ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA DA UNIÃO ESPECIALIZADA VIRTUAL DE PATRIMÔNIO
NÚCLEO JURÍDICO SUMÁRIO

NOTA n. 00144/2023/NUCJUR-SUM/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU

 

NUP: 04977.003159/2011-61

INTERESSADOS: COMPANHIA PAULISTA DE FORÇA E LUZ (33.050.196/0001-88)

ASSUNTOS: PATRIMÔNIO PÚBLICO

 

 

Vem a esta Consultoria Jurídica especializada em patrimônio pela sexta vez, processo administrativo encaminhado pela  Superintendência do Patrimônio da União em São Paulo referente à regularização de imóvel utilizado irregularmente pela COMPANHIA PAULISTA DE FORÇA E LUZ - CPFL, desta vez para dirimir dúvida aposta na Nota Técnica SEI nº 45483/2023/MGI (SEI nº 38671357), qual seja, "se há alguma irregularidade em lavrar o atual Contrato de Cessão e a CPFL efetuar a quitação parcial de débitos, a partir de 1 de maio de 2021, sem prejuízo da continuidade da discussão administrativa e judicial sobre o restante dos valores, pós lavratura do Contrato de Cessão Onerosa, até o período de prescrição e decadência".

Para melhor entendimento da consulta, necessário trazer o texto da mencionada Nota Técnica:

Sumário Executivo

Trata o presente de regularização de ocupação de imóvel da União ocupado pela CPFL, no bairro do Jabaquara, município de Santos. No local, existe uma subestação de energia elétrica, espólio da extinta PORTOBRAS. A CPFL ocupava o imóvel com autorização da CODESP, todavia, sem um instrumento previsto na Legislação Patrimonial.

O assunto já foi tema de uma série de Notas Técnicas e pareceres da CJU, acostados ao longo deste processo.

Após a elaboração de novo Laudo de Homologação e encaminhamento ao Órgão Central da SPU, o processo parece estar caminhando ao desfecho, após a Nota Técnica 39532, SEI 37944048, aguarda manifestação final do GE-DESUP.

Porém, ainda resta um último ponto de discussão: embora a Nota Técnica 39532, SEI 37944048, deixe claro que a assinatura do Contrato de Cessão Onerosa só poderá ser efetuado após o pagamento dos retroativos, a CPFL reconhece apenas a data a partir de 12/04/2021, momento em que houve a revogação do Termo de Permissão de Uso efetivado pela CODESP, com a saída da área da Poligonal do Porto de Santos.

Em relação aos anos anteriores de ocupação, dentro do período de prescrição e decadência, a CPFL pretende discutir de forma administrativa e judicial após a lavratura do presente Contrato de Cessão - SEI 38667552.

Análise

O imóvel, próprio nacional, espólio da extinta PORTOBRÁS, parte do RIP 7071.00132.500-8, é ocupado por subestação da CPFL há tempo. Com o início do procedimento de regularização desses imóveis, pelo Escritório do Patrimônio da União na Baixada Santista, demos início da instrução processual para Cessão onerosa do imóvel.

Durante o andamento do processo, inicialmente, questionamos a Consultoria Jurídica da União em São Paulo, a quem deveria ser atribuída a Cessão do bem: a ANEEL ou a CPFL. A questão suscitou uma série de dúvidas. Houveram manifestações tanto da CJU-SP como da ANEEL. O processo foi enviado para o DECOR para manifestação final, conforme fl. 315;

Na manifestação do DECOR, houve a definição de que o Contrato de Cessão deveria ser lavrado em nome da CPFL e que deveria ser oneroso;

O processo tramitou na SPU durante alguns anos, e, neste ano, está próximo de um desfecho.

Ocorre que na Nota Técnica SEI nº 39532/2023/MGI, SEI 37944048, existe a seguinte advertência de nosso Órgão Central:

É essencial reafirmar que a lavratura do contrato de cessão fica condicionada a quitação dos valores por uso pretérito do bem como já citado em despachos anteriores desta unidade especializada ao longo dos autos.

Neste termos, respeitando o consignado pela Nota Técnica supracitada, efetuamos a Notificação SEI nº 965/2023/SSDEP/SEDEP/COOR/SPU-SP/SPU-MGI, SEI 38285057, informando a CPFL sobre a necessidade de pagamento do retroativo, observando o período de prescrição e decadência:

Informamos que está em fase final de instrução o Processo n° 04977.003159/2011-61, que versa sobre a Regularização da Ocupação da Companhia Piratininga de Força e Luz - CPFL, em imóvel da União, próprio nacional, localizado na Rua Francisco Manoel, nº 1019, no Bairro do Jabaquara, no Município de Santos, Estado de São Paulo, cadastrado sob o RIP nº 7071.01445.500-2.

