ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA JUNTO AO MINISTÉRIO DA CULTURA
COORDENAÇÃO-GERAL DE PARCERIAS E COOPERAÇÃO FEDERATIVA

 

PARECER n. 00095/2024/CONJUR-MINC/CGU/AGU

 

NUP: 01400.025839/2017-67

INTERESSADOS: SECRETARIA DA CIDADANIA E DIVERSIDADE CULTURAL

ASSUNTO: MINUTA DE INSTRUÇÃO NORMATIVA. POLÍTICA NACIONAL DE CULTURA VIVA.

 

 

 EMENTA: I. Administrativo. Ato normativo. Minuta de Instrução Normativa que visa e dispor sobre a concessão de prêmios e bolsas da Política Nacional de Cultura Viva e alterar a IN/MinC n. 08/2016. II. Regulamentação da Lei nº 13.018/2014, que institui a Política Nacional de Cultura Viva. III. Competência da Ministra de Estado da Cultura para dispor sobre a matéria. IV. Parecer favorável, com recomendações.

 

 

RELATÓRIO

 

Por meio do DESPACHO Nº 1718640/2024, o Diretor da Política Nacional de Cultura Viva solicita análise e manifestação sobre minuta de Instrução Normativa que visa dispor sobre a concessão de bolsas e prêmios da Política Nacional de Cultura Viva - PNCV, e alterar, em aspectos pontuais, a Instrução Normativa/MinC nº 8, de 11 de maio de 2016 (SEI 1718259).

Sob o ponto de vista do mérito administrativo, a proposta de Instrução Normativa encontra-se fundamentada na Nota Técnica nº 8/2024 (SEI 1718239), da Diretoria da Política Nacional de Cultura Viva.

Uma vez recebida a consulta nesta Consultoria Jurídica, o seu titular interino, com fundamento no art. 4º, § 3º, da Portaria MinC nº 121/2024, encaminhou os autos à Subsecretaria de Gestão Estratégica, com vistas à avaliação da necessidade de eventual discussão da proposta no âmbito do Comitê Interno de Governança do Ministério da Cultura, ou de eventuais procedimentos prévios de consulta pública, especialmente considerando a existência de iniciativa similar em andamento naquela subsecretaria com o objetivo de sistematizar de forma abrangente a normatização de editais nas políticas de cultura (SEI 1720919).

Por meio do Ofício nº 4/2024/CGIN/SGE/GSE/GM/MinC (SEI 1724342),  a titular da SGE/MINC informou que não se faz necessária a discussão da proposta no âmbito do Comitê Interno de Governança do Ministério da Cultura e que a iniciativa de sistematização abrangente da normatização de editais nas políticas de cultura não progrediu até o momento, dispensando, portanto, quaisquer procedimentos adicionais nesse sentido. 

Este é o relato do necessário.  

 

 

ANÁLISE JURÍDICA

 

A presente análise se dá com fundamento no art. 11 da Lei Complementar nº 73/93, subtraindo-se do âmbito da competência institucional deste Órgão Jurídico, delimitada em lei, análises que importem em considerações de ordem técnica, financeira ou orçamentária, nos termos dos Enunciados de Boa Prática Consultiva AGU nº 7:

 

“A manifestação consultiva que adentrar questão jurídica com potencial de significativo reflexo em aspecto técnico deve conter justificativa da necessidade de fazê-lo, evitando-se posicionamentos conclusivos sobre temas não jurídicos, tais como os técnicos, administrativos ou de conveniência ou oportunidade, podendo-se, porém, sobre estes emitir opinião ou formular recomendações, desde que enfatizando o caráter discricionário de seu acatamento” (Manual de Boas Práticas Consultivas. 4.ed. Brasília: AGU, 2016, página 32).

 

Assim, cumpre esclarecer que não compete a esta Consultoria Jurídica a análise do mérito administrativo do ato normativo que se pretende aprovar, cabendo à autoridade administrativa competente sopesar a conveniência e/ou oportunidade na edição do mencionado ato. Às consultorias jurídicas compete apenas a aferição do aspecto jurídico-legal das minutas cuja análise lhe são submetidas.

