ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CÂMARA NACIONAL DE PROCEDIMENTOS ADMINISTRATIVOS DISCIPLINARES - CNPAD/DECOR/CGU

 

PARECER n. 00001/2024/CNPAD/CGU/AGU

 

NUP: 00688.012643/2023-19.

INTERESSADA: UNAFISCO NACIONAL - ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS AUDITORES FISCAIS DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL.

ASSUNTO: PEDIDO DE REVISÃO DO PARECER N. 00001/2022/CNPAD/CGU/AGU.

 

 
EMENTA: PEDIDO DE REVISÃO DO PARECER N. 00001/2022/CNPAD/CGU/AGU, APROVADO PELO ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO – IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA POR ENRIQUECIMENTO ILÍCITO – AQUISIÇÃO DE BENS EM VALOR DESPROPORCIONAL À EVOLUÇÃO DO PATRIMÔNIO OU À RENDA DO AGENTE PÚBLICO – INDEFERIMENTO DO PEDIDO DE REVISÃO – PROPOSTA DE ADOÇÃO DO PROCEDIMENTO PREVISTO NO ART. 40, § 1º, DA LEI COMPLEMENTAR Nº 73/1993.
I – Não merece prosperar a argumentação externada pela Requerente, de modo que deve ser indeferido o pedido de revisão do PARECER n. 00001/2022/CNPAD/CGU/AGU.
II – Com vistas a se atribuir efeitos vinculantes no âmbito da Administração Pública Federal ao posicionamento consubstanciado neste opinativo, propõe-se a adoção do procedimento previsto no art. 40, § 1º, da Lei Complementar nº 73/1993.

 

 

Sra. Diretora do DECOR,

 

 

I – RELATÓRIO:

 

01. Trata-se de pedido de revisão do PARECER n. 00001/2022/CNPAD/CGU/AGU, encaminhado à Consultoria-Geral da União pela Associação Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil (UNAFISCO Nacional), por meio do Ofício nº 111/2023-JUR (Sequencial 04), de 14 de dezembro de 2023 e pareceres acostados aos sequenciais 02 e 03.

 

02. Por meio DESPACHO n. 00520/2023/GAB/DECOR/CGU/AGU (Seq. 05), o DECOR/CGU enviou, no dia 18/12/2023, a presente demanda à CNPAD, para análise, tendo em vista que "os debates para elaboração do parecer se deram no âmbito da Câmara Nacional de Procedimento Administrativos Disciplinares". 

 

03. Em sessão ordinária da CNPAD, ocorrida no dia 19/12/2023, deliberou-se por elaborar parecer de subsídios à decisão do Advogado-Geral da União, tendo sido designados relatores os procuradores Mila Kothe e Guilherme Raso Marques.

 

04. No requerimento, a UNAFISCO Nacional alega a necessidade de revisão do entendimento exarado no Parecer n. 00001/2022/CNPAD/CGU/AGU, o qual tratou da interpretação do art. 9º, inciso VII, da Lei nº 8.429, de 1992, frente às alterações promovidas pela Lei nº 14.230, de 2021. Defende a requerente a incompatibilidade da exegese adotada no parecerer com os preceitos da nova lei e da Constituição Federal.

 

05. O pleito de revisão se assenta em quatro argumentos, a saber: (i) a necessidade dolo específico do agente público para a configuração do ato de improbidade descrito no art. 9º, inciso VII, da Lei nº 8.429, de 1992; (ii) a necessidade de demonstração, pela Administração, do nexo de causalidade entre o enriquecimento do agente público e o exercício de seu cargo, mandato, função ou emprego público; (iii) a impossibilidade de inversão do ônus da prova ou uso de presunções em desfavor do investigado; (iv) a necessidade de individualização da conduta do investigado, bem como a demonstração do ato que gerou o enriquecimento ilícito.

 

06. Com a devida vênia aos argumentos expostos pela UNAFISCO Nacional e pelos pareceres anexos ao requerimento, eles não são aptos a alterar o entendimento firmado no  Parecer n. 00001/2022/CNPAD/CGU/AGU, pelas razões a seguir delineadas.

 

II - ANÁLISE JURÍDICA:

 

II.1. Preliminares:

 

07. Antes de adentrar ao mérito do requerimento de revisão, cumpre analisar a presença dos pressupostos para sua admissibilidade.

 

08. O pleito se ampara na alegação de que o Parecer n. 00001/2022/CNPAD/CGU/AGU, ato administrativo de natureza enunciativa, aprovado pelo Advogado-Geral da União, estaria maculado de ilegalidade e inconstitucionalidade, por afrontar as disposições da Lei nº 14.230, de 2021, e o princípio constituicional da presunção de inocência (art. 5º, inciso LVII, da CR/88). Assim, a associação interessada, representativa da classe dos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil, constituída na forma da lei, requer a revisão do ato administrativo.

 

09. De acordo com o art. 53 da Lei nº 9.784, de 1999, a Administração deve anular seus próprios atos, quando eivados de vício de legalidade. Trata-se de prerrogativa denominada autotutela administrativa, cuja prática encontra amparo na jurisprudência pátria[1].

 

10. Em regra, a autotutela é exercida de ofício. Nada impede, contudo, a provocação pelo interessado, haja vista o direito de petição consagrado no art. 5º, XXXIV, da Constituição Federal e no art. 3º, III, da Lei nº 9.784, de 1999. O pleito há de ser dirigido à autoridade competente para a anulação do ato.

 

11. No caso em apreço, a UNAFISCO Nacional tem legitimidade para requerer a revisão, pois se enquadra como interessada nos termos do art. 9º, III, da Lei nº 9.784, de 1999[2]. Registre-se, contudo, que a decisão sobre a revisão haverá de ser tomada pelo Advogado-Geral da União, dado que o parecer impugnado foi por ele aprovado, nos termos do Despacho nº 160, de 24 de agosto de 2022.

 

12. Demonstrados o cabimento do pedido de revisão, a legitimidade da associação requerente e a competência para a apreciação do pleito, compete a esta Câmara Nacional subsidiar a autoridade decisora com os argumentos jurídicos pertinentes, tendo em vista a solicitação do DECOR/CGU (Seq. 05).

 

II.2. Do mérito:

 

13. Como se extrai da petição protocolada pela UNAFISCO Nacional e dos pareceres anexos, a associação requerente discorda do entendimento constante no Parecer n. 00001/2022/CNPAD/CGU/AGU, no qual se concluiu que:

 

a. As alterações trazidas pela Lei nº 14.230, de 2021, quanto ao disposto no art. 9º, inciso VII, da Lei nº 8.429, de 1992, cumprem o relevante desiderato de incorporar à descrição típica as construções hermenêuticas consolidadas na doutrina, na jurisprudência e na praxis administrativa, atendendo ao princípio da segurança jurídica;
 
b. Na seara administrativa, já na redação original da Lei nº 8.429, de 1992, consolidou-se o entendimento segundo o qual a infração disciplinar de improbidade administrativa do art. 132, IV, da Lei nº 8.112, de 1990, em qualquer de suas manifestações (enriquecimento ilícito, lesão ao erário ou ofensa aos princípios da Administração Pública), exigia vontade e consciência da ilicitude, o chamado elemento subjetivo doloso;
 
c. A introdução do dolo na base hipotética do ilícito não altera a interpretação da infração, posto que doutrina e jurisprudência há muito vinham exigindo o referido elemento subjetivo para sua configuração;
 
d. Conforme se pode observar da literalidade do art. 9º, inciso VII, da LIA, este não exige em sua base hipotética um especial fim de agir, o que afastaria, segundo uma parte da corrente doutrinária, a necessidade de se falar em dolo específico.
 
