ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA JUNTO AO MINISTÉRIO DA CULTURA
GABINETE

 

PARECER n. 00311/2023/CONJUR-MINC/CGU/AGU

 

NUP: 01400.032551/2017-49

INTERESSADOS: COORDENAÇÃO DE ACOMPANHAMENTO LEGISLATIVO E EMENDAS PARLAMENTARES/COLEP/MINC

ASSUNTOS: ATOS ADMINISTRATIVOS

 

 
EMENTA:
I - Análise e manifestação acerca de projeto de lei em fase de sanção presidencial.
II - Projeto de Lei nº 3268/2021 (PLS nº 482/2017 em sua casa de origem), que “Declara feriado nacional o Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra”, de autoria do senador Randolfe Rodrigues.
III. Pela viabilidade jurídica, no que concerne às competências deste Ministério da Cultura ("pela sanção").

 

 

I. RELATÓRIO

 

Trata-se de expediente encaminhado pela Secretaria Especial para Assuntos Jurídicos da Casa Civil da Presidência da República - SAJ-CC (OFÍCIO CIRCULAR Nº 297/2023/CAP/SALEG/SAJ/CC/PR), dirigido a este Ministério da Cultura e outros Ministérios, por conduto da qual solicita a manifestação sobre o Projeto de Lei nº 3268/2021(PLS nº 482/2017 em sua casa de origem), que “Declara feriado nacional o Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra”, de autoria do senador Randolfe Rodrigues, o qual "abrange pauta de natureza transversal, envolvendo assuntos de competência das pastas em epígrafe, salvo melhor juízo."

 

2. Arremata a SAJ-CC o seguinte no Ofício supra:

 

Tendo em vista que a matéria já se encontra em fase de sanção, encareço seja encaminhado a esta Secretaria parecer do órgão técnico competente, com visto ministerial, até o dia 11/12/23, conforme disposto no parágrafo único do art. 25 do Decreto nº 9.191, de 1º de novembro 2017, sem prejuízo de antecipação tão logo seja realizada, no intuito de colaborar com os trâmites e a urgência que a matéria requer.

 

3. Encaminhada a missiva supra à Assessoria Especial de Assuntos Parlamentares e Federativos deste Ministério, referido órgão redireciona o pleito a esta Consultoria Jurídica, por meio do Ofício nº 569/2023/COLEP/ASPAR/GM/MinC, para emissão de parecer, solicitando a remessa posterior dos autos, até o dia 5/12/2023.

 

4. O inteiro teor do PL encontra-se acostado aos autos do processo SEI (1527215).

 

5. É o relatório. Passo à análise.

 

II. ANÁLISE JURÍDICA

 

6. Preliminarmente, impende tecer breve consideração sobre a competência desta Consultoria Jurídica para manifestação no processo in casu.

 

7. Sabe-se que a Constituição de 1988 prevê as funções essenciais à Justiça em seu Título IV, Capítulo IV; contemplando na Seção II a advocacia pública. Essa essencialidade à justiça deve ser entendida no sentido mais amplo que se possa atribuir à expressão, estando compreendidas no conceito de essencialidade todas as atividades de orientação, fiscalização e controle necessárias à defesa dos interesses protegidos pelo ordenamento jurídico.

 

8. O art. 131 da Constituição, ao instituir em nível constitucional a Advocacia-Geral da União - AGU, destacou como sua competência as atividades de consultoria e assessoramento jurídico ao Poder Executivo, nos termos da lei complementar que dispuser sobre sua organização e funcionamento, in verbis:

 

Art. 131. A Advocacia-Geral da União é a instituição que, diretamente ou através de órgão vinculado, representa a União, judicial e extrajudicialmente, cabendo-lhe, nos termos da lei complementar que dispuser sobre sua organização e funcionamento, as atividades de consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo.
 

