ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA JUNTO AO MINISTÉRIO DA CULTURA
GABINETE

 

PARECER n. 00330/2023/CONJUR-MINC/CGU/AGU

 

NUP: 01400.036975/2023-21

INTERESSADOS: COORDENAÇÃO DE ACOMPANHAMENTO LEGISLATIVO E EMENDAS PARLAMENTARES COLEP/ASPAR/GM/MINC

ASSUNTOS: ATOS ADMINISTRATIVOS

 

EMENTA:
I Análise e manifestação acerca de projeto de lei em fase de sanção presidencial.
II - o Projeto de Lei nº 4.071, de 2015, (Projeto de Lei nº 417, de 2013, no Senado Federal), de autoria do Senhor Senador Randolfe Rodrigues, que “Institui o Dia Nacional de Combate à Tortura”.
III. Pela ausência de óbices jurídicos, no que concerne às competências deste Ministério da Cultura ("pela sanção").

 

 

I.  RELATÓRIO

 

Trata-se de expediente inaugurado a partir de missiva da Secretaria Especial para Assuntos Jurídicos da Casa Civil da Presidência da República - SAJ-CC (OFÍCIO CIRCULAR Nº 330/2023/CAP/SALEG/SAJ/CC/PR), dirigida a este Ministério da Cultura e outros Ministérios, por conduto da qual solicita a manifestação sobre o Projeto de Lei nº 4.071, de 2015, (Projeto de Lei nº 417, de 2013, no Senado Federal), de autoria do Senhor Senador Randolfe Rodrigues, que “Institui o Dia Nacional de Combate à Tortura o qual "abrange pauta de natureza transversal, envolvendo assuntos de competência das pastas em epígrafe, salvo melhor juízo."

 

2. Arremata a SAJ-CC o seguinte no Ofício supra:

 

Tendo em vista que a matéria já se encontra em fase de sanção, encareço seja encaminhado a esta Secretaria parecer do órgão técnico competente, com visto ministerial, até o dia 29/12/23, conforme disposto no parágrafo único do art. 25 do Decreto nº 9.191, de 1º de novembro 2017, sem prejuízo de antecipação tão logo seja realizada, no intuito de colaborar com os trâmites e a urgência que a matéria requer.

 

3. Encaminhada a missiva supra à Assessoria Especial de Assuntos Parlamentares e Federativos deste Ministério, referido órgão redireciona o pleito a esta Consultoria Jurídica, por meio do Ofício nº 608/2023/COLEP/ASPAR/GM/MinC, para emissão de parecer, solicitando a remessa posterior dos autos até o dia 22/12/2023.

 

4. O inteiro teor do PL encontra-se acostado aos autos do processo SEI (1556504).

 

5. É o relatório. Passo à análise.

 

II. ANÁLISE JURÍDICA

 

6. Preliminarmente, impende tecer breve consideração sobre a competência desta Consultoria Jurídica para manifestação no processo in casu.

 

7. Sabe-se que a Constituição de 1988 prevê as funções essenciais à Justiça em seu Título IV, Capítulo IV; contemplando na Seção II a advocacia pública. Essa essencialidade à justiça deve ser entendida no sentido mais amplo que se possa atribuir à expressão, estando compreendidas no conceito de essencialidade todas as atividades de orientação, fiscalização e controle necessárias à defesa dos interesses protegidos pelo ordenamento jurídico.

 

8. O art. 131 da Constituição, ao instituir em nível constitucional a Advocacia-Geral da União - AGU, destacou como sua competência as atividades de consultoria e assessoramento jurídico ao Poder Executivo, nos termos da lei complementar que dispuser sobre sua organização e funcionamento, in verbis:

 

Art. 131. A Advocacia-Geral da União é a instituição que, diretamente ou através de órgão vinculado, representa a União, judicial e extrajudicialmente, cabendo-lhe, nos termos da lei complementar que dispuser sobre sua organização e funcionamento, as atividades de consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo.
 

