ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA JUNTO AO MINISTÉRIO DA CULTURA
COORDENAÇÃO-GERAL DE PARCERIAS E COOPERAÇÃO FEDERATIVA

 

PARECER n. 00032/2024/CONJUR-MINC/CGU/AGU

 

NUP: 01400.000435/2024-90

INTERESSADOS: GABINETE DA MINISTRA GM/MINC

 ASSUNTOS: DIREITO INTERNACIONAL. ACORDO DE COOPERAÇÃO INTERNACIONAL.

 

 

EMENTA: I. Acordo de Cooperação Cultural entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República da Croácia. II. Direito Internacional. III. Possibilidade jurídica. Recomendações.

 

 

RELATÓRIO 

 

Por meio do Ofício nº 469/2024/GM/MinC (1612011), o Gabinete da Ministra solicita análise e manifestação sobre Acordo de Cooperação Cultural celebrado entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República da Croácia, com o objetivo de estabelecer as bases por meio das quais as Partes cooperarão nas esferas da cultura, incluindo, entre outras, políticas culturais, língua e literatura, patrimônio cultural, museus, bibliotecas, artes e indústrias culturais e criativas.

Segundo consta da Exposição de Motivos (SEI 1577625), as negociações do acordo tiveram início em 2006 e, após tentativas frustradas de assinatura, foram retomadas em duas ocasiões, em 2012 e 2021. O Acordo foi finalmente celebrado em Zagreb,  em 14 de fevereiro de 2023e neste momento, o Ministério das Relações Exteriores adota as providências necessárias com vistas ao envio ao Congresso Nacional, nos termos do artigo 84, inciso VIII, combinado com o artigo 49, inciso I, da Constituição Federal.

Para o que interessa à presente análise, constam dos autos o Acordo de Cooperação Cultural celebrado (1577629), a Exposição de Motivos Interministerial nº 00352/2023 MRE MinC (1577625), e o Parecer n. 228/2024/AEAI/GM da Assessoria Especial de Assuntos Internacionais/MINC (1584477), que fundamenta o ato sob o ponto de vista do mérito administrativo. 

Feito este breve relatório, passo à análise da matéria.

 

ANÁLISE JURÍDICA

 

A presente análise se dá com fundamento no art. 11 da Lei Complementar nº 73, de 1993, subtraindo-se do âmbito da competência institucional deste Órgão Jurídico, delimitada em lei, análises que importem em considerações de ordem técnica, financeira ou orçamentária, nos termos do Enunciado de Boas Práticas Consultivas AGU nº 7:

 

“A manifestação consultiva que adentrar questão jurídica com potencial de significativo reflexo em aspecto técnico deve conter justificativa da necessidade de fazê-lo, evitando-se posicionamentos conclusivos sobre temas não jurídicos, tais como os técnicos, administrativos ou de conveniência ou oportunidade, podendo-se, porém, sobre estes emitir opinião ou formular recomendações, desde que enfatizando o caráter discricionário de seu acatamento” (Manual de Boas Práticas Consultivas. 4.ed. Brasília: AGU, 2016, página 32).

 

 Assim, cumpre esclarecer que não compete a esta Consultoria Jurídica a análise do mérito administrativo do instrumento que se pretende celebrar, cabendo à autoridade administrativa competente sopesar a conveniência e/ou oportunidade na edição do mencionado ato. Às consultorias jurídicas compete apenas a aferição do aspecto jurídico-legal das minutas cuja análise lhe são submetidas.

Com relação ao mérito, a proposta foi avaliada pela Assessoria Especial de Assuntos Internacionais/MINC, por meio do Parecer de mérito n. 228/2024/AEAI/GM (1584477), que apresenta o contexto em que a proposta se insere e avalia aspectos relacionados à conveniência e oportunidade do ajuste, concluindo no seguinte sentido:

 

5. Entende-se que a iniciativa dos dois Países de estabelecer o presente Acordo de Cooperação na área da cultura permitirá o desenvolvimento das ações e potencialidades da agenda bilateral, ativando as relações entre as duas sociedades e colaborando para incentivar trocar culturais, nos mais variados espectros da arte e da cultura. 

