ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA JUNTO AO MINISTÉRIO DA CULTURA
COORDENAÇÃO-GERAL DE PARCERIAS E COOPERAÇÃO FEDERATIVA

 

PARECER n. 00077/2024/CONJUR-MINC/CGU/AGU

 

NUP: 01400.006479/2023-42

INTERESSADOS: ASSESSORIA PARLAMENTAR DO MINISTÉRIO DA CULTURA - ASPAR/MINC

ASSUNTOS: CONVÊNIO.

 

EMENTA: Direito Administrativo. Convênio. Execução do convênio por autarquia vinculada ao ente público convenente. Personalidade jurídica distinta do Município. Possibilidade de celebração de termo aditivo para inclusão de unidade executora.
 

 

Tratam os autos do Convênio n. 941747/2023, celebrado em 25/10/2023, entre a União/Ministério da Cultura, representada pela Secretaria de Cidadania e Diversidade Cultural - SCDC, e o Município de Serra Talhada - PE, tendo por objeto a realização do Festival de Forró e Cultura Popular, na comunidade rural de tradição cultural, Fazenda São Miguel, no município de Serra Talhada – PE (SEI 1467324).

Por meio do Despacho ao final do Parecer n. 1/2024/DIFOR/CPDC/CGPDC/DPDC/SCDC/GM (SEI 1693826), a Secretária de Cidadania e Diversidade Cultural solicita a esta Consultoria Jurídica análise e manifestação sobre questionamento exposto pelo órgão no mencionado Parecer.

Relata a SCDC que, apesar de o Convênio em questão ter sido celebrado com o Município, o processo licitatório foi conduzido pela Fundação Cultural de Serra Talhada, criada pela Lei nº 621/86 (SEI nº 1692544 págs. 7 e 8) e reestruturada pela Lei nº 1.561/2016 (SEI nº 1692544 págs. 9 a 16) e toda a documentação tem como signatário o Diretor-Presidente da Fundação, Sr. Josenildo André Barboza. 

Constatado tal fato, a SCDC diligenciou o convenente (SEI nº 1681946) solicitando a comprovação da delegação de competência, tendo em vista que a Fundação de Cultura de Serra Talhada não figura como partícipe no Convênio. Em resposta ao Ofício, o convenente enviou as leis de criação da Fundação supracitadas e a nomeação do Diretor-Presidente (SEI nº 1692544, pág. 1). Observa-se que a Fundação possui autonomia administrativa, financeira e disciplinar de acordo com o art. 1º da Lei º 1.561/2016.

A SCDC destaca que o inciso XX do art. 2º da Lei Municipal nº 1.561/2016 prevê que é um dos objetivos da Fundação realizar, promover e executar as festividades públicas tradicionais ou religiosas, permanentemente ou eventualmente, bem como custear com recursos públicos e/ou privados de pessoas físicas ou jurídicas, nacionais ou estrangeiras, para a contratação de artistas, atrações, bandas, palcos, som, iluminação e demais equipamentos e estruturas necessárias ao evento. Além desse inciso, o art. 21 da mesma lei dispõe que a Fundação Pública poderá firmar acordos, contratos, termos de compromisso, protocolos ou convênios com a União, os Estados e os Municípios, com Governos de outros países, com entidades públicas ou privadas, com pessoas jurídicas ou físicas, tanto nacionais como estrangeiras para a consecução de seus objetivos.

Diante do exposto, considerando que tais dispositivos não tratam especificamente da delegação de competência para realização do processo licitatório e execução do convênio em tela, considerando que a Fundação não figura como unidade executora neste instrumento, a SCDC solicita análise e manifestação desta Consultoria Jurídica no sentido de elucidar se os dispositivos trazidos pelo convenente são suficientes e, portanto, possibilitam que a Fundação possa executar o convênio (bem como o respectivo processo licitatório), ainda que o instrumento tenha sido celebrado com a Prefeitura, e ainda que a Fundação não figure como unidade executora.

É o relatório.

 

ANÁLISE JURÍDICA

 

A presente manifestação se dá em cumprimento ao disposto no art. 11, da Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993, abstraídas as questões de ordem técnica e financeira, ou ainda aspectos de conveniência e oportunidade, alheios à missão deste órgão, nos termos do Enunciado de Boas Práticas Consultivas AGU nº 7:

“A manifestação consultiva que adentrar questão jurídica com potencial de significativo reflexo em aspecto técnico deve conter justificativa da necessidade de fazê-lo, evitando-se posicionamentos conclusivos sobre temas não jurídicos, tais como os técnicos, administrativos ou de conveniência ou oportunidade, podendo-se, porém, sobre estes emitir opinião ou formular recomendações, desde que enfatizando o caráter discricionário de seu acatamento” (Manual de Boas Práticas Consultivas. 4. ed. Brasília: AGU, 2016, página 32).

