ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA DA UNIÃO ESPECIALIZADA VIRTUAL DE PATRIMÔNIO
NÚCLEO JURÍDICO
PARECER n. 00688/2023/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU
NUP: 65402.006710/2023-61
INTERESSADO: E-CJU/PATRIMONIO
ASSUNTO: PROPOSTA DE MINUTA DE ORIENTACAO NORMATIVA
EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO E OUTRAS MATÉRIAS DE DIREITO PÚBLICO. GESTÃO E GOVERNANÇA DO PATRIMÔNIO IMOBILIÁRIO DA UNIÃO. PROPOSTA DE ORIENTACAO NORMATIVA. REGIME JURIDICO DA LEI Nº 14.133, DE 1º DE ABRIL DE 2021. CONCESSAO E PERMISSAO DE USO DE BENS PUBLICOS. LICITACAO. CRITERIO DE JULGAMENTO. MAIOR OFERTA. LACUNA DA LEI. EXISTENCIA DE RESPALDO JURÍDICO PARA QUE O GESTOR PÚBLICO UTILIZE COMO CRITÉRIO DE JULGAMENTO A MAIOR OFERTA NAS LICITAÇÕES VISANDO À CONCESSÃO E A PERMISSÃO DE USO BENS PÚBLICOS DE QUE TRATA O INCISO IV DA LEI Nº 14.133, DE 1º DE ABRIL DE 2021..
Senhor Coordenador
No contexto do processo administrativo NUP nº 65402.006710/2023-61 submetido à análise desta Consultoria Jurídica especializada foram emitidas duas manifestações jurídicas consubstanciadas no PARECER n. 00606/2023/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU e no PARECER n. 00640/2023/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU.
O aludido processo administrativo, oriundo da Base Administrativa da Guarnição de Santa Maria/Exercito Brasileiro/Ministério da Defesa, trata da cessão de uso onerosa sob o regime de arrendamento de parte de imóvel cadastrado como PN RS-03-0348, localizado no Campo de Instrução de Santa Maria (CISM), município de Santa Maria – RS, para fins de exploração pecuária, por meio de procedimento licitatório na modalidade concorrência, do tipo maior oferta, sob o regime jurídico da Lei de Licitações e Contratos nº 14.133, de 2021.
Com relação à modalidade licitatória, a Base Administrativa da Guarnição de Santa adotou o direcionamento proposto na ORIENTAÇÃO NORMATIVA E-CJU/PATRIMÔNIO Nº 06/2023.
Porém, no momento da definição do critério de julgamento o Órgão assessorado licitante se viu diante de dúvida jurídica relevante ao constatar que a nova Lei de Licitações e Contratos deixou brechas no tocante aos contratos ditos de “receita”, de que é exemplo o contrato de cessão de uso sob o regime de arrendamento.
De fato, a análise jurídica empreendida na ocasião do dos opinativos em referência permitiu inferir que as normas procedimentais instituídas pela Lei nº 14.133, de 2021, são voltadas, predominantemente, para os contratos denominados de “despesa,” como as compras, a contratação de serviços, obras e serviços de engenharia, que constituem o meio mais frequente de a Administração Pública suprir as suas próprias necessidades e bem desempenhar sua missão institucional, valendo-se dos recursos públicos arrecadados.
Existem poucas remissões na Lei a respeito dos contratos que promovem o ingresso de valores nos cofres públicos, com se denota da leitura da única regra procedimental sobre contratação que gera receita para o erário:
Art. 110. Na contratação que gere receita e no contrato de eficiência que gere economia para a Administração, os prazos serão de:
I - até 10 (dez) anos, nos contratos sem investimento;
II - até 35 (trinta e cinco) anos, nos contratos com investimento, assim considerados aqueles que impliquem a elaboração de benfeitorias permanentes, realizadas exclusivamente a expensas do contratado, que serão revertidas ao patrimônio da Administração Pública ao término do contrato.
grifos nosso
De outra banda, embora o legislador não tenha se descuidado de incluir hipóteses de destinação de imóveis envolvendo direito real, nos casos de alienação e concessão de direito real de uso de bens (inciso I do artigo 2º), e de utilização compreendendo a transferência do uso e da posse a terceiros, como ocorre na concessão e na permissão de uso de bens públicos (inciso IV, do artigo 2º), não fez constar no artigo 6º da Lei a definição dos institutos jurídicos relacionados no inciso IV, do artigo 2º (concessão e permissão de uso de bens públicos), dando ensejo a incertezas no momento da sua aplicação:
Art. 2º Esta Lei aplica-se a:
I - alienação e concessão de direito real de uso de bens;
II - compra, inclusive por encomenda;
III - locação;
IV - concessão e permissão de uso de bens públicos;
V - prestação de serviços, inclusive os técnico-profissionais especializados;
VI - obras e serviços de arquitetura e engenharia;
VII - contratações de tecnologia da informação e de comunicação.
grifos nossos
Sob a perspectiva da gestão do patrimônio imobiliário da União, os instrumentos jurídicos de destinação instituídos pelas principais normas de regência, notadamente o Decreto-Lei nº 9.760, de1946 e a Lei nº 9.636, de 1998, tem potencial para provocar dúvidas e divergências de interpretação acerca do que estaria albergado na expressão legal: "concessão e permissão de uso de bens públicos".
Nessa senda, impende ponderar que no CAPÍTULO I - DA REGULARIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO ORDENADA - da Lei nº 9.636, de 1998, como o aforamento, a cessão, a permissão de uso, bem como a concessão de uso especial para fins de moradia, encontram-se regulados nas Seções IV, VI, VII e VIII:
SEÇÃO IV
Do Aforamento
Art. 12. Observadas as condições previstas no § 1o do art. 23 e resguardadas as situações previstas no inciso I do art. 5o do Decreto-Lei no 2.398, de 1987, os imóveis dominiais da União, situados em zonas sujeitas ao regime enfitêutico, poderão ser aforados, mediante leilão ou concorrência pública, respeitado, como preço mínimo, o valor de mercado do respectivo domínio útil, estabelecido em avaliação de precisão, realizada, especificamente para esse fim, pela SPU ou, sempre que necessário, pela Caixa Econômica Federal, com validade de seis meses a contar da data de sua publicação.
