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CONSULTORIA JURÍDICA JUNTO AO MINISTÉRIO DA CULTURA
COORDENAÇÃO-GERAL DE PARCERIAS E COOPERAÇÃO FEDERATIVA


PARECER n. 00325/2023/CONJUR-MINC/CGU/AGU

 

NUP: 01400.034422/2023-33

INTERESSADOS: SUBSECRETARIA DE PLANEJAMENTO ORÇAMENTO E ADMINISTRAÇÃO - MINISTÉRIO DA CULTURA

ASSUNTOS: CONTA ÚNICA DO TESOURO NACIONAL. EMPENHO.

 

EMENTA:
I. Direito Financeiro. Direito Administrativo.
II. Conta Única do Tesouro Nacional. Princípio da Anualidade Orçamentária. Lei nº 4.320, de 1964. Decreto nº 93.872, de 1986. Instrução Normativa STN nº 04, de 2004.
III. Imposto de renda. Pagamento de bolsas culturais, prêmios e ajuda de custo no âmbito do Ministério da Cultura.

 

I. RELATÓRIO

 

Trata-se de consulta realizada pela Subsecretaria de Planejamento, Orçamento e Administração do Ministério da Cultura acerca dos questionamentos levantados pela Coordenação-Geral de Execução Orçamentária e Financeira no Ofício nº 3724/2023/CGEX/SPOA/GSE/GM/MinC (SEI nº 1538884).

 

Segundo exposto pela Coordenação-Geral de Execução Orçamentária e Financeira no Ofício nº 3724/2023/CGEX/SPOA/GSE/GM/MinC (SEI nº 1538884), para execução de determinadas políticas públicas no âmbito do Ministério da Cultura, busca-se abrir novas contas correntes junto ao Banco do Brasil para atender aos casos em que os recursos não possam ser sacados diretamente da Conta Única, nos termos do art. 9º, §1º, inciso VI da IN STN n.º 04, de 30 de agosto de 2004.

 

Para tanto, as contas correntes foram abertas e foram emitidas notas de empenho em favor do Banco do Brasil, que atuará como beneficiário do crédito e do recurso financeiro, atuando como agente financeiro para, posteriormente,  repassar os recursos aos beneficiários finais.

 

Ocorre que, segundo a área técnica, as Unidades Gestoras solicitaram o aporte integral dos recursos nas contas correntes. Contudo, até o momento, nem todos os Editais lançados foram encerrados, de forma que os beneficiários finais que receberão o recurso são ainda desconhecidos.

 

A Coordenação-Geral de Execução Orçamentária e Financeira demonstra preocupação com o pretendido, alegando que o cenário pode suscitar questionamentos relacionados à finalidade da abertura da conta corrente e aos princípios da administração Orçamentária e Financeira, principalmente quanto à anualidade do orçamento, uma vez que será alocado orçamento e recurso financeiro de 2023 para pagamento a ser realizado apenas no ano seguinte (aos beneficiários finais).  Entende também não ser viável a manutenção de tais empenhos para inscrição em restos a pagar, no caso da não ocorrência do aporte à conta corrente, uma vez que não se conhecem os beneficiários. 

 

Por fim, destaca também a incerteza de como será realizado o recolhimento referente ao Imposto de Renda, que está previsto para alguns dos programas.

 

Diante deste cenário, solicitou o encaminhamento dos questionamentos à Consultoria Jurídica e à Secretaria do Tesouro Nacional.

 

Não há informação nos autos sobre o efetivo encaminhamento do processo à Secretaria do Tesouro Nacional, constando somente, além do Ofício nº 3724/2023 (SEI nº 1538884), do Ofício nº 355/2023 (SEI nº, 1545233) e do Ofício nº 6828/2023 (SEI nº 1545257), a Nota Técnica nº 01/2023 (SEI nº 1543353).

 

Na Nota Técnica nº 01/2023 (SEI nº 1543353), o Coordenador Geral de Orçamento, Finanças e Contabilidade entendeu que "os procedimentos têm conformidade normativa, não cabendo aqui manifestação sobre conveniência e oportunidade das solicitações".  

