ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA DA UNIÃO ESPECIALIZADA VIRTUAL DE PATRIMÔNIO
NÚCLEO JURÍDICO SUMÁRIO
PARECER n. 01070/2023/NUCJUR-SUM/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU
NUP: 00402.000148/2023-16.
INTERESSADOS: UNIÃO (MINISTÉRIO DA GESTÃO E DA INOVAÇÃO EM SERVIÇOS PÚBLICOS/SECRETARIA DO PATRIMÔNIO DA UNIÃO/SUPERINTENDÊNCIA DO PATRIMÔNIO DA UNIÃO NO ESTADO DE PERNAMBUCO - MGI/SPU/SPU-PE) E MUNICÍPIO DE SÃO VICENTE FERRER-PE.
ASSUNTOS: PROCESSO ADMINISTRATIVO. BENS PÚBLICOS. BEM IMÓVEL DE DOMÍNIO DA UNIÃO. ASSESSORAMENTO JURÍDICO. CONSULTA FORMULADA. ORIENTAÇÃO JURÍDICA.
EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO E OUTRAS MATÉRIAS DE DIREITO PÚBLICO. BENS PÚBLICOS. BEM IMÓVEL DE DOMÍNIO DA UNIÃO. GESTÃO E GOVERNANÇA DO PATRIMÔNIO IMOBILIÁRIO DA UNIÃO. ATIVIDADE FISCALIZATÓRIA. APURAÇÃO DO COMETIMENTO DE INFRAÇÃO(ÕES) ADMINISTRATIVA(S) CONTRA ÁREA DE DOMÍNIO DA UNIÃO. OBRA/CONSTRUÇÃO OU OUTRA BENFEITORIA IRREGULAR. LAVRATURA DE AUTO DE EMBARGO E AUTO DE INFRAÇÃO. IMPOSIÇÃO DE MULTA. RECEITA PATRIMONIAL. ASSESSORAMENTO JURÍDICO. INDAGAÇÃO(ÕES) FORMULADA(S). ORIENTAÇÃO JURÍDICA. ESCLARECIMENTO DE DÚVIDA(S).
I. Consulta formulada. Questionamento(s) envolvendo anulação de multa aplicada pela SPU-PE ao Município de São Vicente Ferrer-PE em razão do cometimento de infração administrativa contra o patrimônio da União.
II. Fiscalização. Atividade executada pela SPU-PE para apuração de infração(ões) administrativa(s) praticada(s) contra o patrimônio imobiliário da União. Artigo 2º, caput, da Instrução Normativa SPU nº 23, de 18 de março de 2020.
III. A anulação da multa decorrente do Auto de Infração nº 245/2021 (SEI nº 20256019) somente poderá ocorrer em caso da constatação de ilegalidade na lavratura.
IV. A multa por aterro/construção irregular constitui receita patrimoninal. Decorrido o prazo limite para a cobrança administrativa, o débito vencido deverá ser encaminhado à unidade competente da Procuradoria da Fazenda Nacional (PFN) para inscrição/inclusão em Dívida Ativa da União (DAU).
V. Necessidade de que o devedor seja previamente notificado para conhecimento/ciência da existência do(s) débito(s) com fixação de prazo para pagamento, sob pena de inscrição em Dívida Ativa. artigo 35, caput, da Instrução Normativa SPU nº 1, de 23 de jullho de 2007, que dispõe sobre o lançamento e a cobrança de créditos originados em Receita Patrimoniais.
VI. Observação da(s) recomendação(ões) sugerida (s) nesta manifestação jurídica.
A Superintendente Substituta do Patrimônio da União no Estado de Pernambuco, por intermédio do OFÍCIO SEI nº 152651/2023/MGI, assinado eletronicamente em 19 de dezembro de 2023 (SEI nº 39165290), disponibilizado a e-CJU/PATRIMÔNIO o link de acesso ao Sistema Eletrônico de informações (SEI) com abertura de tarefa no Sistema AGU SAPIENS 2.0 em 19 de dezembro de 2023, encaminha o processo para análise e manifestação, nos termos do artigo 11, inciso VI, alínea “b”, da Lei Complementar Federal nº 73, de 10 de fevereiro de 1993, que instituiu a Lei Orgânica da Advocacia-Geral da União e do artigo 19, incisos I e II, do Ato Regimental AGU nº 5, de 27 de setembro de 2007.
Trata-se de solicitação de assessoramento jurídico (orientação jurídica) referente a consulta sobre questionamento(s) envolvendo anulação de multa aplicada pela SPU-PE ao Município de São Vicente Ferrer-PE em razão do cometimento de infração administrativa contra imóvel de domínio da União de natureza urbana conceituado como nacional interior, área de terreno com 13.200,00 m² (Treze mil e duzentos metros quadrados) e benfeitoria com área construída de 192,00 m² (Cento e noventa e dois metros quadrados), situado às margens do Rio Sirigi, Distrito de Sirigi, Praça José Nilo, nº 11, Bairro Engenho Triunfo, Município de São Vicente Ferrer, Estado de Pernambuco, CEP nº 55.860-000, cadastrado no Sistema de Gerenciamento de Imóveis de Uso Especial da União (SPIUnet) sob o Registro Imobiliário Patrimonial (RIP) nº 2575.00002.500-8, conforme Relatório de Fiscalização Individual (RFI) nº 245/2021 (SEI nº 20256019), que resultou no Auto de Embargo e Auto de Infração nº 245/2021 (SEI nº 20256019).