e. Contudo, ainda que se adote a corrente que exige o dolo específico para a configuração do enriquecimento ilícito previsto no art. 9º, inciso VII, a atual redação conferida pela Lei nº 14.230, de 2021, requer o fim de obter proveito ou benefício indevido próprio ou alheio. A despeito de ser uma importante inovação legislativa, na prática, não altera a práxis administrativa. Isso porque, o dolo específico se extrai da própria comprovação da configuração do ilícito, já que quem apresenta um patrimônio a descoberto em face de suas rendas conhecidas, devidamente comprovado pela Administração, evidentemente o faz com o intuito de obter proveito ou benefício próprio ou alheio. O não cumprimento do dever funcional de transparência, imposto pelo art. 13 da Lei nº 8.429, de 1992, e pelo art. 1º da Lei nº 8.730, de 1992, recai e reflete-se, de forma inexorável, sobre a própria conduta funcional do servidor vinculado àqueles ditames legais, restando, portanto, atendida até mesmo a elementar inovada com o § 2º do art. 11 da Nova Lei de Improbidade;
 
f. Acerca da inserção da expressão “em razão deles [cargo, mandato, emprego ou função]” no inciso VII do art. 9º da Lei de Improbidade, pode-se inferir que esse reforço legislativo foi necessário por, pelo menos, dois motivos: i) explicitar a necessidade de a Administração comprovar que o enriquecimento indevido tenha sido fruto do período em que o servidor exerce ou exerceu o cargo; e ii) evidenciar a natureza relativa da presunção de ilicitude da variação patrimonial a descoberto, permitindo ao servidor provar a licitude dos acréscimos;
 
g. A expressão “em razão deles [cargo, mandato, emprego ou função]”, que já constava do caput do art. 9º da Lei de Improbidade, não exige da Administração prova de que o enriquecimento decorreu de um ato omissivo ou comissivo praticado pelo servidor no exercício da função pública (fato antecedente). Assim fosse, a conduta não seria enquadrada no art. 9º, inciso VII, mas sim em algum outro tipo infracional, sob pena de tornar o dispositivo letra morta e afastar a norma da construção do sistema de defesa da probidade;
 
h. A inserção da previsão “assegurada a demonstração pelo agente da licitude da origem da evolução patrimonial apurada” apenas evidencia a natureza relativa da presunção de ilicitude do patrimônio a descoberto, permitindo ao servidor provar a licitude dos acréscimos, no exercício desde sempre assegurado da garantia constitucional ao contraditório;
 
i. Permanece válido o entendimento jurisprudencial consolidado segundo o qual, em matéria de enriquecimento ilícito, cabe à Administração comprovar o incremento patrimonial significativo e incompatível com as fontes de renda do servidor. Por outro lado, é do servidor acusado o ônus da prova no sentido de demonstrar a licitude da evolução patrimonial constatada pela administração. Tal entendimento é amparado na presunção legal de ilicitude do patrimônio a descoberto apurado pela Administração (art. 2º, § 5º, da Lei nº 8.730, de 1993) e na distribuição equitativa do ônus probatório (art. 373 e no art. 374, IV, do CPC);
 
j. Entendimento contrário violaria o princípio da proporcionalidade, o qual, além de vedar o excesso, não permite a adoção de medidas insuficientes para a proteção dos direitos fundamentais. Também configuraria retrocesso em matéria de combate à corrupção e afronta aos tratados internacionais sobre combate à corrupção ratificados pela República Federativa do Brasil;
 
k. A questão se resume, então, ao ônus probatório, o qual incumbe à Administração o dever de comprovar: 1) a efetiva ocorrência do incremento patrimonial, 2) que ele é significativo/efetivamente desproporcional; 3) que este incremento é incompatível com as fontes de renda lícitas e conhecidas do servidor; 4) que ele não tem causa válida – outros rendimentos lícitos e conhecidos; e 5) que o incremento ou variação é fruto do período em que exerce ou exerceu mandato, cargo, emprego ou função pública. Após todas essas provas pela Administração, opera a presunção legal relativa de que o enriquecimento é ilícito e cabe ao servidor apresentar sua justificativa para o aumento patrimonial, no sentido de demonstrar a sua licitude, podendo, a título exemplificativo, desvincular o respectivo acréscimo patrimonial do exercício do cargo, de modo a, por exemplo, comprovar outra fonte de renda lícita. Se o servidor as apresenta, cabe à Administração avaliar a veracidade das explicações, para aceitá-las ou afastá-las, fundamentadamente, de acordo com a prova constante dos autos.

 

14. Em linhas gerais, o Parecer questionado defende que as alterações promovidas no art. 9º, inciso VII, da Lei de Improbidade Administrativa pela Lei nº 14.230, de 2021, incorporaram a posição jurisprudencial e administrativa sobre a matéria e ressaltaram as garantias dos acusados, sem, contudo, alterar o ônus probatório para a configuração do ilícito.

 

15. Assim, o parecer em tela concluiu que, em matéria de enriquecimento ilícito, cabe à Administração comprovar: : 1) a efetiva ocorrência do incremento patrimonial, 2) que ele é significativo/efetivamente desproporcional; 3) que este incremento é incompatível com as fontes de renda lícitas e conhecidas do servidor; 4) que ele não tem causa válida – outros rendimentos lícitos e conhecidos; e 5) que o incremento ou variação ocorreu no período em que exerce ou exerceu mandato, cargo, emprego ou função pública. Após todas essas provas pela Administração, opera a presunção legal relativa de que o enriquecimento é ilícito e cabe ao servidor apresentar sua justificativa para o aumento patrimonial, no sentido de demonstrar a sua licitude, podendo, a título exemplificativo, desvincular o respectivo acréscimo patrimonial do exercício do cargo, de modo a, por exemplo, comprovar outra fonte de renda lícita. Se o servidor as apresenta, cabe à Administração avaliar a veracidade das explicações, para aceitá-las ou afastá-las, fundamentadamente, de acordo com a prova constante dos autos[3].

 

16. O entendimento da CNPAD mantém a utilidade e a essência do tipo infracional previsto no art. 9º, inciso VII da LIA, pois não se pode impor à Administração a prova de que a variação patrimonial decorre de ilícito funcional antecedente.

 

17. A exigência de prova do fato antecedente não se coaduna com a mens legis do inciso VII do art. 9º, da LIA, pois implica em sua completa inutilidade já que a conduta ali tipificada é adquirir patrimônio desproporcional à evolução do patrimônio ou à renda do agente público.

 

18. Caso a Administração tivesse que comprovar que o enriquecimento decorreu de um ato omissivo ou comissivo praticado pelo servidor no exercício da função pública, a conduta não seria enquadrada no art. 9º, inciso VII, da LIA mas em algum outro tipo infracional, sob pena de tornar o dispositivo letra morta e isolar a norma do sistema de defesa da probidade.

 

19. O Parecer da CNPAD também defendeu a necessidade da prova do dolo e o direito dos acusados ao contraditório e à ampla defesa, assegurando-lhes a oportunidade de provar a licitude da variação patrimonial apurada, conforme entendimento há muito sendimentado na seara administrativa (Parecer AGU n GQ- 200) e na jurisprudência.

 

20. O Parecer n. 00001/2022/CNPAD/CGU/AGU, longe de macular o ordenamento jurídico, se mostra aderente à mens legislatoris, pois reconhece o objetivo do Congresso Nacional de incorporar à descrição típica as construções hermenêuticas consolidadas na doutrina, na jurisprudência e na praxis administrativa, sem alterar a essência do art. 9º, inciso VII, da LIA. É o que registra a Justificativa do Projeto de Lei da Câmara dos Deputados nº 10.887/2018, que originou a Lei nº 14.230, de 2021:

 

Após o seu jubileu de prata, a Lei de Improbidade Administrativa – LIA carecia de revisão para sua adequação às mudanças ocorridas na sociedade e também para adaptar-se às construções hermenêuticas da própria jurisprudência, consolidadas em decisões dos Tribunais. (...)
 
O texto apresentado representa revisão redacional de adaptação de linguagem, retificando pequenas falhas perceptíveis, além de correções de técnica legislativa, principalmente no Capítulo I que cuida das Disposições Gerais. (...)
 
Neste sentido, a estrutura e a abrangência dos artigos 9º e 10º da LIA permanecem em essência inalterados, subtraindo-se a possibilidade da ocorrência de improbidade administrativa por atos culposos. (Justificativa do Projeto de Lei da Câmara dos Deputados nº 10.887/2018) (destacou-se)
 

21. Inclusive, em julgamento realizado após a promulgação da Lei nº 14.230, de 2021, o Superior Tribunal de Justiça manteve o entendimento de que, em termos de enriquecimento ilícito por variação patrimonial a descoberto, não se impõe à Administração a prova do nexo causal entre o enriquecimento não explicado e a conduta ilícita do agente público no exercício de suas funções.