 

Destacou que "a IN STN nº 04 não trouxe como requisito que os beneficiários dos programas sociais já estejam previamente definidos. Neste mesmo bojo, a norma também não traz menção à obrigatoriedade de que os recursos a serem movimentados devam se ater ao mesmo exercício do aporte. Além disso a transferência de recursos para movimentação de conta corrente exige tanto o empenho quanto o pagamento (os recursos somente estarão disponíveis com o pagamento devidamente executado), portanto não há que se falar em restos a pagar para o caso de recursos a serem movimentados por conta corrente específica".

 

Com relação ao imposto de renda, informou que a "retenção e recolhimento deverão ser realizados no âmbito da própria conta corrente aberta, portanto fora do Sistema Integrado de Administração Financeira - SIAFI.  Entende-se ser possível o lançamento direto das retenções nos sistemas da Receita Federal EFD/REINF e a geração de Documento de Arrecadação de Receitas Federais - DARF para pagamento pelo próprio Banco do Brasil, com débito na própria conta corrente".

 

É o relatório.

 

II. ANÁLISE JURÍDICA

 

A Consultoria Jurídica procede à análise com fundamento no art. 11 da Lei Complementar nº 73/93, subtraindo-se do âmbito da competência institucional deste Órgão Jurídico, delimitada em lei, análises que importem em considerações de ordem técnica, financeira ou orçamentária, nos termos do Enunciado de Boas Práticas Consultivas AGU nº 7:

 

“A manifestação consultiva que adentrar questão jurídica com potencial de significativo reflexo em aspecto técnico deve conter justificativa da necessidade de fazê-lo, evitando-se posicionamentos conclusivos sobre temas não jurídicos, tais como os técnicos, administrativos ou de conveniência ou oportunidade, podendo-se, porém, sobre estes emitir opinião ou formular recomendações, desde que enfatizando o caráter discricionário de seu acatamento” (Manual de Boas Práticas Consultivas. 4.ed. Brasília: AGU, 2016, página 32).

 

Cabe destacar que uma das finalidades deste órgão jurídico é conferir segurança jurídica às autoridades administrativas no exercício de sua função, evitando consequências sancionatórias perante órgãos de controle, e que, na impossibilidade de adoção de determinado caminho (sempre indicado como recomendação), a Consultoria Jurídica indica a forma que entende como mais segura juridicamente para atingir o fim pretendido pelo gestor público.

 

Como relatado, o Ofício nº 3724/2023/CGEX/SPOA/GSE/GM/MinC (SEI nº 1538884) demonstrou preocupação com o pretendido pelas Unidades Gestoras do Ministério da Cultura que solicitaram o aporte integral dos recursos nas contas correntes abertas junto ao Banco do Brasil para pagamento futuro de beneficiários, que ainda sequer foram conhecidos.

 

Destacou também que contas correntes fora do sistema da conta única já foram abertas, bem como já foram emitidas notas de empenho em favor do Banco do Brasil, que atuará como beneficiário do crédito e do recurso financeiro, atuando como agente financeiro para, posteriormente, vir a repassar os recursos aos beneficiários finais.

 

Diante deste cenário, esta manifestação jurídica será dividida em três itens: (a) análise da conta corrente aberta, não sacando os recursos da Conta Única do Tesouro Nacional; (b) pretensão de se empenhar todo o valor disponível ao Ministério da Cultura, mesmo sendo desconhecidos os destinatário dos recursos; e (c) tributação das bolsas e premiações culturais.

 

 

(A) DA ABERTURA DE CONTAS CORRENTES

 

Segundo informou a Coordenação-Geral de Execução Orçamentária e Financeira no Ofício nº 3724/2023/CGEX/SPOA/GSE/GM/MinC (SEI nº 1538884), com base no art. 9º, §1º, inciso VI da Instrução Normativa STN nº 04, de 30 de agosto de 2004, foram abertas contas correntes e foram emitidas notas de empenho em favor do Banco do Brasil, de modo que estes recursos em específico não mais serão sacados diretamente da Conta Única, na medida em que ocorresse a efetiva necessidade de saque.