O processo está instruído com os seguintes documentos:
PROCESSO/DOCUMENTO | TIPO | |||
---|---|---|---|---|
6823809 | Termo | |||
6823811 | Processo | |||
6823812 | Processo | |||
6823813 | Processo | |||
6823814 | Processo | |||
6823815 | Processo | |||
6823816 | Processo | |||
6823817 | Processo | |||
6823818 | Processo | |||
6823819 | Processo | |||
6823820 | Processo | |||
6823821 | Despacho | |||
6823822 | Ofício | |||
6823824 | Despacho | |||
6823825 | Despacho | |||
6823826 | Despacho | |||
6823827 | Anexo | |||
6823828 | Anexo | |||
6823829 | Despacho | |||
04962.201633/2015-19 | Patrimônio: Gestão de Bens Imóveis | |||
04962.203842/2015-99 | Patr. União: Atendimento ao Público | |||
6868649 | Despacho | |||
7044104 | Despacho | |||
7092507 | Despacho | |||
7140237 | Despacho | |||
7187446 | Despacho | |||
7207510 | Despacho | |||
7207513 | Ofício 78273 | |||
7207710 | Espelho | |||
7207762 | Ofício 78288 | |||
7231869 | Despacho | |||
7239149 | Despacho | |||
7252708 | Ofício | |||
7252738 | Relatório | |||
7253071 | Relatório | |||
7310847 | ||||
7316013 | ||||
7316219 | Despacho | |||
7363089 | Despacho | |||
9776301 | ||||
9776463 | ||||
9845476 | Ofício | |||
9845483 | Certidão | |||
19437180 | Formulário | |||
19438675 | Despacho | |||
19447276 | Ordem de Fiscalização 245 | |||
19991527 | Despacho | |||
20256019 | Relatório de Fiscalização Individual - RFI 3130 | |||
20279456 | Despacho | |||
20346278 | Despacho | |||
20473726 | Despacho | |||
19739.144884/2021-40 | Patr. União: Atendimento ao Público | |||
20646101 | Despacho | |||
21234010 | Nota Técnica 61374 | |||
21235646 | Despacho Decisório 4877 | |||
21236178 | Ofício 341162 | |||
21289082 | ||||
21289133 | Despacho | |||
21294248 | Despacho | |||
22084450 | Memória | |||
22084487 | Memória | |||
22084530 | Memória | |||
22085266 | Anexo | |||
22085282 | Anexo | |||
22085330 | Anexo | |||
22085428 | Despacho | |||
25286162 | Ofício 165504 | |||
25288893 | Despacho | |||
25977674 | ||||
25983206 | ||||
25998009 | ||||
26468414 | Despacho | |||
26857359 | Despacho | |||
27025203 | Despacho | |||
27040830 | Nota Técnica 35785 | |||
19739.150397/2022-05 | Patr. União: DEST Alienação - Venda | |||
28594396 | Despacho | |||
28615986 | Despacho | |||
28804080 | Despacho | |||
28817891 | Despacho | |||
29005120 | Despacho | |||
32236600 | Despacho | |||
32268652 | Despacho | |||
32281127 | Ofício 11577 | |||
32281954 | Despacho | |||
32321557 | ||||
33078314 | Despacho | |||
34440221 | Despacho | |||
35775890 | Despacho | |||
36618899 | Ofício 91438 | |||
36618932 | Despacho | |||
36924737 | Espelho | |||
36926704 | Despacho | |||
37006349 | Despacho Decisório 1526 | |||
37006588 | Despacho | |||
37027008 | Despacho | |||
37738669 | Ofício 116127 | |||
37738700 | Despacho | |||
37814078 | ||||
37842080 | ||||
38276176 | Despacho | |||
38455025 | Despacho | |||
38898123 | Nota Técnica 47346 | |||
39165290 | Ofício 152651 | |||
39199475 |
II– PRELIMINARMENTE – FINALIDADE E ABRANGÊNCIA DO PARECER
A presente manifestação jurídica tem o escopo de assessorar a autoridade competente para a prática do ato, para que dele não decorra nenhuma responsabilidade pessoal a ela, e também para que seja observado o princípio da legalidade e os demais que norteiam a atuação da Administração.
Desta forma, cercando-se a autoridade de todas as cautelas para a prática do ato, e documentando-as nos autos, a princípio cessa a sua responsabilidade pessoal por eventuais decorrências não satisfatórias.
A atribuição da e-CJU/PATRIMÔNIO é justamente apontar possíveis riscos do ponto de vista jurídico e recomendar alguma providência para salvaguardar a autoridade assessorada, a quem, em seu juízo discricionário, compete avaliar a real dimensão do risco e a necessidade de se adotar ou não a cautela recomendada.
Disso se conclui que a parte das observações aqui expendidas não passam de recomendações, com vistas a salvaguardar a autoridade administrativa assessorada, e não vinculá-la. Caso opte por não acatá-las, não haverá ilegalidade no proceder, mas simples assunção do risco. O acatamento ou não das recomendações decorre do exercício da competência discricionário da autoridade assessorada.
Já as questões que envolvam a legalidade[1], de observância obrigatória pela Administração, serão apontadas, ao final deste parecer, como óbices a serem corrigidos ou superados. O prosseguimento do feito, sem a correção de tais apontamentos, será de responsabilidade exclusiva do órgão, por sua conta e risco.
Por outro lado, é certo que a análise dos aspectos técnicos da demanda sob análise não está inserido no conjunto de atribuições/competências afetas a e-CJU/PATRIMÔNIO, a qual não possui conhecimento específico nem competência legal para manifestar-se sobre questões que extrapolam o aspecto estritamente jurídico.
III - FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
Para melhor contextualização e compreensão da consulta submetida a apreciação da e-CJU/PATRIMÔNIO, unidade de execução da Consultoria-Geral da União (CGU), Órgão de Direção Superior (ODS) da Advocacia-Geral da União (AGU), reputo relevante transcrever na integralidade a Nota Técnica SEI Nº 47346/2023/MGI (SEI nº 38898123) elaborada pelo Serviço de Destinação Patrimonial da Superintendência do Patrimônio da União no Estado de Pernambuco (SEDEP/SPU-PE), no qual há um relato da situação fática e do(s) questionamento(s) formulado(s), verbis:
"Nota Técnica SEI nº 47346/2023/MGI
Assunto: Anulação de multa aplicada pela SPU-PE ao Município de São Vicente Ferrer, tendo em vista o pedido de solicitação de Cessão Gratuita por parte do ente municipal.
Senhora Chefe do Serviço de Destinação Patrimonial da SPU/PE,
SUMÁRIO EXECUTIVO
1. Trata-se da análise sobre a possibilidade de destinação de imóvel da União localizado às margens do Rio Sirigi, no distrito de Sirigi, município de São Vicente Ferrer- PE, com área de total de 13.200,00m², conforme espelho Spiunet (SEI 7207710) que possui incidência de multa aplicada ao município por esta Superintendência do Patrimônio da União.
ANÁLISE
2. Área da União, caracterizada como bem dominial, localizado às margens do Rio Sirigi, no distrito de Sirigi, Município de São Vicente Ferrer- PE.
3. O imóvel foi adquirido pela União, por compra, através do Ministério da Agricultura, na década de 60 (fls. 03 do SEI nº 6823811).
4. Na certidão da Matrícula nº 431 (6824698), datada de 17/07/2015, apresenta como proprietário a Secretaria do Patrimônio da União do Estado de Pernambuco (SPU-PE).
5. Destaque-se, por oportuno, que a SPU/PE já está providenciando a correção do referido registro para fazer constar como proprietário do imóvel a União Federal (ver Ofício 91438 - SEI 36618899).
6. Em 09/11/2021, a SPU/PE realizou vistoria no imóvel, destacando-se do respectivo relatório o que segue:
Trata-se de um terreno de propriedade da União localizado às margens do Rio Sirigi, no distrito de Sirigi, município de São Vicente Ferrer- PE, com área de total de 13.200,00m², conforme espelho Spiunet ( 7207710).
