ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA DA UNIÃO ESPECIALIZADA VIRTUAL DE PATRIMÔNIO
NÚCLEO JURÍDICO SUMÁRIO
PARECER n. 00196/2024/NUCJUR-SUM/E-CJU/PATRIMÔNIO/CGU/AGU
NUP: 04947.001080/2013-14
INTERESSADOS: UNIÃO - SUPERINTENDÊNCIA REGIONAL DO PATRIMÔNIO DA UNIÃO EM ESPÍRITO SANTO - SPU/ES
ASSUNTOS: PRORROGAÇÃO E OUTROS
EMENTA: Notificação pessoal dos interessados no processo demarcatório. Alteração no rito do processo administrativo. Reabertura da fase de notificações. Devido Processo Legal Substancial. Art. 26 da Lei 9.784/99.
Trata-se de consulta encaminhada pela SPU/ES, formulada na Nota Técnica SEI nº 8269/2024/MGI (40517047):
SUMÁRIO EXECUTIVO
1. Trata a presente Nota Técnica de mero encaminhamento de recomendação do Despacho SPU DECIP CGIPA 39723707 para consulta a CJU sobre o procedimento de retomada do procedimento de notificação após longa pausa do processo demarcatório Trecho Aracruz a Regência (Linhares), para finalmente conclusão dos autos, com pedidos de sanções, incluindo do multa, provocados nos termos da ACP 0000213-17.2012.4.02.5004.
ANÁLISE
2. A Nota Técnica SEI nº 38389/2023/MGI contextualiza a situação do presente processo:
3. O processo foi aberto em 2013, e portanto deve ser analisado sobre as leis e instruções normativas que vigoravam no tempo de sua execução, em especial o Decreto-Lei nº 9.760, de 5 de setembro de 1946, a Lei nº 9.636, de 15 de maio de 1998 e a ON-GEADE-002.
3. A Nota Técnica SEI nº 38389/2023/MGI analisa o atendimento da ON-GEAD-002, visando assegura a correta execução do procedimento demarcatório, isto é, a determinação do posicionamento da LPM e LLTM:
4.17.9 Promovida a revisão pela GEADE e considerado em ordem, o processo retornará à Gerência Regional de origem, para cumprimento do disposto no art. 13 do Decreto Lei n.º 9.760, de 1946.
5. O processo foi analisado pelo órgão central em Brasília, conforme Nota Técnica nº 521/2014/CGIPA/DECAP/SPU/MP (1040-1043)), e a Diretora do Departamento de Caracterização do Patrimônio, sr.a Eliane Hirai, em 29 de agosto de 2014, aprovou o procedimento executado para o posicionamento da LPM, entretanto pediu que fosse alterado o memorial descritivo para que contivesse as informações apresentadas no memorando COCAP/SPU/ESnº 263/2014 (1037-1039).
4.17.10 O Gerente Regional aprovará, em despacho, conforme modelo (ANEXO VI), a Demarcação da LPM e LTM.
6. Pelo Despacho fl. 1171-1172, as pendências foram devidamentes sanadas e o processo foi encaminhado ao sr. superintendente para aprovação em 09 de setembro de 2014. No mesmo dia, o sr. superintendente, Magno Pires da Silva, aprovou o posicionamento da LPM/1831 do trecho Aracruz, então denominado trecho maior compreendido entre a margem esquerda do rio Preto, limites dos municípios de Fundão e Aracruz, passando pelo municipio de Aracruz, se estendendo até a margem direita do rio Preto, afluente do Rio Doce, na localidade de Regência, município de Linhares.da notificação dos alcançados e da alteração legislativa.
4. A Nota Técnica segue:
Posicionada a linha, a etapa seguinte trata da notificação dos alcançados. No processo há o registro de mais de uma centena de notificações entregue pessoalmente ou via AR, que iniciaram pouco depois depois da aprovação, ainda no ano de 2014. Na fl. 1185 consta o o edital nº 03/2014, publicado em 10 de novembro de 2014 no Diário Oficial do Estado, para os alcançados pela LPM. Na fl. 1186 consta a publicação do mesmo edital, também publicado em 10 de novembro de 2014, mas no Jornal A Tribuna, o de maior circulação no ES. Entretanto, não houve uma conclusão da etapa de notificação, inclusive houve a apresentação de impugnações que não foram julgadas.
Acima da ON-GEADE-002, houve alteração do Decreto-Lei nº 9.760, de 1946, que alterou/especificou ainda mais como deve ser o trâmite de notificação dos alcançados.