 

 A Conta Única do Tesouro Nacional é um instrumento crucial para a gestão eficiente das finanças públicas. Essa conta tem como principal característica reunir em um único local todos os recursos financeiros do governo, independentemente da origem ou finalidade.

 

Ao centralizar todos os recursos, a conta única proporciona uma visão consolidada das finanças públicas. Isso facilita a análise e o entendimento da situação fiscal do governo. Permite uma visão mais clara dos saldos disponíveis. Facilita a prestação de contas, amplia a transparência, além de reduzir os custos operacionais associados à gestão financeira.

 

A regra geral, portanto, é que toda despesa seja paga mediante saques na conta do Tesouro Nacional, como expressa o art. 5º do Decreto nº 93.872, de 1986:

 

Art . 5º O pagamento da despesa, obedecidas as normas reguladas neste decreto, será feito mediante saques contra a conta do Tesouro Nacional (Decreto-lei nº 200/67, parágrafo único do art. 92).

 

No mesmo sentido, a Medida Provisória nº 2.170-36, de 23 de agosto de 2001 dispõe:

 

Art. 1o  Os recursos financeiros de todas as fontes de receitas da União e de suas autarquias e fundações públicas, inclusive fundos por elas administrados, serão depositados e movimentados exclusivamente por intermédio dos mecanismos da conta única do Tesouro Nacional, na forma regulamentada pelo Poder Executivo.
Parágrafo único.  Nos casos em que características operacionais específicas não permitam a movimentação financeira pelo sistema de caixa único do Tesouro Nacional, os recursos poderão, excepcionalmente, a critério do Ministro de Estado da Fazenda, ser depositados no Banco do Brasil S.A. ou na Caixa Econômica Federal.

 

Como exposto pelo próprio dispositivo, exceções da regra de movimentação na conta única, somente ocorrerão "Nos casos em que características operacionais específicas não permitam a movimentação financeira".

 

Regulamentando a exceção, a Secretaria do Tesouro Nacional editou a Instrução Normativa nº STN nº 04, de 30 de agosto de 2004, que assim dispõe:

 

Art. 9º Para atender aos casos em que os recursos não possam ser sacados diretamente da Conta Única, os órgãos e entidades da Administração Pública Federal integrantes do orçamento fiscal e da seguridade social excepcionalmente poderão movimentar recursos financeiros em contas correntes bancárias mantidas junto ao Banco do Brasil S/A, ou outros agentes financeiros autorizados pelo Ministério da Fazenda.
§ 1º Poderão ser abertas contas nas seguintes situações:
I - Contas das unidades gestoras off line: utilizadas para movimentação das disponibilidades financeiras das Unidades Gestoras que operam com o SIAFI na modalidade off-line;
II - Contas em moeda estrangeira: utilizadas por Unidades Gestoras autorizadas a abrigar as disponibilidades financeiras em moeda estrangeira para pagamento de despesas no exterior, nos termos do Decreto nº 94.007, de 9 de janeiro de 1987;
III - Contas especiais: utilizadas para a movimentação dos recursos vinculados a empréstimos concedidos por organismos internacionais e agências governamentais estrangeiras, nos termos do Decreto nº 890, de 9 de agosto de 1993, e em consonância com esta Instrução Normativa;
IV - Contas de fomento: utilizadas por unidades gestoras para movimentação de recursos vinculados a operações oficiais de crédito;
V - Contas de Suprimento de Fundos: utilizadas em caráter excepcional para movimentação de suprimento de fundos, onde comprovadamente não seja possível utilizar o Cartão Corporativo do Governo Federal, sendo vedada a utilização destas contas para quaisquer outras finalidades;
VI - Contas de Execução de Programas Sociais - utilizadas exclusivamente para movimentação de recursos destinados à execução de programas sociais do Governo Federal;
VII - Contas de Recursos de Apoio a Pesquisa: utilizadas em caráter excepcional, exclusivamente para movimentação, por meio de cartão, de recursos concedidos a pessoas físicas pra realização de pesquisas.
(...)