Durante a realização da vistoria in loco, a equipe de fiscalização constatou que parte do terreno está sendo utilizada pela Prefeitura de São Vicente Ferrer. No local a prefeitura construiu um grande pátio de estacionamento (tendo sido realizada limpeza do terreno, movimentação de terra e pavimentação com paralelo) e está iniciando a execução de uma obra para ampliação da praça dos taxistas, conforme registro fotográfico abaixo. No momento da fiscalização foi realizada medição da área ocupada pela prefeitura sem a autorização da SPU, ficando constado que a área ocupada irregularmente corresponde à 3.075,00m²”.
Após o trabalho in loco, nos dirigimos até a prefeitura de São Vicente Ferrer e conversamos com a Engenheira Isabela Cavalcanti Guedes, responsável pelas obras da prefeitura, a mesma nos informou que na administração anterior, mesmo a prefeitura sabendo que o imóvel era da união e que não poderia fazer nada sem a autorização dessa Secretaria, realizou construção do pátio de estacionamento e que atualmente a obra iniciada consiste na ampliação da praça dos taxistas.
Desta forma, por se tratar de construção em caráter permanente em terreno da União (próprio nacional- bem de uso especial) , sem a prévia autorização dessa Secretaria, ficou evidenciada infração administrativa contra o patrimônio da União. Portanto, foram lavrados o Auto de Embargo SEI Nº 245 /2021 e Auto de Infração SEI Nº 245/2021, conforme previsão do Art. 10 Paragrafo II da Instrução Normativa nº 23, de 18 de março de 2020, DAS INFRAÇÕES "realização de aterro, construção, obra, cercas ou outras benfeitorias, desmatar ou instalar equipamentos, sem prévia autorização ou em desacordo com aquela concedida, em bens de uso comum do povo, especiais ou dominiais, com destinação especifica fixada por lei ou ato administrativo".
Área de abrangência da construção Irregular: 3075,00 m². Multa: R$ 289.726,50
O Auto de Embargo e o Auto de Infração foram recebidos por Isabela Cavalcanti Guedes (Engenheira Civil - Fiscal de obra do município; CPF: 076.000394-78), no momento a equipe de fiscalização comunicou que a obra estava embargada, e que a prefeitura estava recebendo os Autos de Embargo e Infração por ocupar e realizar obra em bem de uso especial da União sem prévia autorização .
7. A defesa apresentada pelo Município em 19/11/2021 (SEI 20591674) foi indeferida (SEI 21235646), tendo o Município sido notificado através de ofício, em 21/12/2021 (SEI 21236178), no entanto, o protocolo de entrega da referida notificação de indeferimento não foi anexado ao processo.
8. Em 01/06/2022, foi enviado ofício à Procuradoria Regional da União da 5ª Região solicitando a adoção de medidas judiciais no sentido de que o Município desocupe de forma compulsória o imóvel e que seja cobrado pela sua ocupação os valores apurados (SEI nº 25286162).
9. Em 13/03/2023 foi encaminhado Ofício 11577 (SEI 32281127) à Procuradoria Regional da União, comunicando a decisão dessa Superintendência de suspender a ação de reintegração de posse, caso a mesma já tenha sido ajuizada.
10. Através do OFÍCIO SEI Nº 116127/2023/MGI (SEI 37738669), reiteramos o teor do OFÍCIO SEI N° 11577/2023/MGI, no entanto, não há elementos no processo que indiquem a suspensão da ação de reintegração de posse.
11. Atualmente, consta no Sistema de Requerimento Eletrônico de Imóveis - SISREI a formalização da Consulta Prévia N° 0016/2023 (SEI 36924737), datada de 14/08/2023, na qual o município de São Vicente Ferrer solicita a cessão gratuita do referido imóvel informando:
Com o adensamento populacional no Distrito de Siriji houve a necessidade de construção de equipamento urbanístico no terreno da União para atender a população e evitar problema sanitários em razão do abandono pela União deste imóvel. O imóvel teve apenas uma pequena parte adaptada pelo Município com a construção de calçamento em área onde já tinha havido supressão vegetal. Existe junto ao SPU pedido de cessão da área para construção de parque com conservação da área de mata atlântica a ser realizado pelo Município.Em razão do abandono e de já ter havido sido demonstrada a intenção de preservar a área pelo Município requer que seja deferido os pedidos formulados, bem como que a multa aplicada seja anulada em razão de não ter havido qualquer utilização indevida da área pelo Município que apenas efetuou melhorias para a população local em área extremamente degradada. O Município de São Vicente Férrer possui um baixo IDH e o pagamento de multas implicará em prejuízo para os cidadãos, que ficaram sem os recursos públicos necessários para políticas urgentes e necessárias.
12. Em conformidade com o Despacho Decisório (SEI 37006349), há interesse da Administração em regularizar a construção indevidamente realizada, considerando se tratar de futuro equipamento público.
CONCLUSÃO
13. Diante do exposto, sugerimos enviar o presente processo à CJU/AGU para consultar se a multa aplicada ao município de São Vicente Ferrer é passível de anulação, tendo em vista haver interesse público da Administração em regularizar a construção indevidamente realizada, considerando se tratar de futuro equipamento público. Como também, pelo município possuir um baixo IDH e o pagamento da multa implicará em prejuizo para os cidadãos, que ficarão sem os recursos públicos necessários para as políticas urgentes e necessárias, conforme alegado pelo município.
14. Caso não seja possível a anulação da multa, indagamos se seria possível uma cessão gratuita do imóvel ao município com a pendência de pagamento de multa, considerando que o mesmo não dispõe de recurso imediato para a liquidação do débito e o imóvel precisa de uma destinação urgente devido a dificultade da União manter a sua guarda."
Considerando o anteriormente exposto, procederei a análise da solicitação de assessoramento jurídico (orientação jurídica) relacionada ao(s) seguinte(s) questionamento(s) formulado(s):
a) Diante do exposto, sugerimos enviar o presente processo à CJU/AGU para consultar se a multa aplicada ao município de São Vicente Ferrer é passível de anulação, tendo em vista haver interesse público da Administração em regularizar a construção indevidamente realizada, considerando se tratar de futuro equipamento público. Como também, pelo município possuir um baixo IDH e o pagamento da multa implicará em prejuizo para os cidadãos, que ficarão sem os recursos públicos necessários para as políticas urgentes e necessárias, conforme alegado pelo município.
O ato fiscalizatório oriundo da atividade de polícia administrativa para ser considerado legítimo, necessita, como ocorre com qualquer ato administrativo, estar revestido de todos os requisitos de validade, ou seja, ser praticado por agente público no exercício regular de sua competência, ser produzido segundo a forma imposta em lei, além se revestir dos requisitos da finalidade, motivo e objeto (conteúdo). Em síntese, o ato de polícia, espécie do gênero ato administrativo, é considerado legal caso esteja em consonância com os requisitos exigidos para sua validade.