SEÇÃO VI
Da cessão
Art. 18. A critério do Poder Executivo poderão ser cedidos, gratuitamente ou em condições especiais, sob qualquer dos regimes previstos no Decreto-Lei no 9.760, de 1946, imóveis da União a:
I - Estados, Distrito Federal, Municípios e entidades sem fins lucrativos das áreas de educação,cultura, assistência social ou saúde; (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007)
II - pessoas físicas ou jurídicas, em se tratando de interesse público ou social ou de aproveitamento econômico de interesse nacional. (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007
§ 1o A cessão de que trata este artigo poderá ser realizada, ainda, sob o regime de concessão de direito real de uso resolúvel, previsto no art. 7º do Decreto-Lei nº 271, de 28 de fevereiro de 1967, aplicando-se, inclusive, em terrenos de marinha e acrescidos, dispensando-se o procedimento licitatório para associações e cooperativas que se enquadrem no inciso II do caput deste artigo. (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007)
grifo nosso
Torna-se oportuno abrir um parênteses para observar que o artigo 12 supra transcrito ao delimitar a aplicação do aforamento, tanto no que concerne à modalidade licitatória, quanto ao critério de julgamento, afastou eventuais dúvidas relacionadas ao tema objeto deste estudo, eis que:
a) pode ser instrumentalizado mediante leilão ou concorrência pública;
b) respeitado, como preço mínimo, o valor de mercado do respectivo domínio útil, estabelecido em avaliação de precisão, realizada, especificamente para esse fim, pela SPU ou, sempre que necessário, pela Caixa Econômica Federal, com validade de seis meses a contar da data de sua publicação.
A concessão de direito real de uso resolúvel prevista no art. 7º do Decreto-Lei nº 271, de 28 de fevereiro de 1967, por seu turno, foi incluída na legislação federal como regime específico da cessão de uso, consoante § 1º do artigo 18 da Lei nº 9.636, de 1998.
Já a permissão de uso, localizada na Seção VII, diz respeito à utilização a título precário para realização de eventos de curta duração, in verbis:
SEÇÃO VII
Da Permissão de Uso
Art. 22. A utilização, a título precário, de áreas de domínio da União para a realização de eventos de curta duração, de natureza recreativa, esportiva, cultural, religiosa ou educacional,poderá ser autorizada, na forma do regulamento, sob o regime de permissão de uso, em ato do Secretário do Patrimônio da União, publicado no Diário Oficial da União.
§ 1o A competência para autorizar a permissão de uso de que trata este artigo poderá ser delegada aos titulares das Delegacias do Patrimônio da União nos Estados.
§ 2o Em áreas específicas, devidamente identificadas, a competência para autorizar a permissão de uso poderá ser repassada aos Estados e Municípios, devendo, para tal fim, as áreas envolvidas lhes serem cedidas sob o regime de cessão de uso, na forma do art. 18.
(...)
A concessão de uso especial para fins de moradia figura na Seção VIII aplica-se às áreas de propriedade da União, inclusive aos terrenos de marinha e acrescidos, em benefício de determinada categoria de possuidores ou ocupantes:
Seção VIII
Art. 22-A. A concessão de uso especial para fins de moradia aplica-se às áreas de propriedade da União, inclusive aos terrenos de marinha e acrescidos, e será conferida aos possuidores ou ocupantes que preencham os requisitos legais estabelecidos na Medida Provisória no 2.220, de 4de setembro de 2001. (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)
§ 1o O direito de que trata o caput deste artigo não se aplica a imóveis funcionais.(Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)
§ 2o Os imóveis sob administração do Ministério da Defesa ou dos Comandos da Marinha, do Exército e da Aeronáutica são considerados de interesse da defesa nacional para efeito do disposto no inciso III do caput do art. 5º da Medida Provisória nº 2.220, de 4 de setembro de2001, sem prejuízo do estabelecido no § 1o deste artigo. (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007
grifo nosso
A concessão de uso especial para fins de moradia possui características próprias que a diferenciam dos demais instrumentos de regularização fundiária, com viés de direito real, como determina o art. 1.225, XI, do Código Civil de 2002, com a redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007:
Art. 1.225. São direitos reais:
I - a propriedade;
II - a superfície;
III - as servidões;
IV - o usufruto;
V - o uso;
VI - a habitação;
VII - o direito do promitente comprador do imóvel;
VIII - o penhor;
IX - a hipoteca;
X - a anticrese.
XI - a concessão de uso especial para fins de moradia; (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)
Do endereço eletrônico da Secretaria de Patrimônio da União extraímos as definições alusivas à Concessão de Direito Real de Uso - CDRU e à Concessão de Uso Especial para fins de Moradia – CUEM, que permitem identificar as suas principais diferenças:
8. Concessão de Direito Real de Uso - CDRU
A Concessão de Direito Real de Uso (CDRU) pode ser gratuita ou onerosa (paga), individual ou coletiva.
Trata-se do Contrato Administrativo que transfere direitos reais da propriedade e pode ser transmissível por ato inter vivos e causa mortis.
Prevista no Decreto-Lei nº 271, de 1967 e na Lei nº 9.636, de 1998, pode ser aplicada nos seguintes imóveis e situações:
- em terrenos de marinha e acrescidos (áreas alienáveis);
- em áreas reservadas à provisão habitacional ou regularização fundiária;
- em áreas sujeitas á pressão imobiliária ou áreas objeto de conflitos fundiários;
- no uso sustentável das várzeas e para a segurança da posse de comunidades tradicionais e seus meios de subsistência;
- para fins comerciais, de urbanização ou industrialização.
