ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA JUNTO AO MINISTÉRIO DA CULTURA

 

 

PARECER nº 28/2024/CONJUR-MINC/CGU/AGU

PROCESSO nº 01400.006740/2019-28

INTERESSADOS: Secretaria de Economia Criativa e Fomento Cultural

ASSUNTO: Pronac. Recolhimento de saldos de projetos.

 

EMENTA: ADMINISTRATIVO E FISCAL. INCENTIVO À CULTURA.
I - Programa Nacional de Apoio à Cultura - Pronac. Recolhimento ao Fundo Nacional de Cultura (FNC) de saldos de conta bancária vinculada a projeto cultural.
II - Possibilidade de estorno, desde que cabalmente demonstrado que os recursos recolhidos ao FNC não foram captados para a execução do projeto cultural vinculado à conta bancária, mas apenas depositados inadvertidamente sem qualquer impacto na execução das despesas do projeto e sem resultar em qualquer benefício fiscal federal.
III - Não incidência de atualização monetária, tendo em vista a inexistência de erro imputável à administração pública federal no depósito irregularmente efetuado em conta exclusiva do projeto.

 

 

Sra. Consultora Jurídica,

 

Trata-se de consulta formulada pela Secretaria de Economia Criativa e Fomento Cultural por meio do Ofício nº 2545/2023/SEFC/MinC (SEI/MinC 1344572), referente aos fatos narrados na Nota Técnica nº 22/2023 da Diretoria de Fomento Indireto.

Na referida nota técnica, é relatado que o projeto Pronac 19-2212, intitulado Lendas Ciganas, teve sua execução realizada e comprovada em prestação de contas, tendo zerado os recursos depositados em sua conta-movimento quando de sua prestação de contas. Porém, a proponente inadvertidamente teria recebido depósitos de incentivos municipais alguns dias após o encerramento do projeto Pronac 19-2212, sendo que estes recursos acabaram sendo recolhidos ao Fundo Nacional de Cultura (FNC) pelo Ministério da Cultura, quando do encerramento da conta após análise da prestação de contas.

Diante de tais fatos, e considerando os esclarecimentos apresentados pela proponente em requerimento protocolado via SALIC em 02/12/2023 (SEI 1540909), questiona-se se seria possível o estorno do valor recolhido ao FNC à proponente, em conta diversa da conta-movimento do Pronac 19-2212.

É o relatório. Passo à análise.

O recolhimento ao FNC de saldos não utilizados de projetos culturais incentivados pela renúncia fiscal da Lei Rouanet decorre diretamente do art. 5º, inciso V, da referida lei, que assim dispõe:

Art. 5º O FNC é um fundo de natureza contábil, com prazo indeterminado de duração, que funcionará sob as formas de apoio a fundo perdido ou de empréstimos reembolsáveis, conforme estabelecer o regulamento, e constituído dos seguintes recursos:
(...)
V - saldos não utilizados na execução dos projetos a que se referem o Capítulo IV e o presente capítulo desta lei; (...)

A Instrução Normativa nº 11/2024 (art. 49), que atualmente regulamenta o fomento indireto por incentivos fiscais da Lei Rouanet, estabelece alguns procedimentos pelos quais se admite a transferência de saldos entre projetos de um mesmo proponente, desde que dentro do prazo de captação, considerando tais recursos utilizáveis dentro de uma carteira de projetos do proponente, somente sendo passíveis de recolhimento ao FNC aqueles efetivamente não utilizáveis e não utilizados em qualquer projeto autorizado.

No caso em exame, todavia, não se está a tratar de recursos efetivamente captados pela proponente sob a égide do regime fiscal de incentivo da Lei Rouanet, visto que comprovadamente não foram transferidos para a conta-movimento do projeto a partir do saldo da conta-captação aberta para o projeto em questão. Ou seja, não se trata de recursos incentivados efetivamente captados para o projeto Pronac 19-2212, mas de valores inadvertidamente depositados na conta do projeto por um lapso da proponente, que indevidamente indicou a conta para recebimento de recursos de outra natureza, oriundos de incentivos aportados em decorrência da legislação municipal de incentivo à cultura do município de Curitiba-PR.

Embora a documentação acostada aos autos não permita identificar tratar-se efetivamente de incentivo via lei municipal, há outros elementos, apontados pela Diretoria de fomento Indireto na Nota Técnica nº 20/2023, que permitem afirmar não se tratar de recursos de renúncia fiscal federal.