A competência consiste no requisito de validade segundo o qual o ato administrativo praticado se insere no feixe de atribuições legais e regulamentares do agente público que o praticou. A forma significa a observância das formalidades indispensáveis à existência ou regularidade do ato. A finalidade representa a pratica o ato por agente investido de competência em consonância com o fim previsto, expressamente ou implicitamente, na regra de competência. O motivo abrange a matéria de fato (fática) e de direito (jurídica) que fundamenta a prática do ato, sendo materialmente e juridicamente adequado ao resultado obtido. Já o objeto equivale a alteração no mundo jurídico que o ato administrativo almeja implementar, correspondendo ao objetivo imediato da vontade exteriorizada pelo ato do agente público preordenado a determinado fim.
Quanto à definição de infração administrativa e respectivas sanções o Decreto-Lei Federal nº 2.398, de 21 de dezembro de 1987, que dispõe sobre foros, laudêmios e taxas de ocupação relativas a imóveis de propriedade da União preceitua o seguinte:
(...)
"Art. 6º Considera-se infração administrativa contra o patrimônio da União toda ação ou omissão que viole o adequado uso, gozo, disposição, proteção, manutenção e conservação dos imóveis da União. (Redação dada pela Lei nº 13.139, de 2015)
(...)
§ 4º Sem prejuízo da responsabilidade civil, as infrações previstas neste artigo serão punidas com as seguintes sanções: (Incluído pela Lei nº 13.139, de 2015)
I - embargo de obra, serviço ou atividade, até a manifestação da União quanto à regularidade de ocupação; (Incluído pela Lei nº 13.139, de 2015) (grifou-se)
II - aplicação de multa; (Incluído pela Lei nº 13.139, de 2015)
III - desocupação do imóvel; e (Incluído pela Lei nº 13.139, de 2015)
IV - demolição e/ou remoção do aterro, construção, obra, cercas ou demais benfeitorias, bem como dos equipamentos instalados, à conta de quem os houver efetuado, caso não sejam passíveis de regularização." (Incluído pela Lei nº 13.139, de 2015)
A INSTRUÇÃO NORMATIVA SPU Nº 23, DE 18 DE MARÇO DE 2020, conceitua infração administrativa contra o patrimônio da União em seu artigo 10, incisos I a IV, elecando em seu artigo 11, incisos I a V, as sanções a serem aplicadas às infrações praticadas, dentre as quais se destaca o embargo, verbis:
(...)
"CAPÍTULO II
DAS INFRAÇÕES E SANÇÕES
Seção I
DAS INFRAÇÕES
Art. 10. Considera-se infração administrativa contra o patrimônio da União toda ação ou omissão que consista em:
I -violação do adequado uso, gozo, disposição, proteção, manutenção e conservação dos imóveis da União;
II - realização de aterro, construção, obra, cercas ou outras benfeitorias, desmatar ou instalar equipamentos, sem prévia autorização ou em desacordo com aquela concedida, em bens de uso comum do povo, especiais ou dominiais, com destinação específica fixada por lei ou ato administrativo;
III - descaracterização dos bens imóveis da União sem prévia autorização; e
IV - descumprimento de cláusulas previstas nos contratos de destinação patrimonial e no termo de adesão da gestão de praias.
Seção II
DAS SANÇÕES
Art. 11. Sem prejuízo da responsabilidade civil e penal e da indenização prevista no art. 10, da Lei nº 9.636, de 1.998, as infrações contra o patrimônio da União são punidas com as seguintes sanções:
I - embargo de obra, serviço ou atividade, até a manifestação da União quanto à regularidade de ocupação;
II - aplicação de multa nos termos da legislação patrimonial em vigor; (grifou-se)
III - desocupação do imóvel;
IV - demolição e/ou remoção do aterro, construção, obra, cercas ou demais benfeitorias, bem como dos equipamentos instalados, à conta de quem os houver efetuado, caso não sejam passíveis de regularização; e
V - cancelamento contratual e revogação do termo de gestão de praias."
A aplicação das sanções administrativas reflete competência inerente ao exercício do poder de polícia. Tratando-se de ilícito administrativo que configura infração administrativa, a penalidade/sanção do particular em razão dos descumprimento de regras materiais aplicáveis à atividade fiscalizada constitui manifestação do poder de polícia. Dito de outra forma, a atividade do poder de polícia traduz-se na apuração da ocorrência de infração(ões) e na imposição da punição/sanção correspondente.
Para ilustrar adequadamente o liame existente entre a prática de infração administrativa contra o patrimônio da União e a imposição da punição correlata, reputo conveniente transcrever manifestação/entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) na EMENTA do ACÓRDÃO proferido por ocasião do julgamento da AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Nº 4.679, verbis:
