ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA DA UNIÃO ESPECIALIZADA VIRTUAL DE PATRIMÔNIO
NÚCLEO JURÍDICO SUMÁRIO

PARECER n. 00043/2024/NUCJUR-SUM/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU

 

NUP: 19739.158106/2023-08

INTERESSADOS: UNIÃO - SUPERINTENDÊNCIA DO PATRIMÔNIO DA UNIÃO EM ALAGOAS

ASSUNTOS: FISCALIZAÇÃO

 

EMENTA: Consulta. Auto de Infração. Vício insanável é aquele em que a correção da autuação implica modificação do fato descrito no auto de infração. "Erro material é o reconhecido primu ictu oculi, consistente em equívocos materiais sem conteúdo decisório" (REsp n. 1.021.841/PR, Relatora Ministra ELIANA CALMON, 2ª TURMA, DJe de 4/11/2008)​Parâmetros corretos definidos no próprio auto de infração. Erro no resultado da multiplicação.  Nulidade sanável. Reabertura do contraditório. Necessidade. Nova notificação ao autuado. Instrução Normativa SPU nº 23, de 18 de março de 2020.
 

Relatório: 

 

Trata-se de consulta formulada pela SPU/AL, nos seguintes termos:

 

A equipe da SPU/AL, após uma reunião com a Prefeitura de Porto de Pedras para discutir questões relacionadas à praia de Tatuamunha na região da Boca do Rio, realizou uma fiscalização in loco e constatou a presença de uma retroescavadeira em uma área de praia, que é de uso comum da população. Esta retroescavadeira estava trabalhando no início das obras de escavação para a construção de um muro de contenção, fato ocorrido em 18 de outubro de 2023, como pode ser comprovado por meio das imagens disponíveis (anexo I).
No momento da fiscalização, a pessoa responsável pela obra não apresentou os documentos que comprovam a regularidade da obra perante a Superintendência do Patrimônio da União (SPU). Diante disso, foi emitido o Auto de Infração nº 16/2023 (anexo II) e o Auto de Embargo nº 01A (anexo III), para paralisação da obra.
O auto de infração foi enviado via e-mail (anexo IV) e foi apresentada defesa na data de 01 de dezembro de 2023, pelo advogado Sr. Hugo Melro Bentes (autuada: sra. Jaqueline David de Souza - CPF 024.857.014-58), que foi analisada pela SPU.
No entanto, observou-se posteriormente que no auto de infração mencionado consta a metragem quadrada da área de uso comum invadida, sendo de 212,40m², multiplicada pelo valor de multa por metro quadrado, conforme Publicação DOU - PORTARIA 708 (anexo V), que é de R$ 109,94, o que totaliza R$23.351,25.
No Auto de Infração nº 16/2023 (anexo II) foram inseridos os dados corretos de metragem quadrada e de valor por metro quadrado de ocupação irregular, mas o resultado da multiplicação foi anotado equivocadamente, no total de R$ 13.346,71. Não consta nos autos do processo que tenha sido iniciada a cobrança de tal multa.
Considerando que a AGU presta consultoria e assessoramento jurídico aos órgãos e entidades da Administração Pública Federal, e tendo em vista erro formal aqui exposto, esta SPU AL requer consulta em como proceder neste caso:
Diante do exposto e nada mais havendo a acrescentar, nos colocamos à disposição para mais esclarecimentos.

 

Tudo lido e analisado, é o relatório. 

 

Análise:

 

Como regra geral, o auto de infração que apresentar vício insanável deve ser declarado nulo pela autoridade competente. ​Considera-se vício insanável aquele em que a correção da autuação implica modificação do fato descrito no auto de infração.

 

Não obstante, se o auto de infração for declarado nulo, mas estiver caracterizada a conduta ou atividade lesiva ao patrimônio, deverá ser lavrado novo auto, observadas as regras relativas à prescrição.

 

Eventual erro no enquadramento legal da infração não implica vício insanável, podendo inclusive ser alterado pela autoridade julgadora mediante decisão fundamentada que retifique o auto de infração, ouvido o interessado. 

 

Da mesma forma, erros materiais que não prejudiquem a defesa são vícios sanáveis, mas qualquer correção que implique em majoração da penalidade a ser efetivamente executada deve assegurar o direito de defesa ao interessado. 

 

A Lei 9.784/99 determina:

 

Art. 55. Em decisão na qual se evidencie não acarretarem lesão ao interesse público nem prejuízo a terceiros, os atos que apresentarem defeitos sanáveis poderão ser convalidados pela própria Administração.
Art. 64. O órgão competente para decidir o recurso poderá confirmar, modificar, anular ou revogar, total ou parcialmente, a decisão recorrida, se a matéria for de sua competência.
Parágrafo único. Se da aplicação do disposto neste artigo puder decorrer gravame à situação do recorrente, este deverá ser cientificado para que formule suas alegações antes da decisão.