 

Como visto, o ato em análise é um Acordo de Cooperação Cultural celebrado em 14 de fevereiro de 2023 entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República da Croácia, com o objetivo de estabelecer as bases por meio das quais as Partes cooperarão nas esferas da cultura.

O Acordo foi celebrado com fundamento na Convenção da UNESCO sobre a Proteção e Promoção da Diversidade das Expressões Culturais, adotada em Paris em 20 de outubro de 2005, que entrou em vigor em 18 de março de 2007.

Dito isso, observo que é variada a denominação dada aos atos internacionais. Embora a denominação escolhida não influencie o caráter do instrumento, ditada pelo arbítrio das partes, pode-se estabelecer certa diferenciação na prática diplomática, decorrente do conteúdo do ato e não de sua forma. As denominações mais comuns são tratado, acordo, convenção, protocolo e memorando de entendimento.

Os tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional, após firmados, devem ser remetidos à apreciação e aprovação pelo Congresso Nacional, em cumprimento à determinação contida no art. 49, I, combinado com o artigo 84, VIII, da Constituição Federal, que dispõem:

 

Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional:
I - resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional;
(...)
 
Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República:
(...)
VIII - celebrar tratados, convenções e atos internacionais, sujeitos a referendo do Congresso Nacional;
(...)

 

Assim, em atenção aos dispositivos recém-transcritos, os instrumentos internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional deverão ser encaminhados ao Congresso Nacional, a fim de que este delibere sobre o ajuste, uma vez que é da sua competência "resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional".

A este respeito, é importante destacar o entendimento doutrinário de que cabe ao Congresso Nacional avaliar a existência de encargos ou compromissos gravosos. Nesse sentido, leciona o professor Tarciso Dal Maso Jardim [1]:

 

 (...) A informação, sobre acordos executivos celebrados pelo Brasil, deve ser remetida ao Congresso Nacional como rotina e obrigação, até mesmo para o controle parlamentar da classificação feita pelo Executivo de certo tratado como não acarretando “encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional”. Cabe ao Congresso Nacional essa análise, pois sua competência de referendar tratados é ampla e, se a considerarmos restrita, ela diz respeito a termos fluidos, que é o fato de acarretar encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional. A competência do Legislativo de aprovar tratados não pode ser usurpada pela interpretação do Poder Executivo, o que na prática ocorre. (...) 
(sem grifos no original)

 

Vale notar, ainda, que a assinatura de instrumento que acarrete encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional, quando for o caso, deve ser realizada pelo Presidente da República ou por autoridade com plenos poderes para tanto, na forma do artigo 7, parágrafo 2, item 'a', da Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados (promulgada pelo Decreto nº 7.030/2009), que dispõe:

 

Plenos Poderes 
1. Uma pessoa é considerada representante de um Estado para a adoção ou autenticação do texto de um tratado ou para expressar o consentimento do Estado em obrigar-se por um tratado se: 
a)apresentar plenos poderes apropriados; ou 
b)a prática dos Estados interessados ou outras circunstâncias indicarem que a intenção do Estado era considerar essa pessoa seu representante para esses fins e dispensar os plenos poderes. 
2. Em virtude de suas funções e independentemente da apresentação de plenos poderes, são considerados representantes do seu Estado: 
a) os Chefes de Estado, os Chefes de Governo e os Ministros das Relações Exteriores, para a realização de todos os atos relativos à conclusão de um tratado; 
b) os Chefes de missão diplomática, para a adoção do texto de um tratado entre o Estado acreditante e o Estado junto ao qual estão acreditados; 
c)os representantes acreditados pelos Estados perante uma conferência ou organização internacional ou um de seus órgãos, para a adoção do texto de um tratado em tal conferência, organização ou órgão.

