ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA JUNTO AO MINISTÉRIO DA CULTURA
GABINETE

 

PARECER n. 00051/2024/CONJUR-MINC/CGU/AGU

 

NUP: 01400.007478/2018-58

INTERESSADOS: COORDENAÇÃO DE ASSUNTOS PARLAMENTARES CPS MINC

ASSUNTOS: ATOS ADMINISTRATIVOS

 

EMENTA: 
I Análise e manifestação acerca de projeto de lei em fase de sanção presidencial.
II - Projeto de Lei nº 5.206, de 2023 (Projeto de Lei nº 9.474, de 2018, na Câmara dos Deputados), de autoria do Senhor ex-Deputado Chico D'Angelo, que "Institui marco regulatório do Sistema Nacional de Cultura (SNC), para garantia dos direitos culturais, organizado em regime de colaboração entre os entes federativos para gestão conjunta das políticas públicas de cultura".
​III. Pela viabilidade jurídica, pela sanção, ressalvado o alcance da expressão "moralidade pública" (§2º do art. 1º e inciso V do art. 4º do PL).

 

 

I. RELATÓRIO

 

Trata-se de expediente inaugurado a partir de missiva da Secretaria Especial para Assuntos Jurídicos da Casa Civil da Presidência da República - SAJ-CC (OFÍCIO CIRCULAR Nº 18/2024/SALEG/SAJ/CC/PR - SEI 1655123), dirigida a este Ministério da Cultura e outros Ministérios, em 14/03/2024, por conduto da qual solicita a manifestação sobre o Projeto de Lei nº 5.206, de 2023 (Projeto de Lei nº 9.474, de 2018, na Câmara dos Deputados), de autoria do Senhor ex-Deputado Chico D'Angelo, que "Institui marco regulatório do Sistema Nacional de Cultura (SNC), para garantia dos direitos culturais, organizado em regime de colaboração entre os entes federativos para gestão conjunta das políticas públicas de cultura", o qual abrange pauta de natureza transversal, envolvendo assuntos de competência das pastas em epígrafe, salvo melhor juízo.

 

2. Arremata a SAJ-CC o seguinte no Ofício supra:

 

Tendo em vista que a matéria já se encontra em fase de sanção, encareço seja encaminhado a esta Secretaria parecer do órgão técnico competente, com visto ministerial, com a indicação expressa e inequívoca do posicionamento, “favorável” ou “contrária” à sanção, ou, se for o caso, com a consignação de que a matéria está fora das suas competências legais, até o dia 25/03/24, conforme disposto no parágrafo único do art. 25 do Decreto nº 9.191, de 1º de novembro 2017, sem prejuízo de antecipação tão logo seja realizada, no intuito de colaborar com os trâmites e a urgência que a matéria requer.

 

3. Encaminhada a missiva supra à Assessoria Especial de Assuntos Parlamentares e Federativos deste Ministério, este órgão redireciona o pleito a esta Consultoria Jurídica e outros Órgãos e entidades do Sistema MinC, por meio do Ofício-Circular nº 24/2024/CAP/ASPAR/GM/MinC, em 15/03/2024, solicitando manifestação até o dia 19/03/2024.

 

4. O inteiro teor do PL encontra-se acostado aos autos do processo SEI (1655129), além das seguintes manifestações:

 

5. É o relatório. Passo à análise.

 

 

II. ANÁLISE JURÍDICA

 

6. Preliminarmente, impende tecer breve consideração sobre a competência desta Consultoria Jurídica para manifestação no processo in casu.

 

7. Sabe-se que a Constituição de 1988 prevê as funções essenciais à Justiça em seu Título IV, Capítulo IV; contemplando na Seção II a advocacia pública. Essa essencialidade à justiça deve ser entendida no sentido mais amplo que se possa atribuir à expressão, estando compreendidas no conceito de essencialidade todas as atividades de orientação, fiscalização e controle necessárias à defesa dos interesses protegidos pelo ordenamento jurídico.

 

8. O art. 131 da Constituição, ao instituir em nível constitucional a Advocacia-Geral da União - AGU, destacou como sua competência as atividades de consultoria e assessoramento jurídico ao Poder Executivo, nos termos da lei complementar que dispuser sobre sua organização e funcionamento, in verbis:

 

Art. 131. A Advocacia-Geral da União é a instituição que, diretamente ou através de órgão vinculado, representa a União, judicial e extrajudicialmente, cabendo-lhe, nos termos da lei complementar que dispuser sobre sua organização e funcionamento, as atividades de consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo.
 

