ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA JUNTO AO MINISTÉRIO DA CULTURA
COORDENAÇÃO-GERAL DE PARCERIAS E COOPERAÇÃO FEDERATIVA


PARECER n. 00060/2024/CONJUR-MINC/CGU/AGU

 

NUP: 01400.007404/2024-60

INTERESSADOS: GABINETE SAV/GAB/SAV/GM/MINC

ASSUNTOS: ATOS INTERNACIONAIS. DELEGAÇÃO DE COMPETÊNCIA.

 

EMENTA:
I. Direito Administrativo. Consulta. 
II. Delegação de competência. Atos internacionais. Interpretação restritiva. 
III. Decreto nº 11.336, 1º de janeiro de 2023. Portaria MinC nº 18, de 10 de abril de 2023. Decreto nº 6.835, de 30 de abril de 2009. Portaria nº 31, de 29 de maio de 2009.

 

RELATÓRIO

 

Por meio do Ofício nº 280/2024/SAV/GAB/SAV/GM/MinC (SEI nº 1675712), a Secretaria do Audiovisual encaminha a esta Consultoria Jurídica consulta acerca da possibilidade de formalização de acordos internacionais pela titular da Secretaria, com fundamento na Portaria MinC nº 18, de 10 de abril de 2023 ou na Portaria nº 31, de 29 de maio de 2009.

 

Destaca o documento técnico que o setor audiovisual se evidencia, entre outros fatores, pela intensa agenda de eventos e acordos internacionais, pautas que são acompanhadas e eventualmente lideradas pela Secretaria do Audiovisual - SAV. Assim, a SAV trabalha na organização de fluxos e demandas, inclusive representando o Ministério na Reunião Especializada de Autoridades Cinematográficas e Audiovisuais do MERCOSUL - RECAM.

 

Após citar a Portaria MinC nº 18, de 10 de abril de 2023, e a Portaria nº 31, de 29 de maio de 2009, indaga o órgão técnico a esta Consultoria Jurídica:

 

 

É o relatório.

 

FUNDAMENTAÇÃO

 

A presente manifestação se dá em cumprimento ao disposto no art. 11, da Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993, abstraídas as questões de ordem técnica e financeira, ou ainda aspectos de conveniência e oportunidade, alheios à missão deste órgão, nos termos do Enunciado de Boas Práticas Consultivas AGU nº 7:

 

“A manifestação consultiva que adentrar questão jurídica com potencial de significativo reflexo em aspecto técnico deve conter justificativa da necessidade de fazê-lo, evitando-se posicionamentos conclusivos sobre temas não jurídicos, tais como os técnicos, administrativos ou de conveniência ou oportunidade, podendo-se, porém, sobre estes emitir opinião ou formular recomendações, desde que enfatizando o caráter discricionário de seu acatamento” (Manual de Boas Práticas Consultivas. 4. ed. Brasília: AGU, 2016, página 32).

 

Como mencionado, trata-se de consulta efetuada pela Secretaria do Audiovisual acerca da possibilidade de formalização de acordos internacionais pela titular da Secretaria, com fundamento na Portaria MinC nº 18, de 10 de abril de 2023, ou na Portaria nº 31, de 29 de maio de 2009.

 

Atualmente, a delegação de competência, no âmbito do Ministério da Cultura, é materializada pela Portaria MinC nº 18, de 10 de abril de 2023. Através do normativo, a titular da Pasta Ministerial efetuou a seguinte delegação, no que concerne às parcerias:

 

Art. 5º Fica delegado aos titulares da Secretaria-Executiva e das Secretarias do Ministério da Cultura e seus respectivos ordenadores de despesa o exercício da competência para celebração de convênios, contratos administrativos, termos de colaboração, termos de fomento, acordos de cooperação, termos de execução descentralizada, e instrumentos congêneres, no âmbito da competência de sua unidade.
§ 1º Fica vedada a subdelegação da competência de que trata do caput, no que se refere à celebração de termos de fomento e termos de colaboração.
§ 2º Ficam excluídos da delegação estabelecida no caput os convênios ou contratos de repasse com entidades privadas sem fins lucrativos, que deverão observar o disposto no Decreto nº 6.170, de 25 de julho de 2007, e na Portaria Interministerial nº 424, de 30 de dezembro de 2016, dos extintos Ministérios do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão, da Fazenda e da Transparência, Fiscalização e Controladoria-Geral da União.
§ 3º A competência delegada no caput inclui autorização para firmar os respectivos termos aditivos, inclusive os que visem à conversão de convênios e instrumentos congêneres em termos de fomento ou colaboração.