EMENTA: "DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. NOVO MARCO REGULATÓRIO DA TELEVISÃO POR ASSINATURA (LEI N. 12.485/2011). SERVIÇO DE ACESSO CONDICIONADO (SeAC). INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL NÃO CONFIGURADA. AUSÊNCIA DE VÍCIO DE INICIATIVA. COMPETÊNCIA DO CONGRESSO NACIONAL PARA PROPOR ATOS NORMATIVOS DISPONDO SOBRE TELECOMUNICAÇÕES (CRFB, ART. 22, IV) RÁDIO E TELEVISÃO, INDEPENDENTEMENTE DA TECNOLOGIA UTILIZADA (CRFB, ART. 221 E ART. 222, §5º). LEGITIMIDADE CONSTITUCIONAL DE RESTRIÇÕES À PROPRIEDADE CRUZADA (ART. 5º, CAPUT E §1º) E À VERTICALIZAÇÃO DA CADEIA DE VALOR DO AUDIOVISUAL (ART. 6º, I E II). VEDAÇÃO DO ABUSO DO PODER ECONÔMICO E DA CONCENTRAÇÃO EXCESSIVA DO MERCADO (CRFB, ART. 173, §4º E ART. 220, §5º). HIGIDEZ CONSTITUCIONAL DOS PODERES NORMATIVOS CONFERIDOS À ANCINE (ART. 9º, PARÁGRAFO ÚNICO; ART. 21 E ART. 22). NOVA FEIÇÃO DO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE (CRFB, ART. 37, CAPUT). ACEPÇÃO PRINCIPIOLÓGICA OU FORMAL AXIOLÓGICA. EXISTÊNCIA DE PRINCÍPIOS INTELIGÍVEIS (ART. 3º) APTOS A LIMITAR A ATUAÇÃO ADMINISTRATIVA. CONSTITUCIONALIDADE DA RESTRIÇÃO À PARTICIPAÇÃO DE ESTRANGEIROS NAS ATIVIDADES DE PROGRAMAÇÃO E EMPACOTAMENTO DE CONTEÚDO AUDIOVISUAL DE ACESSO CONDICIONADO (ART. 10, CAPUT E §1º). INEXISTÊNCIA DE RESERVA CONSTITUCIONAL PARA A IMPOSIÇÃO DE TRATAMENTO DIFERENCIADO AO ESTRANGEIRO. VIABILIDADE DE DISTINÇÃO PREVISTA EM LEI FORMAL E PERTINENTE À CAUSA JURÍDICA DISCRIMINADORA. VALIDADE DA EXIGÊNCIA DE PRÉVIO CREDENCIAMENTO JUNTO À ANCINE PARA EXPLORAÇÃO DAS ATIVIDADES DE PROGRAMAÇÃO E EMPACOTAMENTO (ART. 12), BEM COMO DA PROIBIÇÃO À DISTRIBUIÇÃO DE CONTEÚDO EMPACOTADO POR EMPRESA NÃO CREDENCIADA PELA AGÊNCIA (ART. 31, CAPUT, §§ 1º E 2º). REGULARIDADE JURÍDICA DA OBRIGAÇÃO DE PRESTAÇÃO DE INFORMAÇÕES SOLICITADAS PELA ANCINE PARA FINS DE FISCALIZAÇÃO QUANTO AO CUMPRIMENTO DAS REGRAS LEGAIS (ART. 13). TÍPICOS DEVERES INSTRUMENTAIS INDISPENSÁVEIS AO EXERCÍCIO DA ORDENAÇÃO ADMINISTRATIVA. PROPORCIONALIDADE DA POLÍTICA DE COTAS DE CONTEÚDO NACIONAL (ARTS. 16, 17, 18, 19, 20, 23). EXISTÊNCIA DE FUNDAMENTOS JURÍDICO-POSITIVOS (CRFB, ARTS. 221 E 222, §3º) E OBJETIVOS MATERIAIS CONSISTENTES. MEDIDA ADEQUADA, NECESSÁRIA E PROPORCIONAL EM SENTIDO ESTRITO. CONSTITUCIONALIDADE DA FIXAÇÃO DE TEMPO MÁXIMO DE PUBLICIDADE COMERCIAL (ART. 24). DEVER DE PROTEÇÃO AO CONSUMIDOR (CRFB, ART. 170, V). INCONSTITUCIONALIDADE DA PROIBIÇÃO DA OFERTA DE CANAIS QUE VEICULEM PUBLICIDADE COMERCIAL DIRECIONADA O PÚBLICO BRASILEIRO CONTRATADA NO EXTERIOR POR AGÊNCIA DE PUBLICIDADE ESTRANGEIRA (ART. 25). AUSÊNCIA DE MOTIVAÇÃO MÍNIMA PARA A CRIAÇÃO DO REGIME DIFERENCIADO. ULTRAJE AO PRINCÍPIO GERAL DA ISONOMIA (CRFB, ART. 5º, CAPUT) ENQUANTO REGRA DE ÔNUS ARGUMENTATIVO. CONSTITUCIONALIDADE DA OUTORGA DO SeAC POR AUTORIZAÇÃO ADMINISTRATIVA SEM NECESSIDADE DE PRÉVIA LICITAÇÃO (ART. 29) NA FORMA DO ART. 21, XI, DA LEI MAIOR. OPÇÃO REGULATÓRIA SITUADA NOS LIMITES DA CONSTITUIÇÃO ECONÔMICA. VALIDADE DA IMPOSIÇÃO ÀS CONCESSIONÁRIAS DE RADIODIFUSÃO DE SONS E IMAGENS DO DEVER DE DISPONIBILIZAÇÃO GRATUITA DOS CANAIS DE SINAL ABERTO ÀS DISTRIBUIDORAS DO SeAC (ART. 32). COMPATIBILIDADE COM A SISTEMÁTICA CONSTITUCIONAL DO ICMS (CRFB, ART. 155, §2º, X, d). HIGIDEZ DO CANCELAMENTO DO REGISTRO DE AGENTE ECONÔMICO PERANTE A ANCINE EM RAZÃO DE DESCUMPRIMENTO DAS OBRIGAÇÕES CRIADAS PELA LEI (ART. 36). GARANTIA DE EFICÁCIA DAS NORMAS JURÍDICAS. CONSTITUCIONALIDADE DO REGIME DE TRANSIÇÃO (ART. 37, §§ 1º, 5º, 6º, 7º e 11). INEXISTÊNCIA DE DIREITO ADQUIRIDO A REGIME JURÍDICO. ACOMODAÇÃO OTIMIZADA ENTRE SEGURANÇA E MODERNIZAÇÃO. INAPLICABILIDADE À ESPÉCIE DA GARANTIA DO EQUILÍBRIO FINANCEIRO DO CONTRATO ADMINISTRATIVO. SETOR ECONÔMICO DOTADO DE LIBERDADE DE PREÇOS.
1. A revisão judicial de marcos regulatórios editados pelo legislador requer uma postura de autocontenção em respeito tanto à investidura popular que caracteriza o Poder Legislativo quanto à complexidade técnica inerente aos temas a que o Poder Judiciário é chamado a analisar pela ótica estrita da validade jurídica.
2. A competência legislativa do Congresso Nacional para dispor sobre telecomunicações (CRFB, art. 22, IV) e para disciplinar os princípios constitucionais incidentes sobre a produção e a programação das emissoras de rádio e televisão (CRFB, art. 221 e art. 222, §5º) confere autoridade ao Poder Legislativo para, sponte propria, criar ou modificar marcos regulatórios setoriais, no que estão abarcados poderes para adaptar as instituições vigentes de modo a garantir a efetividade das novas regras jurídicas.
3. In casu, os artigos 10, 12, 13, 19, § 3°, 21, 22, 25, §1°, 31, caput, 36 e 42 da Lei nº 12.485/11 se limitaram a indicar a autoridade do Estado encarregada de zelar pelo cumprimento da novel disciplina normativa aplicável ao serviço de acesso condicionado, em tudo harmônica com as regras de competência definidas na legislação até então vigente (MP nº 2.228-1/01), emanada do próprio Poder Executivo. Inexistência de vício formal de constitucionalidade a ponto de justificar a glosa judicial da Lei nº 12.485/11 com fulcro no art. 61, §1º, e, da CRFB.
4. As diretrizes constitucionais antitruste (CRFB, arts. 173, §4º e 220, §5º), voltadas a coibir o abuso do poder econômico e a evitar a concentração excessiva dos mercados, permitem combater a ineficiência econômica e a injustiça comutativa que tendem a florescer em regimes de monopólio e oligopólio. No setor audiovisual, prestam-se também a promover a diversificação do conteúdo produzido, impedindo que o mercado se feche e asfixie a manifestação de novos entrantes.