Decreto-Lei nº 9.760, de 1946 - Art. 12-A. A Secretaria do Patrimônio da União do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão fará notificação pessoal dos interessados certos alcançados pelo traçado da linha demarcatória para, no prazo de 60 (sessenta) dias, oferecerem quaisquer impugnações. (Incluído pela Lei nº 13.139, de 2015)
§ 1º Na área urbana, considera-se interessado certo o responsável pelo imóvel alcançado pelo traçado da linha demarcatória até a linha limite de terreno marginal ou de terreno de marinha que esteja cadastrado na Secretaria do Patrimônio da União ou inscrito no cadastro do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) ou outro cadastro que vier a substituí-lo. (Incluído pela Lei nº 13.139, de 2015)
§ 2º Na área rural, considera-se interessado certo o responsável pelo imóvel alcançado pelo traçado da linha demarcatória até a linha limite de terreno marginal que esteja cadastrado na Secretaria do Patrimônio da União e, subsidiariamente, esteja inscrito no Cadastro Nacional de Imóveis Rurais (CNIR) ou outro que vier a substituí-lo. (Incluído pela Lei nº 13.139, de 2015)
§ 3º O Município e o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), no prazo de 30 (trinta) dias contado da solicitação da Secretaria do Patrimônio da União, deverão fornecer a relação dos inscritos nos cadastros previstos nos §§ 1o e 2o. (Incluído pela Lei nº 13.139, de 2015)
§ 4º A relação dos imóveis constantes dos cadastros referidos nos §§ 1o e 2o deverá ser fornecida pelo Município e pelo Incra no prazo de 30 (trinta) dias contado da solicitação da Secretaria do Patrimônio da União.
§ 5º A atribuição da qualidade de interessado certo independe da existência de título registrado no Cartório de Registro de Imóveis. (Incluído pela Lei nº 13.139, de 2015).
Considerando o lapso temporal de 2014 a 2023 e a não conclusão das notificações pessoais sob a redação anterior do Decreto Lei 9.760/46, proponho, considerando as leis e instruções normativas em vigor, que seja reiniciada a presente etapa de notificação pessoal, desde a consulta ao município e ao INCRA, para que nos forneça nova relação, atualizada, de todos os alcançados. Proponho ainda que após identificados todos os alcançados, que seja dispensada de nova notificação aqueles que já a foram notificados em 2014, considerando não haver tido alteração na linha e terem sido notificados via notificação pessoal.
(destaquei)
5. Por fim, a NT conclui e recomenda:
O processo demarcatório denominado LPM Aracruz teve o traçado aprovado em 09 de setembro de 2014, antes das alterações do Decreto-Lei nº 9.760, de 1946 de 2015. O processo de notificação pessoal dos alcançados foi realizado ainda com base no art. 13 original do mesmo decreto contudo, não teve sua etapa concluída e por terem se passado nove anos das notificações sem análise dos recursos nem conclusão da entrega das notificações, propõe-se realizar nova consulta ao município e ao INCRA para que forneçam a relação dos atuais ocupantes alcançados. Então identificar os já notificados e os que ainda não foram, a fim de concluir essa etapa processual com base no Art. 12-A do Decreto Lei 9.760/46. Aqueles já foram notificados devem ser dispensados de novas notificações. Os demais, bem como os editais de citação deverão ser novamente publicados.
(...)
Recomendamos a validação do encaminhamento aqui indicado pela SPU-CGIPA, antes do prosseguimento do processo, considerando o grande número de notificações a serem emitidas.
6. A SPU-CGIPA se manifestou com a seguinte recomendação, por meio do Despacho SPU-DECIP-CGIPA 39723707, a consulta a CJU:
Em resposta à Nota Técnica 38389 (37777151), esta CGIPA não vê óbice na solução apresentada pelo item 12: que o INCRA e os municípios sejam oficiados para apresentarem as informações para identificação dos interessados, nos termos do Art. 12-A do Decreto-Lei nº 9760/1946. Ressaltamos que os cadastros da SPU também devem ser objeto de análise para fins dessa identificação.