 

 

DA LEGISLAÇÃO APLICÁVEL

 

A consulta em tela refere-se a minuta de Instrução Normativa que visa dispor sobre a concessão de bolsas e prêmios no âmbito da Política Nacional de Cultura Viva - PNCV, bem como alterar a Instrução Normativa/MinC nº 8, de 11 de maio de 2016 em aspectos pontuais (SEI 1718259).

Dito isso, observo que a Constituição Federal de 1988, em seu art. 215, imbuiu o Estado (Poder Público de todas as esferas) dos deveres de garantir o pleno exercício dos direitos culturais e o acesso às fontes da cultura nacional e de apoiar e incentivar a valorização e a difusão das manifestações culturais.

Por outro lado, o art. 216-A da Constituição, que trata do Sistema Nacional de Cultura, estabeleceu como princípios deste a diversidade das expressões culturais, a universalização do acesso aos bens e serviços culturais, o fomento à produção, difusão e circulação de conhecimento e bens culturais, e a cooperação entre os entes federados, os agentes públicos e privados atuantes na área cultural, entre outros (CF/88, art. 216-A, § 1º, incisos I a IV).

A fim de concretizar esses deveres constitucionais, o Ministério da Cultura criou o Programa Cultura Viva em 2004, na gestão do então Ministro Gilberto Gil, por meio das Portarias/MINC nº 156, de 06 de julho de 2004  e n° 82, de 18 de maio de 2005.

Posteriormente, o Congresso Nacional reconheceu a importância do Programa Cultura Viva para a sociedade e o converteu em Política Nacional de Cultura Viva – PNCV, por meio da Lei n. 13.018, de 22 de julho de 2014, que atribuiu à PNCV, entre outros, os seguintes objetivos:

 

Art. 2º São objetivos da Política Nacional de Cultura Viva: 
I - garantir o pleno exercício dos direitos culturais aos cidadãos brasileiros, dispondo-lhes os meios e insumos necessários para produzir, registrar, gerir e difundir iniciativas culturais;
II - estimular o protagonismo social na elaboração e na gestão das políticas públicas da cultura;
III - promover uma gestão pública compartilhada e participativa, amparada em mecanismos democráticos de diálogo com a sociedade civil;
IV - consolidar os princípios da participação social nas políticas culturais;
V - garantir o respeito à cultura como direito de cidadania e à diversidade cultural como expressão simbólica e como atividade econômica;
VI - estimular iniciativas culturais já existentes, por meio de apoio e fomento da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;
VII - promover o acesso aos meios de fruição, produção e difusão cultural;
VIII - potencializar iniciativas culturais, visando à construção de novos valores de cooperação e solidariedade, e ampliar instrumentos de educação com educação;
IX - estimular a exploração, o uso e a apropriação dos códigos, linguagens artísticas e espaços públicos e privados disponibilizados para a ação cultural.
 

A Lei n. 13.018/2014 (Lei da PNCV), portanto, é o primeiro fundamento da nova Instrução Normativa, ora em análise, proposta pela Secretaria de Cidadania e Diversidade Cultural.

A Lei da PNCV, em seus art. 8o e 9o, incumbiu ao Ministério da Cultura competências para regulamentar a matéria, dispondo, especialmente, sobre os critérios gerais de distribuição e destinação dos recursos  e sobre as regras de cumprimento do Termo de Compromisso Cultural:

 

