ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA JUNTO AO MINISTÉRIO DA CULTURA
COORDENAÇÃO-GERAL DE PARCERIAS E COOPERAÇÃO FEDERATIVA


PARECER n. 00114/2024/CONJUR-MINC/CGU/AGU

 

NUP: 01400.012871/2023-21

INTERESSADOS: GABINETE DA SECRETARIA-EXECUTIVA GSE/GM/MINC

ASSUNTOS:  PROJETO DE COOPERAÇÃO TÉCNICA INTERNACIONAL. REVISÃO SUBSTANTIVA.

 

 

DIREITO ADMINISTRATIVO E INTERNACIONAL. PROJETO DE COOPERAÇÃO TÉCNICA COM A ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A EDUCAÇÃO, A CIÊNCIA E A CULTURA (UNESCO). REVISÃO SUBSTANTIVA.
I - Projeto de Cooperação Técnica Internacional celebrado no âmbito do Acordo de Cooperação Técnica em Matéria Educacional, Cientifica e Técnica, concluído entre o Governo da República Federativa do Brasil e a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura.
II - Decreto nº 87.522, de 25 de agosto de 1982, que promulga o referido Acordo de Cooperação Técnica em Matéria Educacional, Cientifica e Técnica concluído entre o Governo da República Federativa do Brasil e a UNESCO.
III - Primeira Revisão substantiva.
IV - Aplicação subsidiária do Decreto nº 5.151, de 22 de julho de 2004.
V - Acórdãos nº 1339/2009 e nº 3288/2010 do Plenário do Tribunal de Contas da União.
VI - Viabilidade jurídica, desde que atendidas as recomendações apontadas.

 

 

Tratam os autos de Projeto de Cooperação Técnica Internacional - PCTI 914BR4026 - "Educação e Cultura para promoção da Democracia, da Cidadania e da Diversidade" (SEI 1520025), celebrado entre o Ministério da Cultura e a UNESCO, em novembro de 2023, no âmbito do Acordo de Cooperação Técnica Educacional, Científica e Cultural entre o Brasil e a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), aprovado pelo Congresso Nacional por meio do Decreto Legislativo nº 13, de 31 de março de 1982, e promulgado pelo Decreto nº 87.522, de 25 de agosto de 1982. 

O referido PCTI foi previamente analisado por esta Consultoria Jurídica por meio do PARECER n. 00203/2023/CONJUR-MINC/CGU/AGU (SEI 1397943) e foi aprovado pelo Grupo Intersetorial de Coordenação (GIC), em reunião ordinária realizada em 18 de outubro de 2023  (SEI 1498618), conforme exigem os artigos II e V do do Acordo de Cooperação Técnica Educacional, Científica e Cultural - ACT.

Ressalto que não localizei, nos autos, a comprovação da publicação do extrato do Projeto de Cooperação Técnica no Diário Oficial da União, conforme recomendou o item 30 do PARECER n. 00203/2023/CONJUR-MINC/CGU/AGU, que analisou o Projeto previamente à sua celebração. Recomendo que se providencie a referida publicação e juntada aos autos.

Desta feita, por meio de despacho ao final da Nota Técnica nº 212/2024 (SEI 1716741), o Secretário-Executivo Adjunto solicita a esta Consultoria Jurídica análise e manifestação sobre proposta de primeira Revisão Substantiva (SEI 1716739) do referido Projeto de Cooperação Técnica Internacional, face à necessidade de prorrogação do prazo e de adequação de prioridades identificadas no curso de execução do projeto.