 

Observa-se que para movimentar recursos por conta bancária específica, são requisitos que estes recursos "não possam ser sacados diretamente da Conta Única", bem como que a situação seja enquadrada em uma das hipóteses descritas nos incisos do § 1º do art. 9º Instrução Normativa nº STN nº 04, de  2004.

 

Segundo informação técnica, Secretarias do Ministério da Cultura solicitaram abertura de conta corrente para Execução de Programas Sociais. Há informação de que contas correntes já foram abertas e empenhos já realizados em favor do Banco do Brasil.

 

Não se verifica dos autos ou foi encontrado no sistema SEI do Ministério da Cultura análise específica e aprofundada desta opção feita pelo gestor. Também não se observou manifestação desta Consultoria Jurídica sobre o tema.

 

As justificativas lançadas na solicitação de abertura foram as seguintes:

 

SEI nº 1544731: Secretaria de Economia Criativa e Fomento Cultura
Tal medida se faz necessária uma vez que o Programa em referência se caracteriza pelo atendimento a um grande número de beneficiários, pessoas físicas, que necessitam perceber valores de pequena monta a título de prêmio, bolsa cultural, ajuda de custo e congêneres. Além disso, a tempestividade é um componente determinando na efetividade dos aportes. Deste modo, é salutar e necessário prover capacidade operacional para a correta execução dos recursos.
 
SEI nº 1544759: Secretaria do Audiovisual
O motivo da solicitação é a necessidade de maior eficiência para o pagamento aos beneficiários das ações da Secretaria do Audiovisual, em razão do número de beneficiários que necessitam perceber valores de pequena monta a título de prêmio, bolsa cultural, ajuda de custo e congêneres. Além disso, a tempestividade é um componente determinando na efetividade dos aportes. Deste modo, é salutar e necessário prover capacidade operacional para a correta execução dos recursos.
 
SEI nº 1544784: Secretaria de Formação, Livro e Leitura (SEFLI)
O motivo da solicitação é a necessidade de realização da descentralização da operacionalizam para realização do pagamento das premiações, visando dar celeridade a execução orçamentária e financeira dos editais acima referenciados.
 
SEI nº 1574787: Secretaria de Formação, Livro e Leitura
O motivo da solicitação é a necessidade de realização da descentralização da operacionalizam para realização do pagamento das premiações, visando dar celeridade a execução orçamentária e financeira dos editais acima referenciados.
 
SEI nº 1574793: Secretaria de Cidadania e Diversidade Cultural
Tal medida se faz necessária uma vez que o Programa em referência se caracteriza pelo atendimento a um grande número de beneficiários, pessoas físicas, que necessitam perceber valores de pequena monta a título de prêmio, bolsa cultural, ajuda de custo e congêneres. Além disso, a tempestividade é um componente determinando na efetividade dos aportes. Deste modo, é salutar e necessário prover capacidade operacional para a correta execução dos recursos.
 
SEI nº 1544798: Secretaria de Cidadania e Diversidade Cultural
Tal medida se faz necessária uma vez que o Programa em referência se caracteriza pelo atendimento a um grande número de beneficiários, pessoas físicas, que necessitam perceber valores de pequena monta a título de prêmio, bolsa cultural, ajuda de custo e congêneres. Além disso, a tempestividade é um componente determinando na efetividade dos aportes. Deste modo, é salutar e necessário prover capacidade operacional para a correta execução dos recursos.

 

 

Como visto, o primeiro requisito citado na norma jurídica é que estes recursos "não possam ser sacados diretamente da Conta Única".