 

 

Assim, por se configurar um ajuste a ser celebrado entre dois Países (sujeitos de Direito Internacional Público) sua assinatura deve ser realizada por um representante de cada Parte, que pode ser seu plenipotenciário ou aquele que possua carta de plenos poderes específico para tanto (art. 7º da Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados, promulgada pelo Decreto nº 7.030, de 14 de dezembro de 2009).

No caso dos autos, o Acordo foi assinado pelo Ministro de Estado das Relações Exteriores.

Aplica-se à matéria, ainda, o Decreto nº 9.191, de 1º de novembro de 2017, que estabelece as normas e as diretrizes para elaboração, redação, alteração, consolidação e encaminhamento de propostas de atos normativos ao Presidente da República pelos Ministros de Estado.

Os art. 26 a 32 do Decreto nº 9.191 de 2017 indicam os documentos necessários à instrução do procedimento, em especial, a Exposição de Motivos (art. 27 e 29), e os pareceres jurídicos (art. 31) e de mérito (art. 32) dos órgãos aos quais a matéria esteja relacionada (no caso, o Ministério das Relações Exteriores e o Ministério da Cultura).

A Exposição de Motivos Interministerial foi elaborada pelo Ministério das Relações Exteriores e consta do documento SEI 1577625, juntamente com a minuta de Mensagem ao Congresso Nacional.

Conforme mencionado, o Parecer de mérito por parte do Ministério da Cultura foi elaborado pela Assessoria Especial de Assuntos Internacionais/MINC e consta dos autos como Parecer n. 228/2024/AEAI/GM  (1584477),

Por fim, observo que a minuta de Acordo de Cooperação Cultural foi detalhadamente analisada pela CONJUR-MRE, na forma do PARECER n. 00279/2023/CGDI/CONJUR-MRE/CGU/AGU  (SEI 1577625), cujas conclusões acompanho, não se fazendo necessários reparos à redação proposta.

 

 

CONCLUSÃO

 

Isso posto, conclui-se que o processo reúne os requisitos necessários ao prosseguimento dos trâmites, não se vislumbrando óbices no envio ao Congresso Nacional do texto do "Acordo sobre Cooperação Cultural entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República da Croácia", desde que observado o exposto no presente Parecer e no PARECER n. 00279/2023/CGDI/CONJUR-MRE/CGU/AGU.

Assim, submeto o presente processo à consideração superior, sugerindo, na sequência, o encaminhamento ao Gabinete da Ministra, para ciência e providências cabíveis.

 

 Brasília, 20 de fevereiro de 2024.

 

 

DANIELA GUIMARÃES GOULART

Advogada da União

 

 

Nota:

[1] https://www12.senado.leg.br/publicacoes/estudos-legislativos/tipos-de-estudos/outras-publicacoes/agenda-legislativa/capitulo-13-condicionantes-impostas-pelo-    congresso-nacional-ao-executivo-federal-em-materia-de-celebracao-de-tratados

 


Atenção, a consulta ao processo eletrônico está disponível em https://supersapiens.agu.gov.br mediante o fornecimento do Número Único de Protocolo (NUP) 01400000435202490 e da chave de acesso 1a8eb2e5

 




Documento assinado eletronicamente por DANIELA GUIMARÃES GOULART, com certificado A1 institucional (*.agu.gov.br), de acordo com os normativos legais aplicáveis. A conferência da autenticidade do documento está disponível com o código 1408959941 no endereço eletrônico http://sapiens.agu.gov.br. Informações adicionais: Signatário (a): DANIELA GUIMARÃES GOULART, com certificado A1 institucional (*.agu.gov.br). Data e Hora: 20-02-2024 16:17. Número de Série: 65437255745187764576406211080. Emissor: Autoridade Certificadora do SERPRO SSLv1.