A Nota Técnica nº 212/2024 (SEI 1716741) apresenta a motivação e justificativa da proposta de Revisão, nos seguintes termos:

 

4.6. A Revisão 1 ora proposta estende o prazo do projeto até 21 de novembro de 2025, possibilitando o melhor andamento dos estudos e a produção de dados pactuados. A prorrogação proposta garantirá tempo hábil para melhor condução dos processos seletivos e dos estudos, projetos e planos pactuados. Ao orçamento do projeto serão incorporados os valores de rendimento de aplicação financeira auferidos até março de 2024, no total de R$ 50.748,45 (cinquenta mil setecentos e quarenta e oito reais e quarenta e cinco centavos).
4.7. Assim, a revisão proposta busca promover uma atualização da matriz lógica do projeto por meio da exclusão de atividades que já não se fazem necessárias e a inclusão de três Objetivos Específicos que irão fazer parte de sua composição a fim de consubstanciar o apoio às políticas públicas a serem implementadas pela Subsecretaria de Gestão Estratégica (SGE), Assessoria Especial de Assuntos Internacionais (AEAI) e Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN).
4.8. A revisão da estrutura lógica foi apresentada minuciosamente na nova proposta de plano de trabalho, indicando quais itens foram mantidos, excluídos, alterados ou inseridos, conforme constante no na Proposta de Remodelação (1716739). O orçamento igualmente sofreu revisão, prevendo a redistribuição dos custos conforme os componentes, incorporando ao orçamento do projeto apenas o rendimento de aplicação financeira auferidos até março de 2024, no total de R$ 50.748,45 (cinquenta mil setecentos e quarenta e oito reais e quarenta e cinco centavos), sem, portanto, qualquer ampliação do desembolso. Ainda, o cronograma de execução foi atualizado, prevendo ações até outubro de 2025. Quanto ao cronograma de desembolso, a nova previsão pende de indicação da Subsecretaria de Gestão Estratégica, considerando sua atribuição para tal.
4.9. Conforme se verifica, o projeto mantém o condão de possibilitar os benefícios de escalas diversas, incidindo sobre a sociedade brasileira como um todo pois, em seu escopo, tem o propósito de promover uma reflexão ampla com potencial impacto na educação formal, na economia da cultura, em grupos e indivíduos de todos os segmentos sociais, agentes culturais, artistas, professores, pesquisadores, instituições públicas, organizações da sociedade civil, qualquer um que desenvolva ações de arte, cultura e educação. São beneficiários diretos os gestores públicos nas áreas de cultura e educação, envolvendo as esferas federal, estadual, municipal e do Distrito Federal, além de agentes e produtores culturais e indiretos, a população em geral, estudantes, empreendedores culturais, segmentos identificados com agenda afirmativa relacionada à diversidade cultural, dentre outros.
4.10. Assim, considerando a previsão do Acordo Brasil-UNESCO de que para o atingimento dos objetivos estabelecidos o Artigo I do Decreto nº 87.522/1982, as atividades serão implementadas em consonância com os programas anuais a serem estabelecidos pelo Grupo Intersetorial de Coordenação (GIC), esses autos devem, após devida análise jurídica, serem remetidos para a apreciação do GIC quanto à proposta de reformulação apresentada.
 

 É o relatório  

 

ANÁLISE JURÍDICA

 

A presente análise se dá com fundamento no art. 11 da Lei Complementar nº 73/93, subtraindo-se do âmbito da competência institucional deste Órgão Jurídico, delimitada em lei, análises que importem em considerações de ordem técnica, financeira ou orçamentária, nos termos do Enunciado de Boas Práticas Consultivas AGU nº 7.

Ressalto, ainda, que a presente manifestação apresenta natureza meramente opinativa e, por tal motivo, as orientações apresentadas não se tornam vinculantes para o gestor público, o qual pode, de forma justificada, adotar orientação contrária ou diversa daquela emanada por esta Consultoria Jurídica.

A consulta em tela diz respeito a proposta de Revisão Substantiva do Projeto de Cooperação Técnica Internacional - PCTI 914BR4026 (SEI 1716739), face à necessidade de prorrogação do prazo e de adequação de prioridades identificadas no curso de execução do projeto, sem implicar novos aportes de recursos ao Organismo Internacional.

Os atos de cooperação técnica em matéria internacional em geral regem-se pelo Decreto nº 5.151, de 22 de julho de 2004 e pela Portaria nº 8, de 4 de janeiro de 2017, do Ministério das Relações Exteriores.

