ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA JUNTO AO MINISTÉRIO DA CULTURA
GABINETE

 

PARECER n. 00034/2024/CONJUR-MINC/CGU/AGU

 

NUP: 01400.001238/2024-98

INTERESSADOS: COORDENAÇÃO-GERAL DE LIVRO E LITERATURA CGLIL/MINC

ASSUNTOS: ATOS ADMINISTRATIVOS

 

EMENTA: Direito Administrativo. Minuta de Portaria Ministerial que "Institui Grupo de Trabalho para realizar a curadoria para escolha dos escritores brasileiros que irão participar da Feira Internacional do Livro de Bogotá 2024." Ausência de óbices constitucionais ou legais. Observância das regras do Decreto nº 9.191, de 2017, e do Decreto 10.139, de 2019. Parecer pela regularidade material e formal da proposta, observadas as sugestões formais ora elaboradas.

 

 

I - RELATÓRIO

 

 

Trata-se de expediente encaminhado a esta Consultoria Jurídica pela Secretaria de Formação, Livro e Leitura (Ofício nº 153/2024/SEFLI/GAB/SEFLI/GM/MinC), contendo minuta de Portaria Ministerial, a ser firmada pela Exma. Ministra de Estado da Cultura, que "Institui Grupo de Trabalho para realizar a curadoria para escolha dos escritores brasileiros que irão participar da Feira Internacional do Livro de Bogotá 2024."

 

2. Nos autos do presente processo encontram-se:

(i) as tratativas de convite ao MINC pelo Governo da Colômbia, para participar da Feira de Livros naquele país;

(ii) a minuta de Portaria (SEI 1594257); e

(iii) Nota Técnica 4/2024 (SEI 1598310)

 

3. É o sucinto relatório. Passa-se à análise.

 

II - FUNDAMENTAÇÃO

 

4. Preliminarmente, impende tecer breve consideração sobre a competência desta Consultoria Jurídica para manifestação no processo in casu.

 

5. Sabe-se que a Constituição de 1988 prevê as funções essenciais à Justiça em seu Título IV, Capítulo IV; contemplando na Seção II a advocacia pública. Essa essencialidade à justiça deve ser entendida no sentido mais amplo que se possa atribuir à expressão, estando compreendidas no conceito de essencialidade todas as atividades de orientação, fiscalização e controle necessárias à defesa dos interesses protegidos pelo ordenamento jurídico.

 

6. O art. 131 da Constituição, ao instituir em nível constitucional a Advocacia-Geral da União - AGU, destacou como sua competência as atividades de consultoria e assessoramento jurídico ao Poder Executivo, nos termos da lei complementar que dispuser sobre sua organização e funcionamento, in verbis:

 

Art. 131. A Advocacia-Geral da União é a instituição que, diretamente ou através de órgão vinculado, representa a União, judicial e extrajudicialmente, cabendo-lhe, nos termos da lei complementar que dispuser sobre sua organização e funcionamento, as atividades de consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo.

 

7. Nesta esteira, o art. 11, inciso I e V, da Lei Complementar n.º 73/1993 - Lei Orgânica da Advocacia-Geral da União -, estabeleceu, no que concerne à atividade de consultoria ao Poder Executivo junto aos Ministérios, a competência das Consultorias Jurídicas para assistir a autoridade assessorada no controle interno da constitucionalidade e legalidade administrativa dos atos a serem por ela praticados. Nesse sentido, veja-se:

 

Art. 11 - Às Consultorias Jurídicas, órgãos administrativamente subordinados aos Ministros de Estado, ao Secretário-Geral e aos demais titulares de Secretarias da Presidência da República e ao Chefe do Estado-Maior das Forças Armadas, compete, especialmente:
I - assessorar as autoridades indicadas no caput deste artigo;
(...)
III - fixar a interpretação da Constituição, das leis, dos tratados e dos demais atos normativos a ser uniformemente seguida em suas áreas de atuação e coordenação quando não houver orientação normativa do Advogado-Geral da União;
(...)
V - assistir a autoridade assessorada no controle interno da legalidade administrativa dos atos a serem por ela praticados ou já efetivados, e daqueles oriundos de órgão ou entidade sob sua coordenação jurídica;
 

