ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA JUNTO AO MINISTÉRIO DA CULTURA
COORDENAÇÃO-GERAL DE APOIO JURÍDICO PARA PARCERIAS COM A SOCIEDADE CIVIL E COOPERAÇÃO FEDERATIVA


PARECER n. 00248/2023/CONJUR-MINC/CGU/AGU

 

NUP: 01400.018805/2023-64

INTERESSADOS: GABINETE DA SECRETARIA DE ECONOMIA CRIATIVA E FOMENTO CULTURAL SECFC/GAB/SECFC/GM/MINC

ASSUNTOS: PROTOCOLO DE INTENÇÕES.

 

EMENTA:
I. Direito Administrativo. Protocolo de Intenções.
II. Lei nº 14.133 de 2021.
III. Minuta-modelo da Advocacia-Geral da União.
IV.  Possibilidade jurídica. 

 

RELATÓRIO

 

Tratam os autos de Minuta de Protocolo de Intenções, que se pretende celebrar entre o Ministério da Cultura (MinC), por meio da Secretaria de Economia Criativa e Fomento Cultural (SEFIC), e o Serviço Social da Indústria (SESI), para o desenvolvimento de ações de capacitação de agentes culturais.

 

Para o que interessa à presente análise, constam dos autos a minuta de Protocolo de Intenções (SEI nº 1447579) e a Nota Técnica nº 15/2023 (SEI nº 1447581), da Secretaria de Economia Criativa e Fomento Cultural, que fornece o cenário da política pública e a fundamentação técnica do ato.

 

É o relatório.

 

 

ANÁLISE JURÍDICA

 

A Consultoria Jurídica procede à análise com fundamento no art. 11 da Lei Complementar nº 73, de 1993, subtraindo-se do âmbito da competência institucional deste Órgão Jurídico, delimitada em lei, análises que importem em considerações de ordem técnica, financeira ou orçamentária, nos termos do Enunciado n. 7 do Manual de Boas Práticas Consultivas da AGU: 

 

“A manifestação consultiva que adentrar questão jurídica com potencial de significativo reflexo em aspecto técnico deve conter justificativa da necessidade de fazê-lo, evitando-se posicionamentos conclusivos sobre temas não jurídicos, tais como os técnicos, administrativos ou de conveniência ou oportunidade, podendo-se, porém, sobre estes emitir opinião ou formular recomendações, desde que enfatizando o caráter discricionário de seu acatamento” (Manual de Boas Práticas Consultivas. 4.ed. Brasília: AGU, 2016, página 32).

 

Nesse mister, a presente análise restringe-se a apontar possíveis riscos do ponto de vista jurídico e recomendar providências, para salvaguardar a autoridade assessorada, a quem compete avaliar a real dimensão do risco e a necessidade de se adotar ou não a precaução recomendada.

 

Com relação aos critérios de conveniência e oportunidade, observo que o mérito do instrumento deve ser atestado pela área técnica competente, não cabendo a esta Consultoria imiscuir-se em tais questões. Nesse sentido, a Secretaria de Economia Criativa e Fomento Cultural, por intermédio da Nota Técnica nº 15/2023 (SEI nº 1447581), apresentou a política pública desenvolvida e manifestou-se favoravelmente à celebração do instrumento em apreço.

 

Como visto, o instrumento em análise é um "Protocolo de Intenções", que se pretende celebrar entre o Ministério da Cultura (MinC) e o Serviço Social da Indústria (SESI), cujo objeto encontra-se descrito em sua Cláusula primeira nos seguintes termos (SEI nº 1447579):

 

CLÁUSULA PRIMEIRA  DO OBJETO
O presente Protocolo de Intenções define as bases para futuros projetos que poderão ser desenvolvidos em colaboração entre os Partícipes, por meio da celebração de instrumentos específicos, com vistas ao desenvolvimento de ações de capacitação de agentes culturais em todas as regiões do Brasil, iniciando-se pela região norte, com a finalidade de ofertar habilidades técnicas para elaboração, inscrição, execução e prestação de contas de projetos culturais, no âmbito do Programa Nacional de Apoio à Cultura (Pronac), instituído pela Lei n.º 8.313/1991.