A CDRU é aceita como garantia real nos contratos de financiamento habitacional e é alternativa à Concessão de Uso Especial para fins de Moradia – CUEM, pois não exige requisitos temporais, de posse, área, renda, entre outros.
9. Concessão de Uso Especial para fins de Moradia – CUEM
A CUEM pode ser outorgada àquele que, até 22 de dezembro de 2016, possuiu como seu, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, até 250 m² de imóvel público situado em área urbana, utilizando-o para sua própria moradia ou de sua família.
A CUEM também pode ser outorgada em caráter coletivo, para famílias de baixa renda, caso em que a fração ideal atribuída a cada possuidor não pode ultrapassar o limite de 250 m².
Prevista na MP nº 2.220, de 2001, e na Lei 11.481, de 2007, (que alterou a redação da Lei nº 9.636, de 1998) visa regularizar a ocupação de áreas públicas urbanas com fins de moradia. É o reconhecimento gratuito do direito subjetivo, com fundamento no art. 183 da Constituição Federal, e deverá ser outorgado, obrigatoriamente, àqueles que atenderem aos requisitos legais.
O Direito à moradia deve ser garantido em outro local quando houver situação de risco à vida ou à saúde dos ocupantes. Nos casos em que a área ocupada for de uso comum do povo, destinada a projeto de urbanização, possuir destinação específica, como defesa nacional, preservação ambiental poderá ser exercida em local diferente daquele em que se encontra a posse.
Relevante assinalar que, via de regra, a Concessão de Uso Especial para fins de Moradia – CUEM é conferida diretamente ao beneficiário por ser o "reconhecimento gratuito do direito subjetivo, com fundamento no art. 183 da Constituição Federal, e deverá ser outorgado, obrigatoriamente, àqueles que atenderem aos requisitos legais". Sucede nessas circunstâncias que a contratação direta não ocasiona os embaraços atinentes ao processo licitatório do ponto de vista do presente contexto processual.
Da mesma característica pode se revestir o contrato de Concessão de Direito Real de Uso (CDRU), como direito real resolúvel, para fins específicos de regularização fundiária de interesse social, urbanização, industrialização, edificação, cultivo da terra, aproveitamento sustentável das várzeas, preservação das comunidades tradicionais e seus meios de subsistência ou outras modalidades de interesse social em áreas urbanas.
Todavia, havendo ambiente e imposição legal para competição, o certame público deve se deflagrado.
Relativamente aos institutos jurídicos inseridos no CAPÍTULO II - DA ALIENAÇÃO, entendemos que não se correlacionam com o inciso IV, do artigo 2º, que cuida especificamente de concessão e permissão de uso de bens públicos.
No campo das manifestações doutrinárias, a matéria ganha contornos menos específicos ainda, conforme consignado por Leandro Sarai e Carolina Zancaner Zockun no Livro: “Tratado da Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos. Lei nº 14.133/2021, comentada por advogados públicos, da Editora JusPODIVM, fls. 50/51:
"Concessão de uso de bem público
Conceitos
A concessão de uso de bem publico foi definida por Di Pietro nas linhas que seguem:"Concessão de uso e o contrato administrativo pelo qual a Administração Pública facultará ao particular a utilização privativa de bem público, para que a exerça conforme a sua destinação. Sua natureza é a de contrato de direito público, sinalagmático, oneroso ou gratuito, comutativo e realizado intuito personae.
Maria Sylvia complementa sua lição esclarecendo que:
a) concessão tem cabimento para bens de maior vulto;
b) forma contratual e mais adequada; e
c) o uso deve ser dar conforme a destinação do bem Celso Antônio Bandeira de Mello, por sua vez, tratou do tema nos seguintes termos:
A concessão de uso de bem público e o contrato administrativo pela qual, como o nome já o indica, a Administração trespassa a alguém o uso de um bem público para uma finalidade específica. Se o Poder Público, instado por conveniências administrativas, pretender rescindi-la antes do termo estipulado terá de indenizar o concessionário.
Sendo assim, dado que a Lei nº 14.133, de 2021, estabelece normas gerais de licitação e contratação para as Administrações Públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e considerando que o princípio da especialidade informa que a norma especial afasta ou complementa a incidência da norma geral, e considerando, ainda, que o termo "concessão", isoladamente, não tem regulamentação federal, é possível concluir, pelo menos nesta primeira abordagem, que a expressão "concessão e permissão de uso de bens públicos", pode abranger os tipos de destinação do imóvel da União a terceiros previstos nas principais normas de regência sobre patrimônio imobiliário da União, a exemplo do Decreto-Lei nº 9.760, de 1946 e da Lei nº 9.636, de 1998, exceto o aforamento que possui regramento próprio e suficiente para sua execução, e as outras formas de alienação por não se incluirem no inciso IV do artigo 2º da citada Lei .
No que concerne à permissão de uso de bem público, parece-nos que a clareza do artigo 22 da Lei nº 9.636, de 1998 tem o condão de afastar a necessidade de reflexões adicionais.
Assim, superada a questão de natureza conceitual, resta enfrentar, agora, a lacuna legislativa referente ao critério de julgamento, para fins de destinação de imóveis da União, motivo pelo qual a adequada estruturação do certame demanda particular atenção dos gestores públicos na condução dos processos licitatórios.
Tal contexto demanda interpretação jurídica que propicie conciliar a aplicação das normas gerais de licitação e contratação para as Administrações Públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios com a legislação específica sobre administração bens imóveis desses mesmos entes, quando existentes.
No caso de imóveis de domínio da União, essa tarefa se torna fundamental, a fim de que os órgãos competentes não sejam restringidos, de forma ilógica e distante da realidade fática, no exercício de suas atividades de administração patrimonial, a partir da leitura meramente literal do diploma legal em comento, a nova LLC.
