ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA JUNTO AO MINISTÉRIO DA CULTURA
COORDENAÇÃO-GERAL DE PARCERIAS E COOPERAÇÃO FEDERATIVA


 

PARECER n. 00120/2024/CONJUR-MINC/CGU/AGU

 

NUP: 01400.012268/2024-20

INTERESSADOS: DIRETORIA DA POLITICA NACIONAL DE CULTURA VIVA (DPNCV)

ASSUNTOS: MINUTA DE EDITAL.

 

 

 
EMENTA:
I – Direito Administrativo. Seleção pública. Minuta de Edital Fomento a Projetos Continuados de Pontos de Cultura.
II - Lei nº 14.399, de 08 de julho de 2022 (PNAB), Decreto nº 11.740, de 18 de outubro de 2023, Portaria MinC nº 80, de 27 de outubro de 2023 (Regulamentam a PNAB), Decreto nº 11.453, de 23 de março de 2023 (Decreto de Fomento), Lei nº 13.018, de 22 de julho de 2014 (Política Nacional de Cultura Viva), Instrução Normativa MINC nº 08, de 11 de maio de 2016.
III - Recomendações.

 

I - RELATÓRIO

Por meio do DESPACHO Nº 1753060/2024, a Secretária de Cidadania e Diversidade Cultural solicita, com urgência, a análise e manifestação sobre  modelo de minuta de Edital "Fomento a Projetos Continuados de Pontos de Cultura", que será disponibilizada aos demais entes federados, considerando o disposto no art. 23 da Instrução Normativa nº 08, de 11 de maio de 2016.

​A Nota Técnica n. 14/2024 (SEI 1752684), da Secretaria de Cidadania e Diversidade Cultural - SCDC, apresentou o histórico e diagnóstico da demanda, e emitiu posicionamento técnico favorável quanto à pertinência e conformidade do edital em questão, sob o ponto de vista técnico.

Instruem, ainda, os autos, a minuta cuja análise é solicitada (SEI 1752202) e seus respectivos Anexos (SEI 1752196 a 1752207).

Este é o relato do necessário.

 

 

II - ANÁLISE JURÍDICA

 

A presente análise se dá com fundamento no art. 11 da Lei Complementar nº 73/93, subtraindo-se do âmbito da competência institucional deste Órgão Jurídico, delimitada em lei, análises que importem em considerações de ordem técnica, financeira ou orçamentária.

Nesse mister, a presente análise restringe-se a apontar possíveis riscos do ponto de vista jurídico e recomendar providências, para salvaguardar a autoridade assessorada, a quem compete avaliar a real dimensão do risco e a necessidade de se adotar ou não a precaução recomendada.

Quanto aos aspectos de natureza técnica, parte-se da premissa de que a autoridade competente municiou-se dos conhecimentos específicos imprescindíveis para a sua adequação às necessidades da Administração e quanto à operacionalidade do instrumento em análise, observando os requisitos legalmente impostos.

Dito isso, passo à análise da matéria submetida à consideração desta Consultoria Jurídica, ou seja, a minuta de Edital "Fomento a Projetos Continuados de Pontos de Cultura", que será disponibilizada aos demais entes federados, considerando o disposto no art. 23 da Instrução Normativa nº 08, de 11 de maio de 2016.

A minuta de Edital em questão visa selecionar propostas para a celebração de Termos de Compromisso Cultural com Pontos e Pontões de Cultura juridicamente constituídos, bem como Organizações da Sociedade Civil sem fins lucrativos que desenvolvam e articulem atividades culturais em suas comunidades e ainda não estejam certificadas como Ponto ou Pontão de Cultura, para que desenvolvam projetos que promovam o acesso da população aos bens e aos serviços culturais nos territórios e comunidades onde atuam, nos termos da Política Nacional de Cultura Viva (item 1 do Edital).

A Constituição Federal de 1988, em seu art. 215, imbuiu o Estado (Poder Público de todas as esferas) dos deveres de garantir o pleno exercício dos direitos culturais e o acesso às fontes da cultura nacional e de apoiar e incentivar a valorização e a difusão das manifestações culturais

Por outro lado, o art. 216-A da Constituição, que trata do Sistema Nacional de Cultura, estabeleceu como princípios deste a diversidade das expressões culturais, a universalização do acesso aos bens e serviços culturais, o fomento à produção, difusão e circulação de conhecimento e bens culturais, e a cooperação entre os entes federados, os agentes públicos e privados atuantes na área cultural, entre outros (CF/88, art. 216-A, § 1º, incisos I a IV).