8. Ressalte-se, por oportuno, que o controle interno da legalidade realizado por este órgão jurídico não tem o condão de se imiscuir em aspectos relativos à conveniência e à oportunidade da prática dos atos administrativos, que estão reservados à esfera discricionária do administrador público legalmente competente, tampouco examinar questões de natureza eminentemente técnica, administrativa e/ou financeira, conforme se extrai do Enunciado nº 7 do Manual de Boas Práticas Consultivas da Advocacia-Geral da União, que possui o seguinte teor:

 

A manifestação consultiva que adentrar questão jurídica com potencial de significativo reflexo em aspecto técnico deve conter justificativa da necessidade de fazê-lo, evitando-se posicionamentos conclusivos sobre temas não jurídicos, tais como os técnicos, administrativos ou de conveniência ou oportunidade, podendo-se, porém, sobre estes emitir opinião ou formular recomendações, desde que enfatizando o caráter discricionário de seu acatamento.

 

9. Elaboradas essas considerações preliminares, adentra-se à análise da minuta de Portaria propriamente, enfatizando-se, primeiramente, o fundamento normativo para a competência da Ministra de Estado para expedir Portaria, a saber, o art. 87, parágrafo único, incisos I e II da Constituição Federal, a saber:

 

Art. 87. Os Ministros de Estado serão escolhidos dentre brasileiros maiores de vinte e um anos e no exercício dos direitos políticos.
Parágrafo único. Compete ao Ministro de Estado, além de outras atribuições estabelecidas nesta Constituição e na lei:
I - exercer a orientação, coordenação e supervisão dos órgãos e entidades da administração federal na área de sua competência e referendar os atos e decretos assinados pelo Presidente da República;
II - expedir instruções para a execução das leis, decretos e regulamentos;
(...)
 

10. Ato contínuo, a previsão de criação de grupos de trabalho encontra embasamento, dentre outros normativos, no art. 36 do Decreto nº 9.191, de 1º de novembro de 2017, o qual “Estabelece as normas e as diretrizes para elaboração, redação, alteração, consolidação e encaminhamento de propostas de atos normativos ao Presidente da República pelos Ministros de Estado.”

 
Criação de colegiados
Art. 36. O ato normativo que criar comissão, comitê, grupo de trabalho ou outra forma de colegiado indicará:
I - as competências do colegiado;
II - a composição do colegiado e a autoridade encarregada de presidir ou coordenar os trabalhos;
III - o quórum de reunião e de votação;
IV - a periodicidade das reuniões ordinárias e a forma de convocação das reuniões extraordinárias;        
V - o órgão encarregado de prestar apoio administrativo;       
VI - quando necessário, a forma de elaboração e aprovação do regimento interno;        
VII - quando os membros não forem natos, a forma de indicação dos membros e a autoridade responsável pelos atos de designação;     
VIII - quando o colegiado for temporário, o termo de conclusão dos trabalhos;      
IX - quando for o caso, a necessidade de relatórios periódicos e de relatório final e a autoridade a quem serão encaminhados.      
§ 1º É vedada a divulgação de discussões em curso sem a prévia anuência do titular do órgão ao qual o colegiado esteja vinculado.
§ 2º É obrigatória a participação da Advocacia-Geral da União nos colegiados criados com a finalidade de elaborar sugestões ou propostas de atos normativos de competência ou iniciativa do Presidente da República.
§ 3º A participação na elaboração de propostas de atos normativos terminará com a apresentação dos trabalhos à autoridade responsável, os quais serão recebidos como sugestões e poderão ser aceitos, no todo ou em parte, alterados ou não considerados pela autoridade ou pelos seus superiores, independentemente de notificação ou consulta aos seus autores.
§ 4º A participação dos membros dos colegiados referidos neste artigo será considerada prestação de serviço público relevante, não remunerada. [grifo nosso]