9. Nesta esteira, o art. 11, inciso I e V, da Lei Complementar n.º 73/1993 - Lei Orgânica da Advocacia-Geral da União -, estabeleceu, no que concerne à atividade de consultoria ao Poder Executivo junto aos Ministérios, a competência das Consultorias Jurídicas para assistir a autoridade assessorada no controle interno da constitucionalidade e legalidade administrativa dos atos a serem por ela praticados. Nesse sentido, veja-se:

 

Art. 11 - Às Consultorias Jurídicas, órgãos administrativamente subordinados aos Ministros de Estado, ao Secretário-Geral e aos demais titulares de Secretarias da Presidência da República e ao Chefe do Estado-Maior das Forças Armadas, compete, especialmente:
I - assessorar as autoridades indicadas no caput deste artigo;
(...)
III - fixar a interpretação da Constituição, das leis, dos tratados e dos demais atos normativos a ser uniformemente seguida em suas áreas de atuação e coordenação quando não houver orientação normativa do Advogado-Geral da União;
(...)
V - assistir a autoridade assessorada no controle interno da legalidade administrativa dos atos a serem por ela praticados ou já efetivados, e daqueles oriundos de órgão ou entidade sob sua coordenação jurídica;
 

10. Ressalte-se, por oportuno, que o controle interno da legalidade realizado por este órgão jurídico não tem o condão de se imiscuir em aspectos relativos à conveniência e à oportunidade da prática dos atos administrativos, que estão reservados à esfera discricionária do administrador público legalmente competente, tampouco examinar questões de natureza eminentemente técnica, administrativa e/ou financeira, conforme se extrai do Enunciado nº 7 do Manual de Boas Práticas Consultivas da Advocacia-Geral da União, que possui o seguinte teor:

 

A manifestação consultiva que adentrar questão jurídica com potencial de significativo reflexo em aspecto técnico deve conter justificativa da necessidade de fazê-lo, evitando-se posicionamentos conclusivos sobre temas não jurídicos, tais como os técnicos, administrativos ou de conveniência ou oportunidade, podendo-se, porém, sobre estes emitir opinião ou formular recomendações, desde que enfatizando o caráter discricionário de seu acatamento.

 

11. Elaboradas essas considerações preliminares, passa-se à análise da proposta, a qual já percorreu o trâmite legislativo no âmbito do Congresso Nacional, tendo sido enviado para sanção ou veto do Exmo. Presidente da República, nos termos do art. 66 da Constituição Federal.

 

12. Adentrando-se a leitura de seu teor, verifica-se que a proposta visa instituir o marco regulatório do Sistema Nacional de Cultura - SNC, em obediência ao antevisto no §3º do art. 216-A da Constituição, a saber:

 

Art. 216-A O Sistema Nacional de Cultura, organizado em regime de colaboração, de forma descentralizada e participativa, institui um processo de gestão e promoção conjunta de políticas públicas de cultura, democráticas e permanentes, pactuadas entre os entes da Federação e a sociedade, tendo por objetivo promover o desenvolvimento humano, social e econômico com pleno exercício dos direitos culturais.  
(...)
§ 3º Lei federal disporá sobre a regulamentação do Sistema Nacional de Cultura, bem como de sua articulação com os demais sistemas nacionais ou políticas setoriais de governo. (grifo nosso)

 

13. O PL, em sua versão final ora apreciada, encontra-se subdividido em 6 (seis) Capítulos, assim intitulados:

 

CAPÍTULO I - DA CULTURA, com algumas definições e princípios;

CAPÍTULO II - DO DEVER DO ESTADO NO ÂMBITO DA CULTURA;

CAPÍTULO III - DA GESTÃO PÚBLICA DA CULTURA, com previsão de instrumentos de gestão, tendo por referência a descentralização, a desconcentração de recursos e a participação social;

CAPÍTULO IV - DO SISTEMA NACIONAL DE CULTURA;

CAPÍTULO V - DA GESTÃO DO SISTEMA NACIONAL DE CULTURA, com a estrutura do SNC, além das competências da União e dos Estados e Municípios que aderirem ao SNC;

CAPÍTULO VI - DISPOSIÇÕES FINAIS E TRANSIÓRIAS, com a importante previsão de que o SNC deverá atuar articuladamente com os demais sistemas, políticas setoriais e programas federais.