Sendo assim, antes de tudo, vejamos as modalidades licitatórias instituídas pela LLC:
Art. 28. São modalidades de licitação:
I - pregão;
II - concorrência;
III - concurso;
IV - leilão;
V - diálogo competitivo.
§ 1º Além das modalidades referidas no caput deste artigo, a Administração pode servir-se dos procedimentos auxiliares previstos no art. 78 desta Lei.
§ 2º É vedada a criação de outras modalidades de licitação ou, ainda, a combinação daquelas referidas no caput deste artigo.
Art. 29. A concorrência e o pregão seguem o rito procedimental comum a que se refere o art. 17 desta Lei, adotando-se o pregão sempre que o objeto possuir padrões de desempenho e qualidade que possam ser objetivamente definidos pelo edital, por meio de especificações usuais de mercado.
Parágrafo único. O pregão não se aplica às contratações de serviços técnicos especializados de natureza predominantemente intelectual e de obras e serviços de engenharia, exceto os serviços de engenharia de que trata a alínea “a” do inciso XXI do caput do art. 6º desta Lei.
E, na sequência, a aplicabilidade de cada modalidade segundo a contratação almejada:
Art. 6º Para os fins desta Lei, consideram-se:
(...)
XXXVIII - concorrência: modalidade de licitação para contratação de bens e serviços especiais e de obras e serviços comuns e especiais de engenharia, cujo critério de julgamento poderá ser:
a) menor preço;
b) melhor técnica ou conteúdo artístico;
c) técnica e preço;
d) maior retorno econômico;
e) maior desconto;
(...)
XXXIX - concurso: modalidade de licitação para escolha de trabalho técnico, científico ou artístico, cujo critério de julgamento será o de melhor técnica ou conteúdo artístico, e para concessão de prêmio ou remuneração ao vencedor;
XL - leilão: modalidade de licitação para alienação de bens imóveis ou de bens móveis inservíveis ou legalmente apreendidos a quem oferecer o maior lance;
XLI - pregão: modalidade de licitação obrigatória para aquisição de bens e serviços comuns, cujo critério de julgamento poderá ser o de menor preço ou o de maior desconto;
XLII - diálogo competitivo: modalidade de licitação para contratação de obras, serviços e compras em que a Administração Pública realiza diálogos com licitantes previamente selecionados mediante critérios objetivos, com o intuito de desenvolver uma ou mais alternativas capazes de atender às suas necessidades, devendo os licitantes apresentar proposta final após o encerramento dos diálogos;
Quanto ao critério de julgamento, cabe esmiuçar o que estabelece o indigitado diploma legal.
A concorrência, que se destina à contratação de bens e serviços especiais e de obras e serviços comuns e especiais de engenharia, goza de definição legal quanto ao critério de julgamento a ser utilizado, conforme inciso XXXVIII do artigo 6º:
a) menor preço;
b) melhor técnica ou conteúdo artístico;
c) técnica e preço;
d) maior retorno econômico;
e) maior desconto.
Como se infere, não há no elenco do inciso a previsão do critério da maior oferta, o que, em princípio, inviabilizaria a utilização da concorrência.
Entretanto, cabe rememorar que os contratos de destinação/utilização de imóveis da União (receita) tem como objetivo alcançar como contrapartida o maior valor possível pela disponibilização do bem, que será incorporada ao orçamento como receita pública.
Ao contrário, nos contratos de despesa (compras, serviços e obras e serviços de engenharia) a Administração Pública busca desembolsar o menor valor (despesa), e com isso, a mínima oneração possível no Orçamento Público.
Escapou ao legislador, como se denota, considerando a distinção entre os contratos de despesa e os de receita, o detalhamento das normas procedimentais destinadas às licitações visando ao ingresso de receitas públicas, onde a meta é auferir o maior valor pela destinação do bem.
Por conseguinte, se a meta é auferir o maior valor, o critério de julgamento deve viabilizar tal aspecto da contratação.
A dificuldade aqui noticiada se repete nas demais modalidades licitatórias, com exceção do leilão, como será demonstrado na sequência.
O concurso e o diálogo competitivo não são modalidades coadunáveis com as contratações em apreço, consoante se retira das definições realçadas nas linhas precedentes.
O leilão consiste em modalidade de licitação destinada à alienação de bens imóveis ou de bens móveis inservíveis ou legalmente apreendidos, sendo a única modalidade em que se utiliza o critério de julgamento do maior lance, justamente em virtude de a Administração Pública pretender lograr o maior valor possível.
Afora a expressa previsão legal de que o leilão se reserva à alienação de bens imóveis ou de bens móveis inservíveis ou legalmente apreendidos, é preciso destacar, também, que o leilão dispensa o registro cadastral prévio e a fase de habilitação, dependendo, ainda, da expedição de regulamento, in verbis:
Art. 31. O leilão poderá ser cometido a leiloeiro oficial ou a servidor designado pela autoridade competente da Administração, e regulamento deverá dispor sobre seus procedimentos operacionais.
§ 1º Se optar pela realização de leilão por intermédio de leiloeiro oficial, a Administração deverá selecioná-lo mediante credenciamento ou licitação na modalidade pregão e adotar o critério de julgamento de maior desconto para as comissões a serem cobradas, utilizados como parâmetro máximo os percentuais definidos na lei que regula a referida profissão e observados os valores dos bens a serem leiloados.
§ 2º O leilão será precedido da divulgação do edital em sítio eletrônico oficial, que conterá:
I - a descrição do bem, com suas características, e, no caso de imóvel, sua situação e suas divisas, com remissão à matrícula e aos registros;
II - o valor pelo qual o bem foi avaliado, o preço mínimo pelo qual poderá ser alienado, as condições de pagamento e, se for o caso, a comissão do leiloeiro designado;
III - a indicação do lugar onde estiverem os móveis, os veículos e os semoventes;
IV - o sítio da internet e o período em que ocorrerá o leilão, salvo se excepcionalmente for realizado sob a forma presencial por comprovada inviabilidade técnica ou desvantagem para a Administração, hipótese em que serão indicados o local, o dia e a hora de sua realização;
V - a especificação de eventuais ônus, gravames ou pendências existentes sobre os bens a serem leiloados.