É essencial reafirmar que a lavratura do contrato de cessão fica condicionada a quitação dos valores por uso pretérito do bem como já citado em despachos anteriores desta unidade especializada ao longo dos autos.

Considerando o Art. 10 e Art. 47, §1°, da Lei n°9.636/98, informamos que a Companhia Piratininga de Força e Luz - CPFL, deverá quitar os valores devidos, referentes a ocupação dos últimos 10 (dez) anos, anteriores a lavratura do Contrato de Cessão, de acordo com as verificações relativas a data de ocupação, conhecimento e data de lavratura do futuro Contrato.

Em resposta, através da Notificação SEI nº 965/2023/SSDEP/SEDEP/COOR/SPU-SP/SPU-MGI, SEI 38667552, a CPFL argumenta que o imóvel estava inserido dentro da Poligonal do Porto de Santos, e havia um Termo de Permissão de Uso firmado com a Autoridade Portuária, conforme SEI 38667884:

4. No entanto, em 12/04/2021, a CODESP, por meio da Notificação nº SPA-DINEG- GD/35.2021, revogou o direito de uso do imóvel concedido a PIRATININGA, sob a justificativa de “que o objeto do TPU em questão não está inserido nos limites da Nova Poligonal do Porto de Santos, motivo pelo qual restituímos a gestão da área em questão à SPU-SP para que sejam adotadas as medidas necessárias junto à CPFL”.
5. Dessa forma, a partir de maio/2021, a PIRATININGA deixou de pagar o valor ref. ao uso do imóvel, tendo ciência de sua inadimplência a partir de tal data, haja vista que até abril/2021 os pagamentos ocorreram normalmente para a CODESP, conforme TPU;

13. De fato, como largamente discutido no decorrer deste processo, a Autoridade Portuária efetuou gestão dessas áreas, mesmo após a extinção da PORTOBRAS, momento pelo qual a gestão deveria ser da SPU.

14. Entre 2003 e 2020, o Decreto n° 4.333, de 12 de Agosto de 2002, regulamentava a delimitação do Porto de Santos:

 

Art. 2o A área do Porto Organizado de Santos, no Estado de São Paulo, é constituída:

 

I - pelas instalações portuárias terrestres existentes na margem direita do estuário formado pelas Ilhas de São Vicente e de Santo Amaro, desde a Ponta da Praia até a Alamoa e, na margem esquerda, desde as Ilhas de Barnabé até a embocadura do Rio Santo Amaro, abrangendo todos os cais, docas, pontes, piers de atracação e de acostagem, armazéns, pátios, edificações em geral, vias internas de circulação rodoviárias e ferroviárias e, ainda, os terrenos ao longo dessas faixas marginais e em suas adjacências, pertencentes à União, incorporados ou não ao patrimônio do Porto de Santos, ou sob sua guarda e responsabilidade, incluindo-se também a Usina Hidrelétrica de Itatinga e a faixa de domínio de suas linhas de transmissão;

 

II - pela infra-estrutura de proteção e acesso aquaviário, tais como áreas de fundeio, bacias de evolução, canal de acesso até o paralelo 23º 54’ 48"S e áreas adjacentes a este até as margens das instalações terrestres do porto organizado, conforme definido no inciso I deste artigo, existentes ou que venham a ser construídas e mantidas pela Administração do Porto ou por órgão do Poder Público.

 

15. Ocorre que, até 2020, a Poligonal do Porto de Santos, em termo técnicos, não era um polígono fechado, com precariedade nos limites, na nova configuração urbana do município de Santos. A SPU enfrentou discussões similares em inúmeros processos, sobre a utilização para atividades não portuárias.

16. Pela leitura da Lei da Antiga Poligonal do Porto de Santos, é claro que deve existir uma atividade portuária para que a gestão seja da Autoridade Portuária. Assim, de fato, a gestão deve, e deveria ser da SPU.

17. Mas a situação fática é que existia um Termo de Permissão de Uso, para um órgão da esfera federal, com capital predominantemente público, que efetuava a cobrança pela ocupação. Apenas através da Portaria n° 77, de 29 de junho de 2020, que efetivamente foi publicada uma Poligonal Fechada do Porto Organizado.