 

Assim, por segurança jurídica, recomenda-se às Secretarias que se manifestem expondo por qual razão os recursos não podem ser sacados diretamente na Conta Única. Recomenda-se também que seja explicado como os prêmios e bolsas eram pagos em anos anteriores, se sempre foram abertas contas correntes específicas para tal fim. Se este é o primeiro ano que se pretende abrir a conta corrente em separado da Conta Única, recomenda-se justificar porque a solicitação de abertura ocorre perto do encerramento do exercício financeiro, já que a Pasta Ministerial já vem promovendo Editais de prêmios e outros benefícios desde o início do ano.

 

Recomenda-se, ainda, que fique esclarecido se há custos operacionais envolvidos na abertura de diversas contas, a serem pagos ao Banco do Brasil, e se estes custos são vantajosos, com base no interesse público e na economicidade.

 

A fundamentação enquadrada para abertura da conta foi "Contas de Execução de Programas Sociais - utilizadas exclusivamente para movimentação de recursos destinados à execução de programas sociais do Governo Federal", conforme art. 9º, § 1º, inciso VI, da Instrução Normativa nº STN nº 04, de 2004.

 

Nos termos do Decreto nº 11.016, de 2022, o acesso e a integração de programas sociais do Governo federal ocorrem através do Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal - CadÚnico. Se desconhece, a princípio, que os Editais do Ministério da Cultura, na concessão de premiações e bolsas, são programas englobados ou que se utilizam no mencionado cadastro.

 

Embora o conceito de "Programas Sociais" seja um conceito jurídico indeterminado, isto é, um conceito que deve ser preenchido no caso concreto pela área técnica competente, a excepcionalidade da criação de contas correntes fora da conta única, bem como a motivação do ato administrativo, fazem recomendar com que cada Secretaria que esteja solicitando a abertura da conta justifique, fundamente e explique porque o Edital em que se concedem bolsas culturais (doação com encargo - art. 38, Decreto nº 11.453, de 2023) e premiação cultural (doação sem encargo - art. 41, Decreto nº 11.453, de 2023) podem ser enquadrados no conceito de "Programas Sociais".

 

Vale relembrar que a possibilidade de criação de conta corrente específica é a exceção exposta pela norma, e que toda exceção deve ser interpretada restritivamente. Por essa razão, há necessidade de enquadramento no conceito de "Programas Sociais", sob seu aspecto mais restrito, haja vista que, no conceito amplo, qualquer atuação do Poder Público em benefício de um administrado poderia ser considerado uma ação ou um programa social.

 

Após as devidas justificativas, recomenda-se, assim como foi sugerido pela própria Coordenação-Geral de Execução Orçamentária e Financeira no Ofício nº 3724/2023 (SEI nº 1538884), que os autos sejam encaminhados à Secretaria do Tesouro Nacional, pois compete à STN, nos termos do Decreto nº 11.344, de 2023:

 

Art. 36.  À Secretaria do Tesouro Nacional, órgão central dos Sistemas de Administração Financeira Federal e de Contabilidade Federal, compete:
(...)
VI - planejar, executar e avaliar, em articulação com os órgãos afins, nos aspectos orçamentário, financeiro e contábil, os financiamentos, as subvenções econômicas, as indenizações e as restituições relativas às Operações Oficiais de Crédito e aos Encargos Financeiros da União, os recursos sob a responsabilidade da Secretaria do Tesouro Nacional destinados ao fomento de programas sociais e atividades produtivas no País e no exterior;
(...)
XI - supervisionar a contabilização dos atos e dos fatos de gestão orçamentária, financeira e patrimonial da União;
(...)
XIV - articular-se com os órgãos setoriais do Sistema de Contabilidade Federal para cumprimento das normas contábeis pertinentes à execução orçamentária, financeira e patrimonial;
(...)
XLIII - autorizar a abertura de contas de que trata o parágrafo único do art. 1º da Medida Provisória nº 2.170-36, de 23 de agosto de 2001;
(...)

 

Caso a Secretaria do Tesouro Nacional manifeste-se positivamente pela abertura da conta bancária, entendendo que existem justificativas para excepcionar a movimentação através da Conta Única, a conta poderá ser aberta com segurança jurídica, passando-se a analisar o item seguinte, qual seja, a pretensão de se empenhar todo o valor disponível ao Ministério da Cultura, mesmo sendo desconhecidos os destinatários dos recursos.