§ 3º Além da divulgação no sítio eletrônico oficial, o edital do leilão será afixado em local de ampla circulação de pessoas na sede da Administração e poderá, ainda, ser divulgado por outros meios necessários para ampliar a publicidade e a competitividade da licitação.
§ 4º O leilão não exigirá registro cadastral prévio, não terá fase de habilitação e deverá ser homologado assim que concluída a fase de lances, superada a fase recursal e efetivado o pagamento pelo licitante vencedor, na forma definida no edital.
grifos nossos
Digno de registro o advento do Decreto nº 11.461, de 31 de março de 2023, que regulamentou o art. 31 da Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021. No entanto, o ato normativo somente dispôs sobre os procedimentos operacionais da licitação na modalidade leilão, na forma eletrônica, para alienação de bens móveis inservíveis ou legalmente apreendidos, não abrangendo a alienação de bens imóveis, esta ainda pendente de regulamento específico.
A peculiaridade de o leilão se prestar como meio de alienação bens imóveis, em princípio, já afastaria a sua aplicação na concessão e permissão de uso de bens públicos, porque, como visto, partimos do pressuposto de que os referidos institutos jurídicos não envolvem a venda de bens da União.
Entretanto, vislumbramos empecilho de outra ordem, que consiste na supressão da fase de habilitação prevista no artigo 31, § 4º.
Em geral, os contratos de cessão de uso pelo regime de arrendamento para atividade pecuária (aqui adotados como paradigma para efeito de argumentação) se estendem por um longo período, que pode chegar a 20 anos, tornando fundamental a etapa da habilitação dos licitantes, projetando-se também para a execução contratual, durante a qual o contratado assume a obrigação de manter as condições exigidas para a habilitação na licitação, conforme artigo 92, in verbis:
Art. 92. São necessárias em todo contrato cláusulas que estabeleçam:
(...)
XVI - a obrigação do contratado de manter, durante toda a execução do contrato, em compatibilidade com as obrigações por ele assumidas, todas as condições exigidas para a habilitação na licitação, ou para a qualificação, na contratação direta;
O contexto acima evidencia o impasse decorrente da imprecisão das normas gerais sobre licitação e contratos, quando se trata da sua aplicação na esfera da administração patrimonial da União, recomendando que esta Consultoria especializada elabore orientação jurídica que possa servir de suporte à prática dos atos administrativos a cargo dos gestores públicos.
Nessa trilha, recorremos, inicialmente, à lição de Leandro Sarai e Carolina Zancaner Zockun encontrada no Livro: “Tratado da Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos. Lei nº 14.133/2, 1 comentada por advogados públicos, da Editora JusPODIVM, fls. 22/23, cujo enfoque constitui a utilização de técnicas interpretativas que ampliem as alternativas do gestor para atender da melhor maneira possível o interesse público:
“Para a nova Lei alcançar seus objetivos, nas situações em que houver dúvida razoável quanto às alternativas do gestor, não seria sábio optar pelo caminho que amplie essas alternativas?
O art. 5º da Lei nitidamente orienta que se busque a melhor contratação e, em suma, que se atenda da melhor maneira possível o interesse público. Uma restrição baseada numa interpretação literal e que não tenha finalidade compatível com os princípios do art. 5º ou com os objetivos do artigo 11 mereceria prevalecer?
Havendo mais de uma possibilidade interpretativa valida, de que se vale adotar a interpretação mais restritiva se dela não se puder extrair nenhuma finalidade social? ....
(..)
Ainda nesse tópico introdutório, é preciso ressaltar que a concepção do princípio da legalidade segundo o qual o gestor somente pode fazer o que a lei o obriga e em alguns casos incompatível com um Estado de Direito cuja Constituição exige transformação para superar os desafios atuais e para alcançar o desenvolvimento nacional e os demais objetivos constitucionais (art. 3º da Constituição). O princípio da legalidade somente pode ser entendido como vedação geral para o gestor agir sem determinação expressa quando se esta diante de uma situação em que se discute a possibilidade de restrição a direitos fundamentais ou a disposição gratuita do erário, ou seja, como proteção do cidadão contra o abuso do Estado. Contudo, quando a ação do gestor é necessária para concretização desses direitos, a interpretação da lei, quando houver dúvida quanto ao sentido da norma, não deveria ser resolvida no sentido que permita referida ação?
Tal como ventilado no escólio em destaque, o artigo 5º da Lei nº 14.133, de 2021, autoriza o uso das disposições do Decreto-Lei nº 4.657, de 4 de setembro de 1942 (Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro), que preconiza expressamente:
Art. 5º Na aplicação desta Lei, serão observados os princípios da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da publicidade, da eficiência, do interesse público, da probidade administrativa, da igualdade, do planejamento, da transparência, da eficácia, da segregação de funções, da motivação, da vinculação ao edital, do julgamento objetivo, da segurança jurídica, da razoabilidade, da competitividade, da proporcionalidade, da celeridade, da economicidade e do desenvolvimento nacional sustentável, assim como as disposições do Decreto-Lei nº 4.657, de 4 de setembro de 1942 (Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro).
O Decreto-Lei nº 4.657, Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro - LINDB - , que remonta ao ano de 1942, estabelece, atualmente, os alicerces do nosso sistema jurídico, abarcando diretrizes a serem observadas em todos os ramos do Direito.
Entre as diretrizes contempladas na LINDB interessa realçar a adoção de parâmetros sobre hermenêutica visando à integração do ordenamento jurídico, sobretudo a partir das modificações introduzidas pela Lei nº 13.655, de 2018, marco importante sob a perspectiva da atuação na esfera administrativa.