No entanto, esta Consultoria Jurídica, por meio do PARECER n. 00203/2023/CONJUR-MINC/CGU/AGU (SEI 1397943), aderiu à tese exposta pela Consultoria Jurídica junto ao Ministério da Educação - CONJUR/MEC, segundo a qual em Projetos de Cooperação decorrentes do ACT com a UNESCO, na modalidade direta/agência (em que os projetos são executados diretamente pela UNESCO, segundo suas regras e procedimentos), a aplicação do Decreto nº 5.151/2004, se dará apenas de forma subsidiária e suplementar, haja vista que o referido normativo regulamenta a modalidade denominada de "Execução Nacional", que é aquela pela qual a condução e direção de suas atividades estão a cargo de instituições brasileiras ainda que a parcela de recursos orçamentários de contrapartida da União esteja sob a guarda de organismo ou agência internacional cooperante.

Nesse sentido, trago à baila trecho do PARECER n. 00581/2023/CONJUR-MEC/CGU/AGU - NUP: 23000.023291/2023-12 - doc. SEI n. 1376966), que tratou de PCTI com o Ministério da Educação, celebrado no âmbito do ACT com a UNESCO:

 

(...)
10. Quanto à aplicação no presente Projeto do Decreto nº 5.151, de 22 de julho de 2004, cabe ser ressaltado que foi exarado o PARECER nº 01291/2020/CONJUR-MEC/CGU/AGU (Sei nº 2380930), aprovado pelo DESPACHO nº 03334/2020/CONJUR-MEC/CGU/AGU da Consultora Jurídica do Ministério da Educação, nos autos do Processo nº 23000.016051/2020-19, em razão da solicitação da Secretaria Executiva para que este Órgão Jurídico ratificasse ou retificasse o posicionamento formalizado na Nota nº 01591/2020/CONJUR-MEC/CGU/AGU, SEI nº 2295592, acerca da necessidade de inserção de Contexto Legal nos projetos de execução nacional a serem pactuados no escopo do Acordo Brasil/UNESCO (...)
11. Destarte, segundo a orientação do referido Parecer, aprovada pela então Consultora Jurídica deste Órgão de Assessoramento Jurídico, a Administração Consulente poderá afastar a aplicação de normas do Decreto nº 5.151,de 2004, especialmente no que se refere à necessidade de instrução dos processos com o Contexto Legal previsto no art. 3º, § 1º, do referido ato normativo, justificadamente, em relação aos programas anuais a serem pactuados entre o Ministério da Educação e a UNESCO no escopo do Acordo de Cooperação Técnica Brasil - Unesco, promulgado pelo Decreto nº 87.522, de 1982, haja vista que referido Acordo, diferentemente de outros Acordos firmados pelo Brasil com organismos internacionais, como, por exemplo, o Acordo Básico de Assistência Técnica com a Organização das Nações Unidas, suas Agências Especializadas e a Agência Internacional de Energia Atômica, internalizado mediante o Decreto nº 59.308, de 23 de setembro de 1966, já traz em si um regramento de execução próprio e estabelece como se dará a concretização das medidas nele previstas, portanto, tais programas anuais não se tratam de atos complementares ao Acordo, que atraem a aplicação obrigatória dos regramentos do Decreto nº 5.151, de 2004.
12. Nesse sentido, o novo entendimento da Conjur/MEC, exarado no PARECER nº 01291/2020/CONJUR-MEC/CGU/AGU acima mencionado, permite ao Gestor afastar a aplicação normativa do Decreto nº 5.151, de 2004, especialmente em relação à utilização do Contexto Legal, desde que justificadamente.

 

Sendo assim, a presente análise fundamenta-se primordialmente no próprio PCTI e no Decreto nº 87.522/1982, haja vista que este traz em si um regramento de execução próprio e estabelece como se dará a concretização das medidas nele previstas, aplicando-se o Decreto nº 5.151/2004 apenas subsidiariamente, naquilo que não conflitar com o Decreto nº 87.522/1982, conforme dispõe o item 11 do PCTI (SEI 1520025), que informa a Base Legal do Projeto.