Art. 8º A Política Nacional de Cultura Viva é de responsabilidade do Ministério da Cultura, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios integrantes do Sistema Nacional de Cultura.
§ 1º Nos casos de inexistência dos fundos de cultura estaduais e municipais, o repasse será efetivado por estrutura definida pelo órgão gestor de cultura em cada esfera de governo.
§ 2º O Ministério da Cultura disporá sobre os critérios gerais de distribuição e destinação dos recursos, com atenção especial aos custos diferenciados das regiões do País, e os procedimentos operacionais para elaboração e divulgação das prestações de contas, que serão simplificadas e essencialmente fundamentadas nos resultados previstos nos editais.
(...)
Art. 9º A União, por meio do Ministério da Cultura e dos entes federados parceiros, é autorizada a transferir de forma direta os recursos às entidades culturais integrantes do Cadastro Nacional de Pontos e Pontões de Cultura, com a finalidade de prestar apoio financeiro à execução das ações da Política Nacional de Cultura Viva.
§ 1º A transferência dos recursos de que trata o caput ficará condicionada ao cumprimento de Termo de Compromisso Cultural, que deverá conter a identificação e a delimitação das ações a serem financiadas, as metas, o cronograma de execução físico-financeira e a previsão de início e término da execução das ações ou das fases programadas.
§ 2º No caso da transferência de recursos de que trata o caput , os recursos financeiros serão liberados mediante depósito em contas correntes específicas abertas e mantidas exclusivamente para este fim.
§ 3º Sem prejuízo da fiscalização de competência dos órgãos de controle interno e externo, o Ministério da Cultura regulamentará as regras de cumprimento do Termo de Compromisso Cultural de que trata este artigo e de prestação de contas simplificada conforme estabelecido no § 2º do art. 8º desta Lei.

 

Com base nessas competências, o Ministério da Cultura editou a Instrução Normativa – IN/MINC n. 1/2015, posteriormente substituída pela IN/MINC n. 8/2016, que atualmente regulamenta  alguns dos procedimentos de que trata a Lei nº 13.018/2014, em especial a celebração do Termo de Compromisso Cultural - TCC.

O art. 4º da IN/MINC n. 8/2016 estabelece as seguintes formas de apoio, fomento e parceria para cumprimento dos objetivos da PNCV:

 
Art. 4º A PNCV contará com as seguintes formas de apoio, fomento e parceria para cumprimento de seus objetivos:
I – fomento a projetos culturais de Pontos e Pontões de Cultura juridicamente constituídos, por meio da celebração de Termo de Compromisso Cultural (TCC), nos termos desta Instrução Normativa;
II – premiação de projetos, iniciativas, atividades, ou ações de pontos e pontões de cultura;
III – premiação de projetos, iniciativas, atividades, ou ações de pessoas físicas, entidades e coletivos culturais, no âmbito das ações estruturantes da PNCV;
IV – concessão de bolsas a pessoas físicas visando o desenvolvimento de atividades culturais que colaborem para as finalidades da PNCV; e
V – parcerias entre União, entes federados, instituições públicas e privadas.
Parágrafo único. No âmbito do Ministério da Cultura, compete ao titular da SCDC firmar os instrumentos de apoio, fomento e parceria descritos neste artigo.

 

A IN/MINC n. 8/2016, todavia, tratou com mais profundidade do fomento por meio  de Termo de Compromisso Cultural - TCC (inciso I) e remeteu os prêmios e bolsas da PNCV a regulamentação específica a ser futuramente aprovada pelo Ministério da Cultura. Enquanto essa regulamentação não for aprovada, o art. 67 da IN n. 8/2016 determina que se aplica a essas duas formas de fomento a norma geral do Ministério sobre o assunto, que é a Portaria nº 29, de 21 de maio de 2009 (ainda vigente):

 

Art. 67. Os instrumentos de apoio e fomento descritos nos incisos II, III e IV do caput do art. 4º poderão ser objeto de regulamentação específica do Ministério da Cultura.
Parágrafo único. Enquanto não editada regulamentação específica de que trata o caput, aplica-se, no que couber, a Portaria nº 29, de 21 de maio de 2009, do Ministério da Cultura.

 

Nesse sentido, o objetivo da proposta em análise não é substituir a IN/MINC n. 8/2016, mas estabelecer a regulamentação específica sobre os prêmios e bolsas da PNCV, conforme previsto no art. 67 da IN n. 8/2016 e em conformidade com a sistemática já estabelecida nesta.