 

22. O STJ reafirmou sua jurisprudência no sentido de que incumbe ao servidor acusado o ônus de justificar a origem e a legitimidade do patrimônio incompatível com suas rendas, registrando que as alterações promovidas na Lei de Improbidade reforçaram tal distribuição do ônus probatório. Vejam-se a ementa e o respectivo trecho do acórdão:

 

ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. EVOLUÇÃO PATRIMONIAL A DESCOBERTO. ART. 9º, VII, DA LEI 8.429/1992. CONDUTA ÍMPROBA. PROVA DA ORIGEM LÍCITA. ÔNUS DO AGENTE PÚBLICO. ACÓRDÃO RECORRIDO EM CONTRARIEDADE À JURISPRUDÊNCIA DO STJ. HISTÓRICO DA DEMANDA 1. Cuida-se, na origem, de Ação de Improbidade Administrativa contra dois Auditores Fiscais da Previdência Social, acusados da prática de advocacia administrativa, excesso de exação e evolução patrimonial incompatível com a remuneração de seus cargos. 2. O Recurso Especial comporta conhecimento apenas em relação ao recorrido Joaquim Acosta Diniz e, exclusivamente, quanto à imputação de evolução patrimonial a descoberto prevista no art. 9º, VII, da Lei 8.429/1992. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA DE EVOLUÇÃO PATRIMONIAL A DESCOBERTO 3. O acórdão recorrido consigna que, para a incidência do inciso VII do art. 9º da LIA, "há necessidade de se atrelar a conduta ilícita do agente público no exercício de suas funções à evolução patrimonial considerada desproporcional" (fl. 2.141, e-STJ) (grifei) .4. Evolução patrimonial a descoberto, manifestada por bens materiais, despesas ou estilo de vida incompatíveis com rendimentos efetivamente recebidos, independe de alegação ou prova pelo Estado de conduta ilícita do servidor público. Ao revés, incumbe a este o ônus de cabalmente justificar a origem e a legitimidade do capital ou meios exibidos. Precedentes do STJ .5. Vale destacar que a nova redação do art. 9º, VII, da Lei 8.429/1992, conferida pela Lei 14.230/2021 - em que pese inaplicável ao caso presente ante os limites do quanto decidido pelo STF no Tema 1.199 (irretroatividade do novo regime, salvo em relação às ações em andamento atinentes aos tipos culposos extintos) -, reforça o entendimento jurisprudencial supra-apontado, porque o próprio dispositivo ressalva que será "assegurada a demonstração pelo agente da licitude da origem dessa evolução". AUSÊNCIA DE ENFRENTAMENTO DA QUESTÃO DA LICITUDE DA VARIAÇÃO PATRIMONIAL NO ACÓRDÃO RECORRIDO 6. Como o acórdão recorrido adotou a premissa equivocada de que ao autor da Ação de Improbidade cabia o ônus de provar a correlação entre o acréscimo patrimonial e algum ato ilícito praticado no exercício do cargo, o Tribunal de origem deixou de se pronunciar sobre a alegada desproporção do patrimônio do agente com seus rendimentos como Auditor Fiscal e as eventuais provas por ele apresentadas no sentido da licitude da evolução patrimonial .7. Deve a instância ordinária, firmada a tese jurídica que predomina no STJ, reapreciar os fatos e julgá-los de acordo com a orientação do STJ, motivo pelo qual é de se anular o julgamento para que outro seja realizado. CONCLUSÃO 8. Recurso Especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, provido, a fim de que, nos termos da fundamentação, os autos tornem à Corte de origem para, com base na orientação de que compete ao acusado comprovar a licitude da evolução patrimonial, reapreciar os fatos da causa, exclusivamente em relação a Joaquim Acosta Diniz e à imputação do art. 9º, VII, da Lei 8.429/1992.
 
(...) Vale destacar que a nova redação do art. 9º, VII, da Lei 8.429/1992, conferida pela Lei 14.230/2021 – em que pese inaplicável ao caso presente ante os limites do quanto decidido pelo STF no Tema 1.199 (irretroatividade do novo regime, salvo em relação às ações em andamento atinentes aos tipos culposos extintos) –, reforça o entendimento jurisprudencial supra-apontado, porque o próprio dispositivo ressalva que será "assegurada a demonstração pelo agente da licitude da origem dessa evolução", verbis:
 
Art. 9º (...) VII - adquirir, para si ou para outrem, no exercício de mandato, de cargo, de emprego ou de função pública, e em razão deles, bens de qualquer natureza, decorrentes dos atos descritos no caput deste artigo, cujo valor seja desproporcional à evolução do patrimônio ou à renda do agente público, assegurada a demonstração pelo agente da licitude da origem dessa evolução; (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021)
 
Dessa forma, tanto quanto se entendia antes da vigência da Lei 14.230/2021, é ônus do agente público, e não do Estado, demonstrar que a aquisição dos bens ou estilo de vida de valores desproporcionais não ocorreram em razão do exercício do cargo público.” 
 
(STJ - REsp: 1923138 RJ 2020/0190437-9, Relator: Ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamento: 06/12/2022, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 19/12/2022). (destacou-se)

 

23. Em que pese a exauriente fundamentação do Parecer n. 00001/2022/CNPAD/CGU/AGU e a recente posição do Superior Tribunal de Justiça na mesma linha, a UNAFISCO Nacional propõe a revisão do parecer, sob os seguintes argumentos: (i) a necessidade dolo específico do agente público para a configuração do ato de improbidade descrito no art. 9º, inciso VII, da Lei nº 8.429, de 1992; (ii) a necessidade de demonstração, pela Administração, do nexo de causalidade entre o enriquecimento do agente público e o exercício de seu cargo, mandato, função ou emprego público; (iii) a impossibilidade de inversão do ônus da prova ou uso de presunções em desfavor do investigado; (iv) a necessidade de individualização da conduta do investigado, bem como a demonstração do ato que gerou o enriquecimento ilícito.

 

24. As teses expostas, de antemão conhecidas por este colegiado, foram devidamente abordadas e refutadas no Parecer n. 00001/2022/CNPAD/CGU/AGU. Ainda assim, para uma melhor compreensão da tese defendida pela CNPAD, os argumentos da associação requerente serão analisados, um a um, nos tópicos subsequentes.

 

2.1. Dolo específico:

 

25. De acordo com a UNAFISCO, a Lei nº 14.230, de 2021, ao alterar a Lei de Improbidade Administrativa, passou a exigir o dolo específico na conduta, o que se extrairia da nova redação dada ao art. 1º, §2º e art. 11, §§1º e 2º da Lei nº 8.429, de 1992[4]. Afirma que esse dolo não poderia ser presumido, em razão da redação conferida ao art. 17, §19, II e 17-C, I, da Lei nº 8.429, de 1992[5]. Assim, no seu entender, o Parecer n. 00001/2022/CNPAD/CGU/AGU teria incorrido em contradição ao sustentar que o dolo específico pode ser extraído da própria configuração do ilícito, admitindo a presunção do elemento subjetivo.

 

26. Equivoca-se a associação requerente. O parecer impugnado não ignora a alteração legislativa que passou a exigir o dolo para a configuração de todos os atos de improbidade da Lei nº 8.429, de 1992 (art. 1º, §2º), e tampouco a necessária demonstração do fim de obter proveito ou benefício indevido para si ou para outra pessoa ou entidade (art. 11, §§1º e 2º). Pelo contrário, o Parecer n. 00001/2022/CNPAD/CGU/AGU defende que, em se tratando do ato de improbidade descrito no art. 9º, VII, da Lei nº 8.429, de 1992, o dolo genérico sempre foi exigido para a configuração do ilícito e o chamado “especial fim de agir” integrou a própria descrição tífica desde a redação original[6], de modo que a alteração legislativa não justifica a mudança do entendimento já consolidado administrativa e jurisprudencialmente.

 

27. O parecer da CNPAD também não defende a presunção do elemento subjetivo. De fato, a culpa em sentido amplo não se presume, sob pena de ofensa à presunção de inocência e caracterização da repudiada responsabilidade objetiva. O que se afirmou no parecer é que, em se tratando de elemento subjetivo, o dolo se evidencia pela manifesta vontade do agente que, de forma livre e consciente, viola o dever de conformidade patrimonial que lhe é imposto pela relação de especial sujeição. Assim, é aferível pelas circunstâncias externadas pela conduta, como a omissão de rendas, a falsidade da declaração de bens, a sonegação de informações, sua prestação incompleta, a aquisição de bens ou direitos incompatíveis com a renda declarada, a realização de depósitos ou aplicações financeiras em evidente desconformidade com as rendas lícitas e conhecidas do servidor, entre outras, tudo isso a denotar o interesse do agente em dissimular a origem ilícita do patrimônio e enriquecer indevidamente.

 

28. Observe-se que a conduta vedada pelo art. 9º, VII, da Lei de Improbidade é a aquisição, mediante a prática de ato doloso, no exercício do cargo e em razão dele, de bens cujo valor seja desproporcional à evolução do patrimônio ou à renda do agente público. Da descrição típica já se infere o intuito de obter proveito ou benefício indevido para si ou para outrem, posto que todo acréscimo patrimonial indevido há de beneficiar o agente ou terceiro.

