ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA JUNTO AO MINISTÉRIO DA CULTURA

 

 

PARECER nº 313/2023/CONJUR-MINC/CGU/AGU

PROCESSO nº 01400.028590/2023-90

INTERESSADA: Subsecretaria de Espaços e Equipamentos Culturais

ASSUNTO: Infraestrutura cultural. Fomento à Cultura.

 

EMENTA: DIREITO FINANCEIRO E ORÇAMENTÁRIO.
I - Política Nacional Aldir Blanc de Fomento à Cultura. Orçamento. Vinculação de recursos da política de fomento à cultura para a execução de obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
II - Inteligência do art. 18 da Lei nº 14.719/2023. Possibilidade de vinculação de percentuais diferenciados em diferentes exercícios da PNAB, desde que observados os percentuais máximos e mínimos estabelecidos no § 2º do art. 18.
III - Possibilidade de liberação dos entes federados de executar ações do PAC com recursos da PNAB no exercício de 2023 e ampliação do percentual vinculado para o exercício de 2024, mantida a transferência obrigatória conforme os requisitos da própria PNAB.

 

 

Sra. Consultora Jurídica,

 

Os presentes autos tratam de consulta da Subsecretaria de Espaços e Equipamentos Culturais (SEEC), da Secretaria-Executiva, encaminhada por meio do Ofício nº 32/2023/CGME/SEEC/GSE/MinC (doc. SEI/MinC 1530757).

O objeto da consulta diz respeito à execução orçamentária dos recursos da Lei nº 14.399/2022, que instituiu a Política Nacional Aldir Blanc de Fomento à Cultura - PNAB, particularmente no que diz respeito à parcela de recursos que foi vinculada à execução de obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), regido pela Lei nº 11.578/2007.

Conforme informado no referido ofício, a vinculação de parte das transferências obrigatórias da PNAB ao PAC se deu por força do art. 18 da Lei nº 14.719/2023, que autorizou o Ministério da Cultura a estabelecer diretrizes para a aplicação dos recursos da PNAB no âmbito do Sistema Nacional da Cultura (SNC), consolidando a PNAB como uma política estruturante do SNC.

Para esta finalidade, o próprio art. 18 da Lei nº 14.719/2023, estabeleceu parâmetros a serem observados pelo Ministério da Cultura em sua regulamentação. Em seu § 1º, definiu as áreas de atuação em que estes recursos vinculados seriam utilizados, entre os quais está a construção de espaços culturais, objeto da presente consulta. Em seu § 2º, estabeleceu percentuais mínimos de tais recursos que deveriam ser adotados em ações específicas, sendo que, especificamente no que se refere ao objeto desta consulta, ficou definido o percentual de 10% do total de recursos da PNAB para obras vinculadas ao PAC. E no § 3º, estabeleceu-se que, inobstante a natureza de transferência obrigatória, os repasses de recursos da PNAB a Estados e municípios relativos a estes recursos vinculados ao PAC poderiam sujeitar-se a convênio ou instrumento congênere.

Segundo informado pela SEEC na consulta, o processo seletivo para que entes subnacionais apresentassem propostas de imóveis para receber as obras do PAC da PNAB foi instituído por meio da Portaria MinC nº 74/2023, ocorrendo no bojo do Programa Territórios da Cultura, regido pela Portaria MinC nº 68/2023. Neste processo seletivo, estaria prevista a formalização de 300 termos de compromisso no âmbito do PAC para a implementação do equipamento denominado CEU da Cultura, com valor total de repasse de R$ 600 milhões da PNAB, sendo R$ 300 milhões do orçamento de 2023 e outros R$ 300 milhões do orçamento de 2024, o que equivale a 10% dos recursos da PNAB de cada orçamento anual.

No entanto, a SEEC reporta que deve encontrar sérias dificuldades de formalizar os termos de compromisso necessários para executar os repasses relativos aos recursos da PNAB de 2023 em tempo hábil, tendo em vista a proximidade do final do exercício sem que tenha sido editado o esperado decreto que regularia os procedimentos operacionais para implementação de tais termos de compromisso do PAC. Além disso, não haveria mais tempo hábil para contratação de mandatária da União para a gestão operacional dos termos de compromisso.

Neste sentido, questiona-se sobre a possibilidade jurídica de reorientar as diretrizes do Ministério da Cultura quanto à forma de executar orçamentária e financeiramente estes recursos. De modo particular, indaga-se se seria possível utilizar R$ 600 milhões dos recursos da PNAB previstos para 2024 para a celebração dos termos de compromisso do PAC para a construção dos CEUs da Cultura no exercício de 2024, considerando as disposições estabelecidas no § 2º do art. 18 da Lei nº 14.719/2023.

É o relatório. Passo à análise.

A PNAB é política de fomento à cultura instituída pela Lei nº 14.399/2022 que prevê transferências obrigatórias da União para Estados, municípios e o Distrito Federal da ordem de R$ 3 bilhões por ano ao longo de cinco anos, totalizando um montante de R$ 15 bilhões, conforme o art. 6º da referida lei. O PAC, por sua vez, foi instituído pela Lei nº 11.578/2007 para implementar ações de interesse da União por entes federados também por meio de transferências obrigatórias. Tais ações são determinadas em lei orçamentária, decreto, atos do Comitê Gestor do PAC, ou ainda por leis específicas, como ocorre no caso em exame, em que parte dos recursos da PNAB, embora caracterizados como transferências obrigatórias, foram vinculados a ações específicas pela Lei nº 14.719, de 1º de novembro de 2023.