Assim, vale notar que os beneficiários possíveis dos prêmios e bolsas da PNCV, por exemplo, já se encontravam previstos no art. 4º da IN/MinC n. 8/2016, acima transcrito, e foram mantidos na nova proposta. Por outro lado, algumas regras da IN/MINC n. 8/2016 aplicam-se também aos prêmios e bolsas e continuarão aplicáveis, conforme estabelece a minuta em análise, no art.  4º, § 6º e no art. 34 (numeração original).

 

Vale mencionar, ademais, que o recente Decreto n. ​11.453, de 23 de março de 2023, que dispõe sobre os mecanismos de fomento à cultura, em seu art. 22, resguarda a aplicação da Lei n. 13.018/2023 ao fomento concedido no âmbito da PNCV nos seguintes dispositivos:

 

Art. 2º  A utilização dos mecanismos de fomento cultural visa à implementação:
(...)
II - da Política Nacional de Cultura Viva, de que trata a Lei nº 13.018, de 2014;
(...)
Art. 22.  A modalidade de fomento à execução de ações culturais e a modalidade de apoio a espaços culturais poderão ser implementadas por meio da celebração dos seguintes instrumentos:
(...)
II - termo de compromisso cultural, conforme os procedimentos previstos na Lei nº 13.018, de 2014, e em ato do Ministro de Estado da Cultura, nas hipóteses em que o fomento enquadrar-se no escopo da Política Nacional de Cultura Viva, conforme regulamento específico;
(...)
§ 1º  A escolha do instrumento a ser utilizado deverá ser indicada pelo gestor público no processo administrativo em que for planejada a sua celebração, conforme os objetivos pretendidos, observados os princípios constitucionais da eficiência e da duração razoável do processo.
(...)
§ 4º  Nas hipóteses de celebração dos instrumentos a que se referem os incisos I a III do caput, não será exigível a complementação de que trata o § 2º do art. 6º da Lei nº 8.313, de 1991, tendo em vista que a destinação dos recursos está especificada na origem.

 

Como a PNCV é uma das formas de fomento à cultura, a proposta de Instrução Normativa em análise recepciona e incorpora as regras do Decreto n. 11.453/2023 aplicáveis a prêmios e bolsas culturais em geral, encontrando-se em harmonia com o ordenamento vigente sobre essas áreas correlatas.

A minuta também leva em consideração e adapta ao seu espectro, quando pertinentes, as regras da Portaria MINC n. 29/2009, que guia a elaboração dos editais de seleção pública no âmbito do Ministério da Cultura. Esta Portaria deixará de ser aplicável aos editais de bolsas e prêmios da Cultura Viva, mas a minuta em análise garante a harmonia com o restante do arcabouço aplicável às demais formas de fomento.

Por outro lado, a minuta faz remissão à legislação mais recente e informa que serão aplicados aos prêmios, bolsas e demais instrumentos celebrados com recursos da Política Nacional Aldir Blanc: a Lei nº 14.399, de 08 de julho de 2022, o Decreto nº 11.740 de 18 de outubro de 2023, a Portaria MINC nº 80, de 27 de outubro de 2023, e a Instrução Normativa MINC nº 10, de 28 de dezembro de 2023, no que couber (art. 1º  da minuta em análise).

 

 

ASPECTOS MATERIAIS

 

Quanto aos aspectos materiais da proposta, a Nota Técnica nº 8/2024 (SEI 1718239), da Diretoria da Política Nacional de Cultura Viva, apresenta a estrutura do ato, a origem das novas regras propostas e as alterações propostas sobre a IN/MINC n. 8/2016.

Com efeito, a proposta em tela trata de questão de mérito administrativo que não cabe a esta Consultoria Jurídica avaliar, salvo quanto à coerência e adesão ao ordenamento jurídico vigente sobre a matéria correlata. Observo que a Secretaria da Cidadania e Diversidade CulturalSCDC, por meio da referida Nota Técnica, justificou a maior parte dos dispositivos e indicou as normas vigentes com as quais os novos dispositivos se harmonizam ou nos quais se inspiram.