 

 

(B) DA PRETENSÃO DE EMPENHAR INTEGRALMENTE OS RECURSOS DA PASTA MINISTERIAL NAS CONTAS CORRENTES ABERTAS EM NOME DAS SECRETARIAS.

 

Além das preocupações levantadas acima, no que concerne à possibilidade/legalidade da abertura das contas correntes em nome das Secretarias do Ministério da Cultura, a Coordenação-Geral de Execução Orçamentária informou que as Unidades Gestoras solicitaram o aporte integral dos recursos nas contas correntes. Contudo, até o momento, nem todos os Editais lançados foram encerrados, de forma que os beneficiários finais que receberão o recurso são ainda desconhecidos.

 

Acertada a precaução levantada pela Coordenação-Geral de Execução Orçamentária e Financeira no Ofício nº 3724/2023 (SEI nº 1538884). O princípio da anualidade orçamentária é um dos princípios fundamentais que orientam a elaboração e execução do orçamento público. Este princípio estabelece que o orçamento deve ser elaborado e executado para um período específico, que no Brasil coincide com o ano civil.

 

Nesse sentido, a Lei nº 4.320, de 1964 dispõe expressamente:

 

Art. 34. O exercício financeiro coincidirá com o ano civil.
 
Art. 35. Pertencem ao exercício financeiro:
I - as receitas nêle arrecadadas;
II - as despesas nêle legalmente empenhadas.

 

Dessa forma, ao final de cada ano fiscal, um novo processo orçamentário é iniciado para o ano seguinte. Isso envolve a elaboração de um novo orçamento, considerando as mudanças nas circunstâncias econômicas, políticas e sociais.

 

Terminado o exercício financeiro, órgãos e entidades governamentais remetem de volta ao Tesouro os saldos ou recursos que não foram utilizados durante seu exercício. Esse processo faz parte da gestão financeira pública e está relacionado à eficiência na utilização dos recursos, à transparência e ao cumprimento das normas e princípios orçamentários.

 

Assim, o Presidente da República irá definir as prioridades da política nacional, ajustando o orçamento de acordo com as necessidades de cada Pasta Ministerial.

 

Verifica-se que a busca de utilização de todo o orçamento, na iminência do encerramento do ano civil, impedindo seu retorno à conta única, para definição de novas prioridades públicas no ano seguinte, se não encontrar fundamento legal autorizativo, vai de encontro a princípios como os da anualidade, transparência e eficiência, podendo prejudicar outras Pastas Ministeriais, ou até mesmo o próprio Ministério da Cultura no quantitativo de recursos recebidos no exercício subsequente.

 

Segundo informa a área técnica, foram emitidos empenhos em favor do Banco do Brasil para futuro pagamento a agentes culturais vencedores de certames competitivos que sequer, em alguns casos, tiveram o resultado concluído e os beneficiários conhecidos.

 

O art. 58 da Lei n.º 4.320 de 1964 fornece a definição legal de empenho: “O empenho de despesa é o ato emanado de autoridade competente que cria para o Estado obrigação de pagamento pendente ou não de implemento de condição”.

 

Como destacado pelo PARECER n.º 19/2016/DECOR/CGU/AGU (NUP 01400.007140/2014-72), que abordou consulta formulada pelo próprio Ministério da Cultura, o empenho não cria por si a obrigação de pagamento, consistindo em uma medida destinada a destacar, dos fundos orçamentários destinados à satisfação daquela despesa, a quantia necessária ao resgate do débito. Um instrumento jurídico que possibilitará o nascimento da obrigação de pagar.

 

Sabe-se também que a materialização do empenho ocorre com a emissão da nota de empenho. E a Lei nº 4.320 de 1964 assim dispõe sobre os requisitos essenciais da nota de empenho:

 
Art. 61. Para cada empenho será extraído um documento denominado ‘nota de empenho’ que indicará o nome do credor, a representação e a importância da despesa bem como a dedução desta do saldo da dotação própria.”