O Edital em análise tem como normas de regência, ainda, a Lei nº 14.399, de 08 de julho de 2022 (PNAB), o Decreto nº 11.740, de 18 de outubro de 2023, a Portaria MinC nº 80, de 27 de outubro de 2023 (Regulamentam a PNAB), o Decreto nº 11.453, de 23 de março de 2023 (Decreto de Fomento), a Lei nº 13.018, de 22 de julho de 2014 (Política Nacional de Cultura Viva), a Instrução Normativa MINC nº 08, de 11 de maio de 2016, e a Instrução Normativa (ainda não publicada) analisada por esta Consultoria Jurídica no âmbito do NUP  01400.025839/2017-67.

 

 

II.1 - DA POLÍTICA NACIONAL DE CULTURA VIVA - PNCV

 

A fim de concretizar o dever constitucional de apoio e incentivo à valorização e difusão das manifestações culturais (CF, art. 215) e com inspiração nos princípios constitucionais indicados no art. 216-A, o Programa Cultura Viva foi criado em 2004, pelo então Ministro Gilberto Gil, por meio das Portarias/MinC nº 156, de 06 de julho de 2004  e n° 82, de 18 de maio de 2005.

Reconhecendo a sua importância para a sociedade brasileira, o legislador pátrio converteu o Programa Cultura Viva em Política Nacional de Cultura Viva – PNCV, por meio da Lei n. 13.018, de 22 de julho de 2014, que atribuiu à PNCV, entre outros, os seguintes objetivos:

 

Art. 2º São objetivos da Política Nacional de Cultura Viva: 
I - garantir o pleno exercício dos direitos culturais aos cidadãos brasileiros, dispondo-lhes os meios e insumos necessários para produzir, registrar, gerir e difundir iniciativas culturais;
II - estimular o protagonismo social na elaboração e na gestão das políticas públicas da cultura;
III - promover uma gestão pública compartilhada e participativa, amparada em mecanismos democráticos de diálogo com a sociedade civil;
IV - consolidar os princípios da participação social nas políticas culturais;
V - garantir o respeito à cultura como direito de cidadania e à diversidade cultural como expressão simbólica e como atividade econômica;
VI - estimular iniciativas culturais já existentes, por meio de apoio e fomento da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;
VII - promover o acesso aos meios de fruição, produção e difusão cultural;
VIII - potencializar iniciativas culturais, visando à construção de novos valores de cooperação e solidariedade, e ampliar instrumentos de educação com educação;
IX - estimular a exploração, o uso e a apropriação dos códigos, linguagens artísticas e espaços públicos e privados disponibilizados para a ação cultural.
 

De acordo com o art. 8º da Lei n. 13.018/2014, a PNCV é de responsabilidade conjunta do Ministério da Cultura, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios integrantes do Sistema Nacional de Cultura, incumbindo ao Ministério da Cultura, especialmente, dispor sobre os critérios gerais de distribuição e destinação dos recursos:

 

Art. 8º A Política Nacional de Cultura Viva é de responsabilidade do Ministério da Cultura, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios integrantes do Sistema Nacional de Cultura.
§ 1º Nos casos de inexistência dos fundos de cultura estaduais e municipais, o repasse será efetivado por estrutura definida pelo órgão gestor de cultura em cada esfera de governo.
§ 2º O Ministério da Cultura disporá sobre os critérios gerais de distribuição e destinação dos recursos, com atenção especial aos custos diferenciados das regiões do País, e os procedimentos operacionais para elaboração e divulgação das prestações de contas, que serão simplificadas e essencialmente fundamentadas nos resultados previstos nos editais.
§ 3º Poderão ser beneficiadas entidades integrantes do Cadastro Nacional de Pontos e Pontões de Cultura, nos termos dos planos de trabalho por elas apresentados, que se enquadrem nos critérios gerais de distribuição e destinação dos recursos de que trata o § 2º deste artigo.