No entanto, não foi indicada a justificativa para a revogação da alínea 'b', do inciso IV, do art. 22 da IN/MINC n. 8/2016. Este dispositivo atualmente estabelece:

Art. 22. Para cada TCC deverá ser elaborado plano de trabalho que será parte integrante desse instrumento de parceria, independentemente de transcrição.
§ 1º  Deverá constar do plano de trabalho:
I - descrição de metas a serem atingidas por meio das atividades executadas, devendo estar claro, preciso e detalhado o que se pretende realizar ou obter, bem como quais serão os meios utilizados;
II - cronograma físico, que indique os prazos para a execução das atividades e o cumprimento das metas;
III - cronograma financeiro, que indique os valores a serem repassados conforme o cronograma físico; e
IV – plano de aplicação de recursos, que deverá:
a) detalhar os itens de despesa, inclusive aquelas relativas à equipe de trabalho envolvida diretamente na execução do objeto; e
b) apresentar documentação, acompanhada de justificativa, relativa aos valores previstos para cada item de despesa, capaz de demonstrar que estão compatíveis com os valores de mercado.
 

Como se depreende do dispositivo, o plano de aplicação de recursos é parte integrante do Plano de Trabalho, obrigatório em todos os Termos de Compromisso Cultural, assim como em outros instrumentos que estabelecem o repasse de recursos públicos.

A este respeito, convém lembrar que o Plano de Trabalho é documento técnico crucial, que dá concretude ao planejamento da forma como será executado o objeto e alcançado o resultado do ajuste. É peça fundamental e, portanto, deve contemplar elementos mínimos que demonstrem os meios materiais e os recursos necessários para a concretização dos objetivos, conforme definidos nas metas e em conformidade com os prazos ali estampados. Neste sentido, um plano de trabalho bem elaborado contribui para a fiel execução das obrigações pelos partícipes, assim como facilita o acompanhamento e fiscalização quanto ao seu cumprimento.

O órgão técnico tem a responsabilidade de avaliar o conteúdo das informações consignadas pelo proponente no plano de trabalho, analisado a sua viabilidade, adequação aos objetivos propostos, compatibilidade de custos e qualificação técnica e capacidade gerencial do proponente para a execução da proposta.

Se as informações fornecidas pelo proponente não contêm justificativas relativas aos valores previstos para cada item de despesa, que demonstrem que os valores indicados são compatíveis com os valores de mercado, caberá ao técnico responsável, no âmbito deste Ministério, avaliar por conta própria cada uma das despesas indicadas, responsabilizando-se por eventuais discrepâncias quanto aos valores de mercado.

Vale notar que o fato de não envolver a entidade proponente nas justificativas e na comprovação de adequação dos valores não retira a responsabilidade de nenhuma das partes por eventuais infrações aos princípios da economicidade e da eficiência, mas talvez torne mais complexa a missão dos servidores e gestores que aprovarão o plano de aplicação dos recursos. No entanto, como dito, trata-se de atribuição eminentemente técnica que não cabe a esta Consultoria Jurídica controlar. Recomendo, apenas, que a SCDC avalie a conveniência deste ponto específico da proposta e justifique expressamente a revogação do dispositivo, com a qual deixará de exigir dos proponentes que apresentem "documentação, acompanhada de justificativa, relativa aos valores previstos para cada item de despesa, capaz de demonstrar que estão compatíveis com os valores de mercado".

Caso a SCDC decida manter a proposta de revogação, esta deverá se dar por meio de dispositivo próprio, que trate expressamente das revogações, conforme determina o art. 17 do Decreto n. 9.191/2017 e art. 13 e 14 do Decreto n. 12.002/2004. Assim, o  dispositivo da minuta que trata de revogações deverá ter a seguinte redação:

 

Art... Ficam revogados os seguintes dispositivos da Instrução Normativa MinC nº 1, de 2015, com redação dada pela Instrução Normativa MinC nº 8, de 2016 :
a) alínea 'b', do inciso IV, do art. 22;
b) art. 67.