Instrução Normativa SPU nº 23, de 18 de março de 2020 dispõe:

 

DISPOSIÇÕES GERAIS
Art. 21. A qualquer tempo poderão ser convalidados vícios ou defeitos em documentos ou no trâmite do processo, desde que não acarrete lesão efetiva a direitos já adquiridos, conforme disposto no art. 55 da Lei nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999.
§ 1º Na hipótese de anulação parcial do processo, serão aproveitados todos os atos que não decorram do ato anulado ou não sejam por ele diretamente atingidos, reabrindo-se novo prazo para manifestação do interessado.
§ 2º O erro no enquadramento legal não implica vício insanável, podendo ser alterado de ofício pela autoridade julgadora mediante decisão fundamentada, sem prejuízo do disposto no parágrafo único do art. 64 da Lei nº 9.784, de 1999.
§ 3º A SPU, em seu poder de autotutela, poderá aplicar o art. 53 da Lei nº 9.784, de 1999.
 
(...)

Art. 29. O auto de infração conterá:
I - o número de ordem;
II - o endereço completo do imóvel;
III - a identificação do responsável, ocupante e/ou daquele presente no momento da fiscalização, colhendo-se o número do CPF ou, na impossibilidade, anotando-se a data de nascimento, a naturalidade, e o nome da mãe, para que possa ser consultado o número do CPF do ocupante junto ao Sistema de Informações da Receita Federal - SIRF;
IV - a descrição da infração administrativa contra o patrimônio da União, conforme disposto no art. 10 desta IN;
V - a fundamentação legal da infração administrativa;
VI - a sanção administrativa aplicada, conforme disposto no art. 11 desta IN;
VII - notificação para a apresentação da defesa, no prazo previsto no inciso II, do art. 34, desta IN; e
VIII - ata e assinatura do servidor responsável pela fiscalização.
 

No caso concreto, o auto de infração contém todos os elementos essenciais. Inclusive os parâmetros para o cálculo da multa estão corretos (212,40m² x R$ 109,94), mas o resultado da operação está menor (R$ 13.346,71) do que o devido (R$ 23.351,25).

 

Claramente é um erro material:

 

2. O erro material, passível de ser corrigido de ofício, e não sujeito à preclusão, é o reconhecido primu ictu oculi, consistente em equívocos materiais sem conteúdo decisório propriamente dito.
(REsp 1151982/ES, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 23/10/2012, DJe 31/10/2012) - transcrição parcial

 

1. A jurisprudência do STJ é no sentido de que o "erro material é o reconhecido primu ictu oculi, consistente em equívocos materiais sem conteúdo decisório propriamente dito, como a troca de uma legislação por outra, a consideração de data inexistente no processo ou uma inexatidão numérica; e não, aquele que decorre de juízo de valor ou de aplicação de uma norma jurídica sobre o(s) fato(s) do processo" (REsp n. 1.021.841/PR, Relatora Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 7/10/2008, DJe de 4/11/2008).

 

Mas qualquer correção que implique em majoração da penalidade deve oportunizar ao interessado direito de defesa. É um erro, ainda que sanável. E qualquer correção que afete o montante final a ser executado exige o respeito prévio ao contraditório (art. 5º, LV da CF). 

 

Conclusão. 

 

A partir das premissas acima, responde-se objetivamente as questões trazidas pela SPU:

 

Deve-se cancelar o auto de infração e ser emitido novo auto com o valor correto (R$ 23.351,25)?

 

Não é necessário. O cancelamento (no caso anulação) deveria ser feito se o vício fosse insanável, o que não é o caso dos autos. 

 

Pode-se manter o mesmo auto de infração e comunicar à autuada sobre o recálculo da multa, podendo prosseguir o processo para cobrança, já com o valor correto (R$ 23.351,25), considerando também que a cobrança ainda não foi iniciada?

 

Pode ser mantido o mesmo auto de infração, mas é necessário que a autoridade competente ouça previamente o autuado, notificando-o para que possa exercer o contraditório e formular alegações sobre o erro a ser corrigido. Após, emitir decisão corrigindo (ou não) o erro e, se for o caso, convalidando o auto.

 

Observar que o processo de cobrança não deve seguir imediatamente, pois é indispensável que seja reaberto prazo para manifestação do interessado e, se for o caso, analisar recursos ou impugnações que forem apresentados.

 

Avaliar também se a infração persiste, para aplicação automática da multa mensal (DL 2.398/ art.6º, inciso II do § 4 e §9º e art. 17, § 4º IN SPU 23/20) seguida de execução.

 

Como a AGU orienta agir neste caso, para que não haja dúvida em futuras ações neste tipo de processo?
 

Com a devida vênia, a questão genérica demais para ser respondida de maneira objetiva.  

 

É o Parecer, não vinculante e sujeito à críticas. Dispensada a aprovação do Exmo. Coordenador, na forma do Regimento Interno. 

 

Vitória, ES, 16 de janeiro de 2024.

 

 

LUÍS EDUARDO NOGUEIRA MOREIRA

ADVOGADO DA UNIÃO

 

 


Atenção, a consulta ao processo eletrônico está disponível em https://supersapiens.agu.gov.br mediante o fornecimento do Número Único de Protocolo (NUP) 19739158106202308 e da chave de acesso e66768fe

 




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