9.636, de 1998, estava o Sr. Celso Santos Filho obrigado a requerer o recadastramento (vide art. 7º, em sua redação original[1]), quando deveria então ter informado todas as 1065 vendas que, segundo requerimento SEI 10917731, já tinham sido efetuadas.  

 

Salvo melhor juízo, a documentação apresentada pelo Espólio de Celso Santos Filho não  comprova o oportuno cumprimento das obrigações acima descritas (os pedidos de transferência constantes do SEI 10917734 e 10917735 não nos parecem referir aos lotes inseridos no RIP 7121000461080 – há referência ao RIP 7121.0104610-16, parecendo-nos interessante a instrução dos autos com tela do SIAPE relativa ao mesmo). Deveras, da documentação constante dos autos, encontrado apenas requerimento de cancelamento de taxas de ocupação datado de 10/06/2013, que se reporta ao NUP 04988.006821/2013-04 e ao RIP 7121.0004610-80, e aduz que “a cobrança é indevida visto que as escrituras, registros, alvarás de transferência já foram todos apresentados nos anos em que ocorreram as vendas dos imóveis e não existe mais áreas no imóvel correspondentes ao RIP acima, de propriedade do requerente” (vide SEI 10917739).

 

Embora não tenha sido o objeto da consulta, haja vista a petição apresentada pelo Espólio de Celso Santos Filho (SEI 34251858), parece-nos imperioso o exame dos processos administrativos nº 0880.012640/81-98 e 04988.006821/2013-04, e a verificação da existência de prova que “o requerente cumpriu na ocasião da venda (idos de 1980), todos os requisitos legais exigidos”. Afinal, apenas assim poderá cogitar-se o atendimento do seu pleito de cancelamento das “cobranças de taxa de ocupação exigidas após a comprovada alienação”.

 

Feita essa digressão, passa-se à análise da questão referente à efetivação das transferências de ocupação, a qual não só nos parece possível, como necessária, ante os termos do § 7º do art. 7º da Lei nº 9.636/1998, segundo o qual:

 

Art. 7º
(…)
§ 7º  Para fins de regularização nos registros cadastrais da Secretaria do Patrimônio da União do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão das ocupações ocorridas até 10 de junho de 2014, as transferências de posse na cadeia sucessória do imóvel serão anotadas no cadastro dos bens dominiais da União para o fim de cobrança de receitas patrimoniais dos responsáveis, independentemente do prévio recolhimento do laudêmio.  (Redação dada pela Lei nº 13.813, de 2019)

 

Realce-se, por oportuno, que, conforme expresso na Instrução Normativa SPU Nº 01/2018:

 

Art. 8º São instrumentos válidos para a efetivação da transferência:
(…)
§4º No caso de imóveis sob o regime de ocupação, os títulos públicos lavrados ou quaisquer contratos celebrados entre particulares até 27 de abril de 2006 são aceitos como documentos que comprovem a cadeia de posse, independentemente do recolhimento do laudêmio e da emissão de CAT, nos termos do § 7º, do art. 7º, da Lei nº 9.636 de 1998.
 
Art. 34. O procedimento de transferência de titularidade de imóvel no cadastro da Secretaria do Patrimônio da União poderá ser iniciado:
(…)
III - de ofício, quando a Secretaria do Patrimônio da União tiver conhecimento da transferência.
 
Art. 38. O processo deve ser encaminhado ao Departamento de Destinação Patrimonial, quando envolver:
(…)
II - Transferência de imóveis inscritos sob o regime de ocupação com área igual ou superior a 500.000m², observado que no cálculo serão considerados:
a) Áreas de terrenos que tenham sido objeto de desmembramento, ainda que as áreas remanescentes individualizadas possuam metragem inferior ao estabelecido neste parágrafo; e
b) Terrenos que tenham sido objeto de unificação que resulte em área igual ou superior ao definido neste dispositivo.
(…)

 

De se registrar também que a “cobrança de receitas patrimoniais dos responsáveis” a que alude o § 7º do art. 7º da Lei nº 9.636/1998 está sujeita à observâncias dos prazos previstos no art. 47 da mesma lei, segundo o qual:

 

Art. 47.  O crédito originado de receita patrimonial será submetido aos seguintes prazos:   (Redação dada pela Lei nº 10.852, de 2004)
I - decadencial de dez anos para sua constituição, mediante lançamento; e  (Incluído pela Lei nº 10.852, de 2004)
II - prescricional de cinco anos para sua exigência, contados do lançamento. (Incluído pela Lei nº 10.852, de 2004)
§ 1º  O prazo de decadência de que trata o caput conta-se do instante em que o respectivo crédito poderia ser constituído, a partir do conhecimento por iniciativa da União ou por solicitação do interessado das circunstâncias e fatos que caracterizam a hipótese de incidência da receita patrimonial, ficando limitada a cinco anos a cobrança de créditos relativos a período anterior ao conhecimento. (Redação dada pela Lei nº 9.821, de 1999)
§ 2º  Os débitos cujos créditos foram alcançados pela prescrição serão considerados apenas para o efeito da caracterização da ocorrência de caducidade de que trata o parágrafo único do art. 101 do Decreto-Lei no 9.760, de 1946, com a redação dada pelo art. 32 desta Lei.  (Redação dada pela Lei nº 9.821, de 1999)

 

E mais: por meio do PARECER n. 00007/2016/DECOR/CGU/AGU (NUP 04962.202530/2015-68, seq. 16), o DECOR/AGU acolheu o entendimento do PARECER/MP/CONJUR/DPC/Nº 0471 – 5.9 / 2010, e uniformizou que:

 

PRAZO DE INEXIGIBILIDADE DO ART. 47, §1º, DA LEI Nº 9.636/98. NÃO INCIDÊNCIA SOBRE A RECEITA PATRIMONIAL DE LAUDÊMIO.
I - O prazo quinquenal de inexigibilidade previsto na parte final do §1º do art. 47 da Lei nº 9.636/98 incide apenas sobre as receitas periódicas, não se aplicando, portanto, ao valor devido a título de laudêmio, que se caracteriza como receita eventual e esporádica.

 

Isto posto e considerada a “divergência cartorial” mencionada na Nota Técnica SEI nº 18660/2023/MGI, convém reiterar que, como muito bem exposto no já citado PARECER n. 00162/2010/DECOR/CGU/AGU (vide parágrafo 10), os Cartórios de Registros de Imóveis têm o dever legal de reconhecer a titularidade da União no que tange a imóveis registrados como tal no SPU, com todos os coroiários que de tal situação derivam, especialmente a exigência de CAT para proceder à transferência de titularidade. Nesse sentido, o disposto no Decreto-Lei nº 2.398/1987, segundo o qual:

 

Art. 3º
(…)
§ 2º Os Cartórios de Notas e Registro de Imóveis, sob pena de responsabilidade dos seus respectivos titulares, não lavrarão nem registrarão escrituras relativas a bens imóveis de propriedade da União, ou que contenham, ainda que parcialmente, área de seu domínio:  (Redação dada pela Lei nº 9.636, de 1998)
I - sem certidão da Secretaria do Patrimônio da União - SPU que declare: (Incluído pela Lei nº 9.636, de 1998)
a) ter o interessado recolhido o laudêmio devido, nas transferências onerosas entre vivos; (Redação dada pela Lei nº 9.636, de 1998)
b) estar o transmitente em dia, perante o Patrimônio da União, com as obrigações relativas ao imóvel objeto da transferência; e (Redação dada pela Lei nº 13.139, de 2015)
c) estar autorizada a transferência do imóvel, em virtude de não se encontrar em área de interesse do serviço público;  (Redação dada pela Lei nº 9.636, de 1998)
II - sem a observância das normas estabelecidas em regulamento.   (Incluído pela Lei nº 9.636, de 1998)
 

A propósito do tema, digna de referência orientação constante do PARECER n. 00655/2020/PGFN/AGU (NUP: 10154.138177/2020-30), por meio do qual solucionados, dentre outros, o seguinte questionamento:

 

XI - Nos casos de imóveis localizados inteiramente em terrenos de marinha ou terrenos marginais com demarcação homologada, a SPU pode averbar/registrar seu domínio em matricula irregular pré-existente ou fica obrigada a solicitar o cancelamento do registro ilegal e a abertura de nova matrícula? Se o oficial do cartório permitir a averbação, mas não o cancelamento do registro, pode a SPU solicitar a averbação enquanto aguarda o fim do procedimento de dúvida registral que decidirá sobre o cancelamento?
53. Para manter a coerência com o que foi dito no item anterior, em um primeiro momento o mais prudente é que a SPU requeira ao cartório imobiliário o cancelamento da matrícula aberta em nome do particular, e, ato contínuo, solicite a abertura de uma nova matrícula em nome da União, utilizando-se analogicamente o disposto no art. 18-E do DL nº9.760/46.
54. Recomenda-se que conste do ofício encaminhado ao cartório de registro de imóveis, o teor da Súmula nº 496 do STJ, onde se afirma que “Os registros de propriedade particular de imóveis situados em terrenos de marinha não são oponíveis à União”.
59. Caso haja recusa para efetivar o cancelamento, mas concordância em se proceder à averbação do documento que homologou a demarcação, deve-se proceder à referida averbação e suscitar a dúvida registral. Findando esta de forma desfavorável às pretensões da União, é recomendável que o órgão do contencioso da AGU seja contatado para verificar eventuais possibilidades de discussão na via judicial, é que o procedimento de dúvida registral, embora se processe no Poder Judiciário, não é procedimento de jurisdição contenciosa, e, assim, não faz coisa julgada material, o que daria margem a eventual discussão judicial por outras vias, como por exemplo, uma Ação Ordinária Declaratória ou mesmo por meio de Mandado de Segurança.

 

  III – Conclusão.

 

Ante o exposto e em resposta à consulta formulada por meio do OFÍCIO SEI Nº 57913/2023/MGI, consideram-se corretos o “entendimentos dos técnicos” apontados no parágrafo 34, letras “a” e “b” da Nota Técnica SEI nº 18660/2023/MGI, que devem ter por fundamento a regra do § 7º do art. 7º da Lei nº 9.636/1998.

 

Retornem os autos ao consulente, para adoção das providências cabíveis, observando-se o quanto consignado ao longo do presente opinativo e a eventual necessidade de encaminhamento dos autos ao Departamento de Destinação Patrimonial do órgão central da SPU (cfr. art. 38, II, a da IN SPU nº 01/2018) .

 

 É o parecer. Na oportunidade e considerada a relevância do caso, coloca-se esta parecerista à disposição da SPU/SP, para, por meio de contatos telefônicos, e-mail ou realização de reuniões (cfr. BPC nº 20), solução de eventuais dúvidas e alinhamento de encaminhamentos.

 

Belo Horizonte, 22 de junho de 2023.

 

 

ANA LUIZA MENDONÇA SOARES

ADVOGADA DA UNIÃO

OAB/MG 96.194 - SIAPE 1507513


[1] Art. 7º Os inscritos até 15 de fevereiro de 1997, na Secretaria do Patrimônio da União, deverão recadastrar-se, situação em que serão mantidas, se mais favoráveis, as condições de cadastramento utilizadas à época da realização da inscrição originária, desde que estejam ou sejam regularizados os pagamentos das taxas de que tratam os arts. 1º e 3º do Decreto-Lei nº 2.398, de 21 de dezembro de 1987, independentemente da existência de efetivo aproveitamento.

Parágrafo único. A vedação de que trata o § 6º do art. 3º do Decreto-Lei nº 2.398, de 1987, com a redação dada por esta Lei, não se aplica aos casos previstos neste artigo.

 

 

 


Atenção, a consulta ao processo eletrônico está disponível em https://supersapiens.agu.gov.br mediante o fornecimento do Número Único de Protocolo (NUP) 10154177701202098 e da chave de acesso 0cfe2008

 




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