 

29. Portanto, em se tratando do ato de improbidade descrito no art. 9º, VII, da Lei nº 8.429, de 1992, o “especial fim de agir” não qualifica a conduta, uma vez que constitui elementar do ilícito. A suposta motivação especial integra a própria descrição típica. Assim, o elemento subjetivo a ser provado é o dolo de enriquecer ilicitamente mediante a aquisição de bens desproporcionais à renda. Esse dolo pode ser provado pelas circunstâncias que gravitam a conduta, como a omissão ou dissimulação da origem dos bens. Nesse sentido se firmou a jurisprudência do STJ antes da Lei nº 14.230, de 2021. Veja-se:

 

Destaque-se ainda que a prática do ato de improbidade previsto no art. 9°, VII, da Lei 8.429/1992 dispensa a prova do dolo específico, bastando o dolo genérico, que, nos casos de variação patrimonial a descoberto resta evidenciado pela manifesta vontade do agente em realizar conduta contrária ao dever de legalidade, consubstanciada na falta de transparência da evolução patrimonial e da movimentação financeira, conforme já decidiu a 3ª Seção do STJ no julgamento do MS 12.660/DF, rel. Min. Marilza Maynard (Desembargadora convocada do TJ/SE), julg. em 13/8/2014, Dje 22/8/2014. (Excerto do voto no MS 19.782/DF, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 09/12/2015, DJe 06/04/2016) (...) 5. O mencionado dispositivo considera improbidade administrativa a conduta genericamente dolosa do agente público de aumentar o patrimônio pessoal sem justificativa legal para tanto, independentemente de sua origem ser por desvio funcional ou qualquer outro tipo de atividade. 6. "A improbidade administrativa consistente em o servidor público amealhar patrimônio a descoberto independe da prova de relação direta entre aquilo que é ilicitamente feito pelo servidor no desempenho do cargo e seu patrimônio a descoberto. Espécie de improbidade em que basta que o patrimônio a descoberto tenha sido amealhado em época em que o servidor exercia cargo público" (MS 20.765/DF, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, DJe 14.2.2017). No mesmo sentido: MS 18.460/DF, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Rel. p/ Acórdão Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, DJe 2.4.2014; MS 21.084/DF, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, DJe 1º.12.2016; MS 19.782/DF, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, DJe 6.4.2016; AgRg no AREsp 768.394/MG, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 13.11.2015; AgRg no REsp 1.400.571/PR, Rel. Ministro Olindo Menezes (Desembargador convocado do TRF 1ª Região), Primeira Turma, DJe 13.10.2015; MS 12.660/DF, Rel. Ministra Marilza Maynard (Desembargadora convocada do TJ/SE), Terceira Seção, DJe 22.8.2014; e MS 12.536/DF, Rel. Ministra Laurita Vaz, Terceira Seção, DJe 26/9/2008. 7. Não há, portanto, no fato típico ímprobo a imposição de que a origem do incremento patrimonial esteja relacionada com desvios no exercício do cargo, o que denota que a hipótese legal considera o simples ato genericamente doloso de ostentar patrimônio incompatível com a renda auferida e não justificado legalmente como ato grave violador do princípio da moralidade administrativa. (...) (MS 21.708/DF, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Rel. p/ Acórdão Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 08/05/2019, DJe 11/09/2019). (destacou-se)

 

30. Embora o STJ não tenha se manifestado sobre o dolo específico após as alterações promovidas pela Lei nº 14.230, de 2021, não há razões para vislumbrar a superação do entendimento firmado, pois, como demonstrado, a redação original já exigia o fim de obter proveito indevido para a configuração do ato de improbidade em comento. A alteração legal apenas reforça o entendimento já existente na Administração quanto à tipificação da conduta, cabendo a esta comprovar a existência do dolo, como já vinha fazendo, por meio das circunstâncias que envolvem a prática infracional.

 

31. Diante do exposto, não se mostra pertinente a irresignação da UNAFISCO contra a caracterização do dolo pelas circunstâncias da conduta, afinal, a relação estatutária exige do servidor um grau especial de sujeição, inclusive a demonstração de sua regularidade patrimonial. O não cumprimento do dever funcional de transparência imposto pelo art. 13 da Lei nº 8.429, de 1992, e pelo art. 1º da Lei nº 8.730, de 1992, quando demonstrada a variação patrimonial a descoberto, juntamente com outras circunstâncias, pode evidenciar o dolo de enriquecer ilicitamente. Aliás, conforme reiterada jurisprudência dos tribunais pátrios, a prova do elemento subjetivo não se infere de outro modo. Vejam-se, a propósito, os seguintes arestos:

 

ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE. INSERÇÃO INDEVIDA DE NÚMEROS DE TÍTULOS ELEITOR NO CADASTRO RECEITA FEDERAL. DOLO CONFIGURADO. ARTIGO 11 DA LIA. SENTENÇA REFORMADA. (...) 4. A partir de regras de experiência comum, é possível reconhecer a presença de atuar doloso, mesmo nos casos em que testemunhas ou o próprio agente que realizou o ato digam o contrário. (...) O Homem enquanto ser racional, é dotado de uma característica de difícil apreensão e que o distingue de todos os outros seres vivos: o pensamento. No mundo interior da mente só podemos conhecer o que é transmitido para o mundo exterior, seja de uma forma expressa e directa 1 (comunicação) seja de uma maneira tácita (conduta). Conforme exposto, o dolo enquanto elemento constituído por uma representação e intenção de perpetuar o facto, pertence aos chamados factos internos ou psíquicos. Daí poder nunca vir a ser conhecido ou apreendido por outro que não o próprio sujeito. (...) (TRF-2. Apel. Cível 01400614820144025101/RJ, Relator: Flavio Oliveira Lucas, Data de Julgamento: 13/09/2019, VICE-PRESIDÊNCIA) (destacou-se)
 
PENAL. ART. 334, § 1º, c DO CÓDIGO PENAL. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADOS.ERROS DE TIPO E DE PROIBIÇÃO NÃO CONFIGURADOS. RECURSO DESPROVIDO. (...) IV - A prova do dolo deve ser ele aferido pelas circunstâncias em que praticado o delito, que, no presente caso, apontam para a plena ciência por parte da acusada da ilicitude de sua conduta. V - Recurso da defesa não provido. (TRF-2. Apel. CRim: 00000545220114025152/RJ, Relator: Marcello Ferreira de Souza Granado, Data de Julgamento: 26/02/2014, 1ª Turma Especializada, Data de Publicação: 01/04/2014) (destacou-se)
 
PENAL E PROCESSUAL. MOEDA FALSA. INTRODUÇÃO EM CIRCULAÇÃO. ARTIGO 289, § 1º, DO CP. ELEMENTO SUBJETIVO. ANÁLISE DAS CIRCUNSTÂNCIAS EXTERNAS. RESPONSABILIDADE CRIMINAL COMPROVADA. DESCLASSIFICAÇÃO PARA A FORMA PRIVILEGIADA (ART. 289, § 2º, CP). IMPOSSIBILIDADE. CONDENAÇÃO. REPRIMENDA. SUBSTITUIÇÃO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. 1. Nos crimes de falsum, inexiste possibilidade material de se produzir ampla prova do dolo, devendo o Magistrado se orientar pelo conjunto das evidências, atendo-se aos indicativos externos que expressam a vontade do agente para aferir a presença, ou não, do elemento subjetivo. (...). (TRF-4. Apel. CRim: 6028920084047201/SC 0000602-89.2008.4.04.7201, Relator: Salise Monteiro Sanchotene, DJ: 19/03/2013, Sétima Turma) (destacou-se)

 

2.2. Nexo de causalidade:

 

32. A UNAFISCO também sustenta que as alterações promovidas no inciso VII do art. 9º da Lei de Improbidade Administrativa impuseram à Administração a prova do nexo de causalidade entre o enriquecimento do agente público e o exercício de seu cargo, mandato, função ou emprego público. A seu ver, além da desproporção entre o patrimônio e os rendimentos conhecidos, caberia à Administração provar o ilícito que teria ocasionado o enriquecimento do agente público.

 

33. O argumento da requerente não se sustenta.

 

34. A alteração textual promovida pela Lei nº 14.230, de 2021, ao inserir as expressões “em razão deles [cargo, mandato, função ou emprego]” no inciso VII do art. 9º não é ociosa. O legislador foi intencionalmente repetitivo, pois a expressão já constava do caput do dispositivo. Pode-se inferir que esse reforço legislativo foi necessário, por, pelo menos, dois motivos.

