ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA NO MINISTÉRIO DA CULTURA

 

 

PARECER nº 39/2024/CONJUR-MINC/CGU/AGU

PROCESSO nº 01400.016153/2012-71

INTERESSADA: Secretaria-Executiva

ASSUNTO: Pronac. Fomento indireto. Prestação de contas. Revisão.

 

EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO. PROCESSO ADMINISTRATIVO.
I - Programa Nacional de Apoio à Cultura - Pronac. Fomento indireto. Incentivos fiscais. Omissão na prestação de contas de projeto cultural. Reprovação. Ausência de recurso administrativo. Inscrição no Cadin e instauração de tomada de contas especial para ressarcimento integral dos valores captados.
II - Pedido de revisão. Apresentação posterior de comprovação da execução do objeto proporcional aos recursos efetivamente captados para o projeto.
III - A comprovação de fatos novos e circunstâncias relevantes capazes de influenciar nos fundamentos do ato administrativo possibilitam a revisão da decisão de reprovação, revertendo total ou parcialmente a obrigação de ressarcimento ao erário, conforme se demonstre a regular execução financeira do projeto.
IV - Inaplicabilidade da regra de corte do art. 59, § 3º, da Instrução Normativa nº 1/2023/MinC (atual art. 59, § 3º, da IN nº 11/2024). Necessidade de parecer financeiro para desconstituição de julgamento de prestação de contas proferido com base em norma anterior ao atual regulamento.

 

 

Sra. Consultora Jurídica,

 

Os autos em epígrafe referem-se ao projeto Pronac 12-5747, intitulado Arte da História, já encerrado, com prestação de contas reprovada nos termos do Laudo Final nº 65/2017/CGARE/DEIPC/SEFIC/MinC (SEI/MinC 0433012, fls. 50) e da Portaria nº 272/2017/SEFIC/MinC, por omissão no dever de prestar contas.

A presente consulta foi encaminhada a esta Consultoria Jurídica por meio do Ofício nº 269/2024/GSE/SE/MinC (doc. SEI/MinC 1586792), solicitando subsídios para a decisão do Secretário-Executivo acerca das questões suscitadas pela Subsecretaria de Gestão de Prestação e Tomada de Contas (SGPTC) na Nota Técnica nº 1/2024 (doc. SEI/MinC 1582689), particularmente no que tange à admissibilidade do pedido de revisão.

No referida nota técnica, a SGPTC aponta que o proponente apresenta documentação hábil a demonstrar o cumprimento parcial do objeto do projeto, tendo sido realizadas 20 dos 30 painéis previstos, em locais públicos com acessibilidade e democratização de acesso asseguradas. Ao final, aponta que, tendo em vista a captação parcial dos recursos previstos, equivalente a 30,74% do total autorizado, é possível concluir que houve cumprimento total do objeto, recomendando-se a revisão da reprovação, convertendo-a em aprovação.

É o relatório. Passo a opinar.

A revisão de sanções aplicadas em processos administrativos tem respaldo no art. 65 da Lei nº 9.784/1999, sendo sempre possível, a qualquer tempo, ainda que esgotadas as instâncias administrativas recursais ordinárias, desde que surjam fatos novos ou circunstâncias relevantes suscetíveis de justificar a inadequação da sanção aplicada.

Tal regra decorre do poder de autotutela da administração pública, previsto no art. 53 da mesma lei, segundo o qual a administração deve anular seus atos, quando constatado vício de legalidade, e pode revogá-los por razões de conveniência e oportunidade. A constatação de fatos novos, sejam vícios de validade no ato de reprovação de contas do projeto, sejam circunstâncias relevantes não levadas em consideração à época do julgamento que demonstrem a inadequação da sanção aplicada, podem render ensejo à anulação ou revogação do ato, e portanto podem ser suscitadas a qualquer momento, ainda que encerradas a instâncias recursais administrativas, quer a pedido da parte interessada, quer de ofício pela própria administração. O princípio da autotutela encontra raiz constitucional nos princípios regentes da administração pública (art. 37) e no próprio princípio da inafastabilidade da jurisdição (art. 5º, XXXV), que subordina a coisa julgada administrativa à tutela jurisdicional e, por conseguinte, admite sua precariedade diante de vícios de legalidade e constitucionalidade.

Ademais, acrescente-se ainda que não há decisão judicial decisão favorável à União que obste eventual mudança de posição em sede administrativa.

Assentada a possibilidade jurídica de revisão do ato de reprovação, a pedido ou de ofício, resta avaliar se, em concreto, há fatos novos ou circunstâncias relevantes que imponham a revisão do ato administrativo de reprovação das contas do projeto em exame.

A Portaria nº 272/2017/SEFIC/MinC, com respaldo no Laudo Final nº 65/2017/CGARE/DEIPC/SEFIC/MinC (SEI/MinC 0433012, fls. 50), reprovou o projeto Pronac 12-5747 em razão da completa omissão do proponente em prestar contas da execução do projeto no prazo legal assinalado, mesmo depois de notificado (SEI/MinC 0433012, fls. 47 e 48), tendo permanecido inerte mesmo depois de diversas tentativas de notificação para ressarcimento após a publicação da reprovação.

A reprovação, portanto, foi corretamente aplicada, não sendo o caso de anulação da penalidade de inabilitação aplicada à época, até mesmo por encontrar-se já exaurida e preclusa, tendo em vista que seu prazo de duração (3 anos) já se encontra expirado.