Todavia, merece análise jurídica os impactos relacionados à decisão sobre retomar a notificação apenas para os interessados não abarcados pela ação anterior, assim como o impacto da não notificação daqueles que já o foram. Quanto a isso, recomendamos que o presente caso concreto seja analisado pela CJU/ES, tendo em vista que a fase de
CONCLUSÃO
7. Visando acatar a recomendação da SPU-CGIPA, sugiro encaminhar a CJU/ES o presente processo para que se manifeste sobre "os impactos relacionados à decisão sobre retomar a notificação apenas para os interessados não abarcados pela ação anterior, assim como o impacto da não notificação daqueles que já o foram".
8. E ainda, que ela responda de maneira clara e objetiva, naquilo que lhe for competente:
a) Os imóveis cujos responsáveis já foram notificados, precisam ser novamente notificados? Ou a SPU pode apenas notificar os imóveis remanescentes e aqueles que alteraram o responsável conforme cadastro municipal/rural?
b) Havendo necessidade de nova notificação aos já notificados, devemos analisar aqueles recursos apresentados? Ou eles podem ser desconsiderados?
Encaminhado à CJU/ES que, em razão da matéria, direcionou o processo à e-CJU/Patrimônio, onde foi distribuído segundo as regras ordinárias.
É o relatório necessário.
Trata-se da intimação então prevista no art. 13 do DECRETO-LEI Nº 9.760, DE 5 DE SETEMBRO DE 1946 antes das alterações promovidas pela LEI Nº 13.139, DE 26 DE JUNHO DE 2015. O texto vigente era o seguinte:
Art. 13. De posse dêsses e outros documentos, que se esforçará por obter, e após a realização dos trabalhos topográficos que se fizerem necessários, o Chefe do órgão local do S. P. U. determinará a posição da linha em despacho de que, por edital com o prazo de 10 (dez) dias, dará ciência aos interessados para oferecimento de quaisquer impugnações. (Vide Lei nº 13.139, de 2015) Vigência
Parágrafo único. Tomando conhecimento das impugnações porventura apresentadas, a autoridade a que se refere êste artigo reexaminará o assunto, e, se confirmar a sua decisão, recorrerá ex-offício para o Diretor do S. P. U., sem prejuízo do recurso da parte interessada.
Após alterações promovidas pela Lei 13.136/15, a notificação dos interessados CERTOS passou a ser prevista no art. 12-A:
Art. 12-A. A Secretaria do Patrimônio da União do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão fará notificação pessoal dos interessados certos alcançados pelo traçado da linha demarcatória para, no prazo de 60 (sessenta) dias, oferecerem quaisquer impugnações. (Incluído pela Lei nº 13.139, de 2015)
§ 1o Na área urbana, considera-se interessado certo o responsável pelo imóvel alcançado pelo traçado da linha demarcatória até a linha limite de terreno marginal ou de terreno de marinha que esteja cadastrado na Secretaria do Patrimônio da União ou inscrito no cadastro do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) ou outro cadastro que vier a substituí-lo. (Incluído pela Lei nº 13.139, de 2015)
§ 2o Na área rural, considera-se interessado certo o responsável pelo imóvel alcançado pelo traçado da linha demarcatória até a linha limite de terreno marginal que esteja cadastrado na Secretaria do Patrimônio da União e, subsidiariamente, esteja inscrito no Cadastro Nacional de Imóveis Rurais (CNIR) ou outro que vier a substituí-lo. (Incluído pela Lei nº 13.139, de 2015)
§ 3o O Município e o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), no prazo de 30 (trinta) dias contado da solicitação da Secretaria do Patrimônio da União, deverão fornecer a relação dos inscritos nos cadastros previstos nos §§ 1o e 2o. (Incluído pela Lei nº 13.139, de 2015)
§ 4o A relação dos imóveis constantes dos cadastros referidos nos §§ 1o e 2o deverá ser fornecida pelo Município e pelo Incra no prazo de 30 (trinta) dias contado da solicitação da Secretaria do Patrimônio da União.
§ 5o A atribuição da qualidade de interessado certo independe da existência de título registrado no Cartório de Registro de Imóveis. (Incluído pela Lei nº 13.139, de 2015)
Mesmo antes da alteração legal o STF, na Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.264/PE, já havia afastado a aplicação da redação original do art. 11 do Decreto-Lei 9.760/1946, na redação dada pela Lei 11.481/2007, ao fundamento de que ‘
Ofende as garantias do contraditório e da ampla defesa o convite aos interessados, por meio de edital, para subsidiar a Administração na demarcação da posição das linhas do preamar médio do ano de 1831, uma vez que o cumprimento do devido processo legal pressupõe a intimação pessoal.’.