 

11. À luz do dispositivo supra, pois, veja-se o disposto na minuta de Portaria.  Quanto ao aspecto material, a instituição do Grupo de Trabalho pretende, nos termos da NOTA TÉCNICA Nº 4/2024, o seguinte in verbis:

 

A internacionalização da literatura brasileira é iniciativa fundamental para promover a diversidade cultural, ampliar a visibilidade dos autores nacionais e criar pontes entre diferentes culturas. Ela contribui para uma compreensão mais ampla e profunda da sociedade brasileira, além de fortalecer a presença do Brasil no mundo.

Nesse sentindo, configura-se em um conjunto de ações destinadas a apoiar e consolidar a presença da nossa produção literária no cenário internacional nas esferas de criação, produção e difusão, com vistas a promover o desenvolvimento do País, ao avançar em questões como mercado, valor simbólico e sustentabilidade da área.

Assim, é preciso instituir plano de ação capaz de garantir a internacionalização da literatura produzida no Brasil por meio de estratégias diversas. Por um lado, buscar ampliar o alcance no mercado literário global, ao definir, por exemplo, feiras internacionais de livro para participação prioritária do Brasil e, por outro, promover o conhecimento da literatura brasileira e de seus escritores, ao incentivar a participação destes em festivais literários no exterior.

Em um contexto de eventos que visibilizam um sistema literário nacional como "país-tema" ou "país convidado", é pertinente conhecer em que medida espaços como as feiras internacionais estão sendo aproveitados por países como o Brasil para consolidar uma certa autonomia dos seus campos literário e cultural, e como eventos dessa natureza se configuram como modos de diplomacia cultural num momento de internacionalização dos mercados literário e cultural em nível mundial.

É oportuno destacar os aspectos culturais, econômicos e estratégicos que justificam a adoção de um plano de internacionalização da literatura brasileira, quais sejam:

ampliação da diversidade cultural: o compartilhamento de narrativas, perspectivas e tradições contribui para o diálogo cultural global;

aumento da visibilidade: a participação em eventos internacionais amplia a visibilidade de autores brasileiros e suas obras, promovendo o reconhecimento e a inserção internacional, bem como as oportunidades para novos talentos;

geração de receitas: a negociação de direitos autorais impulsiona a indústria editorial brasileira, fortalecendo a economia criativa;

estabelecimento de parcerias: a exploração de oportunidades de colaboração por meio de encontros com profissionais de editoras locais, instituições culturais e meios de comunicação para alcançar novos públicos;

reforço das relações internacionais: a literatura é uma ferramenta eficaz para para construir "pontes culturais" – por meio dos livros, é possível estabelecer conexões duradouras e promover uma imagem positiva do Brasil no cenário global;

impacto educacional: a internacionalização da literatura contribui para a promoção da língua portuguesa e da cultura brasileira no ambiente educacional internacional, gerando interesse e conexão com a sociedade brasileira.

Diante do exposto, a Secretaria de Formação, Livro e Leitura (SEFLI), por meio da Diretoria de Livro, Leitura, Literatura e Bibliotecas (DLLLB), entende ser prioritário e estratégico constituir delegação para participar da 36ª edição da Feira Internacional do Livro de Bogotá (FILBo), Colômbia, a realizar-se entre 17 de abril e 2 de maio de 2024, conforme documentos SEI 15963721594466 e 1594294, considerando a condição de convidado de honra do Brasil. Dessa forma, a SEFLI/DLLLB propõe a criação de grupo de trabalho para realizar a curadoria de 30 (trinta) escritores brasileiros que comporão a delegação brasileira no evento. ​

É relevante destacar o histórico das participações do Brasil na FILBo. Esta será a terceira vez que o país será convidado de honra da feira colombiana, referência na América Latina, com expectativa de público para 2024 superior a 500 mil pessoas. A primeira vez foi em 1995 e a segunda em 2012. Além disso, as relações bilaterais Brasil-Colômbia na área do livro e leitura vão ao encontro do fortalecimento dos laços com a América Latina e Caribe, que o Governo Lula pretende retomar em seu terceiro mandato.