 

Por sua vez, o art. 9o da Lei n. 13.018/2014 estabeleceu o instrumento jurídico bilateral apto a formalizar a transferência de recursos da PNCV aos Pontos e Pontões de Cultura, que é o Termo de Compromisso Cultural, cujas regras de cumprimento devem ser regulamentadas também pelo Ministério da Cultura:

 

Art. 9º A União, por meio do Ministério da Cultura e dos entes federados parceiros, é autorizada a transferir de forma direta os recursos às entidades culturais integrantes do Cadastro Nacional de Pontos e Pontões de Cultura, com a finalidade de prestar apoio financeiro à execução das ações da Política Nacional de Cultura Viva.
§ 1º A transferência dos recursos de que trata o caput ficará condicionada ao cumprimento de Termo de Compromisso Cultural, que deverá conter a identificação e a delimitação das ações a serem financiadas, as metas, o cronograma de execução físico-financeira e a previsão de início e término da execução das ações ou das fases programadas.
§ 2º No caso da transferência de recursos de que trata o caput, os recursos financeiros serão liberados mediante depósito em contas correntes específicas abertas e mantidas exclusivamente para este fim.
§ 3º Sem prejuízo da fiscalização de competência dos órgãos de controle interno e externo, o Ministério da Cultura regulamentará as regras de cumprimento do Termo de Compromisso Cultural de que trata este artigo e de prestação de contas simplificada conforme estabelecido no § 2º do art. 8º desta Lei.

 

Com base nessas competências, o Ministério da Cultura editou a Instrução Normativa – IN/MinC n. 1/2015, posteriormente alterada e integralmente substituída pela IN/MinC n. 8/2016 (à qual nos referiremos neste Parecer), que, em seu art. 4º, estabelece as formas de apoio, fomento e parceria pelas quais se concretizam os objetivos da PNCV, entre elas o fomento a projetos culturais de Pontos e Pontões de Cultura juridicamente constituídos, por meio da celebração de Termo de Compromisso Cultural (TCC):

 

Art. 4º A PNCV contará com as seguintes formas de apoio, fomento e parceria para cumprimento de seus objetivos:
I – fomento a projetos culturais de Pontos e Pontões de Cultura juridicamente constituídos, por meio da celebração de Termo de Compromisso Cultural (TCC), nos termos desta Instrução Normativa;
(...)

 

A IN/MinC n. 8/2016 detalhou os procedimentos correspondentes ao chamamento público para celebração de Termos de Compromisso Cultural - TCC em seus art. 23 a 26.

O art. 23 da IN/MinC n. 8/2016 determina que os editais de chamamento público da PNCV para a celebração de TCC seguirão modelos aprovados pelo Ministério da Cultura:

Art. 23. Os editais de chamamento público da PNCV para a celebração de TCC seguirão modelos disponibilizados pelo Ministério da Cultura na internet.
§ 1º Os editais devem ser submetidos à emissão de parecer jurídico dos respectivos órgãos de assessoria ou consultoria jurídica da administração pública.
(...)
 

Portanto, quanto à competência para a aprovação da minuta de Edital em análise, não há dúvidas de que esta pertence ao Ministério da Cultura, nos termos do art. 23 da IN/MinC n. 8/2016.

Observo que os modelos de Editais referentes à seleção de Pontos e Pontões de Cultura, destinados a outros entes, foram anteriormente analisados e aprovados por esta Consultoria Jurídica no âmbito do Parecer nº 330/2016/CONJUR-MINC/CGU/AGU (Processo 01400.029708/2015-97). No entanto, com o advento da Política Nacional Aldir Blanc e do Decreto nº 11.453, de 23 de março de 2023 (dos quais trataremos adiante), fez-se necessária a revisão da minuta de Edital atualmente vigente.

Dito isso, registro que o processo público de seleção (também denominado chamamento público ou chamada pública) é materializado por meio de um “edital”, que é instrumento jurídico proveniente do direito administrativo, pelo qual a Administração Pública leva ao conhecimento público determinado certame, fixando as condições de sua realização e convocando os interessados para apresentação de suas propostas/projetos.

O Edital deve observar, inicialmente, os princípios atinentes à administração pública descritos no art. 37, da Constituição Federal de 1988, especialmente os princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e ainda os princípios da finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica e interesse público​ (art. 2º da Lei n. 9.784/1999). 