 

35. O primeiro motivo consiste em explicitar a necessidade de a Administração comprovar que o enriquecimento indevido tenha sido fruto do período em que o servidor exerce ou exerceu o cargo. Com efeito, como reiteração do comando explicitado já desde a elementar “no exercício de mandato, de cargo, de emprego ou de função pública” constante da redação original, a inovação legislativa reafirma que o acréscimo patrimonial a descoberto tem que ocorrer durante o exercício do cargo, não antes do ingresso do agente público no cargo/função, nem após a vacância do cargo por ele ocupado.

 

36. O segundo motivo consiste em evidenciar que o servidor público pode demonstrar a licitude da origem do acréscimo patrimonial, desvinculando o respectivo acréscimo patrimonial a descoberto do exercício do cargo, no sentido de apresentar, por outra fonte de renda lícita, como aluguéis ou recebimento de herança, o que, hipoteticamente, poderia afastar o enquadramento da situação na improbidade administrativa em apreço.

 

37. Dessa forma, o legislador conseguiu afastar qualquer dúvida que poderia pairar sobre eventual presunção absoluta na configuração do tipo previsto no art. 9º, inciso VII, da LIA. Ou seja, mesmo quando comprovado pela Administração o incremento patrimonial significativo incompatível com as fontes de renda do servidor e sem causa válida – outros rendimentos lícitos e conhecidos –, durante o exercício de mandato, de cargo, de emprego ou de função pública, tal fato não gera a presunção absoluta de enriquecimento ilícito, mas sim presunção relativa, pois o servidor pode apresentar sua justificativa para o aumento patrimonial, demonstrando sua licitude.

 

38. Outrossim, a exigência de prova do fato antecedente não se coaduna com a mens legis do inciso VII do art. 9º, da LIA. Tal exigência implica em sua completa inutilidade já que a conduta ali tipificada é adquirir patrimônio desproporcional à evolução do patrimônio ou à renda do agente público. Ora, não se pode acolher uma solução hermenêutica que esvazie o sentido da norma, tornando-a inaplicável. A interpretação deve extrair utilidade da norma e preservar sua vigência. Ademais, o sistema de combate à improbidade requer a efetividade na preservação da integridade do patrimônio do Estado, como aponta o novo caput do artigo 1º da Lei de Improbidade Administrativa:

 

Art. 1º O sistema de responsabilização por atos de improbidade administrativa tutelará a probidade na organização do Estado e no exercício de suas funções, como forma de assegurar a integridade do patrimônio público e social, nos termos desta Lei.

 

39. No caso do inciso VII do art. 9º, da LIA, a presunção de relação com o cargo gerada pela evolução patrimonial não justificada constitui o âmago da norma e se ampara na constatação pragmática de que o rastro do dinheiro aponta o ato de corrupção. Essa solução, resumida na expressão inglesa “follow the money”, foi incorporada ao ordenamento internacional, que passou a ordenar a tipificação do enriquecimento ilícito, independente de prova do ato de corrupção. Assim dispõem o art. IX da Convenção Interamericana contra a Corrupção, promulgada no Brasil pelo Decreto nº 4.410, de 7 de outubro de 2002, e o art. 20 da Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, promulgada pelo Decreto nº 5.687, de 31 de janeiro de 2006:

 

Artigo IX
Enriquecimento ilícito
Sem prejuízo de sua Constituição e dos princípios fundamentais de seu ordenamento jurídico, os Estados Partes que ainda não o tenham feito adotarão as medidas necessárias para tipificar como delito em sua legislação o aumento do patrimônio de um funcionário público que exceda de modo significativo sua renda legítima durante o exercício de suas funções e que não possa justificar razoavelmente. (...) (destacou-se)
 
Artigo 20
Enriquecimento ilícito
Com sujeição a sua constituição e aos princípios fundamentais de seu ordenamento jurídico, cada Estado Parte considerará a possibilidade de adotar as medidas legislativas e de outras índoles que sejam necessárias para qualificar como delito, quando cometido intencionalmente, o enriquecimento ilícito, ou seja, o incremento significativo do patrimônio de um funcionário público relativos aos seus ingressos legítimos que não podem ser razoavelmente justificados por ele. (destacou-se)
 

40. A tipificação do enriquecimento por patrimônio a descoberto se coaduna com os compromissos internacionais assumidos pela República em prol do combate à corrupção. Perceba-se que ambos os textos atribuem ao servidor o dever de justificar o acréscimo patrimonial incompatível com seus rendimentos, como também o faz a parte final do inciso VII do art. 9º, da  LIA, ao assegurar a demonstração, pelo agente, da licitude da origem da evolução patrimonial incompatível com as rendas conhecidas.

 

41. Ademais, como observado pela Nota Técnica nº 01/2021 – 5ª Câmara de Coordenação e Revisão[7] do Ministério Público Federal, a “aplicação nos novos dispositivos da Lei nº 14.230/2021 deve ser orientada pela sua interpretação à luz do Sistema Brasileiro Anticorrupção, em harmonia com a Constituição Federal e sua proteção conferida à tutela da probidade, no princípio republicano e no Estado Democrático, assegurados direitos e garantias fundamentais aos investigados/acusados, como sistema administrativo sancionador, bem como à luz de Convenções Internacionais contra a Corrupção, internalizadas no Direito Brasileiro (OCDE, OEA e ONU)”.

 

42. Observe-se, ademais, que a probidade administrativa constitui direito fundamental, o que se infere da adoção do Regime Republicano por nossa Constituição (art. 1º, caput, c/c art. 5º, §2º, da CR/88). Em se tratando de direito fundamental, as normas internacionais que versam sobre combate à corrupção ganham status supralegal, consoante a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal[8]. Implica afirmar que as convenções contra a corrupção da Organização dos Estados Americanos (OEA) e da Organização das Nações Unidas (ONU) condicionam a intepretação do art. 9º, VII, da Lei de Improbidade Administrativa, impondo ao agente público o dever de explicar a evolução incompatível com seus rendimentos.

 

43. Entendimento contrário violaria o princípio da proporcionalidade, o qual, além de vedar o excesso, não permite a adoção de medidas insuficientes para a proteção dos direitos fundamentais. Uma vez suprido pela Administração o ônus probatório que lhe recai, exigir-lhe, ainda, a prova de que o patrimônio a descoberto decorre da prática de ato funcional no exercício do cargo ou de um fato específico antecedente representa verdadeiro retrocesso nos sistemas de controle e proteção da moralidade administrativa. Com efeito, dada a evolução cotidiana de sofisticadas técnicas de fraudes de difícil constatação, os instrumentos de combate à corrupção não podem retroceder.

 

44. Portanto, a única interpretação que preserva a essência e utilidade do art. 9º, VII, da Lei de Improbidade Administrativa e tutela adequadamente o direito fundamental à administração proba é aquela que vem sendo adotada pelo Superior Tribunal de Justiça desde a redação original do dispositivo e recentemente reafirmada. Veja-se:

 

MANDADO DE SEGURANÇA. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. AUDITORA DA RECEITA FEDERAL. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. CONHECIMENTO DA AUTORIDADE ADMINISTRATIVA. INSTAURAÇÃO DO PAD. CAUSA INTERRUPTIVA. PRESCRIÇÃO AFASTADA. VIOLAÇÃO DE SIGILO. NÃO OCORRÊNCIA. ART. 198, § 1º, II, DO CTN. SINDICÂNCIA PATRIMONIAL. INAPLICABILIDADE. DECRETO QUE REGULAMENTA A LEI 8.429/92, NÃO A LEI N. 8.112/90. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. FALTA DE NOMEAÇÃO DE CURADOR ESPECIAL AO TEMPO DO PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL QUANDO A IMPETRANTE SE ENCONTRAVA PRESA. NÃO OCORRÊNCIA DE NULIDADE DO PAD. EXERCÍCIO DE AMPLA DEFESA. FALTA DE INTIMAÇÃO A CADA DOCUMENTO NOVO JUNTADO AO PAD. INEXISTÊNCIA DE IRREGULARIDADE. INDEFERIMENTO DE PROVAS E DILIGÊNCIAS POR SEREM PROTELATÓRIAS. REGULARIDADE. ALEGAÇÕES DE DOAÇÕES RECEBIDAS DE GENITOR, DEVIDAMENTE CONSIDERADAS PELA COMISSÃO PROCESSANTE. PATRIMÔNIO A DESCOBERTO EM ÉPOCA EM QUE A IMPETRANTE EXERCIA CARGO JUNTO À RECEITA FEDERAL. AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. (...) 10. A jurisprudência deste Superior Tribunal é no sentido de que em matéria de enriquecimento ilícito, cabe à Administração comprovar o incremento patrimonial significativo e incompatível com as fontes de renda do servidor. Por outro lado, é do servidor acusado o ônus de demonstrar a licitude da evolução patrimonial constatada pela administração, sob pena de configuração de improbidade administrativa por enriquecimento ilícito. Precedentes. (...) 12. A improbidade administrativa consistente em o servidor público amealhar patrimônio a descoberto independe da prova de relação direta entre aquilo que é ilicitamente feito pelo servidor no desempenho do cargo e seu patrimônio a descoberto. Espécie de improbidade em que basta que o patrimônio a descoberto tenha sido amealhado em época em que o servidor exercia cargo público. Precedente: MS n. 19782-DF, Relator Min. Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, DJe 06/04/2016. 13. Segurança denegada. (STJ - MS: 20765 DF 2014/0019045-4, Relator: Ministro BENEDITO GONÇALVES, Data de Julgamento: 08/02/2017, S1 - PRIMEIRA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 14/02/2017). (destacou-se).
 
ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. EVOLUÇÃO PATRIMONIAL A DESCOBERTO. ART. 9º, VII, DA LEI 8.429/1992. CONDUTA ÍMPROBA. PROVA DA ORIGEM LÍCITA. ÔNUS DO AGENTE PÚBLICO. ACÓRDÃO RECORRIDO EM CONTRARIEDADE À JURISPRUDÊNCIA DO STJ. HISTÓRICO DA DEMANDA (...) .4. Evolução patrimonial a descoberto, manifestada por bens materiais, despesas ou estilo de vida incompatíveis com rendimentos efetivamente recebidos, independe de alegação ou prova pelo Estado de conduta ilícita do servidor público. Ao revés, incumbe a este o ônus de cabalmente justificar a origem e a legitimidade do capital ou meios exibidos. Precedentes do STJ .5. Vale destacar que a nova redação do art. 9º, VII, da Lei 8.429/1992, conferida pela Lei 14.230/2021 - em que pese inaplicável ao caso presente ante os limites do quanto decidido pelo STF no Tema 1.199 (irretroatividade do novo regime, salvo em relação às ações em andamento atinentes aos tipos culposos extintos) -, reforça o entendimento jurisprudencial supra-apontado, porque o próprio dispositivo ressalva que será "assegurada a demonstração pelo agente da licitude da origem dessa evolução". (...) (STJ - REsp: 1923138 RJ 2020/0190437-9, Relator: Ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamento: 06/12/2022, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 19/12/2022). (destacou-se)

 

2.3. Ônus probatório e presunção de inocência:

 

45. Prosseguindo com sua argumentação, a UNAFISCO alega que a interpretação proposta pela CNPAD encontraria óbice na nova redação dada aos artigos 17, §19, II e 17-C, I, da Lei nº 8.429, de 1992. Sustenta a impossibilidade de inversão do ônus da prova ou uso de presunções em desfavor do investigado.

 

46. Ao que indica a linha de argumentação exposta pela associação requerente, foi conferida interpretação equivocada ao Parecer n. 00001/2022/CNPAD/CGU/AGU. Não se sustentou a inversão do ônus da prova, proscrita pelo art. 17, §19, II, da Lei nº 8.429, de 1992. Tampouco se defendeu o uso da presunção hominis como atalho de fundamentação, o que é vedado pelo art. 17-C, I, da Lei nº 8.429, de 1992. Explica-se.

 

47. No mencionado parecer, a CNPAD sustentou que a interpretação do conjunto de normas integrantes do sistema de responsabilização por atos de improbidade administrativa, seja sob a vigência da redação original da Lei de Improbidade, seja após as alterações promovidas pela Lei nº 14.230, de 2021, permite concluir que, em matéria de enriquecimento ilícito, cabe à Administração comprovar o incremento patrimonial significativo e incompatível com as fontes de renda do servidor. Por outro lado, é do servidor o ônus de demonstrar a licitude da evolução patrimonial constatada pela Administração, sob pena de configuração de improbidade administrativa.

 

48. O ônus probatório imposto ao servidor pressupõe anterior prova, pela Administração, de evolução patrimonial significativa em descompasso com os rendimentos declarados. Esse ônus se justifica pela quebra do dever legal de transparência pelo servidor investigado, previsto no art. 13 da Lei nº 8.429, de 1992, e no art. 1º da Lei nº 8.730, de 1992.

 

49. A questão se resume, então, ao ônus probatório, o qual incumbe à Administração o dever de comprovar: 1) a efetiva ocorrência do incremento patrimonial, 2) que ele é significativo/efetivamente desproporcional; 3) que este incremento é incompatível com as fontes de renda lícitas e conhecidas do servidor; 4) que ele não tem causa válida – outros rendimentos lícitos e conhecidos; e 5) que o incremento ou variação ocorreu no período em que exerce ou exerceu mandato, cargo, emprego ou função pública. Após todas essas provas pela Administração, opera a presunção legal relativa de que o enriquecimento é ilícito e cabe ao servidor apresentar sua justificativa para o aumento patrimonial, no sentido de demonstrar a sua licitude, podendo, a título exemplificativo, desvincular o respectivo acréscimo patrimonial do exercício do cargo, de modo a, por exemplo, comprovar outra fonte de renda lícita. Se o servidor as apresenta, cabe à Administração avaliar a veracidade das explicações, para aceitá-las ou afastá-las, fundamentadamente, de acordo com a prova constante dos autos.

 

50. Os servidores públicos, por lidarem com bens e interesses coletivos, devem prestar contas não só dos seus atos funcionais, mas da sua evolução patrimonial. É o que prescrevem o art. 13 da Lei nº 8.429, de 1992, e o art. 1º da Lei nº 8.730, de 1992, in verbis:

 

Lei nº 8.429, de 1992 (com a redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021)[9]
Art. 13. A posse e o exercício de agente público ficam condicionados à apresentação de declaração de imposto de renda e proventos de qualquer natureza, que tenha sido apresentada à Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil, a fim de ser arquivada no serviço de pessoal competente.
 
Lei nº 8.730, de 1993
Art. 1º É obrigatória a apresentação de declaração de bens, com indicação das fontes de renda, no momento da posse ou, inexistindo esta, na entrada em exercício de cargo, emprego ou função, bem como no final de cada exercício financeiro, no término da gestão ou mandato e nas hipóteses de exoneração, renúncia ou afastamento definitivo, por parte das autoridades e servidores públicos adiante indicados: (...) (destacou-se)

 

51. O dever de transparência quanto à evolução patrimonial é de tal modo relevante que a legislação comina a pena de demissão aos servidores faltosos e até mesmo crime de responsabilidade aos agentes políticos, como se infere do art. 13, §3º, da Lei nº 8.429, de 1992, e do art. 3º da Lei nº 8.730, de 1993:

 

Lei nº 8.429, de 1992 (com a redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021)
Art. 13. (...)
§ 3º Será apenado com a pena de demissão, sem prejuízo de outras sanções cabíveis, o agente público que se recusar a prestar a declaração dos bens a que se refere o caput deste artigo dentro do prazo determinado ou que prestar declaração falsa.
 
Lei nº 8.730, de 1993
Art. 3º A não apresentação da declaração a que se refere o art. 1º, por ocasião da posse, implicará a não realização daquele ato, ou sua nulidade, se celebrado sem esse requisito essencial.
Parágrafo único. Nas demais hipóteses, a não apresentação da declaração, a falta e atraso de remessa de sua cópia ao Tribunal de Contas da União ou a declaração dolosamente inexata implicarão, conforme o caso:
a) crime de responsabilidade, para o Presidente e o Vice-Presidente da República, os Ministros de Estado e demais autoridades previstas em lei especial, observadas suas disposições; ou
b) infração político-administrativa, crime funcional ou falta grave disciplinar, passível de perda do mandato, demissão do cargo, exoneração do emprego ou destituição da função, além da inabilitação, até cinco anos, para o exercício de novo mandato e de qualquer cargo, emprego ou função pública, observada a legislação específica. (destacou-se)

 

52. Perceba-se, ainda, que a Lei nº 8.730, de 1993, atribui ao servidor o dever de indicar a origem dos recursos que tenham propiciado eventual acréscimo apurado em variação patrimonial e faculta ao órgão de controle exigir provas da legitimidade da procedência dos bens e rendas no período relativo à declaração:

 

Art. 2º A declaração a que se refere o artigo anterior, excluídos os objetos e utensílios de uso doméstico de módico valor, constará de relação pormenorizada dos bens imóveis, móveis, semoventes, títulos ou valores mobiliários, direitos sobre veículos automóveis, embarcações ou aeronaves e dinheiros ou aplicações financeiras que, no País ou no exterior, constituam, separadamente, o patrimônio do declarante e de seus dependentes, na data respectiva. (...)
 