Como dito, a presente análise se dá sobre Proposta de Revisão nº 01 - Substantiva  ao Projeto 914BR4026 (SEI 1716739), que objetiva prorrogar por mais 12 meses a vigência do projeto (totalizando 24 meses), assim como excluir algumas atividades pactuadas e inserir três objetivos específicos, de forma que possa refletir as prioridades e estratégias para a implementação das políticas públicas da nova gestão e consequente remanejamento orçamentário alinhado aos novos resultados propostos. Ademais, a Revisão permitirá a incorporação ao orçamento do projeto dos rendimentos de aplicação financeira auferidos até março de 2024, no total de R$ 50.748,45 (cinquenta mil setecentos e quarenta e oito reais e quarenta e cinco centavos).

Em sede preliminar, ressaltamos que o instrumento principal (Projeto 914BR4026 - SEI 1716739) deve estar vigente, sem solução de continuidade, sob pena de se inviabilizar a alteração e prorrogação, tendo em vista o disposto na Orientação Normativa AGU nº 3/2019:

 
ORIENTAÇÃO NORMATIVA AGU Nº 3, DE 1º DE ABRIL DE 2009
(...)
NA ANÁLISE DOS PROCESSOS RELATIVOS À PRORROGAÇÃO DE PRAZO, CUMPRE AOS ÓRGÃOS JURÍDICOS VERIFICAR SE NÃO HÁ EXTRAPOLAÇÃO DO ATUAL PRAZO DE VIGÊNCIA, BEM COMO EVENTUAL OCORRÊNCIA DE SOLUÇÃO DE CONTINUIDADE NOS ADITIVOS PRECEDENTES, HIPÓTESES QUE CONFIGURAM A EXTINÇÃO DO AJUSTE, IMPEDINDO A SUA PRORROGAÇÃO.
INDEXAÇÃO: CONTRATO. PRORROGAÇÃO. AJUSTE. VIGÊNCIA. SOLUÇÃO DE CONTINUIDADE. EXTINÇÃO.

 

Nesse sentido, considerando a duração original do Projeto firmado (16/11/2023 a 16/11/2024),  não haveria, em tese, óbice temporal à prorrogação de vigência, desde que autorizada pelo GIC.

Ressalto que a autorização por parte do GIC é essencial para a alteração e prorrogação de vigência do Projeto, porque cabe a esse colegiado, nos termos do Acordo Brasil/UNESCO, a definição dos programas anuais e respectivas atividades. Logo, somente o GIC poderá autorizar a prorrogação dos prazos dos projetos que ele mesmo definiu.

Ademais, a referida autorização do GIC pressupõe a análise dos diversos elementos envolvidos no Projeto para averiguar a pertinência e adequação de sua prorrogação de prazo, a exemplo dos recursos financeiros disponíveis, calendário das despesas correspondentes ao programa anual de cooperação, relatório semestral de atividades, conforme previsto nos seguintes dispositivos do Acordo:

 

ARTIGO V
Execução do Acordo
a) Um Grupo Intersetorial de Coordenação (GIC) será constituído para auxiliar a UNESCO e o Governo na execução do Acordo.
[...]
d) Uma vez por ano, o Grupo Intersetorial de Coordenação aprovará o quadro dos recursos financeiros disponíveis, o calendário das despesas correspondentes ao programa anual de cooperação e o relatório financeiro do ano anterior.
e) Para a execução das atividades previstas no presente Acordo, um Grupo Especial de Apoio Técnico (GSAT) funcionará junto ao Grupo Intersetorial de Coordenação. O grupo especial terá a responsabilidade da implementação das decisões do Grupo Intersetorial de Coordenação e da elaboração dos relatórios semestrais, administrativos, técnicos e financeiros, referentes à execução do Acordo. O Secretário-Geral do Ministério da Educação e Cultura, após consulta ao Ministério das Relações Exteriores e à Secretaria de Planejamento da Presidência da República, indicará ao GIC os nomes dos membros brasileiros do GSAT.
[...]
ARTIGO VI
Relatórios
Em cada semestre, um relatório de atividades, cobrindo os seis meses anteriores, será elaborado e enviado pelo Grupo Intersetorial de Coordenação ao Ministério e ao Diretor Geral da UNESCO.
(grifo nosso)