Quanto aos princípios administrativos que regem a seleção no âmbito da PNCV, o art. 12 da Instrução Normativa MINC n. 8/2016 estabelece:

 

Art. 12.  O regime jurídico de que trata a Lei nº 13.018, de 2014, regulamentado por esta Instrução Normativa, tem como fundamentos a gestão pública democrática, a participação social, o fortalecimento da sociedade civil e a transparência na aplicação dos recursos públicos, devendo obedecer aos princípios da isonomia, da legalidade, da presunção de legitimidade, da impessoalidade, da moralidade, da publicidade, da economicidade e da eficiência, dos objetivos especificados na referida Lei e dos objetivos relacionados a seguir:
I - o reconhecimento da participação social como direito do cidadão;
II - a solidariedade, a cooperação e o respeito à diversidade para a construção de valores de cidadania e de inclusão social e produtiva;
III - a promoção do desenvolvimento local, regional e nacional, inclusivo e sustentável;
IV - o direito à informação, à transparência e ao controle social das ações públicas;
V - a integração e a transversalidade dos procedimentos, mecanismos e instâncias de participação social;
VI - a valorização da diversidade cultural e da educação para a cidadania ativa;
VII - a promoção e a defesa dos direitos humanos;
VIII - a preservação, a conservação e a proteção dos recursos hídricos e do meio ambiente;
IX - a valorização das culturas populares afro-brasileiras, dos povos indígenas e dos demais povos e comunidades tradicionais; e
X - a preservação e a valorização do patrimônio cultural brasileiro, em suas dimensões material e imaterial.
 

Dito isso, observo que o art. 24 da IN/MinC n. 8/2016 dispõe sobre os requisitos mínimos do Edital nos seguintes termos:

 

Art. 24. O edital do chamamento público especificará, no mínimo:
I - o preâmbulo, com o nome do certame, o ente público gestor, a legislação aplicável e os motivos para a seleção; (presente na minuta)
II - a programação orçamentária que autoriza e fundamenta a celebração da parceria; (item 2)
III – o prazo de vigência do certame; (item 16)
IV - o objeto da parceria; (item 1)
V - as datas, os prazos, as condições, o local e a forma de inscrição de propostas; (item 6)
VI - os critérios de seleção e julgamento das propostas, inclusive no que se refere à metodologia de pontuação e ao peso atribuído a cada um dos critérios estabelecidos, se for o caso; (Anexo 2)
VII - o valor previsto para a realização do objeto; (item 2)
VIII - obrigações de prestação de contas; e (item 15.2 e Anexo 10)
IX - a exigência de que a entidade proponente possua: (item 4)
a) comprovação de, no mínimo, três anos de existência e desenvolvimento de atividade cultural, através de fotos, material gráfico de eventos, publicações impressas e em meios eletrônicos e outros materiais comprobatórios;
b) situação cadastral ativa no CNPJ, conforme regulamentação específica da Secretaria da Receita Federal do Brasil;
c) experiência prévia na realização do objeto da parceria ou objeto de natureza semelhante;
d) capacidade técnica e operacional para o cumprimento das metas estabelecidas; e
e) inscrição no SNIIC, criado pela Lei nº 12.343, de 2010. (não consta)
§ 1º Os editais de chamamento público no âmbito da PNCV poderão conter cláusula ou condição relativa à participação no certame e à execução de parcerias por público determinado, com delimitação territorial, pontuação diferenciada, cotas ou quaisquer outros mecanismos que visem aos seguintes objetivos: (item 7)
I - redução nas desigualdades sociais e regionais;
II - promoção da igualdade de gênero, racial, de direitos de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais - LGBT ou de direitos das pessoas com deficiência;
III - promoção de direitos de indígenas, de quilombolas e de povos e comunidades tradicionais; ou
IV - promoção de direitos de quaisquer populações em situação de vulnerabilidade social.  
§ 2º Os editais de chamamento público no âmbito da PNCV poderão prever a remuneração de integrantes de comissões de seleção, observada a legislação vigente sobre a matéria.  (não consta)

 

A minuta em análise atende a quase todos os requisitos mencionados no art. 24 da IN/MinC n. 8/2016, nos itens destacados acima, com as seguintes ressalvas:

a) Não se verificou a menção à inscrição no SNIIC,  conforme exigido pelo art. 24, inciso IX, 'e', da IN/MinC n. 8/2016. Recomendo que a ausência seja verificada.

b) Quanto ao disposto no art. 24, § 2º, recomenda-se o acréscimo de nota ao Edital, alertando os entes usuários da minuta sobre a possibilidade de remuneração de integrantes de comissões de seleção, observada a legislação vigente sobre a matéria. 