 

 

REQUISITOS FORMAIS PARA A EDIÇÃO DO ATO

 

De acordo com o art. 2º do Decreto nº 10.139, de 28 de novembro de 2019, os atos normativos inferiores a decreto poderão ser editados sob a forma de:

 

I - portarias - atos normativos editados por uma ou mais autoridades singulares;
II - resoluções - atos normativos editados por colegiados; ou
III - instruções normativas - atos normativos que, sem inovar, orientem a execução das normas vigentes pelos agentes públicos.

 

Por sua vez, o Decreto n. 12.002, de 22 de abril de 2024, que substituirá o Decreto nº 10.139/2019 a partir de 1º de junho de 2024, estabelece as mesmas espécies de atos normativos, porém nos seguintes termos:

 

Art. 9º  Os atos normativos inferiores a decreto serão editados sob a denominação de:

I - instruções normativas e portarias - atos normativos editados por uma ou mais autoridades singulares; e

II - resoluções - atos normativos editados por colegiados.

 

 

No caso dos autos, como afirmado, pretende-se estabelecer regulamentação específica para a concessão de prêmios e bolsas no âmbito da Política Nacional de Cultura Viva, e alterar aspectos pontuais da IN/MINC n. 8/2016, orientando a execução da Lei n. 13.018/2014, com fundamento nas competências atribuídas ao Ministério da Cultura pelo art. 9º, § 3º, e art. 8º, § 2º, desta Lei. Trata-se de hipótese evidente de adoção da modalidade "instrução normativa".

Portanto, verificada a adequabilidade do instrumento (Instrução Normativa) à finalidade pretendida (regulamentação da Lei n. 13.018/2014),  cabe verificar (i) a competência do agente, (ii) a existência de justificativa/fundamentação do propósito pelo administrador, (iii) o cumprimento dos requisitos de validade e do respeito ao princípio da legalidade.

 

Sobre a competência, não há dúvida de que a Ministra de Estado é autoridade competente para disciplinar a matéria, no âmbito do Ministério da Cultura. Isto porque as Instruções Normativas têm por fundamento o poder hierárquico, podendo ser expedidas por qualquer chefe de órgãos, repartições e serviços, desde que nos limites de sua competência.

Ademais, dispõe a Constituição Federal, art. 87, parágrafo único, incisos I e II, que compete aos Ministros de Estado “exercer a orientação, coordenação e supervisão dos órgãos e entidades da administração federal na área de sua competência (...)” e "expedir instruções para a execução das leis, decretos e regulamentos".

Vale lembrar, ainda, que a regulamentação da Lei n. 13.018/2014 encontra-se entre as competências da Titular do Ministério da Cultura, conforme se infere do art. 8º, § 2º, e do art. 9º, § 3º da referida Lei. Portanto, uma vez que não há, na proposta em tela, extrapolação de tais competências,  em tese, não se vislumbra ilegalidade na sua publicação.

 

No que se refere ao propósito da administração, verifica-se que a Nota Técnica nº 8/2024 (SEI 1718239), da Diretoria da Política Nacional de Cultura Viva,​ informa, em suma, que:

 

1.6 A PNCV conta com diferentes formas de apoio, como consta na IN nº 08/2016, art. 4º, fomento a projetos culturais de Pontos e Pontões de Cultura juridicamente constituídos, premiação de projetos, iniciativas, atividades, ações de pontos e pontões de cultura, ações de pessoas físicas, entidades, grupos e coletivos culturais, visando ao desenvolvimento de atividades culturais que colaborem para as finalidades da PNCV.
(...)
1.8 Considerando a responsabilidade da Secretaria de Cidadania e Diversidade Cultural em gerir a Política Nacional Cultura Viva e assegurar a execução da PNCV é imprescindível uma nova Instrução Normativa com regulamentação específica para execução de formas de apoio à premiações e concessão de bolsas, da mesma forma a necessidade de alterar determinadas cláusulas da Instrução Normativa Nº 08, de 11 de maio de 2016.
1.9 A urgência em atualizar regras por um novo normativo que torne processos mais ágeis e transparentes deve-se, em grande parte, para atender à Política Nacional Aldir Blanc de Fomento à Cultura (PNAB), levando em consideração que serão destinados, no mínimo, R$388 milhões anualmente da PNAB à PNCV. 
1.10 Considerando a falta de regulamentação específica para premiações e bolsas culturais na IN nº 08/2016, tendo como referência somente a Portaria MinC nº 29, de 21 de maio de 2009, e a necessidade de alterar determinadas cláusulas da Instrução Normativa Nº 08, de 11 de maio de 2016, apresentamos para análise e manifestação da Consultoria Jurídica deste Ministério, a seguinte proposta.