9. Nesta esteira, o art. 11, inciso I e V, da Lei Complementar n.º 73/1993 - Lei Orgânica da Advocacia-Geral da União -, estabeleceu, no que concerne à atividade de consultoria ao Poder Executivo junto aos Ministérios, a competência das Consultorias Jurídicas para assistir a autoridade assessorada no controle interno da constitucionalidade e legalidade administrativa dos atos a serem por ela praticados. Nesse sentido, veja-se:

 

Art. 11 - Às Consultorias Jurídicas, órgãos administrativamente subordinados aos Ministros de Estado, ao Secretário-Geral e aos demais titulares de Secretarias da Presidência da República e ao Chefe do Estado-Maior das Forças Armadas, compete, especialmente:
I - assessorar as autoridades indicadas no caput deste artigo;
(...)
III - fixar a interpretação da Constituição, das leis, dos tratados e dos demais atos normativos a ser uniformemente seguida em suas áreas de atuação e coordenação quando não houver orientação normativa do Advogado-Geral da União;
(...)
V - assistir a autoridade assessorada no controle interno da legalidade administrativa dos atos a serem por ela praticados ou já efetivados, e daqueles oriundos de órgão ou entidade sob sua coordenação jurídica;
 

10. Ressalte-se, por oportuno, que o controle interno da legalidade realizado por este órgão jurídico não tem o condão de se imiscuir em aspectos relativos à conveniência e à oportunidade da prática dos atos administrativos, que estão reservados à esfera discricionária do administrador público legalmente competente, tampouco examinar questões de natureza eminentemente técnica, administrativa e/ou financeira, conforme se extrai do Enunciado nº 7 do Manual de Boas Práticas Consultivas da Advocacia-Geral da União, que possui o seguinte teor:

 

A manifestação consultiva que adentrar questão jurídica com potencial de significativo reflexo em aspecto técnico deve conter justificativa da necessidade de fazê-lo, evitando-se posicionamentos conclusivos sobre temas não jurídicos, tais como os técnicos, administrativos ou de conveniência ou oportunidade, podendo-se, porém, sobre estes emitir opinião ou formular recomendações, desde que enfatizando o caráter discricionário de seu acatamento.

 

11. Elaboradas essas considerações preliminares, passa-se à análise da proposta. Primeiramente, impende realçar que compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre cultura, nos termos do art. 24, IX, da Constituição Federal. Outrossim, a proposta não está inserida no âmbito de iniciativa privativa de algum órgão, de modo que qualquer parlamentar ou o Poder Executivo detém a competência para a iniciativa, encontrando-se a proposta regular também nesse ponto. Adicione-se, ainda, que o PL ​já percorreu o trâmite legislativo no âmbito do Congresso Nacional, tendo sido enviado para sanção ou veto do Exmo. Presidente da República, nos termos do art. 66 da Constituição Federal.

 

12. Adentrando-se a leitura de seu teor, verifica-se que a proposta visa declarar feriado nacional o dia 20 de novembro, para a celebração do Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra.

 

13. Veja-se a justificativa apresentada pelo autor da proposta, extraída do sítio eletrônico do Senado Federal[1]:

 

Comemora-se, em 20 de novembro, o Dia da Consciência Negra. A data, na verdade, é uma alusão à data de falecimento de Zumbi dos Palmares, o último dos líderes do Quilombo dos Palmares, o maior do período Brasil-Colônia. Zumbi representa para os negros a resistência e luta contra a escravidão, e lutou pela liberdade e prática da cultura e religião africana.
O calendário das escolas incorporou a data como Dia da Consciência Negra a partir de 2003, mesmo ano em que o ensino da história e cultura afro-brasileiras também foi inserido no currículo das instituições de ensino. Foi somente em 2011 que a Lei nº 12.519 oficializou o Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra como sendo em 20 de novembro, mas não o tratou como feriado nacional.
A data é considerada feriado apenas em municípios e estados que aprovaram leis específicas sobre a data. Atualmente, há cinco estados e diversos municípios em que o feriado foi instituído, totalizando mais de mil cidades. No Rio de Janeiro, por exemplo, isso se deu por meio de lei municipal e estadual.
O povo africano durante o período do Brasil Colonial deixou sua marca em nossa cultura, política, gastronomia e religião, sendo fundamental que nossa sociedade preste essa justa homenagem e reconhecimento pela importância de Zumbi dos Palmares e de outros personagens negros em nossa história.
O estabelecimento do Dia Nacional da Consciência Negra em 20 de novembro, nos moldes atuais, deve ser considerado, sim, um avanço, mas o estabelecimento desta data como feriado nacional é de grande relevância para que essa parcela da sociedade, que representa mais da metade de nossa população, receba mais um aceno público e oficial de sua importância para o Brasil.
 