Quanto aos recursos orçamentários (art. 24, inciso II, da IN n. 8/2016), recomenda-se que seja juntado aos autos dos respectivos processos o comprovante de disponibilidade orçamentária dos recursos que suportarão as despesas previstas no certame, conforme determina o art. 26 da Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF (Lei Complementar n. 101/2000).

Com relação à Comissão de Seleção, o art. 25 da IN n. 8/2016 dispõe:

 

Art. 25.  Para realizar a avaliação e a seleção dos inscritos nos editais, será composta comissão julgadora paritária com membros do Poder Executivo e da sociedade civil, composta por membros com notório saber e comprovada expertise na área específica relacionada ao edital de seleção, designados pelo Ministério da Cultura, no caso de editais publicados pela União, ou pelo órgão competente no âmbito estadual, municipal ou do Distrito Federal, para os editais publicados por entes federados parceiros.
Parágrafo único. Cada proposta será analisada por no mínimo dois integrantes da Comissão de Seleção, sendo que pelo menos um deles deve ser servidor ou funcionário da administração pública.
(destacamos)

 

Com efeito, observo que o item 11.2 da minuta em análise atende ao disposto no caput do dispositivo. O disposto no parágrafo único, por sua vez, consta do item 11.8.

Quanto aos critérios de seleção e julgamento, deve ser observado o disposto no art. 26 da IN/MinC n. 8/2016:

 

Art. 26.  Os critérios de seleção e julgamento previstos no edital observarão:
I - a adequação do projeto cultural apresentado aos objetivos e prioridades da PNCV, com especial atenção aos benefícios culturais, sociais e econômicos oferecidos às comunidades envolvidas;
II - a capacidade técnica da entidade para a execução do objeto;
III - o disposto no art. 3º da Lei nº 13.018, de 2014, prevendo como beneficiária a sociedade, e prioritariamente os povos, grupos, comunidades e populações em situação de vulnerabilidade social e com reduzido acesso aos meios de produção, registro, fruição e difusão cultural, que requeiram maior reconhecimento de seus direitos humanos, sociais e culturais ou no caso em que estiver caracterizada ameaça a sua identidade cultural;
IV - a distribuição equitativa dos recursos a serem aplicados na execução da PNCV; e
V - a qualificação técnica da proposta, considerando:
a) definição das metas a serem entregues;
b) pertinência das estratégias em relação aos resultados pretendidos;
c) descrição das etapas/ações para desenvolvimento do projeto;
d) adequação da equipe técnica para a realização do projeto;
e) estrutura de gestão e estratégias de monitoramento do projeto;
f) coerência entre as ações do projeto e os custos apresentados;
g) viabilidade do projeto no prazo proposto; e
h) razoabilidade dos itens de despesas e seus custos.
 
Parágrafo único. A Comissão Julgadora deverá, sempre que necessário, emitir recomendações técnicas, tendo em consideração os critérios de seleção e julgamento previstos no edital, sendo que, caso não conclua pela imediata desclassificação da proposta, apontará os itens do projeto que necessitem ser ajustados, para que a administração pública solicite ao proponente os referidos ajustes antes da celebração do TCC.

 

A minuta de edital em análise trata dos critérios de seleção e julgamento em seu Anexo 2, sendo que a regra constante do art. 26, parágrafo único, da IN MINC n. 8/2016 consta dos itens 11.11 e 12.5, quanto aos ajustes no Plano de Trabalho.

Tratando-se de questão de índole eminentemente técnica, incumbe aos órgãos técnicos das respectivas esferas federativas garantir que os critérios de seleção atendam ao disposto no dispositivo recém transcrito e que sejam objetivos, transparentes e isonômicos. Nesse sentido, com base nas recomendações dos órgãos de controle, esta Consultoria tem recomendado aos órgãos gestores de editais:

a) criar indicadores que possam ser relacionados a critérios mensuráveis, aos quais se atribuirá pontuação específica, objetivamente quantificável (ou fundamentar tecnicamente a escolha dos critérios indicados);

b) a revisão de conceitos que possam indicar um grau de subjetividade tendente a propiciar decisões arbitrárias por parte da Comissão de Seleção, fragilizando o resultado da seleção.