5. In casu, as restrições à propriedade cruzada (art. 5º, caput e §1º), bem como a vedação à verticalização da cadeia de valor do audiovisual (art. 6º, I e II), todas introduzidas pela Lei nº 12.485/11, pretendem, de forma imediata, concretizar os comandos constitucionais inscritos no art. 170, §4º e 220, §5º, da Lei Maior; bem como realizam, de forma mediata, a dimensão objetiva do direito fundamental à liberdade de expressão e de informação, no que tem destaque o papel promocional do Estado no combate à concentração do poder comunicativo. Inexistência de ofensa material à Carta da República.
6. A moderna concepção do princípio da legalidade, em sua acepção principiológica ou formal axiológica, chancela a atribuição de poderes normativos ao Poder Executivo, desde que pautada por princípios inteligíveis (intelligible principles) capazes de permitir o controle legislativo e judicial sobre os atos da Administração.
7. In casu, os arts. 9º, parágrafo único, 21 e 22 da Lei nº 12.485/11, apesar de conferirem autoridade normativa à Agência Nacional do Cinema (ANCINE), estão acompanhados por parâmetros aptos a conformar a conduta de todas as autoridades do Estado envolvidas na disciplina do setor audiovisual brasileiro (ex vi do art. 3º da Lei do SeAC), impedindo que qualquer delas se transforme em órgão titular de um pretenso poder regulatório absoluto. Não ocorrência de violação material à Carta da República.
8. A Constituição de 1988 não estabeleceu qualquer regra jurídica que interdite a distinção entre brasileiro e estrangeiro, ao contrário do que acontece com a situação do brasileiro nato e do naturalizado, para a qual há explícita reserva constitucional acerca das hipóteses de tratamento diferenciado (CRFB, art. 12, §2º). Destarte, é juridicamente possível ao legislador ordinário fixar regimes distintos, desde que, em respeito ao princípio geral da igualdade (CRFB, art. 5º, caput), revele fundamento constitucional suficiente para a discriminação, bem como demonstre a pertinência entre o tratamento diferenciado e a causa jurídica distintiva.
9. In casu, o art. 10, caput e §1º, da Lei nº 12.485/11, ao restringir a gestão, a responsabilidade editorial e as atividades de seleção e direção inerentes à programação e ao empacotamento a brasileiros natos ou naturalizados há mais de 10 (dez) anos, representou típica interpretação legislativa evolutiva do comando constitucional encartado no art. 222, §2º, da Lei Maior, de todo condizente com os vetores axiológicos que informam, no plano constitucional, a atividade de comunicação de massa, dentre os quais a preservação da soberania e identidade nacionais, o pluralismo informativo e a igualdade entre os prestadores de serviço a despeito da tecnologia utilizada na atividade.
10. O poder de polícia administrativa manifesta-se tanto preventiva quanto repressivamente, traduzindo-se ora no consentimento prévio pela Administração Pública para o exercício regular de certas liberdades, ora no sancionamento do particular em razão do descumprimento de regras materiais aplicáveis à atividade regulada. Em qualquer caso, a ingerência estatal (fiscalizatória e punitiva) exsurge como garantia da efetividade da disciplina jurídica aplicável. (destacou-se)
11. In casu, os arts. 12 e 13 da Lei nº 12.485/11 simplesmente fixam deveres instrumentais de colaboração das empresas para fins de permitir a atividade fiscalizatória da ANCINE quanto ao cumprimento das novas obrigações materiais a que estão sujeitos todos os agentes do mercado audiovisual. Já o art. 31, caput, §§1º e 2º, da Lei nº 12.485/11 consubstancia engenhosa estratégia do legislador para conduzir as empacotadoras ao credenciamento exigido pela nova disciplina normativa, bem como induzir o cumprimento das respectivas cotas de conteúdo nacional. Ausência de quaisquer vícios que justifiquem declaração de inconstitucionalidade do modelo regulatório.
12. A legitimidade constitucional de toda intervenção do Estado sobre a esfera jurídica do particular está condicionada à existência de uma finalidade lícita que a motive, bem como ao respeito ao postulado da proporcionalidade, cujo fundamento deita raízes na própria noção de princípios jurídicos como mandamentos de otimização (ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. Trad. Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 116).
13. In casu, os arts. 16, 17, 18, 19, 20, 23 da Lei nº 12.485/11, ao fixarem cotas de conteúdo nacional para canais e pacotes de TV por assinatura, promovem a cultura brasileira e estimulam a produção independente, dando concretude ao art. 221 da Constituição e ao art. 6º da Convenção Internacional sobre a Proteção e Promoção da Diversidade das Expressões Culturais (Decreto nº 6.177/2007). A intervenção estatal revela-se, ademais, (i) adequada, quando relacionada ao fim a que se destina, (ii) necessária, quando cotejada com possíveis meios alternativos e (iii) proporcional em sentido estrito, quando sopesados os ônus e bônus inerentes à medida restritiva.
14. O art. 24 da Lei nº 12.485/11, que fixou limites máximos para a publicidade comercial na TV por assinatura, encontra-se em harmonia com o dever constitucional de proteção do consumidor (CRFB, art. 170, V), máxime diante do histórico quadro registrado pela ANATEL de reclamações de assinantes quanto ao volume de publicidade na grade de programação dos canais pagos.
15. O princípio constitucional da igualdade (CRFB, art. 5º, caput), enquanto regra de ônus argumentativo, exige que o tratamento diferenciado entre indivíduos seja acompanhado de causa jurídica suficiente para amparar a discriminação, cujo exame de consistência, embora preserve um espaço de discricionariedade legislativa, é sempre passível de aferição judicial (CRFB, art. 5º , XXXV).
16. In casu, o art. 25 da Lei nº 12.485/11 proíbe a oferta de canais que veiculem publicidade comercial direcionada ao público brasileiro contratada no exterior por agência de publicidade estrangeira, estabelecendo (i) uma completa exclusividade em proveito das empresas brasileiras (e não apenas preferência percentual), (ii) sem prazo para ter fim (ex vi do art. 41 da Lei do SeAC) e (iii) despida de qualquer justificação que indique a vulnerabilidade das empresas brasileiras de publicidade. Inconstitucionalidade do art. 25 da Lei nº 12.485/11 por violação ao princípio constitucional da isonomia (CRFB, art. 5º, caput).
17. O dever constitucional de licitar (CRFB, art. 37, XXI) somente incide nas hipóteses em que o acesso de particulares a alguma situação jurídica de vantagem relacionada ao Poder Público não possa ser universalizada. Destarte, descabe cogitar de certame licitatório quando a contratação pública não caracterizar escolha da Administração e todo cidadão possa ter acesso ao bem pretendido. Ademais, no campo das telecomunicações, é certo que a Constituição admite a outorga do serviço mediante simples autorização (CRFB, art. 21, XI).