 

Dito isso, observo que a Constituição Federal de 1988, em seu art. 215, imbuiu o Estado (Poder Público de todas as esferas) dos deveres de garantir o pleno exercício dos direitos culturais e o acesso às fontes da cultura nacional e de apoiar e incentivar a valorização e a difusão das manifestações culturais.

 

No âmbito da valorização cultural, através do mecanismo de incentivo fiscal (art. 48 do Decreto nº 11.453 de 2023 e Instrução Normativa MinC nº 3 de 2023), o Ministério da Cultura, juntamente com a Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República (SECOM/PR), lançou parceria com o objetivo de ampliar os investimentos culturais na Região Norte do Brasil, que historicamente tem os menores índices de recursos para a cultura, especialmente no que se refere ao mecanismo Incentivo a projetos Culturais do Pronac (Lei nº 8.313, de 1991).

 

Nesse cenário, a área técnica entende que é necessário potencializar a participação dos agentes culturais da região norte, especialmente aqueles em início de carreira e com menos experiência na participação em seleções públicas, para que o Programa Rouanet Norte consiga atingir seu público alvo prioritário.

 

Desta forma, houve manifestação de entidades interessadas em cooperar para a realização das ações de capacitação, garantindo e potencializando a participação dos agentes culturais, como destacado acima. Uma das entidades é o Serviço Social da Indústria (SESI), partícipe do instrumento que se pretende celebrar. Nos exatos termos da manifestação técnica (SEI nº 1447581):

4.10. Não obstante, a SEFIC entende que é necessário potencializar a participação dos agentes culturais da região norte, especialmente aqueles em início de carreira e com menos experiência na participação em seleções públicas, para que o Programa Rouanet Norte consiga atingir seu público alvo prioritário, ou seja, as camadas da população  que historicamente têm menos oportunidades de obter financiamento para o custeio de ações culturais. Somente com a participação maciça de pequenos agentes culturais, em condições de igualdade de concorrência com aqueles que já possuem vasto histórico de participação e sucesso na realização de projetos culturais fomentados pelo poder público, é que poderão ser alcançados os objetivos do Programa Rouanet Norte.
4.11. Em face desta premissa e, considerando o anúncio de que o MinC fará rodadas de divulgação do edital e de capacitação de agentes culturais nos 7 estados da Região Norte, houve manifestação de entidades interessadas em cooperar para a realização das ações de capacitação. De forma mais assertiva, foram iniciadas tratativas com o Departamento Nacional (DN) do Serviço Social da Indústria (SESI), a fim de estabelecer parceria para o desenvolvimento dessas ações, considerando o sucesso de atividades conjuntas realizadas anteriormente e tendo em vista a expertise da instituição no que se refere à capacitação profissional, aliada à capilaridade e extensão da sua rede descentralizada.

 

Não há dúvidas, portanto, quanto à competência do Ministério da Cultura para a celebração do ato.

 

Observa-se que o instrumento pretendido não prevê a transferência de recursos entre as partes (CLÁUSULA QUINTA). Nesses termos, fica afastada a aplicação do Decreto nº 11.531 de 2023 e da Portaria Conjunta MGI/MF/CGU nº 33 de 2023, que dispõem sobre os instrumentos de repasse (convênios e contratos de repasse) a serem celebrados pelos órgãos e entidades da Administração Pública Federal com órgãos ou entidades públicas para a execução de programas, projetos e atividades de interesse recíproco, que envolvam a transferência de recursos financeiros oriundos do Orçamento Fiscal e da Seguridade Social da União.

 

Observo, ainda, que o instrumento em análise não menciona um plano de trabalho e não estabelece obrigações imediatas. Assim, não se trata de Acordo de Cooperação Técnica.