 

Além disso, tendo em vista que o modelo adotado no Acordo de Cooperação Técnica em Matéria Educacional, Científica e Técnica, concluído entre Brasil e UNESCO, promulgado pelo Decreto n. 87.522/1982, é o da operacionalização de programas anuais, a exceção a esta regra, com prorrogação excepcional de vigência dos projetos, deve estar amparada em forte motivação administrativa que demonstre sua necessidade, mediante demonstração das justificativas concretas, razoáveis e proporcionais pelas quais o projeto deve ter prazo estendido, em prol de melhor realizar os objetivos do Acordo e o interesse público.

Como visto, consta dos autos a Nota Técnica nº 212/2024 (SEI 1716741), da Secretaria-Executiva/MinC, que apresenta a proposta de alteração do Projeto e as respectivas justificativas.

Importante ressaltar que a prorrogação dos Projetos anuais, no âmbito do Acordo Brasil/UNESCO, foi admitida juridicamente pela CONJUR/MEC, por meio do Parecer nº 00365/2022/CONJUR-MEC/CGU/AGU, cujas conclusões ratifico, nos seguintes termos:

 

"(...).
20. De fato, ao analisar o texto da norma em questão se extrai que sua finalidade é estabelecer atividades anuais, ou seja, destinadas a serem executadas em determinado ano, de modo que no ano seguinte sejam programadas outras atividades e projetos, conforme estabelecido pelo GIC.
21. No caso, se o texto do Acordo empregou o termo "anuais" para definir os programas aprovados pelo GIC, deve-se compreender que as respectivas atividades são para execução anual, tendo em vista o princípio de hermenêutica jurídica segundo o qual "Não se presumem, na lei, palavras inúteis". A esse respeito, convém trazer à baila as palavras de Carlos Maximiliano [1] :
As expressões do Direito interpretam-se de modo que não resultem frases sem significação real, vocábulos supérfluos, ociosos, inúteis.
(...)
Dá-se valor a todos os vocábulos e, principalmente, a todas as frases, para achar o verdadeiro sentido de um texto; porque este deve ser entendido de modo que tenham efeito todas as suas provisões, nenhuma parte resulte inoperativa ou supérflua, nula ou sem significação alguma.
22. Consequentemente, conclui-se que o modelo adotado pelo Acordo de Cooperação Técnica em Matéria Educacional, Científica e Técnica, concluído entre Brasil e UNESCO, promulgado pelo Decreto n. 87.522, de 25 de agosto de 1982, é o da operacionalização de programas cujas atividades sejam executadas anualmente.
23. Essa regra de programas anuais, contudo, não impede que excepcionalmente haja a prorrogação de vigência dos projetos superior à anualidade prevista.
24. Isso porque toda regra comporta exceções, notadamente porque o ordenamento jurídico se dirige à realidade fática na qual uma multiplicidade de situações pode surgir, a exigir soluções para o caso concreto, para o quê não contribuiria uma interpretação fixa e rígida dos termos normativos.
25. Nessa esteira, pode ser que as diversas vicissitudes pelas quais passa a execução de um projeto gere situação em que a prorrogação de vigência seja necessária, em atendimento ao interesse público, desde que haja clara e inequívoca fundamentação, objetivamente demonstrada, em consonância com o princípio da motivação administrativa, a razoabilidade e a proporcionalidade.
26. Ademais, cabe ressaltar que, embora haja expressa menção a programas anuais, não existe nos termos do Acordo, por outro lado, regra proibitiva de prorrogação de vigência, nem de que os projetos adentrem no ano seguinte.
27. Consequentemente, embora a regra seja a execução de programas anuais, não vislumbro ofensa à juridicidade em que se realize, excepcionalmente, prorrogação de vigência dos projetos, desde que:
 
a) seja pelo tempo estritamente necessário para conclusão do projeto;
b) seja demonstrada a necessidade e o atendimento ao interesse público, de forma razoável e proporcional;
c) se justifique a causa que dá ensejo à prorrogação;
d) que o projeto ainda esteja vigente, ou seja, não haja solução de continuidade;
e) que a prorrogação seja autorizada pelo Grupo Intersetorial de Coordenação (GIC)."
(Destaques do original).

