ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA DA UNIÃO ESPECIALIZADA VIRTUAL DE PATRIMÔNIO
NÚCLEO JURÍDICO
PARECER n. 00483/2023/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU
NUP: 10154.167732/2022-01
INTERESSADOS: FUNDAÇÃO DA FAMÍLIA E ASSUNTOS COMUNITÁRIOS "IRMÃ VERA" E OUTROS
ASSUNTOS: CESSÃO GRATUITA A ENTIDADE PRIVADA SEM FINS LUCRATIVOS
EMENTA: PATRIMÔNIO IMOBILIÁRIO DA UNIÃO. CESSÃO DE USO GRATUITO A ENTIDADE PRIVADA SEM FINS LUCRATIVOS. DÚVIDAS ACERCA DA NECESSIDADE DE EXIGÊNCIA DE CERTIFICADO DE ENTIDADE BENEFICIENTE DE ASSISTÊNCIA SOCIAL. CONDIÇÃO INAPLICÁVEL À ESPÉCIE. PARECER N. 00017/2022/DECOR/CGU/AGU COM TEMÁTICA VOLTADA À ISENÇÃO DE TAXA DE OCUPAÇÃO.
Trata-se de processo oriundo da SPU/SC, cujo objeto é a Cessão de Uso Gratuito de bem imóvel da União, espólio da antiga RFSA Rede Ferroviária Federal S.A - RFFSA, situado na Rua Almirante Lamego, s/n, no Município de Laguna, neste Estado, constituído pela antiga Estação Ferroviária de Laguna de NBP 6200251, com área de 293,32 m² para Fundação da Família e Assuntos Comunitários Irmã Vera.
Em que pese Nota Técnica favorável do próprio órgão e em Ata Deliberativa do GE-DESUP e manifestação favorável no PARECER n. 00068/2023/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU, persiste dúvida quanto à aplicabilidade do PARECER n. 00017/2022/DECOR/CGU/AGU ao caso concreto, no tocante à necessidade de apresentação do Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social, para fins de gratuidade da cessão.
Processo redistribuído a este advogado em razão de férias do advogado prevento.
Em análise primeira foi emitida a NOTA n. 00050/2023/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU, perfilhando o entendimento e conclusão do PARECER n. 00068/2023/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU, que opinou pela possibilidade legal de celebração do contrato de Cessão de Uso Gratuito.
Persistindo à dúvida da SPU/SC quanto à possibilidade somente na hipótese de apresentação pela Cessionária do Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social, em face do PARECER n. 00017/2022/DECOR/CGU/AGU, os autos retornam, com juntada do respectivo parecer.
É o relatório. Passo à análise conclusiva.
II - ANÁLISE E FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA.
Como mencionado na NOTA n. 00050/2023/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU, confirmou-se a temática distinta proposta no PARECER n. 00017/2022/DECOR/CGU/AGU, que se refere à isenção de pagamento de taxa de ocupação, condição inaplicável ao presente caso.
Portanto, sanado o questionamento proposto pela SPU/SC quanto à necessidade de apresentação de Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social, implicando na não aplicabilidade ao caso vertente do entendimento esposado no Parecer do DECOR suscitado pelo órgão assessorado.
Ad argumentandum e para rememorar a análise levada a efeito no PARECER n. 00068/2023/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU, que dá respaldo jurídico, no presente caso, à celebração do Contrato de Cessão de Uso Gratuito, é oportuno transcrever breves trechos de seu teor:
"Num apertado resumo, as questões apresentadas são:
a) Se é cabível o enquadramento no na lei patrimonial da Fundação da Família e Assuntos Comunitários Irmã Vera, fundação pública criada pela Lei Municipal nº 276, de 21 de maio de 1993,
b) Se é aplicável a dispensa de licitação prevista no inciso I, do § 2º, do art. 17 da Lei nº 8.666/93.
Sem mais delongas, passa-se a responder as questões suscitadas (31036444), sendo a primeira:
a) “Solicitamos esclarecimentos relativos ao provável enquadramento legal ou não da entidade acima mencionada conforme legislação abaixo mencionada:
Lei n° 9.636, de 15/05/1998
Art. 18. A critério do Poder Executivo poderão ser cedidos, gratuitamente ou em condições especiais, sob qualquer dos regimes previstos no Decreto-Lei no 9.760, de 1946, imóveis da União a:
I - Estados, Distrito Federal, Municípios e entidades sem fins lucrativos das áreas de educação, cultura, assistência social ou saúde; [...]”
A referida fundação é uma entidade sem fins econômicos, com personalidade jurídica de direito privado, instituída pelo poder público municipal, com autonomia gerencial e financeira, patrimônio próprio e receitas próprias, criada pela Lei Municipal nº 276, de 21 de maio de 1993, cujo novo estatuto foi aprovado pelo Decreto Municipal nº 2282, de 14 de janeiro de 2008, tendo sido considerada de utilidade pública pela Lei Municipal nº 438, de 04 de setembro de 1995.