 

Sobre a diferença entre o Acordo de Cooperação Técnica e o Protocolo de Intenções, trago à baila o esclarecimento constante da Nota Explicativa 1, da Minuta de Protocolo de Intenções recentemente aprovada pela  Advocacia-Geral da União[1]:

 

O Protocolo de Intenções se diferencia de convênios, contratos de repasse e termos de execução descentralizada pelo simples fato de não existir a possibilidade de transferência de recursos entre os partícipes.
O Protocolo de Intenções se diferencia de Acordos de Cooperação Técnica pelo fato de ser um ajuste genérico, sem obrigações imediatas. Dessa forma, trata-se de um documento sucinto, que não necessariamente exige um plano de trabalho ou um projeto específico para lhe dar causa, sendo visto como um mero consenso entre seus partícipes, a fim de, no futuro, estabelecerem instrumentos específicos acerca de projetos que pretendem firmar, se for o caso.
Deste modo, não se deve confundir o Protocolo de Intenções com o Acordo de Cooperação Técnica, visto que neste último há obrigações e atribuições assumidas pelas partes, caracterizando-se como um instrumento jurídico obrigacional, e não um mero ajuste, consenso entre os partícipes em relação à determinadas matérias.

 

Nesse sentido, as cláusulas segunda, terceira e quarta da minuta (SEI nº 1447581) trazem expressões como "na medida de suas possibilidades", "no limite de suas possibilidades", "Envidar esforços", demonstrando não haver obrigações imediatas a serem exigidas.

 

Quanto ao fundamento jurídico do Protocolo de Intenções, observo que o art. 184 da Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021 permite a celebração de convênios, acordos, ajustes e outros instrumentos congêneres celebrados por órgãos e entidades da Administração Pública:

 

Art. 184. Aplicam-se as disposições desta Lei, no que couber e na ausência de norma específica, aos convênios, acordos, ajustes e outros instrumentos congêneres celebrados por órgãos e entidades da Administração Pública, na forma estabelecida em regulamento do Poder Executivo federal.

 

Deste modo, os acordos, ajustes e instrumentos congêneres são espécies do gênero convênio, embora mais simplificados, em que os partícipes colaboram para alcançar os objetivos propugnados, sem transferência de recursos.

 

Os ajustes desta natureza são, em regra, formalizados por meio de instrumentos que conterão o objeto e as condições em que se pretende uma cooperação entre as partes. Observarão, no mais, e no que couber, o disposto na Lei de Licitações.

 

Como o Protocolo de Intenções não foi regulamentado, pode-se recorrer, por analogia ao Decreto nº 11.531 de 2023, art. 11, §3º, que estabelece as cláusulas necessárias aos convênios e contratos de repasse, descartando-se, desde já, as cláusulas que dispõem sobre transferência de recursos financeiros e questões referentes ao plano de trabalho:

 

Art. 11. (...)
§ 3º  São cláusulas necessárias no convênio ou no contrato de repasse, no mínimo: 
I - o objeto e os seus elementos característicos, em conformidade com o plano de trabalho, que integrará o termo celebrado independentemente de transcrição;
II - a vigência, fixada de acordo com o prazo previsto para a consecução do objeto e em função das metas estabelecidas;
III - a forma e a metodologia de comprovação da consecução do objeto;
IV - a descrição dos parâmetros objetivos que servirão de referência para a avaliação do cumprimento do objeto;
V - as obrigações dos partícipes; e
VI - a titularidade dos bens remanescentes.

 

Como mencionado, a Advocacia Geral da União – AGU aprovou, recentemente, minuta padrão de Protocolo de Intenções a ser utilizada por entes públicos para estabelecer um vínculo cooperativo ou de parceria entre si, e disponibilizou-a aos órgãos assessorados no sítio eletrônico da instituição[1].