 

Entende-se assim que se encontra justificada a necessidade da norma e o propósito da Administração ao editar o referido instrumento normativo, abstraindo-se o conteúdo técnico analisado pelo órgão técnico competente, não sujeito ao crivo desta Consultoria Jurídica.

 

Quanto aos aspectos estritamente formais contidos na minuta, insta ponderar que a ela se aplicam o Decreto nº 10.139/2019, o Decreto nº 9.191/2017, e, a depender da data de publicação, o Decreto n. 12.002/2024 (em vigor a partir de 1º de junho de 2024) que estabelecem normas para elaboração, redação, alteração, revisão e consolidação de atos normativos.

A este respeito, destaco que a numeração da presente Instrução Normativa deve ser estabelecida em continuidade à série anteriormente iniciada, tendo em vista o disposto no Decreto nº 10.139/2019, e no Decreto n. 12.002/2024.

No que tange especificamente à data de entrada em vigor, recomenda-se a avaliação da necessidade de postergação da produção de efeitos, nos termos do art. 17 do Decreto n. 12.002/2024. Caso não haja motivos para estabelecimento da vacatio legis, a Instrução Normativa poderá entrar em vigor na data de sua publicação. 

Informo que realizamos alguns ajustes sobre o texto, na forma da minuta anexa,  a fim de conferir clareza e coerência à norma, além de ajustes formais, considerando as regras estabelecidas nos Decretos acima mencionados. Nesse sentido, a minuta anexa encontra-se apta à assinatura da Ministra e publicação no Diário Oficial da União.

 

Por fim, destaco que a proposta de ato normativo em exame está potencialmente sujeita à prévia análise de impacto regulatório - AIR, nos termos do Decreto nº 10.411/2020. Assim, recomendo que o órgão técnico avalie a necessidade de produção da AIR ou dispensa desta, nos termos do art. 4º  c/c  art. 2º, inciso II, do referido Decreto. Caso a AIR seja dispensada, é necessária a avaliação de resultado regulatório, no prazo máximo de 3 anos, conforme art. 12 do Decreto nº 10.411/2020.

 

 

CONCLUSÃO

 

Diante do exposto, e sem adentrar nos valores de conveniência e oportunidade na criação de mecanismos institucionais, não sujeitos ao crivo desta Consultoria Jurídica, opina-se pela inexistência de óbices jurídico-formais na minuta de Instrução Normativa em análise, estando o ato em tela apto a ser assinado pela Ministra de Estado da Cultura, desde que observado o disposto no presente Parecer e utilizada a minuta anexa.

Destaca-se que, conforme Enunciado nº 05, do Manual de Boas Práticas Consultivas da AGU, “ao órgão Consultivo que em caso concreto haja exteriorizado juízo conclusivo de aprovação de minuta de edital ou contrato e tenha sugerido as alterações necessárias, não incumbe pronunciamento subsequente de verificação do cumprimento das recomendações consignadas”. Assim, não é necessário o retorno dos autos a esta Consultoria, salvo se subsistir dúvida de cunho jurídico.

Isto posto, submeto o presente Parecer à consideração superior, sugerindo que os autos sejam encaminhados à Secretaria da Cidadania e Diversidade Cultural, para as providências cabíveis.

 

Brasília, 07 de maio de 2024.

 

 

DANIELA GUIMARÃES GOULART

Advogada da União

 

 


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