Dentro desses limites, a LINDB visou garantir mais eficiência e racionalidade às decisões da Administração Pública, admitindo a valoração das consequências práticas das escolhas empreendidas pelo gestor público, considerando os obstáculos e as dificuldades reais e as exigências das políticas públicas a seu cargo.
Importante destacar os dispositivos que se conectam com o atuar do agente público:
Art. 20. Nas esferas administrativa, controladora e judicial, não se decidirá com base em valores jurídicos abstratos sem que sejam consideradas as consequências práticas da decisão. (Incluído pela Lei nº 13.655, de 2018) (Regulamento)
Parágrafo único. A motivação demonstrará a necessidade e a adequação da medida imposta ou da invalidação de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa, inclusive em face das possíveis alternativas. (Incluído pela Lei nº 13.655, de 2018)
Art. 21. A decisão que, nas esferas administrativa, controladora ou judicial, decretar a invalidação de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa deverá indicar de modo expresso suas consequências jurídicas e administrativas. (Incluído pela Lei nº 13.655, de 2018) (Regulamento)
Parágrafo único. A decisão a que se refere o caput deste artigo deverá, quando for o caso, indicar as condições para que a regularização ocorra de modo proporcional e equânime e sem prejuízo aos interesses gerais, não se podendo impor aos sujeitos atingidos ônus ou perdas que, em função das peculiaridades do caso, sejam anormais ou excessivos. (Incluído pela Lei nº 13.655, de 2018)
Art. 22. Na interpretação de normas sobre gestão pública, serão considerados os obstáculos e as dificuldades reais do gestor e as exigências das políticas públicas a seu cargo, sem prejuízo dos direitos dos administrados. (Regulamento)
§ 1º Em decisão sobre regularidade de conduta ou validade de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa, serão consideradas as circunstâncias práticas que houverem imposto, limitado ou condicionado a ação do agente. (Incluído pela Lei nº 13.655, de 2018)
§ 2º Na aplicação de sanções, serão consideradas a natureza e a gravidade da infração cometida, os danos que dela provierem para a administração pública, as circunstâncias agravantes ou atenuantes e os antecedentes do agente. (Incluído pela Lei nº 13.655, de 2018)
§ 3º As sanções aplicadas ao agente serão levadas em conta na dosimetria das demais sanções de mesma natureza e relativas ao mesmo fato. (Incluído pela Lei nº 13.655, de 2018)
Art. 23. A decisão administrativa, controladora ou judicial que estabelecer interpretação ou orientação nova sobre norma de conteúdo indeterminado, impondo novo dever ou novo condicionamento de direito, deverá prever regime de transição quando indispensável para que o novo dever ou condicionamento de direito seja cumprido de modo proporcional, equânime e eficiente e sem prejuízo aos interesses gerais. (Regulamento)
Parágrafo único. (VETADO). (Incluído pela Lei nº 13.655, de 2018)
Art. 24. A revisão, nas esferas administrativa, controladora ou judicial, quanto à validade de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa cuja produção já se houver completado levará em conta as orientações gerais da época, sendo vedado que, com base em mudança posterior de orientação geral, se declarem inválidas situações plenamente constituídas. (Incluído pela Lei nº 13.655, de 2018) (Regulamento)
Parágrafo único. Consideram-se orientações gerais as interpretações e especificações contidas em atos públicos de caráter geral ou em jurisprudência judicial ou administrativa majoritária, e ainda as adotadas por prática administrativa reiterada e de amplo conhecimento público. (Incluído pela Lei nº 13.655, de 2018)
Art. 25. (VETADO). (Incluído pela Lei nº 13.655, de 2018)
Art. 26. Para eliminar irregularidade, incerteza jurídica ou situação contenciosa na aplicação do direito público, inclusive no caso de expedição de licença, a autoridade administrativa poderá, após oitiva do órgão jurídico e, quando for o caso, após realização de consulta pública, e presentes razões de relevante interesse geral, celebrar compromisso com os interessados, observada a legislação aplicável, o qual só produzirá efeitos a partir de sua publicação oficial. (Incluído pela Lei nº 13.655, de 2018) (Regulamento)
O disposto do art. 22 preconiza com ineditismo que na interpretação das normas sobre gestão pública sejam considerados os obstáculos e as dificuldades reais do gestor e as exigências das políticas públicas a seu cargo, sem prejuízo dos direitos dos administrados.
No caso submetido ao crivo desta Consultoria, que redundou na proposição da presente orientação normativa, a dificuldade real do gestor restou materializada no momento da definição do critério de julgamento na concorrência pública, tendo em vista a omissão da Lei.
Vale registrar que a prorrogação da vigência da Lei nº 8.666, de 1993 até 30 de dezembro de 1993 tem sido utilizada como atalho para evitar o enfrentamento dessa e de outras questões.
Talvez, isso tenha concorrido para a parca produção de material doutrinário ou jurisprudencial sob a ótica da nova LLC. que, suspeitamos, ganhará corpo e relevância quando ocorrer o término da vigência da Lei nº 8.666, de 1993.
Inobstante, foi possível notar que já existem interpretações divergentes envolvendo o assunto.
Em pesquisa realizada na internet, o Tribunal de Contas do Estado do Paraná, em deliberação proferida em 20 de julho de 2023 decidiu que "É possível a utilização do pregão negativo - por maior preço - nas licitações destinadas à concessão de uso de bem público, de acordo com as disposições da Lei nº 10.520/02 (Lei do Pregão) e da Lei nº 14.133/2021":
Processo nº 7595/22
Acordão nº : 1657/23 - Tribunal Pleno
Entidade: Município de Tomazina
Relator: Conselheiro José Durval Mattos do Amaral
É possível a utilização do pregão negativo - por maior preço - nas licitações destinadas à concessão de uso de bem público, de acordo com as disposições da Lei nº 10.520/02 (Lei do Pregão) e da Lei nº 14.133/2021 (Nova Lei de Licitações e Contratos), cuja vigência foi postergada para 30 de dezembro de 2023. Essas leis não alteraram a figura do pregão por maior preço, que segue nos mesmos termos já fixados pela jurisprudência e pela doutrina.