 

Segundo o entendimento da Secretaria do Audiovisual, a norma acima transcrita indica "a capacidade dos titulares das Secretarias em firmarem acordos de cooperação, mas sem especificar o alcance dessa delegação".

 

Observa-se que a Portaria não faz menção expressa aos acordos internacionais. Pelo contrário, todos os instrumentos listados, no âmbito de parcerias, são celebrados com entes públicos ou privados nacionais.

 

É o que ocorre atualmente com convênios e acordo de cooperação técnica (Decreto nº 11.531, de 2023); termos de colaboração, termos de fomento e acordos de cooperação (Lei nº 13.019, de 2014 e Decreto nº 8.726, de 2016); e termos de execução descentralizada (Decreto nº 10.426, de 2020).

 

Desta forma, ante a ausência de previsão expressa, englobar parcerias internacionais só seria possível através de uma interpretação ampliativa da Portaria de delegação de competência.

 

Ocorre que a interpretação das portarias de delegação de competência não deve ser realizada de forma extensiva, ou seja, não se deve ampliar o alcance das competências delegadas além do que foi expressamente previsto na norma. Tal posicionamento se fundamenta na necessidade de preservar a legalidade e a segurança jurídica, evitando interpretações diversas, à margem do consentimento do titular da Pasta, e que podem gerar conflitos de interesse e competência.

 

Ademais, a interpretação ampliativa das portarias de delegação de competência poderia comprometer a eficácia da Administração Pública, ao desvirtuar o objetivo da delegação e criar situações de incerteza e instabilidade nas relações administrativas. Portanto, é imprescindível que a interpretação dessas normas seja realizada de forma restritiva, observando rigorosamente os limites estabelecidos pelo texto normativo e pela legislação aplicável.

 

O segundo questionamento diz respeito à vigência e eficácia da Portaria MinC nº 31, de 2009, que expressa:

 

O MINISTRO DE ESTADO DA CULTURA, no uso das atribuições que lhe são conferidas pelos incisos I e II do parágrafo único do art. 87 da Constituição Federal de 1988, pela Lei nº 10.683, de 28 de maio de 2003 e pelo Decreto nº 6.835, de 30 de abril de 2009, resolve:
Art. 1º Delegar competência ao Secretário do Audiovisual para assinar os atos necessários à implementação de Programas Internacionais do Ministério da Cultura relativos às atividades audiovisuais e cinematográficas no âmbito da cooperação internacional e do intercâmbio cultural.
Art. 2º Delegar competência ao Diretor-Presidente da Agência Nacional do Cinema (ANCINE) para assinar os atos necessários à implementação de Programas Internacionais relativos às atividades audiovisuais e cinematográficas no âmbito da co-produção e co-distribuição.
Art. 3º Designar o Secretário do Audiovisual representante do Brasil junto a Reunião Especializada de Autoridades Cinematográficas e Audiovisuais do MERCOSUL - RECAM.
Art. 4º Designar o Diretor Presidente da Agência Nacional do Cinema (ANCINE) representante do Brasil junto a Conferência de Autoridades Audiovisuais e Cinematográficas Iberoamericanas - CAACI.
Art. 5º Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação e revoga a Portaria nº 171, de 11 de agosto de 2005.
 

Primeiro ponto que deve ser verificado é se a norma de 2009 continua vigente após quase 15 (quinze) anos e diversas alterações na estrutura administrativa.