 

Conforme se depreende da transcrição acima, a prorrogação de Projetos, no âmbito do Acordo Brasil/UNESCO, é admissível juridicamente, desde que se observem os requisitos apontados no parágrafo 27 do Parecer acima transcrito, e seja demonstrado nos autos o seu cumprimento.

Embora não seja de aplicação obrigatória ao presente caso, recomenda-se observar as orientações do Manual da ABC/MRE, denominado "Diretrizes para o Desenvolvimento da Cooperação Técnica Internacional Multilateral e Bilateral" (6ª edição, janeiro de 2024, p. 56) [1], que contém quadro explicativo da natureza das revisões aos acordos de cooperação técnica com organismos internacionais, com o seguinte teor sobre as revisões substantivas:

 

 

 

 

 

Assim, para a regular Revisão do Projeto 914BR4026​, além de não haver alteração do objeto nem dos objetivos inicialmente estabelecidos, é preciso assegurar o interesse público nas alterações a serem implementadas, considerando as disposições comumente contidas nos documentos iniciais de projetos dessa natureza, que autorizam a alteração por meio de Revisões para adequações financeiras e/ou eventuais ajustes de execução, objetivando o aperfeiçoamento necessário à continuidade de sua implementação, mediante o consentimento das partes.

Vale registrar a necessária observância ao ordenamento jurídico pátrio quando da alteração pleiteada, conforme já apontado pelo Tribunal de Contas da União - TCU. Inclusive, reiteramos recomendação anterior (PARECER n. 00203/2023/CONJUR-MINC/CGU/AGU) no sentido de que, na execução das ações, sejam fielmente observadas as decisões do TCU nos Acórdãos nº 1.339/2009 – Plenário e 3.288/2010 - Plenário, que traçaram diversas recomendações a serem adotadas junto aos projetos de cooperação, que são estendidas ao projeto em curso. Assim, recomenda-se a observância no presente Projeto do disposto nos citados acórdãos, em especial, no tocante à proposta de Revisão:

 

“[...] 9.2.4. as “revisões substantivas” aos atos complementares de cooperação técnica internacional não podem descaracterizar a definição original dos projetos pactuados, devendo-se promover, quando necessárias alterações de maior impacto qualitativo, a elaboração de um novo ajuste, como meio de facilitar o acompanhamento da execução dos projetos e a avaliação de seus resultados, bem como estimular, por parte da Administração Pública, uma mais acurada programação das ações a serem desenvolvidas em parceria com organismos internacionais.
[...]” (Acórdão nº 1339/2009).

 

Em relação a despesas com diárias e passagens, reitera-se o exposto no PARECER n. 00203/2023/CONJUR-MINC/CGU/AGU, no sentido de que sejam observadas as orientações que constam em manual disponibilizado pela Controladoria-Geral da União, denominado "Viagens no âmbito de Projeto de Cooperação" (Volume II, CGU, Brasília, julho de 2012). Segundo referido manual, é possível o pagamento de diárias e passagens a consultores contratados pelo projeto, com recursos deste, desde que a viagem esteja (a) justificada e seja em razão de atividades/produtos previstas no projeto, (b) previsão das viagens no orçamento do projeto; c) aprovação dessas despesas; d) pagamento com recursos do projeto.

Outrossim, importante salientar que os serviços de consultoria contratados por organismos internacionais somente se justificam para prestação de assessoria técnica ou transferência de conhecimentos do organismo internacional ao parceiro público nacional, em atividades que exigem conhecimentos especializados e com qualificações específicas dos profissionais selecionados.

