ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA JUNTO AO MINISTÉRIO DA CULTURA
GABINETE

 

PARECER n. 00294/2023/CONJUR-MINC/CGU/AGU

 

NUP: 01400.023259/2023-83

INTERESSADOS: DIVISÃO DE PROTOCOLO/DIPRO/MINC.

ASSUNTOS: ATOS ADMINISTRATIVOS

 

EMENTA:
I - Análise e manifestação acerca de projeto de lei em fase de sanção presidencial.
II - Projeto de Lei nº 597, de 2021, de autoria do Senhor Deputado Flávio Nogueira, que “Reconhece como manifestação da cultura nacional as obras do poeta, compositor, cineasta e jornalista piauiense Torquato Pereira de Araújo Neto”.
III. Pela viabilidade jurídica. ("Sanção total"). 

 

 

I. RELATÓRIO

 

Trata-se de expediente inaugurado a partir de missiva da Secretaria Especial para Assuntos Jurídicos da Casa Civil da Presidência da República - SAJ-CC (OFÍCIO CIRCULAR Nº 280/2023/CAP/SALEG/SAJ/CC/PR), dirigida a este Ministério da Cultura e outros Ministérios, em 16/11/2023, por conduto da qual solicita a manifestação sobre o Projeto de Lei nº 597, de 2021, de autoria do Senhor Deputado Flávio Nogueira, que “Reconhece como manifestação da cultura nacional as obras do poeta, compositor, cineasta e jornalista piauiense Torquato Pereira de Araújo Neto, o qual "abrange pauta de natureza transversal, envolvendo assuntos de competência das pastas em epígrafe, salvo melhor juízo."

 

2. Arremata a SAJ-CC o seguinte no Ofício supra:

 

Tendo em vista que a matéria já se encontra em fase de sanção, encareço seja encaminhado a esta Secretaria parecer do órgão técnico competente, com visto ministerial, atéo dia 24/11/23, conforme disposto no parágrafo único do art. 25 do Decreto nº 9.191, de 1ºde novembro 2017, sem prejuízo de antecipação tão logo seja realizada, no intuito de colaborar com os trâmites e a urgência que a matéria requer.

 

3. Encaminhada a missiva supra à Assessoria Especial de Assuntos Parlamentares e Federativos deste Ministério, referido órgão redireciona o pleito a esta Consultoria Jurídica, por meio do Ofício-Circular nº 63/2023/COLEP/ASPAR/GM/MinC, para emissão de parecer, até o dia 23/11/2023.

 

4. O inteiro teor do PL encontra-se acostado aos autos do processo SEI (1505785).

 

5. É o relatório. Passo à análise.

 

II. ANÁLISE JURÍDICA

 

6. Preliminarmente, impende tecer breve consideração sobre a competência desta Consultoria Jurídica para manifestação no processo in casu.

 

7. Sabe-se que a Constituição de 1988 prevê as funções essenciais à Justiça em seu Título IV, Capítulo IV; contemplando na Seção II a advocacia pública. Essa essencialidade à justiça deve ser entendida no sentido mais amplo que se possa atribuir à expressão, estando compreendidas no conceito de essencialidade todas as atividades de orientação, fiscalização e controle necessárias à defesa dos interesses protegidos pelo ordenamento jurídico.

 

8. O art. 131 da Constituição, ao instituir em nível constitucional a Advocacia-Geral da União - AGU, destacou como sua competência as atividades de consultoria e assessoramento jurídico ao Poder Executivo, nos termos da lei complementar que dispuser sobre sua organização e funcionamento, in verbis:

 

Art. 131. A Advocacia-Geral da União é a instituição que, diretamente ou através de órgão vinculado, representa a União, judicial e extrajudicialmente, cabendo-lhe, nos termos da lei complementar que dispuser sobre sua organização e funcionamento, as atividades de consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo.
 

