ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA DA UNIÃO ESPECIALIZADA VIRTUAL DE PATRIMÔNIO
NÚCLEO JURÍDICO

PARECER n. 00787/2023/NUCJUR/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU

 

NUP: 05080.019795/1954-12

INTERESSADOS: SUPERINTENDÊNCIA DO PATRIMÔNIO DA UNIÃO NO ESTADO DA BAHIA (SPU/BA)(CJU-BA)

ASSUNTOS: UTILIZAÇÃO DE BENS PÚBLICOS

 

EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO E OUTRAS MATÉRIAS DE DIREITO PÚBLICO. BENS PÚBLICOS. GESTÃO E GOVERNANÇA DO PATRIMÔNIO IMOBILIÁRIO DA UNIÃO. PROCEDIMENTOS ADMINISTRATIVOS. ORIENTAÇÃO JURÍDICA, CONSULTA FORMULADA.
I - Dúvida quanto a dominialidade de imóvel denominado como Terreno Foreiro à Fazenda Nacional Interior;
II - Imóvel situado dentro de uma circunferência de 1.320 (mil trezentos e vinte) metros de raio em torno do 4° G.M.A.C., e fora da faixa de 100,00m do litoral;
III - Domínio da União;
IV - Fundamentação Legal: Art. 1°, "l", da Lei n° 9.760/46 e Art. 20, "I", da CF/88.

 

I - RELATÓRIO

 

A Superintendência do Patrimônio da União no Estado da Bahia - SPU/BA, encaminhou os autos do processo em epígrafe a esta Consultoria Jurídica com o objetivo de sanear dúvida quanto a fundamentação legal ou motivação para a incorporação do imóvel ao domínio da União sob a conceituação Nacional Interior.

 

Os autos foram encaminhados a esta Consultoria Jurídica tramitam na forma exclusivamente digital, através dos link's:  <https://sei.economia.gov.br/sei/processo_acesso_externo_consulta.php?id_acesso_externo=2971096&infra_hash=67cd1ba61892b3ec341e6be490aeb2d2>, <https://sei.economia.gov.br/sei/processo_acesso_externo_consulta.php?id_acesso_externo=2971154&infra_hash=a69bdcd0381b809f6a1ed493191f290a>, e <https://sei.economia.gov.br/sei/processo_acesso_externo_consulta.php?id_acesso_externo=2971155&infra_hash=f66e5709d7e973734ba55164780d3957>, de acesso SEI, instruídos destacadamente com os seguintes documentos:

Trata-se de imóvel conceituado como Terreno Foreiro a Fazenda Nacional, em que, não restou demonstrado na Certidão de Inteiro Teor (30659268a fundamentação legal ou motivação para a incorporação do imóvel ao domínio da União sob a conceituação Nacional Interior, referente a Matrícula n° 17.675 do Imóvel.

 

Os autos foram encaminhados a esta Consultoria, através do OFÍCIO SEI Nº 103881/2023/MGI (37247295), de 13 de setembro de 2023, e foram regularmente distribuídos.

 

É o que se tem a relatar. Passa-se a opinar.

 

II - ANÁLISE E FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA

 

Esta manifestação jurídica tem a finalidade de assistir a autoridade assessorada no controle interno da legalidade administrativa. A função do órgão de consultoria é apontar possíveis riscos do ponto de vista jurídico e recomendar providências para salvaguardar o Gestor Público, a quem compete avaliar a real dimensão do risco e a necessidade de se adotar ou não a precaução recomendada.

 

Importante salientar que o exame dos autos cinge-se aos aspectos jurídicos, excluídos, portanto, aqueles de natureza técnica e/ou financeira. Em relação a estes, partiremos da premissa de que a autoridade assessorada municiou-se dos conhecimentos específicos imprescindíveis para a sua adequação às necessidades da Administração, observando os requisitos legalmente impostos.

 

De outro lado, cabe esclarecer que não é papel do órgão de assessoramento jurídico exercer a auditoria quanto à competência de cada agente público para a prática de atos administrativos. Incumbe, isto sim, a cada um destes, observar se os seus atos estão dentro do seu limite de competências.

 

Destaque-se que determinadas observações são feitas sem caráter vinculativo, mas em prol da segurança da própria autoridade assessorada, a quem compete, dentro da margem de discricionariedade que lhe é conferida por lei, avaliar e acatar, ou não, tais ponderações. Não obstante, as questões relacionadas à legalidade serão apontadas para fins de sua correção. O seguimento do processo sem a observância destes apontamentos será de responsabilidade exclusiva do(s) agente(s) público(s) envolvido(s).