Neste sentido, o Acórdão 3.288/2010 - TCU - Plenário, já mencionado no PARECER n. 00203/2023/CONJUR-MINC/CGU/AGU:

 

"(...)
1.5.3.1. as contratações de bens e serviços relacionados a temas e práticas já de domínio público, usualmente encontrados no mercado interno, por meio de projetos de cooperação técnica internacional custeados totalmente com recursos orçamentários da União, sem que ocorra prestação de assessoria técnica ou transferência de conhecimentos do organismo internacional, conforme observado no Projeto OEI/BRA 09/004, encontra-se em desacordo com a previsão contida no art. 2º, § 5º, do Decreto nº 5.151/2004, e no Acórdão 1339/2009-Plenário, cujo prazo para regularização da situação está fixado em 31/12/2010, conforme decidido por meio do Acórdão 1256/2010-Plenário;
 
1.5.3.2. a contratação de serviços de consultoria para elaboração e aplicação de checklist e organização de processos, conforme observado no âmbito do Projeto OEI/BRA nº 09/004, contraria o disposto nos arts. 4º, § 2º, e 5º, § 2º, do Decreto nº 5.151/2004, que vedam a contratação para a realização de serviços comuns que não demandam conhecimentos especializados e sem qualificações específicas dos profissionais selecionados, bem como o Acórdão 1339/2009-Plenário;
 
1.5.3.3. a utilização de organismo internacional somente para intermediar contratações, sem a prestação de assessoria técnica ou a transferência de conhecimento, conforme observado no Projeto OEI/BRA nº 09/004, contraria o disposto no §5º, art. 2º do Decreto 5151/2004 e no Acórdão 1339/2009-Plenário;
 
1.5.3.4. a contratação de serviços de consultoria para suprir a falta de pessoal na realização de serviços que seus próprios servidores têm a capacitação técnica para realizar, observada no âmbito do Projeto OEI/BRA nº 09/004, afronta a interpretação que deve ser dada ao disposto no art. 4º, § 6º, do Decreto nº 5.151/2004, assim como o entendimento firmado pelo Tribunal quando da prolação do Acórdão 1339/2009-Plenário;
(...)".
 

Na mesma linha, o Acórdão 1.339/2009 - TCU – Plenário:

 
"(...)
9.2. Firmar os seguintes entendimentos, relativamente à execução de projetos de cooperação técnica internacional financiados exclusivamente com recursos orçamentários da União:
9.2.1. os acordos básicos de cooperação técnica internacional prestada ao Brasil não autorizam que a contraparte externa efetue, no interesse da Administração demandante, o desempenho de atribuições próprias dos órgãos públicos, nas quais não haverá transferência de conhecimento por parte do organismo internacional executor ou em que a assessoria técnica de um ente externo é dispensável, por se tratar de temas e práticas já de domínio público, demandados rotineiramente pela Administração, a exemplo da contração de bens e serviços de natureza comum, usualmente disponíveis no mercado;
9.2.2. ainda que o projeto de cooperação internacional contemple, em sua globalidade, tanto atividades de efetiva assistência técnica como ações complementares, de caráter instrumental, apenas aquelas podem ser assumidas pelo organismo internacional cooperante, devendo as de caráter ordinário ser integradas ao projeto pela Administração Pública, valendo-se dos mecanismos institucionais próprios do regime jurídico administrativo; (...)"
 

Dessa forma, recomenda-se que o órgão consulente observe que as atividades de consultoria atendam aos critérios do Decreto nº 5.151/2004, aqui aplicado de forma supletiva, e da jurisprudência do Tribunal de Contas da União, a fim de evitar situações de ilegalidade decorrentes do emprego irregular dos serviços de consultoria.

No que diz respeito à incorporação de rendimentos de aplicações financeiras, observo que não se verificou no Projeto tal previsão. Entretanto, desde que tal proposta seja aprovada pelo GIC, não vislumbro impedimento legal para tal. 