§ 5º Relacionados os bens, direitos e obrigações, o declarante apurará a variação patrimonial ocorrida no período, indicando a origem dos recursos que hajam propiciado o eventual acréscimo. (...)
 
§ 7º O Tribunal de Contas da União poderá:
a) expedir instruções sobre formulários da declaração e prazos máximos de remessa de sua cópia;
b) exigir, a qualquer tempo, a comprovação da legitimidade da procedência dos bens e rendas acrescidos ao patrimônio no período relativo à declaração.

 

53. Como visto, a legislação não deixa margem de dúvida sobre o ônus do servidor de indicar a origem dos recursos que sustentam sua evolução patrimonial não respaldada nos rendimentos conhecidos, normas que seguem válidas após a edição da Lei nº 14.230, de 2021. Os dispositivos citados reforçam a tese da corrente dominante na doutrina e na jurisprudência, segundo a qual o enriquecimento ilícito tipificado no art. 9º, VII, da Lei de Improbidade não implica em inversão do ônus da prova, mas em distribuição equitativa desse ônus, com amparo legal, como sustentam Emerson Garcia e Rogério Pacheco Alves:

 

Compete ao autor o ônus de provar a aquisição de bens de valor desproporcional à renda do agente, sendo este o fato indicante; o fato indicado, por sua vez, é o enriquecimento ilícito, o qual é desdobramento lógico daquele. A evolução patrimonial dos agentes públicos, consoante o art. 13 da Lei nº 8.429/1992, é objeto de rigoroso controle, o que reforça a assertiva de que rendimentos percebidos e bens adquiridos devem evolver de forma correlata, sendo indício veemente de enriquecimento ilícito e, ipso fato, de improbidade, a dissonância existente entre a evolução patrimonial do agente e a contraprestação que lhe fora paga pelo Poder Público pelos serviços prestados. Em casos tais, será flagrante que o ímprobo auferiu vantagens indevidas em razão de sua condição de agente público, o que, por si só, infringe a moralidade administrativa.
 
Não há que se falar em inversão do ônus da prova, restando ao agente público demandado, unicamente, o ônus de provar os fatos modificativos, impeditivos ou extintivos da pretensão do autor, o que deflui da própria sistemática vigente (art. 333, II, do CPC). Essa conclusão é robustecida pelo disposto no art. 2º, § 5º, da Lei nº 8.730/1993, segundo o qual, "relacionados os bens, direitos e obrigações, o declarante apurará a variação patrimonial ocorrida no período, indicando a origem dos recursos que hajam propiciado o eventual acréscimo". (GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério Pacheco. Improbidade administrativa. 4. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris. 2008. p. 327) (destacou-se)
 

54. O que se extrai da interpretação sistemática das Leis nº 8.429, de 1992, e nº 8.730, de 1993, é a justa distribuição do ônus probatório, corolário do princípio da paridade de armas[10]. Enquanto a primeira parte do inciso VII do art. 9º da Lei nº 8.429, de 1992, atribui à Administração o ônus de provar o patrimônio a descoberto durante o exercício do cargo, o art. 2º, §5º, da Lei nº 8.730, de 1993, cumulado com a parte final do inciso VII, do art. 9º, da Lei nº 8.429, de 1992, impõem ao servidor o ônus de provar a origem lícita da variação patrimonial. Outorga-se, assim, ao servidor uma segunda chance de cumprir o dever de transparência imposto pelo art. 13 da Lei nº 8.429, de 1992, e pelo art. 1º da Lei nº 8.730, de 1992, do qual não se desincumbiu a tempo e modo.

 

55. Portanto, a presunção de ilicitude do enriquecimento só se aplica em caso de omissão do servidor quanto ao dever legal de explicar as fontes dos ingressos. Trata-se de presunção relativa legalmente prevista. Tal presunção não se identifica com aquela vedada pelo art.17-C, I, da Lei de Improbidade Administrativa.

 

56. O art.17-C da Lei nº 8.429, de 1992, trata dos requisitos da sentença proferida nas ações civis de improbidade administrativa. O aludido inciso I impõe ao magistrado o dever de indicar de modo preciso os fundamentos que demonstram os elementos dos atos de improbidade previstos na lei, os quais não podem ser presumidos. A norma impede o magistrado de se valer de atalhos na fundamentação, mediante recurso à praesumptio hominis, mas não altera o ônus probatório e as presunções legais dele resultantes, as denominadas praesumptio iuris. Mesmo porque a Lei nº 14.230, de 2021, não revogou o art. 2º, §5º, da Lei nº 8.730, de 1993, que impõe ao servidor o ônus da prova sobre a licitude da variação patrimonial. Ao contrário, reafirmou tal ônus na parte final do inciso VII, do art. 9º, da Lei nº 8.429, de 1992, como demonstrou recentemente o Ministro Herman Benjamin no voto do condutor do Recurso Especial nº 1.923.138-DF:

 

(...) Vale destacar que a nova redação do art. 9º, VII, da Lei 8.429/1992, conferida pela Lei 14.230/2021 – em que pese inaplicável ao caso presente ante os limites do quanto decidido pelo STF no Tema 1.199 (irretroatividade do novo regime, salvo em relação às ações em andamento atinentes aos tipos culposos extintos) –, reforça o entendimento jurisprudencial supra-apontado, porque o próprio dispositivo ressalva que será "assegurada a demonstração pelo agente da licitude da origem dessa evolução", verbis:
 
Art. 9º (...) VII - adquirir, para si ou para outrem, no exercício de mandato, de cargo, de emprego ou de função pública, e em razão deles, bens de qualquer natureza, decorrentes dos atos descritos no caput deste artigo, cujo valor seja desproporcional à evolução do patrimônio ou à renda do agente público, assegurada a demonstração pelo agente da licitude da origem dessa evolução; (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021)
 
Dessa forma, tanto quanto se entendia antes da vigência da Lei 14.230/2021, é ônus do agente público, e não do Estado, demonstrar que a aquisição dos bens ou estilo de vida de valores desproporcionais não ocorreram em razão do exercício do cargo público.”  (STJ - REsp: 1923138 RJ 2020/0190437-9, Relator: Ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamento: 06/12/2022, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 19/12/2022). (destacou-se)

 

57. Desse modo, não se pode acolher a argumentação da UNAFISCO, porquanto dissociada de uma visão integrada do sistema de responsabilização por atos de improbidade administrativa a que alude o art. 1º da Lei nº 8.429, de 1992[11].

 

2.4. Individualização da conduta:

 

58. Por fim, a associação requerente sustenta a necessidade de individualização da conduta do investigado, bem como a demonstração do ato que gerou o enriquecimento ilícito para a configuração do ilícito previsto no art. 9º, inciso VII, da Lei nº 8.429, de 1992. A tese se ampara no combatido argumento da impossibilidade de presunção de ilicitude da evolução patrimonial não explicada.

 

59. O art. 9º, inciso VII, da Lei nº 8.429, de 1992, considera improbidade administrativa a conduta dolosa do agente público de aumentar o patrimônio pessoal sem justificativa legal para tanto. A falta de justificativa razoável faz presumir a relação do enriquecimento com o exercício do cargo. A Lei de Improbidade não impõe à Administração a prova de relação direta entre aquilo que é ilicitamente feito pelo servidor no desempenho do cargo e seu patrimônio a descoberto, o que retiraria toda a utilidade do dispositivo. Não haveria motivos para a Administração apurar o acréscimo patrimonial se pudesse provar, de antemão, o ato de corrupção. Este bastaria para a tipificação da conduta como ato de improbidade em outro tipo infracional.

 

60. O dispositivo em questão somente encontra sentido e utilidade se adequadamente distribuído o ônus probatório, na linha do que prescrevem a Convenção Interamericana contra a Corrupção e a Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, acima citadas. O servidor investigado tem o dever legal de transparência patrimonial, assim como a obrigação de declinar a origem dos bens desproporcionais à sua renda declarada. Exigir prova do ato de corrupção gerador do enriquecimento é ignorar tais preceitos normativos.