 

Observa-se que o nome do credor deverá ser conhecido nesta fase, e não posteriormente. A liquidação, fase seguinte ao empenho da despesa pública, representa a verificação da correção do empenho realizado. Assim dispõe o art. 63 da Lei nº 4.320 de 1964, que cuida da liquidação da despesa, ou seja, verificação do título pertencente ao credor:

 
Art. 63. A liquidação da despesa consiste na verificação do direito adquirido pelo credor tendo por base os títulos e documentos comprobatórios do respectivo crédito.
§ 1° Essa verificação tem por fim apurar:
I - a origem e o objeto do que se deve pagar;
II - a importância exata a pagar;
III - a quem se deve pagar a importância, para extinguir a obrigação.
§ 2º A liquidação da despesa por fornecimentos feitos ou serviços prestados terá por base:
I - o contrato, ajuste ou acôrdo respectivo;
II - a nota de empenho;
III - os comprovantes da entrega de material ou da prestação efetiva do serviço.

 

No caso dos autos, há informação de que ainda não se sabe quem serão muitos dos beneficiários dos Editais publicados pelo Ministério da Cultura, que só serão conhecidos no ano seguinte.

 

Portanto, estamos diante de uma situação em que não se sabe quem serão os beneficiários, e ainda não há instrumento jurídico que fundamente a transferência de recursos da União para o indivíduo. Ou seja, trata-se de credores futuros e desconhecidos, sem instrumento que permita criar a obrigação de pagamento.

 

Os próprios Editais deixam claro que a participação e escolha de participante ao final do Edital não gera para o vencedor direito a receber o prêmio ou recursos financeiros.

 

A Portaria MinC nº 29, de 21 de maio de 2009, que dispõe sobre a elaboração e gestão de editais de seleção pública para apoio a projetos culturais e para concessão de prêmios a iniciativas culturais, destaca expressamente:

 

Art. 40. O apoio/prêmio aos selecionados está condicionado à existência de disponibilidade orçamentária e financeira, caracterizando a seleção como expectativa de direito do proponente.
Parágrafo único. O disposto neste artigo deverá vir expresso no corpo do edital.

 

Dessa forma, buscar empenhar todo o recurso orçamentário deste exercício ao Banco do Brasil para futuro pagamento a credor final ainda inexistente seria, s.m.j.​, uma via de contornar o princípio da anualidade orçamentária, o que esbarraria nas normas acima.

 

Pela mesma razão, não há que se falar em restos a pagar, pois, novamente, não se sabe quem será o beneficiário final do recurso, e a mera publicação do edital não é o instrumento jurídico que permita identificar o "credor" (ainda não existente) e criar uma obrigação jurídica que vincule a Administração Pública. Nos termos do Decreto nº 93.872, de 1986:

 

Art . 67. Considerem-se Restos a Pagar as despesas empenhadas e não pagas até 31 de dezembro, distinguindo-se as despesas processadas das não processadas (Lei nº 4.320/64, art. 36).
§ 1º Entendem-se por processadas e não processadas, respectivamente, as despesas liquidadas e as não liquidadas, na forma prevista neste decreto.
§ 2º O registro dos Restos a Pagar far-se-á por exercício e por credor.

 

 

(C) TRIBUTAÇÃO DAS BOLSAS E PREMIAÇÕES CULTURAIS.

 

Em relação a como será realizado o recolhimento referente ao Imposto de Renda, "pois se desconhece outros Órgãos que já tenham realizado tal pagamento utilizando as contas correntes do Banco do Brasil" (SEI nº 1538884), deve-se, preliminarmente, ser consultada a Secretaria do Tesouro Nacional, conforme exposto no item (A) desta manifestação jurídica.