18.Assim, na mesma resposta a Notificação SEI nº 965/2023/SSDEP/SEDEP/COOR/SPU-SP/SPU-MGI, SEI 38667552, a CPFL argumenta:

Portanto, com o devido respeito e acatamento, a PIRATININGA não concorda em anuir com a quitação dos valores referentes a ocupação dos últimos 10 (dez) anos, anteriores a lavratura do Contrato de Cessão, por entender que: (i) é notável a inadimplência a partir de Maio/2021; (ii) o Termo de Permissão de Uso foi celebrado junto à CODESP, do qual os pagamentos eram realizados para tal órgão; (iii) não é de autonomia da PIRATININGA gerenciar repasses monetários entre CODESP vs SPU; (iv) a solicitação da regularização dos débitos anteriores à maio/2021, deverão seguir com discussões em outro fórum, e se necessário, judicialmente;

19. Assim, está claro que a CPFL pretende quitar os débitos a partir de 1 de maio de 2021, lavrar o atual contrato e começar a pagar os valores de retribuição mensal. Em relação aos valores pretéritos de maio de 2021, pretendem continuar a discussão.

20. Desta forma, cabe um questionamento a nossa Consultoria Jurídica da União, se há alguma irregularidade em lavrar o atual Contrato de Cessão e a CPFL efetuar a quitação parcial de débitos, sem prejuízo da continuidade da discussão administrativa e judicial sobre o restante.

21. Com isso, partimos de uma situação de "total" irregularidade, perante a Legislação Patrimonial, para uma situação regular, do ponto de vista da ocupação, e de discussão, do ponto de vista de pagamento parcial dos retroativos.

 

Conclusão

23.Tendo em vista a argumentação da CPFL - Piratininga, em relação ao pagamento de valores retroativos, apenas a partir da rescisão do Termo de Permissão de Uso com a Autoridade Portuária, sugiro o encaminhamento a CJU, questionando se há alguma irregularidade em lavrar o atual Contrato de Cessão e a CPFL efetuar a quitação parcial de débitos, a partir de 1 de maio de 2021, sem prejuízo da continuidade da discussão administrativa e judicial sobre o restante dos valores, pós lavratura do Contrato de Cessão Onerosa, até o período de prescrição e decadência.

Recomendação

Encaminhar a Consultoria Jurídica da União. (grifos nosso)

 

Uma preliminar, porém, cumpre-se ser levantada.

Diante da análise dos autos, possível é verificar que a CPFL quer se valer da condição de concessionária de serviço público para tentar não cumprir com as determinações legais. Tanto que por longos anos, sequer se pronunciou para o chamado nos autos pela SPU/SP. Advirta-se que o único privilégio da concessionária em uma possível regularização do imóvel, é utilizá-lo mediante prévia declaração de inexigibilidade de licitação. No mais, terá que observar toda a legislação patrimonial (inclusive de preço fixado nos normativos e pagamento de multa), tal como ela  dispensa o tratamento aos usuários do serviço público do qual é prestadora.

Neste ponto, portanto, a SPU/SP não pode se desvencilhar de seu dever no exercício do poder de polícia - o fiscalizatório - e consequente aplicação de multa, tal logo seja detectado uma infração. Note-se que não se trata de uma atividade de cunho subjetivo, de avaliação de mérito, mas de ato objetivo determinado por lei., conforme Decreto-Lei nº 2.398/1987:

Art. 6o Considera-se infração administrativa contra o patrimônio da União toda ação ou omissão que viole o adequado uso, gozo, disposição, proteção, manutenção e conservação dos imóveis da União. (Redação dada pela  Lei nº 13.139, de 2015).

(...)

§ 7o Verificada a ocorrência de infração, a Secretaria do Patrimônio da União do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão aplicará multa e notificará o embargo da obra, quando cabível, intimando o responsável para, no prazo de 30 (trinta) dias, comprovar a regularidade da obra ou promover sua regularização. (Incluído pela  Lei nº 13.139, de 2015)

 

No mesmo sentido, é a Instrução Normativa nº 23/20 quando prevê:

 
Art. 17.A multa por infração contra o patrimônio da União será aplicada nas hipóteses previstas no art. 6º do Decreto-Lei nº 2.398, de 1987.
(...)
§ 3º Verificada a ocorrência de infração, o fiscal da SPU aplicará multa, contendo informações de autoria, materialidade e valor da infração, e notificará o embargo da obra, quando cabível, intimando o responsável para, no prazo de 30 (trinta) dias, comprovar a regularidade da obra ou promover sua regularização.
(...)
§ 5º Caberá ao autuado demonstrar à Secretaria do Patrimônio da União que o cometimento da infração foi cessado, cabendo ao órgão a análise e a deliberação sobre continuidade da cobrança da multa.
§ 6º A multa será cominada cumulativamente com o disposto no parágrafo único do art. 10 da Lei no 9.636, de 1998, nos casos de ocorrências em imóveis dominiais.
§ 7º Não será aplicada a multa quando se verificar a mera posse ou ocupação ilícita da área, sem que nela tenha sido realizado irregularmente qualquer aterro, construção, obra, cercas, instalação de equipamentos ou outras benfeitorias, hipótese em que incidirá o disposto no parágrafo único, do art. 12º, sem prejuízo da aplicação do Capítulo III, desta IN.
(...)

 

Portanto, basta que se identifique a infração e os responsáveis pelo imóvel para que se aplique a sanção.

É oportuno ressaltar que a ninguém é dado o direito de alegar o desconhecimento da lei para justificar o respectivo descumprimento, já que nos termos  Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro:

Art. 3o  Ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece. 

 

Desse modo, ainda que não tenha sido objeto da consulta, verificamos que a CPFL  atravessou recurso quando autuada pela construção não autorizada pela SPU e defendendo-se, alegou que tinha sido autorizada pela Prefeitura, o que sob sua ótica, afastaria a irregularidade.

Ora, sabe-se que os normativos que regem os imóveis do patrimônio da União são expressos em determinar a necessidade de prévia autorização da Superintendência do Patrimônio da União, com o prévio depósito dos projetos arquitetônicos para sua análise.

Inconteste, portanto, a irregularidade pela ocupante do imóvel.

Já quanto à consulta especificada na Nota Técnica SEI nº 45483/2023/MGI (SEI nº 38671357), verifica-se, como já amplamente fundamentado nos autos do processo, o entendimento da Advocacia-Geral da União, por meio do  PARECER n. 01124/2015/MAA/CONJUR-MP/CGU/AGU (NUP: 04905.201964/2015-25), acompanhado por esta Consultoria-Jurídica, de que a multa será aplicada sempre que detectada a irregularidade/infração, podendo ser substituída pela cobrança retroativa nas hipóteses de regularização por cessão de uso onerosa. É o que prescreve, inclusive, o § 9º, do art. 17 da Instrução Normativa nº 23/20.

Sabe-se que as áreas inseridas dentro porto organizado estão fora da gestão da Secretaria do Patrimônio da União, sendo atribuição da concessionária do porto. É também sabido, conforme alegado na Nota Técnica, que até a publicação da Portaria n° 77, de 29 de junho de 2020, que definiu a nova Poligonal do Porto Organizado, não havia um contrato de cessão único da área para a Companhia Docas do Estado de São Paulo - CODESP, e sim a destinação de várias parcelas da poligonal em separado, já que tal poligonal não era uma área fechada.

Apesar de a CPFL afirmar e ter apresentado o Termo de Permissão de Uso nº 12/2002 firmado em 30/08/2002 com a Companhia Docas do Estado de São Paulo - CODESP para o uso da área, a SPU afirma haver dúvidas se tal área estaria inserida dentro da poligonal do Porto. Então pergunta, se poderia ser firmado o contrato de cessão de uso onerosa com a previsão do pagamento retroativo quanto ao tempo em que não há questionamento da CPFL.

Pois bem, parece que antes da publicação da Portaria n° 77, de 29 de junho de 2020, até a SPU/SP  não tinha certeza quanto às áreas passíveis de sua gestão. Some-se a isso, o fato de a CPFL alegar ter pago os valores para a CODESP (o que deverá ser comprovado nos autos). Tais fatos parecem permitir a possibilidade de firmar-se o contrato de cessão de uso onerosa com a previsão expressa de que os valores serão pagos retroativamente à data da publicação da Portaria nº 77 ou à data de início de seus efeitos, com a ressalva de que os anos anteriores serão analisados pela Administração, caso em que a CPFL aceitará a conclusão do respectivo processo administrativo, devendo efetuar o pagamento acaso assim for a decisão da Administração.

É o entendimento que se apresenta, diante dos fatos elencados.

Remetam-se ao órgão consulente, com as considerações de estilo.

 

 

Brasília, 08 de dezembro de 2023.

 

 

 

PATRÍCIA KARLLA BARBOSA DE MELLO

ADVOGADA DA UNIÃO

 

 


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