Conforme previsto no art. 18 de tal lei, compete ao Ministério da Cultura, por ato próprio, definir as diretrizes para a aplicação dos recursos da Política Nacional Aldir Blanc - PNAB (Lei nº 14.399/2022). Estas diretrizes incluem a vinculação de recursos da PNAB para determinadas ações, particularmente construção ou reformas de espaço culturais, próprios da administração pública ou não; aquisição de equipamentos e acervos; ações de fortalecimento da Política Nacional de Cultura Viva – PNCV (Lei nº 13.018/2014), entre outras políticas de cultura relacionadas ao Sistema Nacional de Cultura (SNC).

Para o objeto desta consulta, interessa-nos tratar especificamente do inciso I do § 1º do art. 18, isto é, a vinculação de recursos da PNAB para a construção de espaços culturais no âmbito do PAC.

Embora o art. 18 atribua ampla discricionariedade ao Ministério da Cultura para estabelecer diretrizes para aplicação dos recursos da PNAB, especificamente no que tange ao PAC, o § 2º do artigo já traz alguns parâmetros obrigatórios a serem observados em regulamentos que venham a dispor sobre o tema. Primeiramente, é estabelecido um percentual máximo de 30% do valor total dos recursos da PNAB previstos na Lei nº 14.399/2022. Em segundo lugar, estabelece que, destes 30%, ao menos um terço (10%) deva ser direcionado para a PNCV, e no máximo um terço (10%) deva ser direcionado ao PAC.

No entanto, é importante observar que estes percentuais definidos em lei não se referem a cada exercício da PNAB especificamente, mas ao total de R$ 15 bilhões previstos na Lei nº 14.399/2022. Além disso, a lei não especifica de que forma estes recursos precisam ser vinculados a cada política ou programa, tampouco se esta vinculação deva ocorrer de forma proporcional em todos os exercícios de execução da PNAB. Tais detalhes podem, a princípio, ser regulamentados pelo Ministério da Cultura com base no caput do art. 18 da Lei nº 14.719/2023.

Assim, desde que respeitado o percentual máximo de vinculação dos recursos, bem como as proporções de distribuição de recursos entre os entes subnacionais estabelecida na Lei nº 14.399/2023, pode o Ministério da Cultura condicionar percentuais diferenciados de repasses em diferentes exercícios, inclusive desvinculando a totalidade dos recursos previstos para 2023 e vinculando um percentual maior para o exercício de 2024. Caso esta opção seja exercida, porém, é importante observar que a desvinculação implica em que todo o orçamento da PNAB deva ser repassado aos entes federados que apresentem plano de ação de acordo com as ações da PNAB. Afinal, trata-se de transferências obrigatórias que estariam desvinculadas do art. 18 da Lei nº 14.719/2023, e passariam a estar condicionadas unicamente aos requisitos da própria PNAB.

Ademais, esta prerrogativa pode vir a ser exercida de forma gradual e ser aplicada de forma diferenciada para os percentuais mínimos específicos estabelecidos para as obras do PAC e para as ações da PNCV, previstos no § 2º do  art. 18 da Lei 14.719/2023, desde que, em qualquer caso, sejam respeitados os percentuais mínimo e máximos para cada modalidade de gasto sobre o total de recursos previstos para os cinco anos da PNAB.

Por fim, observamos que, caso esta seja a opção a ser adotada pelo Ministério, o processo seletivo para os terrenos a serem contemplados no Programa Territórios da Cultura (obras do PAC no MinC) deverá ter seus normativos adaptados para que Estados possam qualificar-se ao recebimento dos recursos conforme a proporcionalidade a que fazem jus, dentro da nova sistemática a ser adotada, que os obrigará a executar um volume maior dos seus repasses da PNAB em ações do PAC.

Neste sentido, a Portaria MinC nº 74/2023 poderá ser alterada para reorganizar os prazos para a conclusão do processo seletivo dos CEUS da Cultura, de modo a condicionar apenas a aplicação de recursos da PNAB previstos para o orçamento de 2024.

Com esta medida, entende-se que restaria superada, sem riscos jurídicos, a dificuldade operacional apontada pela SEEC no Ofício nº 32/2023/CGME/SEEC/GSE/MinC (doc. SEI/MinC 1530757), viabilizando a vinculação de um montante razoável de recursos apenas em 2024 sem prejuízo da livre execução dos recursos de 2023 pelos entes federados no próprio fomento à cultura da PNAB. Assim, recuperar-se-ia o tempo hábil para as contratações e termos de compromisso necessários no âmbito do PAC, a fim de que não haja atrasos de cronogramas para início das obras do programa, tornando a execução financeira de tais obras muito similar àquela que ocorreria caso os repasses já tivessem ocorrido em 2023.

 

À consideração superior.

 

Brasília, 6 de dezembro de 2023.

 

OSIRIS VARGAS PELLANDA

Advogado da União

Coordenador-Geral Jurídico de Políticas Culturais

 


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