9. Nesta esteira, o art. 11, inciso I e V, da Lei Complementar n.º 73/1993 - Lei Orgânica da Advocacia-Geral da União -, estabeleceu, no que concerne à atividade de consultoria ao Poder Executivo junto aos Ministérios, a competência das Consultorias Jurídicas para assistir a autoridade assessorada no controle interno da constitucionalidade e legalidade administrativa dos atos a serem por ela praticados. Nesse sentido, veja-se:

 

Art. 11 - Às Consultorias Jurídicas, órgãos administrativamente subordinados aos Ministros de Estado, ao Secretário-Geral e aos demais titulares de Secretarias da Presidência da República e ao Chefe do Estado-Maior das Forças Armadas, compete, especialmente:
I - assessorar as autoridades indicadas no caput deste artigo;
(...)
III - fixar a interpretação da Constituição, das leis, dos tratados e dos demais atos normativos a ser uniformemente seguida em suas áreas de atuação e coordenação quando não houver orientação normativa do Advogado-Geral da União;
(...)
V - assistir a autoridade assessorada no controle interno da legalidade administrativa dos atos a serem por ela praticados ou já efetivados, e daqueles oriundos de órgão ou entidade sob sua coordenação jurídica;
 

10. Ressalte-se, por oportuno, que o controle interno da legalidade realizado por este órgão jurídico não tem o condão de se imiscuir em aspectos relativos à conveniência e à oportunidade da prática dos atos administrativos, que estão reservados à esfera discricionária do administrador público legalmente competente, tampouco examinar questões de natureza eminentemente técnica, administrativa e/ou financeira, conforme se extrai do Enunciado nº 7 do Manual de Boas Práticas Consultivas da Advocacia-Geral da União, que possui o seguinte teor:

 

A manifestação consultiva que adentrar questão jurídica com potencial de significativo reflexo em aspecto técnico deve conter justificativa da necessidade de fazê-lo, evitando-se posicionamentos conclusivos sobre temas não jurídicos, tais como os técnicos, administrativos ou de conveniência ou oportunidade, podendo-se, porém, sobre estes emitir opinião ou formular recomendações, desde que enfatizando o caráter discricionário de seu acatamento.

 

11. Elaboradas as considerações supra, adentra-se à análise da proposta, a qual já percorreu o trâmite legislativo no âmbito do Congresso Nacional, tendo sido enviado para sanção ou veto do Exmo. Presidente da República, nos termos do art. 66 da Constituição Federal.

 

12. Primeiramente, impende realçar que compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre cultura, nos termos do art. 24, IX da Constituição Federal. Outrossim, a proposta não está inserida no âmbito de iniciativa privativa de algum outro órgão, de modo que qualquer parlamentar detém a competência para a iniciativa, encontrando-se a proposta regular também nesse ponto. 

 

13. Adentrando-se ao teor da proposta, visualiza-se que pretende sejam reconhecidas as obras do poeta, compositor, cineasta e jornalista piauiense Torquato Neto como manifestação da cultura nacional. A respeito, veja-se a justificativa do Parlamentar para a propositura em questão[1]:

 

Torquato Neto foi um importante poeta, compositor, cineasta e jornalista que nasceu em Teresina, em 9 de novembro de 1944, e faleceu no Rio de Janeiro, em 1972, portanto, muito jovem ainda, aos 28 anos de idade. Filho único do Promotor de Justiça no Estado do Piauí, Dr. Heli Rocha Nunes (1918-2010) e da professora piauiense Maria Salomé da Cunha Araújo (1918-1993), aos 16 anos mudou-se da capital do Estado para a cidade baiana de Salvador a fim de cursar os estudos secundários, período no qual, apesar de ainda em tenra idade, trabalhou como assistente de direção no antológico filme “Barra Vento”, de Glauber Rocha, um dos ápices da filmografia do chamado Cinema Novo
Em 1962, foi para o Rio de Janeiro para estudar Jornalismo na universidade, atuando, a partir de então, como jornalista possuidor de colunas próprias no Correio da Manhã, Jornal dos Sports e Última Hora. Torquato Neto atuava como agente cultural, defensor das manifestações artísticas de vanguarda (...)
 