14. Sobre a instituição de datas comemorativas, há que se fazer referência à Lei n. 12.345, de 2010, a qual "Fixa critério para instituição de datas comemorativas", a saber:

 

Art. 1o A instituição de datas comemorativas que vigorem no território nacional obedecerá aocritério da alta significação para os diferentes segmentos profissionais, políticos, religiosos, culturais e étnicos que compõem a sociedade brasileira.(grifo nosso)
 
Art. 2o A definição do critério de alta significação será dada, em cada caso, por meio de consultas e audiências públicas realizadas, devidamente documentadas, com organizações e associações legalmente reconhecidas e vinculadas aos segmentos interessados.

 

15. Conforme mencionado na justificativa do PL, a Lei nº 12.519, de 10 de novembro de 2011, já instituiu o Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra, a ser comemorado, anualmente, no dia 20 de novembro - de onde se deduz que o requisito de consultas e audiências públicas já restou superado. A inovação no PL em comento se volta, pois, para a declaração da data como feriado nacional.

 

16. Instada a se manifeatar sobre o tema, a Fundação Cultural Palmares posicionou-se favoravelmente à proposta, conforme doc SEI 0457471.

 

17. A data já se configura em feriado em alguns estados e municípios, conforme mencionado na justificativa do PL - o que denota a importância da celebração nos calendários locais. Trata-se, pois, de promover o reconhecimento de personalidade e evento histórico e cultural de relevância única para a formação do País - o que vai ao encontro de preceito constitucional, que determina ao Estado o dever de proteger as manifestações das culturas afro-brasileiras como grupo formativo do processo civilizatório nacional (art. 215, § 1º, da Constituição Federal), concluindo-se, pois, por sua viabilidade jurídica.

 

18. Quanto aos aspectos estritamente formais, insta ponderar que ao Projeto de Lei se aplicam as regras encartadas pela Lei Complementar nº 95, de 26 de fevereiro de 1998, que dispõe sobre a elaboração, a redação, a alteração e a consolidação das leis, conforme determina o parágrafo único do art. 59 da Constituição.

 

 

III. CONCLUSÃO

 

19. Diante do exposto, sem adentrar nos valores de conveniência e oportunidade na criação de mecanismos institucionais, não sujeitos ao crivo desta CONJUR, não se visualizam óbices jurídicos ao Projeto de Lei nº 3268/2021(PLS nº 482/2017 em sua casa de origem), que “Declara feriado nacional o Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra”, de autoria do senador Randolfe Rodriguesde modo que, no que concerne às competências legais deste Ministério da Cultura (sem prejuízo da análise das outras Pastas Ministeriais), o projeto encontra-se apto a ser submetido à sanção presidencial.

 

20. Encaminhem-se os autos, via SEI, à ASPAR, em resposta ao Ofício nº 569/2023/COLEP/ASPAR/GM/MinC.

 

 

Brasília, 06 de dezembro de 2023.

 

 

(assinado eletronicamente)

SOCORRO JANAINA M. LEONARDO

Advogada da União

Consultora Jurídica

 

 


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Notas

  1. ^ Disponível em: https://legis.senado.leg.br/sdleg-getter/documento?dm=7321855&ts=1701696472034&disposition=inline&_gl=1*nzt8ls*_ga*NzU4MDc5MzQzLjE2NDQ1MDQ1OTk.*_ga_CW3ZH25XMK*MTcwMTg3MTI4My43LjAuMTcwMTg3MTI4My4wLjAuMA.. . Acesso em 6 de dezembro de 2023.



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