Essa é a orientação do Pleno do Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR), em resposta à Consulta formulada pelo Município de Tomazina, por meio da qual questionou sobre a possibilidade da utilização do pregão por maior preço, também chamado de pregão negativo, nas licitações destinadas à concessão de uso de bens públicos.
A Equipe Técnica da Zênite, no Blog Zênite, publicado em 30 de junho de 2022, entendeu de modo diverso, ao afirmar que as licitações para concessões e permissões de uso de bens públicos, de acordo com a sistemática implantada pela Lei nº 14.133/2021, deverão ser processadas pela modalidade leilão:
“DIRETO AO PONTO
(…) concluímos que a Lei nº 14.133/2021 aplica-se aos casos de concessões e permissões de uso de bens públicos. E, seguindo a opção literal da nova Lei, deve ser adotado critério de julgamento “maior lance” e pela modalidade leilão.
Na argumentação, a Zenite, pontua que:
Ainda que essa tenha sido a opção literal da Lei nº 14.133/2021, não se afasta a adoção do pregão por maior lance, em função de prática já consolidada.”
Apesar da previsão expressa estabelecendo a aplicação da Lei nº 14.133/2021 aos casos de concessões e permissões de uso de bens públicos, não foi instituída qualquer disciplina ou procedimento específico para esses casos.
Em vista desse silêncio e considerando que, em geral, as licitações para concessões e permissões de uso de bens públicos adotam o critério de julgamento de maior lance, de acordo com a sistemática implantada pela Lei nº 14.133/2021, as licitações para esse fim deverão ser processadas pela modalidade leilão."
Tais entendimentos revelam que as lacunas identificadas na nova LLC possuem o condão de elevar o nível de insegurança na atuação dos gestores públicos.
Nessa conjuntura, a autoridade pública deve permanecer atenta para as consequências práticas de suas decisões, demonstrando expressa e justificadamente no processo administrativo que ponderou os seus efeitos, antevendo, inclusive, as repercussões negativas na hipótese de a lacuna legislativa representar efetivo obstáculo ao pleno exercício de suas competências institucionais.
Por fim, diante da falta de previsão legal expressa acerca do critério de julgamento compatível com a licitação visando à formalização do contrato de destinação de imóveis da União, (exceto o aforamento e a alienação), indagar-se-ia se tal omissão constituiria argumento lógico, plausível e suficiente para justificar a inação do Órgão assessorado.
À vista dos fundamentos expostos, entendemos que não.
Sendo assim, no intuito de orientar a atuação dos Órgãos assessorado sugerimos a presente minuta da Orientação Normativa que aborda o critério de julgamento a ser utilizado na concorrência pública visando à concessão e permissão de uso de bem público, para a apreciação e pronunciamento dos membros da e-CJU/Patrimônio:
ORIENTAÇÃO NORMATIVA E-CJU/PATRIMÔNIO Nº XXXX/2023
CONSIDERANDO A ORIENTAÇÃO NORMATIVA E-CJU/PATRIMÔNIO Nº 06/2023, OBSERVADOS OS PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE, DA IMPESSOALIDADE, DA MORALIDADE, DA PUBLICIDADE, DA EFICIÊNCIA, DO INTERESSE PÚBLICO, DA PROBIDADE ADMINISTRATIVA, DA IGUALDADE, DO PLANEJAMENTO, DA TRANSPARÊNCIA, DA EFICÁCIA, DA SEGREGAÇÃO DE FUNÇÕES, DA MOTIVAÇÃO, DA VINCULAÇÃO AO EDITAL, DO JULGAMENTO OBJETIVO, DA SEGURANÇA JURÍDICA, DA RAZOABILIDADE, DA COMPETITIVIDADE, DA PROPORCIONALIDADE, DA CELERIDADE, DA ECONOMICIDADE E DO DESENVOLVIMENTO NACIONAL SUSTENTÁVEL, ASSIM COMO AS DISPOSIÇÕES DO DECRETO-LEI Nº 4.657, DE 4 DE SETEMBRO DE 1942 (LEI DE INTRODUÇÃO ÀS NORMAS DO DIREITO BRASILEIRO) E DO DECRETO Nº 9.830, DE 10 DE JUNHO DE 2019, HÁ RESPALDO JURIDICO PARA QUE O GESTOR PUBLICO UTILIZE COMO CRITÉRIO DE JULGAMENTO A MAIOR OFERTA NAS LICITACOES VISANDO À CONCESSAO E PERMISSAO DE USO BENS PUBLICOS DE QUE TRATA O INCISO IV DA LEI Nº 14.133, DE 1º DE ABRIL DE 2021.
1. A Lei nº 14.133, de 2021, de 1º de abril de 2021, Lei de Licitações e Contratos Administrativos – LLC- prevê expressamente no artigo 2º, inciso IV, a sua aplicação nas hipóteses de concessão e permissão de uso de bens públicos;
2. No entanto, as normas procedimentais instituídas pela Lei nº 14.133, de 2021, são voltadas predominantemente para os contratos denominados de “despesa,” como as compras, a contratação de serviços, obras e serviços de engenharia, que constituem o meio mais frequente de a Administração Pública suprir as suas próprias necessidades e bem desempenhar sua missão institucional, valendo-se dos recursos públicos antecipadamente arrecadados.
3. Existem poucas remissões na Lei a respeito dos contratos que promovem o ingresso de valores nos cofres públicos, com se denota da leitura da única regra procedimental sobre contratação que gera receita para o erário.