 

O Ministério da Cultura tem que possuir esta informação, uma vez que o Decreto nº 10.139, de 28 de novembro de 2019, determinou a consolidação de todos os atos normativos inferiores a Decreto, estipulando prazos para esta revisão, que já se encerraram. O tema, inclusive, já havia sido objeto de manifestação pela então Consultoria Jurídica junto ao Ministério do Turismo, que concluiu no PARECER n. 00315/2022/CONJUR-MTUR/CGU/AGU (72031.005070/2020-50):

 

CONCLUSÃO
33. Com efeito, sugere-se a avaliação técnica quanto à da Portaria nº 31, de 29 de maio de 2009, editada pelo extinto Ministério da Cultura, juntada aos autos com vistas a comprovar as delegações de competência, uma vez que pode estar enquadrada na necessária revisão de atos normativos prevista no Decreto nº 10.139, de 28 de novembro de 2019, que "Dispõe sobre a revisão e a consolidação dos atos normativos inferiores a decreto".
(...)

 

Pressupondo que a norma apresentada esteja vigente, é necessário analisar e responder: a mencionada norma ainda possui fundamento para manter a plena aplicabilidade mesmo sem autorização expressa da atual Ministra de Estado?

 

Observando o preâmbulo da Portaria MinC nº 31, de 2009, verifica-se que aquela delegação de competência para "assinar os atos necessários à implementação de Programas Internacionais do Ministério da Cultura" se fundamentava no Decreto nº 6.835, de 30 de abril de 2009.

 

O Decreto nº 6.835, de 30 de abril de 2009 aprovava a estrutura regimental do Ministério da Cultura no longínquo ano de 2009, dispondo como competência da SAV:

 

Art. 14.  À Secretaria do Audiovisual compete:
(...)
X - acompanhar a elaboração dos tratados e convenções internacionais sobre o audiovisual e cinema, identificando e orientando as atividades necessárias à sua aplicação;
(...)
XIV - representar o Brasil em organismos e eventos internacionais relativos às atividades cinematográficas e audiovisuais; e
(...)

 

 

A mencionada norma encontra-se revogada desde 2012.

 

Atualmente a estrutura do Ministério da Cultura é disciplinada pelo Decreto nº 11.336, de 2023, não sendo listada, entre as competências da Secretaria do Audiovisual (art. 33), nenhuma referência expressa a tratados e convenções internacionais, como existia no ano de 2009.

 

Dessa forma, não há como se depreender da Portaria nº 31, de 2009, uma manifestação de vontade ou delegação à Secretária do Audiovisual, pois as competências de que trata a norma em questão não se encontram atualmente expressas no Decreto nº 11.336, de 2023, que é a norma atualmente vigente.

 

Assim, s.m.j., entende-se que a delegação de competência indagada pela Secretaria do Audiovisual só pode ocorrer após uma norma de delegação de competência expressa da atual Ministra de Estado, que será analisada sob seus aspectos jurídicos, uma vez que a Portaria MinC nº 31, de 2009, ainda que vigente, não guarda harmonia expressa com o atual Decreto nº 11.336, de 2023 e a norma atual de delegação de competência (Portaria MinC nº 18, de 2023) não delega expressamente a prática de atos internacionais.

 

 

CONCLUSÃO

 

Diante do exposto, ressalvados os aspectos técnicos de conveniência e de oportunidade não sujeitos ao crivo desta Consultoria Jurídica, em resposta à consulta efetuada pela Secretaria do Audiovisual, entende-se que:

 

a) a delegação de competências do art. 5º da Portaria MinC nº 18, de 2023, é suficiente para respaldar a formalização de acordos de cooperação internacionais?

Não, por ausência de delegação expressa (itens 7 a 13 desta manifestação).

 

b) caso a resposta ao item 'a' seja negativa, a Portaria MinC nº 31, de 2009, ainda é vigente e capaz de produzir esse efeito?

A Portaria MinC nº 31, de 2009 não é capaz de produzir o efeito pretendido, uma vez que, ainda que vigente, não guarda harmonia expressa com o atual Decreto nº 11.336, de 2023, não havendo, portanto, como se depreender do ato uma manifestação de vontade favorável do Presidente da República ou da Ministra de Estado, para se operar a delegação da prática dos atos internacionais à Secretária do Audiovisual (itens 14 a 23 desta manifestação).

 

É o parecer. À consideração superior.

 

Brasília, 02 de abril de 2024.

 

 

(assinatura eletrônica)

GUSTAVO ALMEIDA DIAS

Advogado da União

 

 


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