Ou seja: tanto antes quanto agora intima-se o interessado pessoalmente para, querendo, impugnar a linha demarcatória.
Em regra, a alteração da lei processual não retroage para atingir os atos jurídicos já praticados.
É o que dispõe o DECRETO-LEI Nº 4.657, DE 4 DE SETEMBRO DE 1942, a Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro:
Art. 6º A Lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada. (Redação dada pela Lei nº 3.238, de 1957)
§ 1º Reputa-se ato jurídico perfeito o já consumado segundo a lei vigente ao tempo em que se efetuou. (Incluído pela Lei nº 3.238, de 1957)
§ 2º Consideram-se adquiridos assim os direitos que o seu titular, ou alguém por êle, possa exercer, como aquêles cujo comêço do exercício tenha têrmo pré-fixo, ou condição pré-estabelecida inalterável, a arbítrio de outrem. (Incluído pela Lei nº 3.238, de 1957)
§ 3º Chama-se coisa julgada ou caso julgado a decisão judicial de que já não caiba recurso. (Incluído pela Lei nº 3.238, de 1957)
No mesmo sentido, a LEI Nº 13.105, DE 16 DE MARÇO DE 2015 - o Código de Processo Civil - de aplicação subsidiária ao processo administrativo:
Art. 14. A norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada.
É o conhecido princípio "tempus regit actum". Explica o STJ:
"1. A nova lei processual se aplica imediatamente aos processos em curso (ex vi do art. 1.046 do CPC/2015), respeitados o direito adquirido, o ato jurídico perfeito, a coisa julgada, enfim, os efeitos já produzidos ou a se produzir sob a égide da nova lei.
2. Considerando que o processo é constituído por inúmeros atos, o Direito Processual Civil orienta-se pela Teoria dos Atos Processuais Isolados, segundo a qual cada ato deve ser considerado separadamente dos demais para o fim de determinar qual a lei que o regerá (princípio do tempus regit actum). Esse sistema está inclusive expressamente previsto no art. 14 do CPC/2015.
3. Com base nesse princípio e em homenagem à segurança jurídica, o Pleno do Superior Tribunal de Justiça interpretou o art. 1.045 do Código de Processo Civil de 2015 e concluiu que o novo CPC entrou em vigor no dia 18/03/2016, além de elaborar uma série de enunciados administrativos sobre regras de direito intertemporal (vide Enunciados Administrativos n. 2 e 3 do STJ).
4. Esta Corte de Justiça estabeleceu que a lei que rege o recurso é aquela vigente ao tempo da publicação do decisum. Assim, se a decisão recorrida for publicada sob a égide do CPC/1973, este Código continuará a definir o recurso cabível para sua impugnação, bem como a regular os requisitos de sua admissibilidade. A contrario sensu, se a intimação se deu na vigência da lei nova, será ela que vai regular integralmente a prática do novo ato do processo, o que inclui o cabimento, a forma e o modo de contagem do prazo."
(AgInt no AREsp 785269/SP)
Tais regras são perfeitamente aplicáveis ao Direito Administrativo. Portanto, se a notificação foi consumada "segundo a lei vigente ao tempo em que se efetuou", é válida.
Naturalmente, a notificação válida não afasta os demais direitos dos interessados no curso do processo, em especial o disposto nos arts. 27 e 28 da LEI Nº 9.784 , DE 29 DE JANEIRO DE 1999, que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal.
Art. 27. O desatendimento da intimação não importa o reconhecimento da verdade dos fatos, nem a renúncia a direito pelo administrado.
Parágrafo único. No prosseguimento do processo, será garantido direito de ampla defesa ao interessado.
Art. 28. Devem ser objeto de intimação os atos do processo que resultem para o interessado em imposição de deveres, ônus, sanções ou restrição ao exercício de direitos e atividades e os atos de outra natureza, de seu interesse.
Ou seja, a qualquer tempo (antes da decisão final) qualquer interessado poderá apresentar sua defesa/impugnação ou alegações, que deverão ser regularmente apreciadas pela Administração. Note-se também que o direito de defesa independe de atendimento à notificação.
No caso concreto a SPU está reiniciando uma fase do procedimento demarcatório (fase das notificações aos interessados), paralisado em 2014.
Assim, embora as notificações anteriores permaneçam válidas, não é possível deixar de perceber que o grande lapso temporal tende a gerar uma grande insegurança jurídica.