4. Embora o legislador não tenha se descuidado de incluir hipóteses de destinação de imóveis envolvendo direito real, nos casos de alienação e concessão de direito real de uso de bens, e de utilização, compreendendo a transferência do uso e da posse a terceiros como ocorre na concessão e na permissão de uso de bens públicos, não fez constar no artigo 6º da Lei a definição dos institutos jurídicos relacionados no inciso IV, do artigo 2º (concessão e permissão de uso de bens públicos), dando ensejo a incertezas no momento da sua aplicação.
5. Sob a perspectiva da gestão do patrimônio imobiliário da União, os instrumentos jurídicos de destinação instituídos pelas principais normas de regência, notadamente o Decreto-Lei nº 9.760, de1946 e a Lei nº 9.636, de 1998, tem potencial para provocar dúvidas e divergências de interpretação acerca do que estaria albergado na expressão legal: "concessão e permissão de uso de bens públicos"
6. Sendo assim, dado que a Lei nº 14.133, de 2021, estabelece normas gerais de licitação e contratação para as Administrações Públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e considerando que o princípio da especialidade informa que a norma especial afasta ou complementa a incidência da norma geral, e considerando, ainda, que o termo "concessão", isoladamente, não tem regulamentação federal, é possível concluir, pelo menos nesta primeira abordagem, que a expressão "concessão e permissão de uso de bens públicos", pode abranger os tipos de destinação do imóvel da União a terceiros previstos nas principais normas de regência sobre patrimônio imobiliário da União, a exemplo do Decreto-Lei nº 9.760, de 1946 e da Lei nº 9.636, de 1998, exceto o aforamento que possui regramento próprio e suficiente para sua execução, e as outras formas de alienação por não se incluirem no inciso IV do artigo 2º da citada Lei .
7. No que concerne especificamente ao critério de julgamento a ser utilizado nas modalidades licitatórias, escapou ao legislador, considerando a distinção entre os contratos de despesa e os de receita, o detalhamento das normas procedimentais visando ao ingresso de receitas públicas, onde a meta é auferir o maior valor pela destinação do bem.
8. A dificuldade se refere a todas as modalidades licitatórias, com exceção do leilão, que consiste na modalidade de licitação destinada à alienação de bens imóveis ou de bens móveis inservíveis ou legalmente apreendidos, em que se utiliza o critério de julgamento do maior lance, justamente em virtude de a Administração Pública almejar a obtenção do maior valor possível pela venda do bem.
9. Entretanto, a peculiaridade de o leilão se prestar como meio de alienação bens imóveis, em princípio, já afastaria a sua aplicação nas hipóteses de concessão e permissão de uso de bens públicos, uma vez que os referidos institutos jurídicos não envolvem a venda de bens da União.
10. Afora a expressa previsão legal de que o leilão se aplica à alienação de bens imóveis, a modalidade dispensa o registro cadastral prévio e a fase de habilitação (art. 31, § 4º da LCC), etapa fundamental nas licitações visando às contratações que se prolongam no tempo, de que é exemplo a cessão de uso sob o regime de arrendamento, durante a qual o contratado assume a obrigação de manter as condições exigidas para a habilitação na licitação (artigo 92, da LCC),
11. Deste modo, não havendo entre os dispositivos da LLC norma compatível com as características do contrato cujo objeto constitui a destinação de bens imóveis da União a terceiros, justifica-se recorrer a regras de interpretação jurídica que possibilitem conciliar a aplicação das normas gerais de licitação e contratação para as Administrações Públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios com a legislação especial sobre administração bens imóveis desses mesmos entes, quando existentes, consoante artigo 5º da Lei nº 14.133, de 2021, que autoriza o uso das disposições do Decreto-Lei nº 4.657, de 4 de setembro de 1942 (Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro).
12. O Decreto-Lei nº 4.657, de 1942, Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro - LINDB - com as alterações promovidas pela Lei nº 13.655, de 2018, visou garantir mais eficiência e racionalidade às decisões da Administração Pública, admitindo de forma clara a valoração das consequências práticas das escolhas empreendidas pelo gestor público, considerando os obstáculos e as dificuldades reais e as exigências das políticas públicas a seu cargo.
13. Nesse cenário, a ausência de previsão normativa acerca do critério de julgamento, por si só, não pode ser utilizada como argumento lógico, plausível e suficiente para justificar a inação do gestor público, a quem cabe permanecer atento às consequências práticas de suas decisões, demonstrando expressa e justificadamente no processo administrativo que ponderou os seus efeitos, antevendo, inclusive, as repercussões negativas na hipótese de a lacuna legislativa representar obstáculo razoável ao pleno exercício de suas competências institucionais.
14. Assim, considerando a ORIENTAÇÃO NORMATIVA E-CJU/PATRIMÔNIO Nº 06/2023, observados os princípios da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da publicidade, da eficiência, do interesse público, da probidade administrativa, da igualdade, do planejamento, da transparência, da eficácia, da segregação de funções, da motivação, da vinculação ao edital, do julgamento objetivo, da segurança jurídica, da razoabilidade, da competitividade, da proporcionalidade, da celeridade, da economicidade e do desenvolvimento nacional sustentável, assim como as disposições do Decreto-Lei nº 4.657, de 4 de setembro de 1942 (Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro) e do Decreto nº 9.830, de 10 de junho de 2019, há respaldo jurídico para que o gestor público utilize como critério de julgamento a maior oferta nas licitações visando à concessão e a permissão de uso bens públicos, de que trata o inciso IV da Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021.
Referências: PARECER n. 00606/2023/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU. PARECER n. 00640/2023/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU - NUP: 65402.006710/2023-61
À consideração superior.
São Paulo, 12 de setembro de 2023.
LUCIANA MARIA JUNQUEIRA TERRA
ADVOGADA DA UNIÃO
Atenção, a consulta ao processo eletrônico está disponível em https://supersapiens.agu.gov.br mediante o fornecimento do Número Único de Protocolo (NUP) 65402006710202361 e da chave de acesso 4f0cc45c