 

Na presente consulta, a SCDC questiona sobre a possibilidade de a Fundação Cultural de Serra Talhada executar o Convênio n. 941747/2023, celebrado pelo Ministério diretamente com o Município de Serra Talhada, sem que a Fundação figure como unidade executora no instrumento.​

O Convênio em questão, celebrado em 25/10/2023, é regido pelo Decreto nº 11.531, de 16 de maio de 2023 e pela Portaria Conjunta MGI/MF/CGU nº 33, de 30 de agosto de 2023.

Inicialmente, vale mencionar que um Convênio tem, em regra, duas partes: o concedente e o convenente, assim definidas no art. 10 da Portaria Conjunta, n. 33/2023:

 

V - concedente: órgão ou entidade da administração pública federal responsável pela transferência dos recursos financeiros destinados à execução do objeto de convênio ou de contrato de repasse;
VII - convenente: órgão ou entidade estadual, distrital ou municipal, consórcio público ou entidade privada sem fins lucrativos, com o qual a administração pública federal pactua a execução de programa, projeto, atividade, obra ou serviço de engenharia, mediante celebração de convênio ou de contrato de repasse;

 

No caso dos autos, o concedente é a União, representada pelo Ministério da Cultura/SCDC, e o convenente é o Município de Serra Talhada.

Dito isso, observo que, no Direito brasileiro, são consideradas pessoas jurídicas de direito público interno aquelas indicadas no art. 41 do Código Civil (Lei n. 10.406/2002):

 

Art. 41. São pessoas jurídicas de direito público interno:
I - a União;
II - os Estados, o Distrito Federal e os Territórios;
III - os Municípios;
IV - as autarquias, inclusive as associações públicas; (Redação dada pela Lei nº 11.107, de 2005)
V - as demais entidades de caráter público criadas por lei.
Parágrafo único. Salvo disposição em contrário, as pessoas jurídicas de direito público, a que se tenha dado estrutura de direito privado, regem-se, no que couber, quanto ao seu funcionamento, pelas normas deste Código.
 

Portanto, a União, Estados, DF, Municípios e autarquias são pessoas jurídicas de direito público interno e podem figurar como concedentes ou convenentes em um Convênio. 

No entanto, caso o convênio seja firmado com uma Secretaria Municipal de Cultura, por exemplo, o titular desta precisaria ter competência delegada pelo Prefeito, ou, alternativamente, o Município, representado pelo Prefeito, poderia figurar como interveniente, em conformidade com o que dispõe o §3º do art. 38 da Portaria Conjunta nº 33, de 2023:

§ 3º Na hipótese de o instrumento vir a ser firmado por entidade ou órgão do estado, do Distrito Federal ou do município, o ente federado ao qual esteja vinculado ou subordinado deverá participar como interveniente, salvo se o representante legal da entidade ou do órgão tiver competência para assinar o instrumento, conforme as normas locais.

 

Isso porque as Secretarias de Cultura (ao contrário das autarquias) não têm personalidade jurídica de direito público interno, conforme consta do art. 41, inciso IV, do Código Civil (acima transcrito).

Voltando ao caso dos autos, observa-se que a Fundação Cultural de Serra Talhada tem personalidade jurídica de direito público, com autonomia administrativa, financeira e disciplinar, conforme consta da Lei Municipal nº 1.561/2016 - SEI nº 1692544 págs. 9 a 16. Trata-se realmente de uma autarquia que, portanto, poderia figurar como convenente no instrumento, representada por seu Diretor-Presidente, sem que a Prefeita precisasse lhe delegar competências para tanto.

No entanto, não foi o que aconteceu no caso dos autos. O Município de Serra Talhada figura como convenente no Convênio n. 941747/2023 e, para todos os efeitos, é o ente público responsável pela execução do instrumento.

Como bem apontado pela SCDC, para que a Fundação Cultural possa atuar no Convênio n. 941747/2023, ela precisaria ser indicada como Unidade Executora, que é assim definida pelo art. 10, VIII, da Portaria Conjunta n. 33/2023:

VIII - unidade executora: órgão ou entidade da administração pública direta ou indireta de qualquer esfera de governo, inclusive consórcio público de direito público, partícipe no instrumento, sobre o qual recai a responsabilidade pela execução do objeto pactuado, a critério do convenente, desde que aprovado previamente pelo concedente ou pela mandatária;
 

O art. 36 da Portaria Conjunta nº 33/2023 detalha a atuação da unidade executora nos seguintes termos:

 