Um exemplo fictício facilita a exposição:
"Sr. Fulano" estava inscrito no cadastro da Prefeitura em 2014 como titular do imóvel na "rua X, nº 5" e foi pessoalmente notificado. Mas hoje, em 2018, o imóvel foi vendido para o "Sr. Beltrano", que também vendeu o imóvel para a "Cicrano Construções", atual "proprietária" do imóvel.
No exemplo acima, a notificação do "sr. Fulano" foi válida. Mas mesmo assim a SPU precisa intimar "Cicrano Construções", atual interessada.
Não porque a notificação anterior seja inválida, mas porque a fase de notificações foi reaberta. E hoje o interessado é "Cicrano Construções". Além de sucessor, é interessado.
Por outro lado, se o "Sr. Fulano" continuasse sendo o interessado, não haveria necessidade de renovar a notificação para impugnação. Mas parece-nos que neste caso é necessário intimá-lo para ter ciência da continuidade do processo.
Pode parecer excesso de zelo ou de formalismo, mas a paralisação de um processo por quase 10 anos (ainda que por motivos incontornáveis) é uma anormalidade. Inúmeras situações podem ter ocorrido nesse período que afetem a defesa do legitimado.
E o cidadão tem direito de ser intimado de qualquer anormalidade em processo que possa afetar seus direitos.
Em suma, o direito de defesa não deve ser visto como mera formalidade: o cidadão, se quiser, tem o direito de participar do processo e, nos limites da lei, influir na decisão a ser tomada, além de não não ser surpreendido com movimentos inesperados/anômalos.
Existem duas dimensões em que o devido processo legal se manifesta. Uma dimensão formal, na medida em que o processo deve seguir os ditames da lei, e uma dimensão material, substancial, na medida em que o processo deve ser justo e efetivo, sendo que apenas a observância da legislação não é suficiente.
Observar que o art. 28 da Lei 9.784/99, acima transcrito, fala em intimação de atos do interesse do legitimado. E o prosseguimento do processo após uma década é do interesse do ocupante.
A partir das premissas acima, responde-se objetivamente às questões:
7. Visando acatar a recomendação da SPU-CGIPA, sugiro encaminhar a CJU/ES o presente processo para que se manifeste sobre "os impactos relacionados à decisão sobre retomar a notificação apenas para os interessados não abarcados pela ação anterior, assim como o impacto da não notificação daqueles que já o foram".
As notificações consumadas segundo a lei vigente ao tempo em que se efetuaram são válidas. Desnecessário repetir o ato para a mesma finalidade, no mesmo processo, para a mesma pessoa. Os interessados atuais necessariamente devem ser notificados, na forma da lei vigente, não importando se são sucessores de pessoa regularmente intimada. Os que já foram notificados validamente para impugnar o traçado devem ser notificados do prosseguimento do processo após anos de paralisação. A falta de notificação válida pode implicar em nulidade, se demonstrado o prejuízo.
8. E ainda, que ela responda de maneira clara e objetiva, naquilo que lhe for competente:
a) Os imóveis cujos responsáveis já foram notificados, precisam ser novamente notificados?
Se a fase de notificações foi reaberta, os interessados atuais devem ser notificados. Os interessados já notificados regularmente e que ainda permanecem nesta condição não precisam ser novamente notificados para a mesma finalidade, mas devem ser intimados da continuidade do processo.
Ou a SPU pode apenas notificar os imóveis remanescentes e aqueles que alteraram o responsável conforme cadastro municipal/rural?
A SPU deve notificar todos os atuais interessados. Os que já foram notificados validamente e permanecem na condição de interessado não precisam ser novamente notificados para mesma finalidade. Devem ser intimados para ciência da continuidade do processo.
b) Havendo necessidade de nova notificação aos já notificados, devemos analisar aqueles recursos apresentados? Ou eles podem ser desconsiderados?
Os recursos devem ser devidamente analisados, sob pena de nulidade. Como visto acima (art. 27 da Lei 9.784/99), o direito de defesa independe do atendimento de notificação. Basta ser legitimado (art. 9º da Lei 9.784/99) para ter assegurado o direito de defesa e ao contraditório. Os já notificados devem ser notificados de que o processo terá continuidade.
É o Parecer, opinativo, cabendo a decisão ao Gestor, na forma do art. 50, VII, da Lei 9.784/99.
Dispensada a aprovação na forma do Regimento Interno.
Vitória, ES, 08 de março de 2024.
LUÍS EDUARDO NOGUEIRA MOREIRA
ADVOGADO DA UNIÃO
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