 

61. Não há, portanto, no fato típico ímprobo a imposição de que a origem do incremento patrimonial esteja relacionada com desvios no exercício do cargo, o que denota que a hipótese legal considera o simples ato doloso de ostentar patrimônio incompatível com a renda auferida e não justificado legalmente como ato grave violador do princípio da moralidade administrativa.

 

62. Estão demonstradas, assim, as razões pelas quais não há de prosperar o pedido de revisão formulado pela UNAFISCO Nacional. Por outro lado, o pleito denota a controvérsia sobre a interpretação a ser conferida ao art. 9º, inciso VII, da Lei nº 8.429 de 1992, com a redação que lhe conferiu a Lei nº 14.230, de 2021. Essa questão tem potencial para gerar entendimentos divergentes no seio da Administração, levando a diferentes decisões administrativas em casos similares, com prejuízos irreparáveis à isonomia entre os servidores acusados e à segurança jurídica esperada na condução dos processos administrativos.

 

63. Desse modo, considerando-se que a igualdade perante a lei e a segurança jurídica são vetores da Administração Pública, consoante o art. 5º, caput, da Constituição Federal e o art. 30 da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (Decreto-Lei nº 4.657, de 1942), bem como diante do respaldo jurisprudencial[12] conferido à tese aqui esposada, mostra-se relevante que se confiram efeitos vinculantes no âmbito da Administração Pública Federal ao presente opinativo, nos termos do art. 40 da Lei Complementar nº 73, de 1993.

 

III - CONCLUSÃO:

 

64. Ante o exposto, uma vez devidamente contestados os argumentos da tese revisional e demonstrado o recente alinhamento do Superior Tribunal de Justiça à tese defendida pela Câmara Nacional de Procedimentos Administrativos Disciplinares, não merece prosperar a argumentação externada pela Requerente, de modo que deve ser indeferido o pedido de revisão do PARECER n. 00001/2022/CNPAD/CGU/AGU.

 

65. Ademais, com vistas a se atribuir efeitos vinculantes no âmbito da Administração Pública Federal ao posicionamento consubstanciado neste opinativo, propõe-se a adoção do procedimento previsto no art. 40, § 1º, da Lei Complementar nº 73/1993, de modo a se entender que, em relação à interpretação do disposto no art. 9º, inciso VII, da Lei nº 8.429/1992, com redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021:

 

a) a nova redação conferida ao dispositivo incorporou o entendimento jurisprudencial e administrativo consolidado, dispensando a prova do ato ilícito ensejador do enriquecimento;
 
b) o dolo do tipo está na vontade e consciência de adquirir, para si ou para outrem, no exercício de mandato, de cargo, de emprego ou de função pública, e em razão deles, bens de qualquer natureza, cujo valor seja desproporcional à evolução do patrimônio ou à renda do agente público, dispensada outra motivação especial;
 
c) a nova redação atribuída ao dispositivo reforça a presunção legal de que a variação patrimonial a descoberto tem relação com o exercício do cargo e sua licitude deve ser provada pelo servidor; e
 
d) quanto ao ônus probatório, incumbe à Administração Pública provar (i) a efetiva ocorrência do incremento patrimonial do servidor público, (ii) que esse incremento é significativo/efetivamente desproporcional com as suas fontes de renda lícitas e conhecidas, (iii) que ele não tem causa válida – outros rendimentos lícitos e conhecidos e (iv) que o incremento ou variação adveio do período em que o servidor público exerce ou exerceu mandato, cargo, emprego ou função pública, de modo que, provadas essas circunstâncias, opera a presunção legal relativa de que o enriquecimento é ilícito e cabe ao servidor público provar a licitude do incremento patrimonial apurado. Se o servidor público justifica o incremento patrimonial, cabe à Administração avaliar a veracidade das explicações para aceitá-las ou afastá-las, fundamentadamente, de acordo com a prova constante dos autos.

 

 

À consideração superior.

 

 

Brasília, 26 de março de 2024.

 

 

 

Guilherme Raso Marques

Procurador da Fazenda Nacional

Relator

Mila Kothe

Procuradora da Fazenda Nacional

Relatora


[1] Vide, a propósito, a Súmula 473 do Supremo Tribunal Federal: “A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial.

 

[2]Art. 9o São legitimados como interessados no processo administrativo: (...) III - as organizações e associações representativas, no tocante a direitos e interesses coletivos;”.

 

[3] A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça há muito se firmou nesse sentido. Vide, a propósito, o Mandado de Segurança nº 20.765 - DF, Relator Ministro Benedito Gonçalves, Data de Julgamento: 08/02/2017, S1 - Primeira Seção, Data de Publicação: DJe 14/02/2017 e Mandado de Segurança nº 19782 - DF, Relator Ministro Mauro Campbell Marques, Data de Julgamento: 09/12/2015, S1 - Primeira Seção, Data de Publicação: DJe 06/04/2016.

 

[4] Art. 1º O sistema de responsabilização por atos de improbidade administrativa tutelará a probidade na organização do Estado e no exercício de suas funções, como forma de assegurar a integridade do patrimônio público e social, nos termos desta Lei. (...) 

§ 2º Considera-se dolo a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito tipificado nos arts. 9º, 10 e 11 desta Lei, não bastando a voluntariedade do agente. (...)

Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública a ação ou omissão dolosa que viole os deveres de honestidade, de imparcialidade e de legalidade, caracterizada por uma das seguintes condutas: (...)

§ 1º Nos termos da Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, promulgada pelo Decreto nº 5.687, de 31 de janeiro de 2006, somente haverá improbidade administrativa, na aplicação deste artigo, quando for comprovado na conduta funcional do agente público o fim de obter proveito ou benefício indevido para si ou para outra pessoa ou entidade. 

§ 2º Aplica-se o disposto no § 1º deste artigo a quaisquer atos de improbidade administrativa tipificados nesta Lei e em leis especiais e a quaisquer outros tipos especiais de improbidade administrativa instituídos por lei. (...)

 

[5] Art. 17. A ação para a aplicação das sanções de que trata esta Lei será proposta pelo Ministério Público e seguirá o procedimento comum previsto na Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil), salvo o disposto nesta Lei. (...)

§ 19. Não se aplicam na ação de improbidade administrativa:

I - a presunção de veracidade dos fatos alegados pelo autor em caso de revelia; 

II - a imposição de ônus da prova ao réu, na forma dos §§ 1º 2º do art. 373 da Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil); 

III - o ajuizamento de mais de uma ação de improbidade administrativa pelo mesmo fato, competindo ao Conselho Nacional do Ministério Público dirimir conflitos de atribuições entre membros de Ministérios Públicos distintos;

IV - o reexame obrigatório da sentença de improcedência ou de extinção sem resolução de mérito. (...)

Art. 17-C. A sentença proferida nos processos a que se refere esta Lei deverá, além de observar o disposto no art. 489 da Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil):  

I - indicar de modo preciso os fundamentos que demonstram os elementos a que se referem os arts. 9º, 10 e 11 desta Lei, que não podem ser presumidos; (...)

 

[6] Art. 9° Constitui ato de improbidade administrativa importando enriquecimento ilícito auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividade nas entidades mencionadas no art. 1° desta lei, e notadamente: (...) VII - adquirir, para si ou para outrem, no exercício de mandato, cargo, emprego ou função pública, bens de qualquer natureza cujo valor seja desproporcional à evolução do patrimônio ou à renda do agente público; (...)

 

[7] Disponível em: http://www.mpf.mp.br/pgr/documentos/NTOrientao12.2021.pdf

 

[8] Recurso Extraordinário nº 466.343/SP.

 

[9] A obrigação de declaração de bens já constava na redação original da Lei de Improbidade Administrativa nos seguintes termos: “Art. 13. A posse e o exercício de agente público ficam condicionados à apresentação de declaração dos bens e valores que compõem o seu patrimônio privado, a fim de ser arquivada no serviço de pessoal competente.”

 

[10] O princípio da paridade de armas foi positivado no CPC/15 nos seguintes termos: “Art. 7º É assegurada às partes paridade de tratamento em relação ao exercício de direitos e faculdades processuais, aos meios de defesa, aos ônus, aos deveres e à aplicação de sanções processuais, competindo ao juiz zelar pelo efetivo contraditório.”

 

[11] Art. 1º O sistema de responsabilização por atos de improbidade administrativa tutelará a probidade na organização do Estado e no exercício de suas funções, como forma de assegurar a integridade do patrimônio público e social, nos termos desta Lei.

 

[12] STJ - REsp: 1923138 RJ 2020/0190437-9, Relator: Ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamento: 06/12/2022, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 19/12/2022.


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