Por oportuno, informa-se que no fim de 2023 o Brasil foi nomeado país presidente do Conselho Geral do Centro Regional de Fomento do Livro na América Latina e Caribe (Cerlalc-UNESCO), organismo internacional e intergovernanental ibero-americano com 21 países membros, sendo o Brasil desde 1973, para um mandato de dois anos sob o comando da ministra da Cultura, Margareth Menezes. Sediado na cidade de Bogotá, o Cerlalc atua no sentido de criar condições para o desenvolvimento de sociedades leitoras. Para isso, orienta suas ações para a alavancagem da produção e circulação do livro, a promoção da leitura e escritura, e o estímulo e proteção da criação intelectual.

Assim sendo, a criação de grupo de trabalho para garantir uma participação proveitosa na 36ª edição da FILBo corrobora o intuito do governo brasileiro, por meio do Ministério da Cultura, em promover a literatura brasileira, atuando na potencialização da arte literária e da democratização do acesso ao livro, à leitura e à literatura.

 

12. No que concerne ao aspecto formal, a minuta deve resguardar consonância com as normas que regulam a elaboração de atos normativos, notadamente o já referido Decreto nº 9.191, de 2017 - assim que algumas sugestões serão a seguir elaboradas, quando da análise de cada articulado da proposta, senão, veja-se. 

 

13. A epígrafe deve seguir a numeração do ano passado, em conformidade com o art. 3º do Decreto nº 10.139, de 2019:

Art. 3º  As portarias, as resoluções e as instruções normativas terão numeração sequencial em continuidade às séries em curso quando da entrada em vigor deste Decreto.  

 

14. A ementa e o preâmbulo estão em conformidade com as normas de regência, consubstanciando-se a Ministra de Estado na autoridade competente para emissão do ato.

 

15. O art. 1º apresenta, adequadamente, o objeto do ato.

 

16. Os arts. 2º e 4º trazem a composição e a organização do GT. Apenas no art. 2º, sugere-se que o conectivo "e" seja aposto no penúltimo inciso (o de número "III", ao invés do "II").

 

17. O art. 3º apresenta competência do GT.

 

18. O art. 5º prevê apresentação de relatório final e o prazo de vigência do GT.

 

19. O art. 6º antevê que a participação no Grupo de Trabalho será considerada prestação de serviço público relevante, não remunerada - em consonância, pois, com o §4º art. 36 do Decreto nº 9.191, de 2017; por seu turno, o art. 7º antevê o prazo de duração do GT.

 

20. O 8º traz a vigência do ato: uma vez que não se trata de um ato normativo propriamente (mas de efeito concreto), entende-se despicienda a previsão de vacatio legis, restando válida, pois, a previsão de que entrará em vigor na data da publicação, além de a NT antever a justificativa para entrada em vigor de forma imediata (data da publicação). 

 

 

III - CONCLUSÃO

 

21. Em razão do exposto, sem adentrar nos valores de conveniência e oportunidade na criação de mecanismos institucionais, não sujeitos ao crivo desta CONJUR, é de se concluir pela viabilidade jurídica da minuta de Portaria que "Institui Grupo de Trabalho para realizar a curadoria para escolha dos escritores brasileiros que irão participar da Feira Internacional do Livro de Bogotá 2024",  observadas as sugestões formais acima elaboradas, após o que o ato se encontrará apto a ser submetido ao apreço pela Exma. Ministra de Estado da Cultura. 

 

22. Devolvam-se os autos à SECRETARIA DE FORMAÇÃO, LIVRO E LEITURA - SEFLI.

 

Brasília, 16 de fevereiro de 2024.

 

 

(assinado eletronicamente)

SOCORRO JANAINA M. LEONARDO

Advogada da União

Consultora Jurídica

 

 


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