 

Assim, caberá tão somente a esta Consultoria, à luz do art. 131 da Constituição Federal de 1988 e art. 11, inciso V, da Lei Complementar nº 73/1993, que trata da Lei Orgânica da Advocacia Geral da União - AGU e dá outras providências, c/c art. 1º, V, § 5º, da Portaria AGU nº 14, de 23 de janeiro de 2020, prestar assessoramento sob o enfoque estritamente jurídico, não sendo competência deste órgão consultivo o exame da matéria em razão das motivações técnica e econômica, nem da oportunidade e conveniência, tampouco fazer juízo crítico sobre cálculos e avaliações, ou mesmo invadir o campo relacionado à necessidade material no âmbito do órgão assessorado.

 

No que tange ao objeto da consulta em tela, faz-se necessário destacar que o Decreto-Lei n° 9.760, de 5 de setembro de 1946, ao tratar sobre os bens imóveis da União, dispôs:

 

Art. 1º Incluem-se entre os bens imóveis da União:
[...]
l) os que tenham sido a algum título, ou em virtude de lei, incorporados ao seu patrimônio.

 

Observou nos autos que, consta na Matricula do imóvel a conceituação Terreno Foreiro à Fazenda Nacional (37085902​), sem constar qualquer outra informação que justifique a classificação como Nacional Interior.

 

Neste diapasão, colaciona-se o entendimento firmado pela Suprema Corte no  RE 636.199/ES, na relatoria da Ministra Rosa Weber, DJe 03/08/2017 e  AC 1032193-43.2020.4.01.3700, ​Rel. Desemb. Fed. Marcos Augusto de Sousa, 8ª Turma, PJe 14/03/2022:

 
CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO, TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS INFRINGENTES EM REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÃO CÍVEL. JUÍZO DE ADEQUAÇÃO. AÇÃO COMUM. IMÓVEL SITUADO EM TERRENO "DE MARINHA COM NACIONAL INTERIOR". GLEBA RIO ANIL. ILHA COSTEIRA, SEDE DE MUNICÍPIO. TAXA DE OCUPAÇÃO, FORO E LAUDÊMIO. COBRANÇA APÓS A EMENDA CONSTITUCIONAL 46/2005. POSSIBILIDADE. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. MÉRITO DE REPERCUSSÃO GERAL. PROCEDIMENTO DEMARCATÓRIO. INTIMAÇÃO POR EDITAL. VALIDADE. MATÉRIA TIDA POR INFRACONSTITUCIONAL PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. PRECEDENTES.
...
8. Situando-se o imóvel sub examine em terreno "de marinha com nacional interior", encravado na Gleba Rio Anil, objeto de contrato de aforamento transcrito, em data anterior à promulgação da Constituição Federal de 1988, no registro de imóveis, nos termos do art. 1.127 do Código Civil, evidencia-se, na linha da diretriz do Pretório Excelso, a não-incidência das modificações da EC 46/2005, dada a prevalência da multicitada regra do art. 20I, da CF/1988.
 
CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO ORDINÁRIA. BENS PÚBLICOS. FORO E LAUDÊMIO. IMÓVEL SITUADO EM TERRENO NACIONAL INTERIOR. GLEBA RIO ANIL. ILHA COSTEIRA SEDE DE MUNICÍPIO. COBRANÇA APÓS A EC 46/2005. POSSIBILIDADE. PRECEDENTE FIRMADO PELO STF NO JULGAMENTO DO RE 636.199/ES, COM REPERCUSSÃO GERAL. APELAÇÃO PROVIDA.
1. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 636.199/ES, com repercussão geral, fixou a tese segundo a qual a EC 46/2005 não interferiu na propriedade da União, nos moldes do artigo 20VII, da Constituição da Republica, sobre os terrenos de marinha e seus acrescidos, situados em ilhas costeiras sede de municípios (Plenário, Rel. Min. Rosa Weber, DJe 03/08/2017).
2. Muito embora a orientação direta de repercussão geral firmada pelo STF tenha por objeto o inciso VII do art. 20 da CF, não resta dúvida de que resolve a questão constitucional consistente em saber se a propriedade da União sobre os bens previstos nos demais incisos do citado artigo - localizados em ilhas costeiras sede de municípios foi modificada em face da promulgação da Emenda Constitucional em tela. Nesse sentido, do STF: RE 1.183.025, Plenário, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 26/04/2019; ARE 1.197.581/MA, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJe 15/04/2019; ARE 1.148.023/MA, Rel. Min. Edson Fachin, DJe 23/10/2018; e ARE 1.150.229/MA, Rel. Min. Luiz Fux, DJe 20/08/2018.
3. Considerando que o imóvel aqui em referência, conforme a certidão juntada com a inicial, está localizado em terreno nacional interior (Gleba Rio Anil) objeto de contrato de aforamento transcrito no registro de imóveis ( CC, art. 1.227), em data anterior ao advento da CF de 1988, sobre esse bem não incidem as modificações da EC 46/2005, presente a disposição do art. 20I, da CF, na linha do que decidido pelo Pretório Excelso. Precedentes da Turma.
 