9. Nesta esteira, o art. 11, inciso I e V, da Lei Complementar n.º 73/1993 - Lei Orgânica da Advocacia-Geral da União -, estabeleceu, no que concerne à atividade de consultoria ao Poder Executivo junto aos Ministérios, a competência das Consultorias Jurídicas para assistir a autoridade assessorada no controle interno da constitucionalidade e legalidade administrativa dos atos a serem por ela praticados. Nesse sentido, veja-se:

 

Art. 11 - Às Consultorias Jurídicas, órgãos administrativamente subordinados aos Ministros de Estado, ao Secretário-Geral e aos demais titulares de Secretarias da Presidência da República e ao Chefe do Estado-Maior das Forças Armadas, compete, especialmente:
I - assessorar as autoridades indicadas no caput deste artigo;
(...)
III - fixar a interpretação da Constituição, das leis, dos tratados e dos demais atos normativos a ser uniformemente seguida em suas áreas de atuação e coordenação quando não houver orientação normativa do Advogado-Geral da União;
(...)
V - assistir a autoridade assessorada no controle interno da legalidade administrativa dos atos a serem por ela praticados ou já efetivados, e daqueles oriundos de órgão ou entidade sob sua coordenação jurídica;
 

10. Ressalte-se, por oportuno, que o controle interno da legalidade realizado por este órgão jurídico não tem o condão de se imiscuir em aspectos relativos à conveniência e à oportunidade da prática dos atos administrativos, que estão reservados à esfera discricionária do administrador público legalmente competente, tampouco examinar questões de natureza eminentemente técnica, administrativa e/ou financeira, conforme se extrai do Enunciado nº 7 do Manual de Boas Práticas Consultivas da Advocacia-Geral da União, que possui o seguinte teor:

 

A manifestação consultiva que adentrar questão jurídica com potencial de significativo reflexo em aspecto técnico deve conter justificativa da necessidade de fazê-lo, evitando-se posicionamentos conclusivos sobre temas não jurídicos, tais como os técnicos, administrativos ou de conveniência ou oportunidade, podendo-se, porém, sobre estes emitir opinião ou formular recomendações, desde que enfatizando o caráter discricionário de seu acatamento.

 

11. Elaboradas essas considerações preliminares, passa-se à análise da proposta. Primeiramente, impende realçar que compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre cultura (reconhecimento de datas comemorativas), nos termos do art. 24, IX da Constituição Federal. Outrossim, a proposta não está inserida no âmbito de iniciativa privativa de algum órgão, de modo que qualquer parlamentar detém a competência para a iniciativa, encontrando-se a proposta regular também nesse ponto. Adicione-se, ainda, que o PL ​já percorreu o trâmite legislativo no âmbito do Congresso Nacional, tendo sido enviado para sanção ou veto do Exmo. Presidente da República, nos termos do art. 66 da Constituição Federal.

 

12. Adentrando-se a leitura de seu teor, verifica-se que a proposta visa instituir o Dia Nacional de Combate à Tortura, a ser celebrado, anualmente, no dia 14 de julho, em todo o território nacional.

13. Em consulta ao sítio eletrônico do Senado[1] sobre a justificativa da proposta, tem-se o seguinte:

 

Em 23 de maio de 1989 o Congresso Nacional aprovou e em 28 desetembro do mesmo ano o Brasil ratificou a Convenção das Nações Unidas Contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes.
(..)
Além da referida Convenção, o crime de tortura é definido na Lei n° 9.455,de 7 de abril de 1997 (...)
No entanto, apesar de legalmente vedada e sociamente condenada, o uso da tortura como meio de obtenção de informação continua a ser prática recorrente em nosso país. São inúmeras e diárias as denúncias de ocorrência de tortura nas delegacias policiais, presídios e em operações policiais.
(...)
Em 14 de julho de 2013, o cidadão Amarildo de Souza foi levado para a base da Unidade de Polícia Pacificadora, da Polícia Militar do Rio de Janeiro, localizada na Rocinha, com a justificativa de que estaria detido para averiguações. No entanto, passados quatro meses, não se tem notícia de seu paradeiro, ou da localização de seu corpo.
(...)
Diante desse quadro, em que pese a existência do dia internacional de combate à tortura, celebrado em 26 de junho, entendemos ser de suma importância a criação de um dia nacional de combate à tortura, a ser celebrado na data do desaparecimento de Amarildo, como forma de lembrança da necessidade de combate diário a este que é um dos piores crimes cometidosm, até hoje, pelo Estado.