No que toca à Proposta de Revisão apresentada (SEI 1716739), por se tratar de conteúdo eminentemente técnico, que foge às competências deste Órgão Jurídico, desde que sejam observadas as advertências e recomendações apontadas neste Parecer e sejam aprovadas pelo Grupo Intersetorial de Coordenação - GIC, entendemos pela sua viabilidade jurídica.

Cabe, por conseguinte, recomendar que as prorrogações sejam excepcionais, ou seja, como último recurso, para que assim seja preservado o modelo de programas anuais definido no Acordo, de modo que o GIC, órgão colegiado competente para autorizar a prorrogação, seja criterioso ao analisar a necessidade de dilação dos prazos, amparado em justificativas concretas, razoáveis e proporcionais, expostas por meio da devida motivação administrativa, tendo em vista a realização dos objetivos do Acordo e o atendimento ao interesse público.

Dito isso, recomendo que o órgão consulente atente ao disposto na Lei n. 12.527, de 18 de novembro de 2011 (Lei de Acesso à Informação), dando publicidade às informações relativas à Revisão ora em análise, após aprovada, e aos documentos técnicos derivados do Projeto como um todo (inclusive os produtos de consultorias e relatórios finais do Projeto, entre outros).

Por fim, observo que, após assinada pelas partes a Revisão Substantiva nº 1 e aprovada pelo GIC, seu extrato deve ser publicado no Diário Oficial da União, como forma de conferir eficácia ao ato, como recomendado no PARECER n. 00203/2023/CONJUR-MINC/CGU/AGU.

 

 

CONCLUSÃO

 

Ante o exposto, e ressalvados os aspectos técnicos e de conveniência e oportunidade na efetivação do ajuste, não sujeitos ao crivo desta Consultoria Jurídica, e ainda considerando-se a manifestação favorável do órgão técnico responsável, conclui-se que a Revisão ora proposta é, em tese, juridicamente viável, desde que sejam atendidas as recomendações registradas neste Parecer e que a Revisão seja celebrada até a data em que expira o instrumento, sob pena de inviabilizar-se a prorrogação pretendida. 

Por fim, vale lembrar que, de acordo com o Enunciado nº 05 do Manual de boas Práticas Consultivas da AGU: “Ao órgão Consultivo que em caso concreto haja exteriorizado juízo conclusivo de aprovação de minuta de edital ou contrato e tenha sugerido as alterações necessárias, não incumbe pronunciamento subsequente de verificação do cumprimento das recomendações consignadas”. Assim, não é necessário o retorno dos autos a esta Consultoria, salvo se subsistir dúvida de cunho jurídico.               

Isto posto, submeto o presente processo à consideração superior, sugerindo que os autos sejam, na sequência, encaminhados à SECRETARIA-EXECUTIVA, para as providências cabíveis.

 

Brasília, 16 de maio de 2024.

 

 

DANIELA GUIMARÃES GOULART

Advogada da União

 

Nota:

[1] https://www.gov.br/abc/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/documentos/manual_cgcm-cgcb-versao_externa_6a_edicao_05jan2024_final.pdf

 


Atenção, a consulta ao processo eletrônico está disponível em https://supersapiens.agu.gov.br mediante o fornecimento do Número Único de Protocolo (NUP) 01400012871202321 e da chave de acesso 4f8c5fda

 




Documento assinado eletronicamente por DANIELA GUIMARÃES GOULART, com certificado A1 institucional (*.agu.gov.br), de acordo com os normativos legais aplicáveis. A conferência da autenticidade do documento está disponível com o código 1499354878 no endereço eletrônico http://sapiens.agu.gov.br. Informações adicionais: Signatário (a): DANIELA GUIMARÃES GOULART, com certificado A1 institucional (*.agu.gov.br). Data e Hora: 16-05-2024 18:44. Número de Série: 65437255745187764576406211080. Emissor: Autoridade Certificadora do SERPRO SSLv1.