Art. 36. Quando o convenente for entidade ou órgão público, inclusive consórcios públicos de direito público, a execução do objeto poderá recair sobre unidade executora específica, desde que:
I - tenha previsão no plano de trabalho aprovado;
II - exista cláusula no instrumento celebrado estabelecendo que a execução dar-se-á pela unidade executora; e
III - a unidade executora pertença ou esteja vinculada ao convenente.
§ 1º No caso descrito no caput, o convenente continuará responsável pela execução do instrumento, sendo que a unidade executora responderá solidariamente na relação estabelecida.
§ 2º Quando constatada irregularidade na execução do objeto pactuado, desvio ou malversação de recursos públicos, responderão solidariamente os titulares do convenente e da unidade executora, na medida de seus atos, competências e atribuições.
§ 3º A responsabilização prevista nos §§ 1º e 2º deverá constar no instrumento celebrado, como cláusula necessária.
§ 4º A unidade executora deverá atender a todos os dispositivos desta Portaria Conjunta que sejam aplicáveis ao convenente, inclusive os requisitos de cadastramento e condições de celebração.
§ 5º Os empenhos e a conta bancária do instrumento serão realizados em nome do convenente.
§ 6º Os atos e procedimentos relativos à execução serão realizados pelo convenente ou unidade executora no Transferegov.br.
§ 7º Os convenentes serão responsáveis pelo acompanhamento, fiscalização e prestação de contas quando o objeto do instrumento recair sobre unidade executora específica.

 

Portanto, a unidade executora deve pertencer ou estar vinculada ao convenente, e para sua participação na avença, deve-se inserir no instrumento cláusula estabelecendo que a execução dar-se-á pela unidade executora e sua presença também deve ser prevista no plano de trabalho. 

A unidade executora deverá atender a todos os dispositivos da Portaria Conjunta nº 33/2023 que sejam aplicáveis ao convenente, inclusive os requisitos de cadastramento e condições de celebração (art. 36, § 4º).

Destaca-se também que mesmo com a presença da unidade executora, o convenente continuará responsável pela execução do instrumento, sendo que a unidade executora responderá solidariamente na relação estabelecida (art. 36, § 1º).

Portanto, face ao cenário normativo exposto, os partícipes têm duas opções para regularizar a execução do Convênio em tela:

(i) o Município assumir diretamente a execução do Convênio, conforme combinado inicialmente entre as partes; ou

(ii) as partes concordarem em inserir a Fundação Cultural como unidade executora no instrumento, por meio de termo aditivo que indique a qualificação completa e as obrigações da autarquia e da convenente para com esta, bem como as alterações necessárias no plano de trabalho.

Observo que a minuta-padrão da AGU [1] contém todas as cláusulas e informações necessárias para guiar a elaboração de um termo aditivo visando a inclusão da unidade executora, caso este seja o caminho escolhido.

Ressalto, por fim, que o representante da unidade executora deverá assinar o termo aditivo e demonstrar o cumprimento de todas as exigências aplicáveis ao Convenente, conforme determina o art. 36 § 4º e art. 38, § 1º, da Portaria Conjunta n. 33/2023.

 

 

CONCLUSÃO

 

Diante do exposto, e ressalvados os aspectos técnicos de conveniência e de oportunidade não sujeitos ao crivo desta Consultoria Jurídica, em resposta à consulta efetuada pela SCDC/MINC,  entende-se que a Fundação Cultural de Serra Talhada é pessoa jurídica distinta do Município e, não sendo partícipe no Convênio n. 941747/2023, não tem competência para executar este Convênio específico, por mais que tenha competência para celebrar convênios diretamente com o Ministério.

Caso o Município de Serra Talhada deseje inserir a Fundação Cultural como unidade executora do Convênio, e a SCDC esteja de acordo com essa opção, um termo aditivo poderá ser celebrado com essa finalidade, seguindo as normas da Portaria Conjunta n. 33/2023 e as cláusulas aplicáveis da minuta-padrão da AGU.

Isso posto, submeto o presente Parecer à consideração superior, recomendando seu encaminhamento à Secretaria da Cidadania e Diversidade Cultural, para ciência e providências cabíveis.

 

Brasília, 15 de abril de 2024.

 

 

DANIELA GUIMARÃES GOULART

Advogada da União

 

Nota:

[1] https://www.gov.br/agu/pt-br/composicao/cgu/cgu/modelos/conveniosecongeneres/modelo-de-minuta-para-convenios-com-orgao-ou-ente-publico-sem-obras-ou-servico-de-engenharia-setembro-2023.pdf


Atenção, a consulta ao processo eletrônico está disponível em https://supersapiens.agu.gov.br mediante o fornecimento do Número Único de Protocolo (NUP) 01400006479202342 e da chave de acesso b7bcf143

 




Documento assinado eletronicamente por DANIELA GUIMARÃES GOULART, com certificado A1 institucional (*.agu.gov.br), de acordo com os normativos legais aplicáveis. A conferência da autenticidade do documento está disponível com o código 1466287604 no endereço eletrônico http://sapiens.agu.gov.br. Informações adicionais: Signatário (a): DANIELA GUIMARÃES GOULART, com certificado A1 institucional (*.agu.gov.br). Data e Hora: 15-04-2024 10:06. Número de Série: 65437255745187764576406211080. Emissor: Autoridade Certificadora do SERPRO SSLv1.