Portanto, quanto ao questionamento levantado no item 10 da Nota Técnica SEI nº 34030/2023/MGI (37215359), se "o fato de constar na matrícula imobiliária a informação de que se trata de terreno Foreiro à Fazenda Nacional, torna-se uma justificativa e fundamentação legal para que o imóvel seja considerado como de domínio da União conceituado como Terreno Nacional  Interior?" , s.m.j., com base no entendimento firmado pelo STF, entende-se que sim, tendo por fundamento o Art. 1°, l, do Decreto-Lei n° 9.760/46 em consonância com o Art. 20, inciso I, da Constituição federal de 1988:

 

Art. 20. São bens da União:
I - os que atualmente lhe pertencem e os que lhe vierem a ser atribuídos;

 

Ademais, o terreno está situado fora da faixa de cem metros da orla marítima e dentro do círculo de 1.320m de raio em torno do 4° G.M.A.C. (28761407, fls. 23). Assim, o imóvel em análise restaria situado em faixa de segurança, conforme interpretação do art. 100, alínea "a", em consonância com o art. 1°, alínea "e", ambos do Decreto-Lei n° 9.760/46:

 
Art. 100. A aplicação do regime de aforamento a terras da União, quando autorizada na forma deste Decreto-lei, compete ao S. P. U., sujeita, porém, a prévia audiência:
a) dos Ministérios da Guerra, por intermédio dos Comandos das Regiões Militares; da Marinha, por intermédio das Capitanias dos Portos; da Aeronáutica, por intermédio dos Comandos das Zonas Aéreas, quando se tratar de terrenos situados dentro da faixa de fronteiras, da faixa de 100 (cem) metros ao longo da costa marítima ou de uma circunferência de 1.320 (mil trezentos e vinte) metros de raio em torno das fortificações e estabelecimentos militares; (negritei)

 

Analisando a Certidão de Domínio de Imóvel da União (34390574), emitida pelo Núcleo de Destinação Patrimonial, trata-se de terreno "conceituado como ALODIAL, portanto, não pertence ao acervo patrimonial da União, conforme preceitua o Decreto-Lei nº 9.760, de 05 de setembro de 1946".

 

O terreno alodial é vizinho ao Terreno de Marinha, de propriedade privada, que se encontra livre de responsabilidades, encargos, impostos, vínculos, entre outras coisas, como aforamento ou enfiteuse, que pode ser utilizada de forma liberta.

 

Nesse sentido, vale ressaltar que a Secretaria do Patrimônio da União - SPU é a responsável pela administração do patrimônio da União, sendo-lhe atribuída a obrigação de identificar, demarcar, cadastrar, registrar, fiscalizar, regularizar as ocupações e promover a utilização destes bens imóveis da União.

 

O caso em tela trata de aspectos técnicos a ser observado pela SPU/BA, que deve proceder com a análise da fundamentação que levou a inclusão do terreno como Alodial. Ainda, cabe ao consulente proceder com a profícua análise dos documentos, inclusive das plantas para averiguar a localização do imóvel e sua real classificação.

 

​Por fim, constatou-se na Matrícula n. 17.675, Livro Geral de 1982, do 1° Ofício de Registro de Imóveis de Salvador/BA, dispõe que a União é possuidora do domínio direto (Terreno Foreiro à Fazenda Nacional), tendo transferido ao particular apenas o domínio útil do terreno. 

 

III - CONCLUSÃO

 

Ante o exposto, nos limites da consulta formulada, considerando que a orientação promovida por este consultivo especializado é quanto ao controle de legalidade da Administração, não implicando conferência de documentos, matérias de cálculo, técnicas ou financeiras, ou mesmo deliberação, que é prerrogativa do gestor público, recomenda-se o encaminhamento da presente manifestação jurídica ao órgão consulente, com as ponderações feitas acima, por entender que restaram dirimidas as dúvidas jurídicas apresentadas pelo órgão patrimonial no bojo da Nota Técnica SEI nº 34030/2023/MGI (37215359), motivo pelo qual se sugere a devolução do feito para a SPU/BA.

 

Esta signatária justifica a demora na elaboração da presente manifestação em virtude da complexidade do caso, mais voltado para a área técnica do que para a área jurídica.

 

Ao protocolo da Consultoria Jurídica da União Especializada Virtual de Patrimônio (E-CJU/PATRIMÔNIO) para restituir o processo ao Órgão de Origem, para ciência deste, bem como para adoção da(s) providência(s) pertinente(s).

 

Brasília, 09 de outubro de 2023.

 

JOÉLIA DE LIMA RODRIGUES

ADVOGADA DA UNIÃO CJU-RR/CGU/AGU


Atenção, a consulta ao processo eletrônico está disponível em https://supersapiens.agu.gov.br mediante o fornecimento do Número Único de Protocolo (NUP) 05080019795195412 e da chave de acesso 8c8a80f1




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