18. In casu, o art. 29 da Lei nº 12.485/11 viabiliza que a atividade de distribuição do serviço de acesso condicionado seja outorgada mediante autorização administrativa, sem necessidade de prévio procedimento licitatório, o que se justifica diante da nova e abrangente definição do SeAC (art. 2º, XXIII, da Lei nº 12.485/11), apta a abarcar todas as possíveis plataformas tecnológicas existentes (e não apenas cabos físicos e ondas de radiofrequência), bem como diante da qualificação privada recebida pela atividade no novo marco regulatório da comunicação audiovisual. Inexistência de ofensa material à Constituição de 1988.
19. O art. 32, §§ 2º, 13 e 14, da Lei nº 12.485/11, ao impor a disponibilidade gratuita dos canais de TV aberta às distribuidoras e às geradoras de programação da TV por assinatura, não ofende a liberdade de iniciativa nem os direitos de propriedade intelectual, porquanto o serviço de radiodifusão é hoje inteiramente disponibilizado aos usuários de forma gratuita. A Lei do SeAC apenas replicou, no âmbito do serviço de acesso condicionado, a lógica vigente na televisão aberta.
20. O art. 36 da Lei nº 12.485/11, ao permitir o cancelamento do registro de agente econômico perante a ANCINE por descumprimento de obrigações legais, representa garantia de eficácia das normas jurídicas aplicáveis ao setor, sendo certo que haveria evidente contradição ao se impedir o início da atividade sem o registro (por não preenchimento originário das exigências legais) e, ao mesmo tempo, permitir a continuidade de sua exploração quando configurada a perda superveniente da regularidade. Destarte, a possibilidade de cancelamento do registro é análoga à do seu indeferimento inicial, já chancelada nos itens 10 e 11 supra.
21. A existência de um regime jurídico de transição justo, ainda que que consubstancie garantia individual diretamente emanada do princípio constitucional da segurança jurídica e da proteção da confiança legítima (CRFB, art. 5º, XXXVI), não impede a redefinição e a atualização dos marcos regulatórios setoriais, tão caras à boa ordenação da vida em sociedade.
22. In casu, o art. 37, §§ 6º, 7º e 11, da Lei nº 12.485/11, ao fixar regras sobre a renovação das outorgas após o fim do respectivo prazo original de vigência e regras pertinentes às alterações subjetivas sobre a figura do prestador do serviço, é constitucionalmente válido ante a inexistência, ab initio, de direito definitivo à renovação automática da outorga, bem como da existência de margem de conformação do legislador para induzir os antigos prestadores a migrem para o novo regime.
23. O art. 37, §§ 1º e 5º, da Lei nº 12.485/11, ao vedar o pagamento de indenização aos antigos prestadores do serviço em virtude das novas obrigações não previstas no ato de outorga original, não viola qualquer previsão constitucional, porquanto, em um cenário contratual e regulatório marcado pela liberdade de preços, descabe cogitar de qualquer indenização pela criação de novas obrigações legais (desde que constitucionalmente válidas). Eventuais aumentos de custos que possam surgir deverão ser administrados exclusivamente pelas próprias empresas, que tanto podem repassá-los aos consumidores quanto retê-los em definitivo. Impertinência da invocação do equilíbrio econômico e financeiro dos contratos administrativos (CRFB, art. 37, XXI).
24. Conclusão. Relativamente à ADI 4679, julgo o pedido procedente em parte, apenas para declarar a inconstitucionalidade material do art. 25 da Lei nº 12.485/2011; relativamente às ADI 4747, 4756 e 4923, julgo os pedidos improcedentes."
É pacífico o entendimento jurisprudencial segundo o qual, no exercício do poder de autotutela dos seus atos, a Administração deve anulá-los, de ofício, quando eivados de ilegalidade, ou pode revogá-los por motivo de conveniência e oportunidade, desde que resguardado o direito adquirido.
A anulação e revogação são as principais modalidades de desfazimento ou retirada do ato administrativo ou do procedimento. As Súmulas nºs 346 e 473 do Supremo Tribunal Federal (STF) tratam delas, respectivamente, nos seguintes termos:
SÚMULA 346
“A administração pública pode declarar a nulidade de seus próprios atos.”
SÚMULA 473
"A administração pública pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência e oportunidade, respeitados os direitos adquiridos e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial.”
As súmulas evidenciam, entre outras questões, o princípio da autotutela administrativa[2], segundo o qual a administração pode controlar seus próprios atos, anulando ou declarando a nulidade dos atos ilegais, ou revogando os atos inoportunos e inconvenientes.
Revogação consiste em medida privativa da Administração e obedece às regras de competência. De acordo com o princípio do paralelismo das formas, somente aquele que tem atribuições para praticar o ato pode revogá-lo. Os fundamentos das medidas são distintos: enquanto a revogação abrange tão somente o mérito, ou seja, a oportunidade e conveniência do ato, a anulação recai sobre a ilegalidade ou ilegitimidade. Na revogação, a Administração Pública promove o desfazimento do ato administrativo, mas não por razão de vício ou de defeito. A revogação é cogitada se o ato for válido e perfeito. Caso seja defeituoso, a Administração deverá providenciar sua invalidação.
Quanto à invalidade do ato administrativo, também denominada nulidade, podem ser identificados 2 (dois) níveis (graus). No grau mais elevado, o negócio jurídico é nulo (invalidade/nulidade absoluta), e no menor grau, anulável (invalidade/nulidade relativa).
Para que a multa imposta ao ente Municipal seja anulada é necessário/imprescindível que o Auto de Infração nº 245/2021 (SEI nº 20256019) padeça de ilegalidade que repercuta em sua validade[3][4] e eficácia[5][6].
O Auto de Infração nº 245/2021 (SEI nº 20256019) foi lavrado no exercício da atividade fiscalizatória desenvolvida pela SPU-PE para apuração de infração(ões) administrativa(s) praticadas contra o patrimônio imobiliário da União conforme arcabouço legal e normativo vigente, constituindo consectário/desdobramento lógico do processo administrativo sancionador instaurado cuja tramitação observou, em uma análise preliminar, as diretrizes e procedimentos das atividades de fiscalização dos imóveis da União previstos na INSTRUÇÃO NORMATIVA SPU Nº 23, DE 18 DE MARÇO DE 2020, que estabelece as diretrizes e procedimentos das atividades de fiscalização dos imóveis da União.