 

Caso a Secretaria do Tesouro Nacional manifeste-se positivamente pela abertura da conta bancária, entendendo que existem justificativas para excepcionar a movimentação através da Conta Única, a conta poderá ser aberta com segurança jurídica e, superada esta etapa, deve-se verificar a forma do recolhimento do imposto.

 

Através do PARECER SEI Nº 3702/2023/MF (SEI nº 1510966), cuja leitura na íntegra se recomenda, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional entendeu que bolsas culturais (que não sejam bolsas de pesquisa), em regra, sujeitam-se à incidência do imposto de renda pessoa física, devendo o ente responsável pelo seu pagamento efetuar a retenção do imposto de renda, de acordo com a tabela progressiva mensal.

 

No que concerne às premiações culturais, se forem pagas em dinheiro às pessoas físicas e concedidas nos termos da LC 195, de 2022, serão isentas. Fora do marco normativo da Lei Complementar, o entendimento é pela incidência do imposto de renda sobre os valores pagos a título de premiação cultural a pessoas físicas. Será calculado, em regra, de acordo com a tabela progressiva mensal, a título de antecipação do devido na DAA (itens 68 e 69 da referida manifestação).

 

O procedimento de recolhimento em si foi também tratado no PARECER SEI Nº 3702/2023/MF (SEI nº 1510966). Por se tratar de questão procedimental, caso ainda haja dúvidas, recomenda-se que seja consultado órgão orçamentário desta Pasta ou a própria Receita Federal.

 

 

III. CONCLUSÃO

 

Diante do exposto, ressalvados os aspectos de conveniência e de oportunidade não sujeitos ao crivo desta Consultoria Jurídica, em resposta à consulta da Subsecretaria de Planejamento, Orçamento e Administração, entende-se e recomenda-se:

 

a) O encaminhamento dos autos à Secretaria do Tesouro Nacional, nos termos do art. 36, VI, XI, XIV, XLIII, Decreto nº 11.344, de 2023, após manifestação técnica justificando a necessidade de movimentar recursos financeiros em contas correntes bancárias mantidas junto ao Banco do Brasil S/A (itens 30 a 37), excepcionando assim a regra de saque diretamente da Conta Única do Tesouro Nacional. A manifestação conclusiva da STN é fundamental para abertura das contas correntes pretendidas.

 

b) Como não se sabe quem serão os beneficiários, e não há instrumento jurídico que fundamente a transferência de recursos da União para o indivíduo, estamos diante de uma situação em que o credor é futuro e desconhecido, sem instrumento que permita criar a obrigação de pagamento. Desta forma, buscar empenhar todo o recurso orçamentário deste exercício ao Banco do Brasil para futuro pagamento a credor final ainda não foi identificado seria, s.m.j.​, uma via de contornar o princípio da anualidade orçamentária, o que não é recomendado por esta Consultoria Jurídica.

 

c) As hipóteses de tributação de premiações e bolsas culturais foram analisadas pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional no PARECER SEI Nº 3702/2023/MF (SEI nº 1510966), cuja leitura se recomenda na íntegra. O procedimento de recolhimento em si foi também tratado no PARECER SEI Nº 3702/2023/MF (SEI nº 1510966). Por se tratar de questão procedimental, caso ainda haja dúvidas, recomenda-se que seja consultado órgão orçamentário desta Pasta ou a própria Receita Federal.

 Por fim, registra-se o caráter opinativo da manifestação jurídica ora apresentada, ressaltando que cabe ao administrador de acordo com a regra do art. 50 da Lei nº 9.784/99, ofertar decisão motivada para o caso, segundo juízo de conveniência e oportunidade que melhor atenda ao interesse público, desde que sem ofensa ao princípio da legalidade.

 

Isso posto, submeto o presente processo à consideração superior, sugerindo que, após aprovação, os autos sejam encaminhados ​à Subsecretaria de Planejamento, Orçamento e Administração do Ministério da Culturapara as providências cabíveis.

 

 

Brasília, 19 de dezembro de 2023.

 

 

(assinatura eletrônica)

GUSTAVO ALMEIDA DIAS

Advogado da União

 

 


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