Com efeito, o projeto Pronac 19-2212 foi autorizado a captar R$ 65.660,00, conforme homologação concedida em 01/07/2020 segundo as regras vigentes à época, nos termos do art. 25 da Instrução Normativa MC nº 2/2019. Com base no art. 30 de tal instrução normativa, a movimentação dos recursos captados somente era autorizada após a captação atingir ao menos 20% do total homologado. Com o aporte de R$ 58.180,62 na conta-captação, a proponente teve seus recursos liberados  e transferidos para a conta-movimento, não havendo mais registros de novas captações após esta liberação.

Portanto, conforme informado pela área técnica, a proponente logrou êxito em captar 88,61% do total autorizado, chegando ao seu termo, com o término do prazo de execução, em 21/12/2022. A prestação de contas apresentada logo após o término da execução demonstrou a utilização integral dos recursos captados e liberados, no montante de R$ 59.998,95 (103,11% do total captado, incluídos os rendimentos da aplicação financeira), visto que a conta-movimento encontrava-se já zerada quando da entrega da prestação de contas.

Apenas após a prestação de contas a conta bancária voltou a receber novos aportes diretos, não oriundos da conta-captação, que totalizavam R$ 37.075,30 no momento em que o próprio Ministério da Cultura promoveu seu encerramento e recolhimento de saldos ao FNC, em 17/10/2023, já em fase de avaliação de resultados.

Além disso, conforme atestado pela diretoria de Fomento Indireto, somente os recursos aportados na conta-captação dos projetos culturais do Pronac é que efetivamente são contabilizados para fins de incentivo fiscal a patrocinadores e doadores. Recursos aportados diretamente na conta-movimento do projeto não dão resultam em qualquer benefício fiscal aos depositantes, tratando-se de operação não contabilizada como renúncia fiscal federal. Logo, eventual estorno de valores à proponente não teria impacto sobre quaisquer incentivos fiscais usufruídos por doadores e patrocinadores no âmbito do Pronac, uma vez que não se trata de recursos que tenham sido captados sob tal regime tributário na conta-captação do projeto.

Por fim, é relevante considerar que o valor em disputa, no montante de R$ 37.075,30, extrapola em muito o valor total autorizado que o projeto estava autorizado a captar, e sequer poderia ter sido acatado na conta-captação do projeto, por extrapolar o limite de renúncia fiscal autorizada para o projeto em questão. Assim, é verossímil, no cotejo com as demais circunstância apuradas, concluir que se trata de valores que foram indevidamente depositados na conta do Pronac 19-2212, não fazendo parte dos recursos regularmente captados e destinados à execução proporcional de 88,61% do projeto originalmente aprovado, após as devidas readequações orçamentárias.

Isto posto, considerando tratar-se de recursos não oriundos de renúncia fiscal federal depositados inadvertidamente em conta de projeto cultural do Pronac, não se vislumbram óbices de natureza jurídica ao estorno de tais valores à proponente, uma vez que tal medida não trará nenhum impacto para a análise da prestação de contas do projeto já encerrado ante do aporte de tais recursos, tampouco resultará em prejuízo à União, tendo em vista a ausência de renúncia fiscal federal na origem de tais recursos.

No entanto, considerando que a conta-movimento – de onde os recursos foram recolhidos – já foi encerrada e não pode ser reaberta em virtude de sua finalidade específica para a execução do projeto já encerrado, deverá o estorno ser realizado em conta própria da proponente, ou em conta vinculada ao projeto incentivado conforme a lei do município de Curitiba, sendo recomendável que a interessada informe-se previamente junto ao poder público local acerca dos procedimentos necessários junto ao fisco municipal para que o eventual benefício fiscal seja usufruído pela empresa incentivadora naquela esfera da administração. Independentemente do que seja acertado entre a interessada e o município de Curitiba quanto a este procedimento, poderá o Ministério da Cultura estornar o valor de R$ 37.075,30 indevidamente recolhido ao FNC, sem correção monetária, tendo em vista tratar-se de erro imputável exclusivamente à proponente, que não poderia ter indicado a conta bancária do projeto Pronac para recebimento de recursos estranhos ao projeto.

 

À consideração superior.

 

Brasília, 14 de fevereiro de 2024.

 

OSIRIS VARGAS PELLANDA

Advogado da União

Coordenador-Geral Jurídico de Políticas Culturais

 


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