Desse modo, as obras artísticas e intelectuais intangíveis, de valor reconhecido por sua importância no contexto da história e da cultura do País, representam patrimônio nacional imaterial pelo que expressam como símbolo da qualidade estilística que reúnem em si, ao enunciar o que de melhor foi produzido, perpetuando-se pelo passar do tempo nas gerações sucessivas da nação. Por essa razão, considerando a necessidade de preservar a memória intangível da cultura brasileira, da qual Torquato Neto é um dos seus mais nobres representantes, especialmente pela sua atuação na luta pela construção de uma arte verdadeiramente nacional e o papel que exerceu na formação das mudanças de concepção ocorridas apartir dele e do movimento tropicalista que, ao lado de outros intelectuais, tão bem formulou, é necessária uma salvaguarda para dar continuidade e preservação aopatrimônio cultural que ele nos legou, no intuito de assegurar que as gerações do porvir possam conhecer o que ele logrou com seu gênio criativo e manter a identidade cultural da Pátria, passando-a de geração a geração como nosso patrimônio. Sua importância é incontestável na construção da memória artística e intelectual brasileira, bem como no registro do cotidiano brasileiro do terceiro quarto do século XX.

14. Instadas a se manifestar, as Secretarias do Audiovisual - SAV e a da Formação, Livro e Leitura - SEFLI opinaram favoravelmente à sanção do PL em comento, nos termos do Ofício nº 80/2023/SAV/GM/MinC (SEI 1512407) e do Formulário elaborado pela SEFLI (SEI nº 1512980), de onde se extrai o seguinte excerto:

 

(...)

A eventual consagração das obras de Torquato Neto como Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil seria um reconhecimento significativo de sua importância para a identidade cultural do país. Essa honraria destacaria não apenas a contribuição individual de Torquato Neto, mas também o impacto mais amplo de suas criações artísticas no cenário cultural brasileiro.

É o Parecer.

 

 

15. Nesses termos, no que concerne especificamente ao reconhecimento cultural da obra do homenageado (Torquato Neto), é de se concluir pela viabilidade jurídica da proposta, a qual vai ao encontro das políticas desta Pasta Ministerial no sentido de reconhecer e proteger o patrimônio cultural, senão, veja-se o antevisto no art. 21 da Lei n. 14.600, de 2023 (que regula a estrutura dos Ministérios):

 

Art. 21. Constituem áreas de competência do Ministério da Cultura:
(...)
II - proteção do patrimônio histórico, artístico e cultural;

 

16. Quanto aos aspectos estritamente formais, insta ponderar que ao Projeto de Lei se aplicam as regras encartadas pela Lei Complementar nº 95, de 26 de fevereiro de 1998, que dispõe sobre a elaboração, a redação, a alteração e a consolidação das leis, conforme determina o parágrafo único do art. 59 da Constituição.

 

III. CONCLUSÃO

 

17. Diante do exposto, sem adentrar nos valores de conveniência e oportunidade na criação de mecanismos institucionais, não sujeitos ao crivo desta CONJUR, opina-se pela viabilidade jurídica do Projeto de Lei nº 597, de 2021, de autoria do Senhor Deputado Flávio Nogueira, que “Reconhece como manifestação da cultura nacional as obras do poeta, compositor, cineasta e jornalista piauiense Torquato Pereira de Araújo Neto, encontrando-se a proposta apta a ser submetida ao apreço do Exmo. Presidente da República​ (pela "sanção total").

 

18. Devolvam-se os autos à ASPAR, em resposta ao Ofício-Circular nº 63/2023/COLEP/ASPAR/GM/MinC, em prosseguimento.

 

 

 

Brasília, 23 de novembro de 2023.

 

 

(assinado eletronicamente)

SOCORRO JANAINA M. LEONARDO

Advogada da União

Consultora Jurídica

 

 


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Notas

  1. ^ Disponível em: https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1967357&filename=PL%20597/2021 . Acesso em 23. nov. 2023.



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