 

14. Mais especificamente sobre a redação final, mister trazer a lume a inclusão no texto da expressão "moralidade pública", nos seguintes dispositivos:

 

Art. 1º caput
(...)
§ 2º Para fins desta Lei, o pleno exercício dos direitos culturais não deverá possuir caráter político-partidário ou personalista, tampouco afrontar a dignidade e a moralidade pública ou incitar a prática de crimes;
(...)
Art. 4º É dever do Estado assegurar a todos o pleno exercício dos direitos culturais, mediante: 
(...)
V - proteção das culturas, dos territórios, das expressões, dos usos e costumes, da moralidade pública, das formas de vida, das cosmologias, dos valores religiosos, da espiritualidade, dos lugares sagrados e dos cultos dos povos indígenas, bem como de comunidades tradicionais e quilombolas; (grifo nosso)

 

15. A expressão traz um conceito indeterminado, e que pode remontar a tema que foge da abrangência dos direitos culturais propriamente, senão, veja-se.

 

16. Muito embora a moralidade já conste expressamente no texto constitucional, seu   âmbito se insere como princípio a nortear a Administração Pública - moralidade administrativa, pois - seja no art. 37, caput, seja no inciso LXXIII do art. 5º, quando da previsão de ação popular em face de ato lesivo à moralidade administrativa.

 

17. Nesse contexto, a previsão de uma moralidade pública estaria mais associada a um conceito de comportamento, perante o público, um conceito afeto, pois, a costumes, o que extrapolaria o âmbito dos direitos culturais.

 

18. De todo modo, ainda que se opte por sua manutenção - e, portanto, da manutenção dos dispositivos em sua integralidade - mister que seja promovida uma interpretação conforme, no sentido de qualificar a referida moralidade como uma moralidade administrativa, quando diante de atuação do próprio Estado, em consonância, pois, com o princípio já disposto na Constituição - sem prejuízo, ainda, de uma melhor delimitação do alcance por ocasião do Decreto Regulamentador da Lei.

 

19. No mais, importante consignar que, uma vez ouvidas as Secretarias finalísticas no âmbito deste Ministério, bem como suas entidades vinculadas, as manifestações ressaltaram a importância do tema, com sugestão de sanção em sua integralidade.

 

20. Assim, ​é de se concluir pela viabilidade jurídica da proposta, no que concerne às competências deste Ministério da Cultura, observada a ressalva apontada acima - expressão de "moralidade pública". 

 

21. Quanto aos aspectos estritamente formais, insta ponderar que ao Projeto de Lei se aplicam as regras encartadas pela Lei Complementar nº 95, de 26 de fevereiro de 1998, que dispõe sobre a elaboração, a redação, a alteração e a consolidação das leis, conforme determina o parágrafo único do art. 59 da Constituição.

 

 

III. CONCLUSÃO

 

22. Diante do exposto, sem adentrar nos valores de conveniência e oportunidade na criação de mecanismos institucionais, não sujeitos ao crivo desta CONJUR, opina-se pela viabilidade jurídica do Projeto de Lei nº 5.206, de 2023 (Projeto de Lei nº 9.474, de 2018, na Câmara dos Deputados), de autoria do Senhor ex-Deputado Chico D'Angelo, que "Institui marco regulatório do Sistema Nacional de Cultura (SNC), para garantia dos direitos culturais, organizado em regime de colaboração entre os entes federativos para gestão conjunta das políticas públicas de cultura", de modo que, no que concerne às competências legais deste Ministério da Cultura, o projeto encontra-se apto a ser submetido à sanção presidencial, com a única observação quanto ao alcance da expressão "moralidade pública", conforme apontado acima. 

 

23. Encaminhem-se os autos, via SEI, à Assessoria Parlamentar - ASPAR, conforme solicitado no Ofício-Circular nº 24/2024/CAP/ASPAR/GM/MinC. 

 

 

 

Brasília, 20 de março de 2024.

 

 

(assinado eletronicamente)

SOCORRO JANAINA M. LEONARDO

Advogada da União

Consultora Jurídica

 

 


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