Considerando o regramento normatizado na INSTRUÇÃO NORMATIVA SPU Nº 23, DE 18 DE MARÇO DE 2020, a qual confere concretude ao dever-poder de fiscalização que integra a esfera do denominado poder de polícia administrativa (dever-poder de atuação) e em razão do aduzido nos itens "22." e "23.", a anulação da da multa decorrente Auto de Infração nº 245/2021 (SEI nº 20256019) somente poderá ocorrer caso seja constatada/identificada ilegalidade na lavratura do referido instrumento fiscalizatório que repercuta em sua validade e eficácia.
b) Caso não seja possível a anulação da multa, indagamos se seria possível uma cessão gratuita do imóvel ao município com a pendência de pagamento de multa, considerando que o mesmo não dispõe de recurso imediato para a liquidação do débito e o imóvel precisa de uma destinação urgente devido a dificultade da União manter a sua guarda.
O ordenamento jurídico contempla permissivo para que a União outorgue a cessão de uso de bem imóvel de sua propriedade a determinado órgão ou entidade da Administração Pública, de forma gratuita, visando conceder-lhe benefício que entenda conveniente prestar.
A Cessão de Uso representa o contrato administrativo utilizado para destinar imóvel de propriedade da União de forma privativa, quando há a necessidade de manter o domínio do bem, e a atividade a ser desenvolvida for de interesse público ou social, ou de aproveitamento econômico de interesse nacional. A cessão de uso não transfere direito real ao cessionário e poderá ser nos regimes gratuito, oneroso, ou em condições especiais.
A Cessão de Uso Gratuito consiste no contrato administrativo utilizado para destinar imóvel de domínio da União, sem ônus, para fins específicos, quando o cessionário for entidade que exerça atividade comprovadamente de interesse público ou social, autorizado o uso em determinadas condições definidas em contrato, sendo este direito, pessoal e intransferível a terceiros.
A pendência do pagamento da multa imposta não constitui, isoladamente, óbice para a destinação do bem imóvel ao ente municipal, incumbindo a Superintendência do Patrimônio da União no Estado de Pernambuco (SPU-PE), aferir minuciosamente o atendimento, pelo cessionário, dos requisitos legais e normativos previstos no Ordenamento Patrimonial para viabilizar a destinação pretendida.
A multa por aterro/construção irregular constitui receita patrimonial decorrente da sanção prevista no artigo 6º do Decreto-Lei nº 2.398, de 21 de dezembro 1987. Decorrido o prazo limite para a cobrança administrativa, o débito vencido deverá ser encaminhado à unidade competente da Procuradoria da Fazenda Nacional (PFN) para inscrição/inclusão em Dívida Ativa da União (DAU).
Como requisito para a inscrição/inclusão em Dívida Ativa da União (DAU), o devedor deverá ser previamente notificado pela SPU-PE, dando-lhe conhecimento/ciência da existência do(s) débito(s) e fixando prazo para pagamento, sob pena de inscrição em Dívida Ativa, conforme disposto no artigo 35, caput, da Instrução Normativa SPU nº 1, de 23 de jullho de 2007, que dispõe sobre o lançamento e a cobrança de créditos originados em Receita Patrimoniais.
Segundo regramento previsto na Instrução Normativa SPU nº 1, de 23 de jullho de 2007, a notificação será expedida por via postal, endereçada ao domicílio fiscal do devedor, com Aviso de Recebimento (AR) a ser assinado e datado na entrega (art. 35, parág. 2º). Para encaminhamento do processo para inscrição, o devedor deverá ter sido notificado há, no mínimo, 30 (trinta) dias contados do recebimento da notificação ou da publicação do Edital (art. 35, parág. 4º).
Destaco que a análise aqui empreendida circunscreve-se aos aspectos legais envolvidos, não incumbido a esta unidade jurídica imiscuir-se no exame dos aspectos de economicidade, oportunidade, conveniência, assim como os aspectos técnicos envolvidos, conforme diretriz inserta na Boa Prática Consultiva (BPC) nº 7[7].
Tal entendimento está lastreado no fato de que a prevalência do aspecto técnico ou a presença de juízo discricionário determinam a competência e a responsabilidade da autoridade administrativa pela prática do ato.
Neste sentido, a Boa Prática Consultiva (BPC) nº 7, cujo enunciado é o que se segue:
"Enunciado
A manifestação consultiva que adentrar questão jurídica com potencial de significativo reflexo em aspecto técnico deve conter justificativa da necessidade de fazê-lo, evitando-se posicionamentos conclusivos sobre temas não jurídicos, tais como os técnicos, administrativos ou de conveniência ou oportunidade, podendo-se, porém, sobre estes emitir opinião ou formular recomendações, desde que enfatizando o caráter discricionário de seu acatamento." (grifou-se)
IV - CONCLUSÃO
Em face do anteriormente exposto, observado a(s) recomendação(ões) sugerida(s) no(s) item(ns) "24.", "28.", "29.", "30.", "31." e "32." desta manifestação jurídica, abstraídos os aspectos de conveniência e oportunidade do Administrador, nos limites da lei, e as valorações de cunho econômico–financeiro, ressalvadas, ainda, a manutenção da conformidade documental com as questões de ordem fática, técnica e de cálculo, ínsitas à esfera administrativa, essenciais até mesmo para a devida atuação dos órgãos de controle, o feito está apto para a produção dos seus regulares efeitos, tendo em vista não conter vício insanável com relação à forma legal que pudesse macular o procedimento.
Em razão do advento da PORTARIA NORMATIVA CGU/AGU Nº 10, de 14 de dezembro de 2022, publicada no Suplemento "A" do Boletim de Serviço Eletrônico (BSE) nº 50, de 14 de dezembro de 2022, que dispõe sobre a organização e funcionamento das Consultorias Jurídicas da União Especializadas Virtuais (e-CJUs), convém ressaltar que as manifestações jurídicas (pareceres, notas, informações e cotas) não serão objeto de obrigatória aprovação pelo Coordenador da e-CJU, conforme estabelece o artigo 22, caput, do aludido ato normativo.
Feito tais registros, ao Núcleo de Apoio Administrativo da Consultoria Jurídica da União Especializada Virtual de Patrimônio (e-CJU/PATRIMÔNIO) para restituir o processo a Superintendência do Patrimônio da União no Estado de Pernambuco (SPU-PE) para ciência desta manifestação jurídica, mediante disponibilização de chave (link) de acesso externo como usuário externo ao Sistema AGU SAPIENS 2.0., bem como para adoção da(s) providência(s) que entender pertinente(s).
Vitória-ES., 29 de dezembro de 2023.
(Documento assinado digitalmente)
Alessandro Lira de Almeida
Advogado da União
Matrícula SIAPE nº 1332670
Atenção, a consulta ao processo eletrônico está disponível em https://supersapiens.agu.gov.br mediante o fornecimento do Número Único de Protocolo (NUP) 00402000148202316 e da chave de acesso 0098972d
Notas