As fundações públicas de natureza jurídica de direito privado integram a Administração Pública Indireta e têm sua previsão no inciso XIX do art. 37 da Constituição Federal:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
XIX - somente por lei específica poderá ser criada autarquia e autorizada a instituição de empresa pública, de sociedade de economia mista e de fundação, cabendo à lei complementar, neste último caso, definir as áreas de sua atuação; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
A administração indireta é o conjunto de entidades criadas ou autorizadas por lei específica que prestam serviços públicos ou de interesse público. Sua existência se baseia no princípio de descentralização ou distribuição de competências e atividades. Ou seja, quando não pretende executar certa atividade através de seus próprios órgãos, o poder público transfere a sua execução a outras entidades.
Maria Sylvia Zanella di Pietro leciona que a fundação tem natureza pública quando “é instituída pelo poder público com patrimônio, total ou parcialmente público, dotado de personalidade jurídica, de direito público ou privado, e, destinado, por lei, ao desempenho de atividades do Estado na ordem social, com capacidade de autoadministração e mediante controle da Administração Pública, nos limites da lei” (Direito Administrativo, 5ª edição, São Paulo: Atlas, 1995, p. 320).
Dito isso, a fundação pública, ainda que instituída com personalidade jurídica de direito privado, integra, portanto, a administração pública indireta.
A redação do questionado inciso I do art. 18 da Lei nº 9.636/1998, quanto ao enquadramento, é esclarecida pela alínea “a” do inciso II do art. 2º da Portaria SPU nº 144/2001, norma reguladora que estabelece:
Art. 2º As cessões de uso gratuito ou em condições especiais de imóveis da União deverão observar as seguintes destinações:
[...]
II - a Estados e Municípios, para os seguintes fins:
a) uso no serviço público estadual ou municipal, inclusive para entidades vinculadas da Administração Pública indireta, bem como para empresas públicas e de economia mista;
[...]
III - a entidades sem fins lucrativos, de caráter educacional, cultural ou de assistência social, para os seguintes fins:
[...]
Note-se que no art. 2º estão inseridas as entidades públicas. Já o inciso III deixa evidente que as entidades sem fins lucrativos ali previstas são as entidades privadas, uma vez que as fundações públicas sem fins lucrativos se encontram inseridas na alínea “a” acima transcrita.
Assim, de acordo com a norma regulamentar, é possível o enquadramento no inciso I do art. 18 da Lei nº 9.636/1998 c/c a alínea “a” do inciso II do art. 2º da Portaria SPU nº 144/2001.
Quanto à segunda questão:
b) Caso seja possível o enquadramento da entidade mencionada no dispositivo legal citado, resto-nos esclarecer os aspectos relativos à Lei de Licitações. Caberia o enquadramento da dispensa de licitação através do § 2° do art. 17, da Lei de Licitações (Lei 8.666, de 21/06/1993)
A primeira questão praticamente responde a segunda, pois é dispensada licitação, quando o uso se destinar a outro órgão ou entidade da Administração Pública, qualquer que seja a localização do imóvel, conforme o Parecer n° 0837 – 5.4.1/2012/DPC/CONJUR-MP/CGU/AGU (NUP 05550.000031/2010-38), nos seguintes termos:
14. Em última instância, o fato de a cessão de uso não estar expressamente prevista em qualquer dos dispositivos do art. 17 da Lei nº 8.666/1993 não implica na desnecessidade de formalização do ato de dispensa de licitação, mas sim que, em princípio, o procedimento teria que ser realizado pela Administração. A licitação só não é realizada porque a CONJUR firmou interpretação jurídica válida no sentido de que se a Lei dispensa a concorrência para a concessão de um direito real de uso, instrumento que transfere muito mais poderes ao destinatário do bem, obviamente dispensou na hipótese de cessão de uso."
III - CONCLUSÃO
Isto posto, acolho o entendimento do PARECER n. 00068/2023/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU, para adotá-lo no presente caso.
Reconheço afastada a aplicabilidade do PARECER n. 00017/2022/DECOR/CGU/AGU, por entender se tratar de uma outra temática, notadamente, a isenção de taxa de ocupação.
Importante apontar o atendimento da solicitação da SPU/SC através do OFÍCIO SEI Nº 51652/2023/MGI, no que tange a apresentação pela entidade interessada de maior detalhamento do projeto a ser implantado, com juntada do Plano de Trabalho e da demonstração da fonte de recursos financeiros que irão custear a sua execução, conforme documentos SEI 34744777 e 34744772.
É o parecer.
Brasília, 21 de junho de 2023.
SILVINO LOPES DA SILVA
Advogado da União em Roraima-CJU-RR/CGU/AGU
Atenção, a consulta ao processo eletrônico está disponível em https://supersapiens.agu.gov.br mediante o fornecimento do Número Único de Protocolo (NUP) 10154167732202201 e da chave de acesso 5d5f6dd4