 

14. Não se mostra despiciendo frisar que, para a instituição de datas comemorativas em âmbito nacional, a Lei nº 12.345, de 9 de dezembro de 2010, a qual "Fixa critério para instituição de datas comemorativas", requer a realização de audiências públicas, senão, veja-se:

Art. 1o  A instituição de datas comemorativas que vigorem no território nacional obedecerá ao critério da alta significação para os diferentes segmentos profissionais, políticos, religiosos, culturais e étnicos que compõem a sociedade brasileira. 
Art. 2o  A definição do critério de alta significação será dada, em cada caso, por meio de consultas e audiências públicas realizadas, devidamente documentadas, com organizações e associações legalmente reconhecidas e vinculadas aos segmentos interessados. 
Art. 3o  A abertura e os resultados das consultas e audiências públicas para a definição do critério de alta significação serão objeto de ampla divulgação pelos meios oficiais, facultando-se a participação dos veículos de comunicação social privados. 
Art. 4o  A proposição de data comemorativa será objeto de projeto de lei, acompanhado de comprovação da realização de consultas e/ou audiências públicas a amplos setores da população, conforme estabelecido no art. 2o desta Lei. 
 

15. Não resta dúvida, por outro lado, que a fixação de data que objetive lançar luz ao combate à tortura no País dispõe de alta relevância e significação para a sociedade brasileira como um todo, especialmente diante, conforme exposto na justificativa do PL, do expressivo número de violência praticada pelos agentes do Estado - medida esta que vai ao encontro de políticas públicas transversais, como o combate às desigualdades e à violência, o que também é incumbência desta Pasta Ministerial, de modo que não se visualizam óbices jurídicos ao referido reconhecimento, pelo menos no que concerne às competências deste Ministério da Cultura.

 

16. Quanto aos aspectos estritamente formais, insta ponderar que ao Projeto de Lei se aplicam as regras encartadas pela Lei Complementar nº 95, de 26 de fevereiro de 1998, que dispõe sobre a elaboração, a redação, a alteração e a consolidação das leis, conforme determina o parágrafo único do art. 59 da Constituição.

 

III. CONCLUSÃO

 

17. Diante do exposto, sem adentrar nos valores de conveniência e oportunidade na criação de mecanismos institucionais, não sujeitos ao crivo desta CONJUR, não se visualizam óbices jurídicos ao Projeto de Lei nº 4.071, de 2015, (Projeto de Lei nº 417, de 2013, no Senado Federal), de autoria do Senhor Senador Randolfe Rodrigues, que “Institui o Dia Nacional de Combate à Tortura”​ de modo que, no que concerne às competências legais deste Ministério da Cultura (sem prejuízo da análise das outras Pastas Ministeriais), o projeto encontra-se apto a ser submetido à sanção presidencial.

 

18. Encaminhem-se os autos, via SEI, à ASPAR em resposta ao Ofício nº 608/2023/COLEP/ASPAR/GM/MinC, em prosseguimento.

 

 

 

Brasília, 22 de dezembro de 2023.

 

 

(assinado eletronicamente)

SOCORRO JANAINA M. LEONARDO

Advogada da União

Consultora Jurídica

 

 


Atenção, a consulta ao processo eletrônico está disponível em https://supersapiens.agu.gov.br mediante o fornecimento do Número Único de Protocolo (NUP) 01400036975202321 e da chave de acesso 5bf07c28

Notas

  1. ^ Disponível em: https://legis.senado.leg.br/sdleg-getter/documento?dm=4301796&ts=1703112873933&disposition=inline&_gl=1*11aje6m*_ga*NzU4MDc5MzQzLjE2NDQ1MDQ1OTk.*_ga_CW3ZH25XMK*MTcwMzI0MzUzMy44LjAuMTcwMzI0MzUzMy4wLjAuMA..Acesso em 22/12/2023.



Documento assinado eletronicamente por SOCORRO JANAINA MAXIMIANO LEONARDO, com certificado A1 institucional (*.agu.gov.br), de acordo com os normativos legais aplicáveis. A conferência da autenticidade do documento está disponível com o código 1375934174 no endereço eletrônico http://sapiens.agu.gov.br. Informações adicionais: Signatário (a): SOCORRO JANAINA MAXIMIANO LEONARDO, com certificado A1 institucional (*.agu.gov.br). Data e Hora: 22-12-2023 08:26. Número de Série: 51385880098497591760186147324. Emissor: Autoridade Certificadora do SERPRO SSLv1.