Entretanto, considerando que a execução física e financeira do projeto não foi objeto de julgamento de mérito devido à omissão na apresentação de documentos, é possível que o proponente tenha realizado o objeto, ainda que parcialmente, sem que tal fato viesse a ser considerado à época do julgamento. É o que parece ter ocorrido no caso em exame, em que o proponente, embora tardiamente, apresentou documentos comprobatórios de boa parte dos produtos pactuados no projeto, a saber, 20 de 30 painéis desenhados e pintados em muros localizados em logradouros públicos no município de São Mateus do Sul - PR, conforme atestado pela área técnica.

Havendo provas de que o recurso público captado foi utilizado na execução física do projeto, não é possível manter o entendimento que resultou em reprovação integral do projeto. Há, portanto, fatos novos capazes de reverter as premissas factuais que levaram à decisão de reprovação.

Contudo, é importante considerar que esta revisão pode reverter total ou parcialmente a obrigação de ressarcimento ao erário, conforme se demonstre a regular execução física e financeira do projeto.

Pelo que se depreende do pedido de revisão, o proponente não apresentou documentos detalhados da execução financeira do projeto, documentos estes exigidos segundo as normas aplicáveis no prazo de vigência do projeto, bem como à época em que deveria ter apresentado a respectiva prestação de contas.

Apenas com o advento da Instrução Normativa MinC nº 1/2023, respaldada nas disposições do Decreto nº 11.453/2023, é que passou a ser possível dispensar, em regra, a prestação de contas financeira de projetos com valor inferior a R$ 750.000,00, admitindo-se apenas a prestação de contas de objeto, regra esta mantida na atual Instrução Normativa MinC nº 11/2024.

Embora esta Consultoria Jurídica já tenha consolidado o entendimento de que as regras de análise de prestações de contas sejam aplicáveis aos projetos em execução, bem como àqueles pendentes de julgamento, não é este o caso dos autos, em que estamos a tratar de um projeto já encerrado, com prazo de prestação de contas já expirado há anos, e com reprovação das contas já decretada de acordo com os normativos vigentes à época.

Portanto, embora a revisão dos fatos que culminaram com a reprovação das contas do projeto seja possível a qualquer momento, não é possível que, neste processo revisional, seja o proponente dispensado de apresentar documentos minimamente capazes de desconstituir o ato de reprovação segundo as regras a que estava sujeito quando beneficiou-se do programa de governo. Logo, não se aplica ao caso a regra de corte do art. 59, § 3º, da Instrução Normativa MinC nº 1/2023 (atual art. 59, § 3º, da IN MinC nº 11/2024), sendo necessária a elaboração de parecer financeiro que aborde a regularidade das demonstrações financeiras da execução do projeto, as quais, salvo melhor juízo, me parecem insuficientes para uma aprovação total das contas do projeto.

Do cotejo dos dados do projeto no Salic com os documentos ora carreados pelo proponente, verifica-se que o objeto foi executado satisfatoriamente, uma vez que com uma captação de pouco menos de um terço dos recursos autorizados foi possível realizar dois terços dos produtos previstos. Esta simples informação permite inferir que a despesa com o artista foi executada, ainda que não tenha sido apresentado recibo, nota fiscal ou comprovante de transferência bancária desta despesa. No entanto, a análise de custo do projeto aprovado no Salic contém uma rubrica de R$ 9.000,00 para pagamento do artista, de um total de R$ 24.000,00 captados e utilizados pelo proponente. É necessário, assim, que os documentos fiscais e outros equivalentes apresentados pelo proponente deem conta de comprovar o restante das despesas de acordo com os parâmetros do projeto, respeitados os limites de cada rubrica orçamentária, o que não é possível com os poucos recibos apresentados, que agregam pouco além do valor destinado ao artista.

O exame detalhado da prestação de contas financeira no presente caso, além de servir de motivação para a revisão das contas do projeto, também encontra guarida no § 4º do art. 59 da Instrução Normativa MinC nº 11/2024, segundo o qual, independentemente do valor captado, "a análise financeira detalhada será realizada nos casos em que seja observado indício de aplicação irregular ou uso indevido dos recursos públicos", o que é razoável admitir na hipótese em que um proponente fica mais de 10 anos sem prestar contas para somente então requerer a revisão de sua reprovação.

Por fim, observo que, caso não sejam suficientemente demonstradas as despesas no valor total da captação (R$ 24.000,00) de acordo com os valores aprovados na planilha de custos do projeto, ainda assim é possível a revisão do ato, porém apenas para reduzir o valor do ressarcimento ao erário.

Diante de todo o exposto, opina-se pela possibilidade de acatamento do pedido de revisão da decisão de reprovação da prestação de contas do projeto Pronac 12-5747, sendo porém necessário um exame detalhado de sua prestação de contas financeira, a fim de que se demonstre a regular utilização de todos os recursos captados de acordo com os parâmetros estabelecidos no orçamento do projeto, o que, se não devidamente demonstrado, resultará em reversão parcial da reprovação e refazimento dos cálculos do montante a ser ressarcido.

 

À consideração superior.

 

Brasília, 23 de fevereiro de 2024.

 

OSIRIS VARGAS PELLANDA

Advogado da União

Coordenador-Geral Jurídico de Políticas Culturais

 


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