 

Vale lembrar que, em decorrência da necessidade de parametrização e uniformização da Administração Pública e visando a agilização dos procedimentos, é que as minutas padronizadas publicadas pela AGU devem ser utilizadas por toda Administração Pública, nos termos do Enunciado de Boas Práticas Consultivas AGU nº 6: 

 

A atuação consultiva na análise de processos de contratação pública deve fomentar a utilização das listas de verificação documental (check lists), do Guia Nacional de Licitações Sustentáveis e das minutas de editais, contratos, convênios e congêneres, disponibilizadas nos sítios eletrônicos da Advocacia-Geral da União e da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional.
No intuito de padronização nacional, incumbe aos Órgãos Consultivos recomendar a utilização das minutas disponibilizadas pelos Órgãos de Direção Superior da AGU, cujas atualizações devem ser informadas aos assessorados.
Convém ainda que os Órgãos Consultivos articulem-se com os assessorados, de modo a que edições de texto por estes produzidas em concreto a partir das minutas-padrão sejam destacadas, visando a agilizar o exame jurídico posterior pela instância consultiva da AGU.

 

Observo que a minuta em análise segue à risca a minuta-modelo de Protocolo de Intenções da AGU, com as adaptações necessárias. Portanto, o documento reúne todos os requisitos legais aplicáveis, dispensando análise detalhada de suas cláusulas.

 

Por fim, quanto à autoridade signatária por parte deste Ministério, verifico que foi corretamente observado o disposto no art. 5º da Portaria/MinC n. 18, de 10 de abril de 2023:

 

Art. 5º Fica delegado aos titulares da Secretaria-Executiva e das Secretarias do Ministério da Cultura e seus respectivos ordenadores de despesa o exercício da competência para celebração de convênios, contratos administrativos, termos de colaboração, termos de fomento, acordos de cooperação, termos de execução descentralizada, e instrumentos congêneres, no âmbito da competência de sua unidade.

       

CONCLUSÃO

 

Ante o exposto, ressalvados os aspectos técnicos e de conveniência e oportunidade na efetivação do ajuste, não sujeitos ao crivo desta Consultoria Jurídica, cumpre opinar pela possibilidade de prosseguimento dos trâmites.

 

Por fim, vale lembrar que, de acordo com o Enunciado nº 05 do Manual de boas Práticas Consultivas da AGU: “Ao órgão Consultivo que em caso concreto haja exteriorizado juízo conclusivo de aprovação de minuta de edital ou contrato e tenha sugerido as alterações necessárias, não incumbe pronunciamento subsequente de verificação do cumprimento das recomendações consignadas”. Assim, não é necessário o retorno dos autos a esta Consultoria, salvo se subsistir dúvida de cunho jurídico.

 

Isso posto, submeto os autos à consideração superior, sugerindo que sejam, na sequência, encaminhados à Secretaria de Economia Criativa e Fomento Cultural, para as providências cabíveis.

 

 

Brasília, 11 de outubro de 2023.

 

 

(assinatura eletrônica)

GUSTAVO ALMEIDA DIAS

Advogado da União

 

 


Atenção, a consulta ao processo eletrônico está disponível em https://supersapiens.agu.gov.br mediante o fornecimento do Número Único de Protocolo (NUP) 01400018805202364 e da chave de acesso 8ab328c7

Notas

  1. a, b Disponível em: https://www.gov.br/agu/pt-br/composicao/cgu/cgu/modelos/conveniosecongeneres/minuta-de-protocolo-de-intencoes-atualizada-a-vista-do-decreto-n-11-531-de-2023.pdf   Acesso em 11.10.2023.



Documento assinado eletronicamente por GUSTAVO ALMEIDA DIAS, com certificado A1 institucional (*.agu.gov.br), de acordo com os normativos legais aplicáveis. A conferência da autenticidade do documento está disponível com o código 1307173990 no endereço eletrônico http://sapiens.agu.gov.br. Informações adicionais: Signatário (a): GUSTAVO ALMEIDA DIAS, com certificado A1 institucional (*.agu.gov.br). Data e Hora: 11-10-2023 13:27. Número de Série: 51385880098497591760186147324. Emissor: Autoridade Certificadora do SERPRO SSLv1.