Cabe, ainda, à SCDC e aos órgãos técnicos das respectivas esferas federativas garantir que os conceitos expostos no Edital sejam compreensíveis pelo público em geral, não somente o público-alvo, mas também a população e os órgãos de controle que o examinarão, o que está diretamente relacionado com a transparência e a moralidade do procedimento e a amplitude do acesso à inscrição.

A SCDC informa, ainda, que a minuta de Edital já incorpora as alterações propostas na nova Instrução Normativa que alterará a IN/MINC n. 8/2016, analisada por esta Consultoria Jurídica no âmbito do processo 01400.025839/2017-67 (PARECER n. 00095/2024/CONJUR-MINC/CGU/AGU).

 

 

II.2 - DA POLÍTICA NACIONAL ALDIR BLANC DE FOMENTO À CULTURA - PNAB

 

Lei nº 14.399, de 08 de julho de 2022, instituiu a Política Nacional Aldir Blanc de Fomento à Cultura - PNAB, baseada na parceria da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios com a sociedade civil no setor da cultura, bem como no respeito à diversidade, à democratização e à universalização do acesso à cultura no Brasil.

Por meio da referida Lei (art. 6º), a União entregará aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios R$ 3.000.000.000,00 (três bilhões de reais), no primeiro exercício subsequente ao da entrada em vigor da Lei e nos 4 (quatro) anos seguintes. Este recurso será aplicado pelos demais entes em ações culturais conforme disposto na Lei, em especial, para o que interessa ao caso dos autos, na forma do  art. 7º da Lei:

 

Art. 7º Os recursos a que se refere o art. 6º desta Lei serão executados da seguinte forma:       Vigência
I - 80% (oitenta por cento) em ações de apoio ao setor cultural por meio de:
a) editais, chamadas públicas, prêmios, aquisição de bens e serviços vinculados ao setor cultural e outros instrumentos destinados à manutenção de agentes, de espaços, de iniciativas, de cursos, de produções, de desenvolvimento de atividades de economia criativa e de economia solidária, de produções audiovisuais, de manifestações culturais, bem como à realização de atividades artísticas e culturais que possam ser transmitidas por meios telemáticos e digitais;
b) subsídio para manutenção de espaços artísticos e de ambientes culturais que desenvolvam atividades regulares de forma permanente em seus territórios e comunidades;
II - 20% (vinte por cento) em ações de incentivo direto a programas, a projetos e a ações de democratização do acesso à fruição e à produção artística e cultural em áreas periféricas, urbanas e rurais, bem como em áreas de povos e comunidades tradicionais.
 

A Lei nº 14.399/2022 foi regulamentada pelo Decreto n. 11.740, de 18 de outubro de 2023, que, em seus art. 10 e 19, inciso I, atribuiu ao Ministério da Cultura a competência para estabelecer as diretrizes complementares de aplicação da Política Nacional Aldir Blanc de Fomento à Cultura por meio de atos específicos.

Com base nessas competências, o Ministério da Cultura estabeleceu diretrizes complementares para solicitação e aplicação de recursos de que trata a Lei nº 14.399/2022, por meio da Portaria MINC nº 80, de 27 de outubro de 2023. Esta Portaria define os percentuais mínimos de aplicação dos recursos da PNAB para a implementação e fortalecimento da PNCV, nos seguintes termos:

 
Art. 2º Os recursos de que trata esta Portaria serão distribuídos aos entes federativos observando os critérios de partilha estabelecidos pela Lei nº 14.399, de 2022 e os seguintes percentuais vinculantes:
I - aos Estados e ao Distrito Federal:
a) no mínimo dez por cento dos recursos destinados aos Estados e ao Distrito Federal para a implementação da Política Nacional de Cultura Viva, instituída pela Lei nº 13.018, de 22 de julho de 2014; e
(...)
II - aos municípios que receberem valores iguais ou superiores a R$ 360.000,00 (trezentos e sessenta mil reais): no mínimo vinte e cinco por cento dos recursos para a implementação da Política Nacional de Cultura Viva, instituída pela Lei nº 13.018, de 2014.
(…)
§ 2º Os Estados e o Distrito Federal deverão destinar entre quinze a vinte por cento dos recursos de que trata a alínea "a" do inciso I do caput para celebração de Termos de Compromisso Cultural com Pontões de Cultura, sendo garantida a seleção de, no mínimo, um Pontão de Cultura por Estado.
Art. 15. Os recursos de que trata esta Portaria serão utilizados para fortalecimento da Política Nacional de Cultura Viva, instituída pela Lei nº 13.018, de 2014, observando, no mínimo, os percentuais vinculativos de que trata o art. 2º desta Portaria.
Parágrafo único. Os recursos de que trata este Capítulo poderão ser destinados à celebração de Termos de Compromisso Cultural com Pontos e Pontões de Cultura, premiações, e concessão de bolsas.
 

A Nota Técnica SCDC n. 14/2024 informa que, para recebimento dos recursos da PNAB vinculados à PNCV, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios cadastraram os valores do Plano de Ação conforme determina o art. 5º, § 3º, da referida Portaria:

 
§ 3º No preenchimento dos valores do Plano de Ação, deverão ser respeitados os valores máximos e mínimos estabelecidos para a Política Nacional de Cultura Viva nos termos do art. 2º desta Portaria, bem como o limite máximo de cinco por cento dos recursos para operacionalização dos recursos.
 

Vale notar, ainda, que Portaria MINC nº 80/2023, assim como a IN MINC n. 08/2016, também estabelece que modelos padronizados de Editais serão disponibilizados aos entes federados, nos seguintes termos:

 

Art. 16. Os editais de chamamento público de que trata este Capítulo seguirão os modelos disponibilizados pelo Ministério da Cultura, garantindo os objetivos, princípios e diretrizes da Política Nacional de Cultura Viva.
Parágrafo único. O Ministério da Cultura definirá nos modelos de editais, as diretrizes e os limites para que os entes federativos possam estabelecer critérios de regionalização, priorização de temáticas e linguagens alinhados às suas políticas, sem necessidade de aprovação prévia do edital pelo Ministério da Cultura.

 

O art. 17 da Portaria MINC nº 80/2023 determina que o Cadastro Nacional de Pontos e Pontões de Cultura será adotado como instrumento de reconhecimento, mapeamento e certificação simplificada de entidades culturais e coletivos. Os parágrafos do referido dispositivo, por sua vez, estabelecem:

 

§ 1º Para fins do disposto no caput, poderão ser utilizados os cadastros estaduais, distrital e municipais, desde que integrados ao cadastro nacional, por deliberação da Comissão de Gestão Compartilhada do Cadastro Nacional de Pontos e Pontões de Cultura.
§ 2º É vedado ao ente federativo impedir a participação em seus editais de entidades e coletivos que ainda não sejam certificadas como Pontos ou Pontões de Cultura.
§ 3º Os editais deverão prever expressamente a possibilidade de certificação como Ponto ou Pontão de cultura das entidades e coletivos culturais classificados pelas comissões julgadoras, sem necessidade de nova análise da Comissão de Certificação Simplificada de Pontos e Pontões de Cultura, desde que adotadas as minutas de editais padronizadas disponibilizadas pelo Ministério da Cultura.

 

Recomendo à SCDC que se manifeste sobre a opção de não mencionar na minuta de Edital em tela o disposto nos os §§ 1º  e 3º. O § 2º é decorrência lógica do Edital, que permite a inscrição de entidades que ainda não sejam certificadas, para posterior certificação (itens 1.2, 3.2 e 4.1).

Ressalto, por fim, que incumbe à SCDC, órgão do Ministério responsável pela Política Nacional de Cultura Viva (nos termos do art. 18 do Decreto n. 11.336/2023), garantir o cumprimento do disposto na Portaria MINC nº 80/2023, no que diz respeito às suas competências.

 

 

II.3 - DO DECRETO N. 11.453/2023 (DECRETO DE FOMENTO)

 

O Decreto n. 11.453, de 23 de março de 2023 (Decreto de Fomento à Cultura), dispõe sobre os mecanismos de fomento do sistema de financiamento à cultura e aplica-se à matéria no que não conflitar com a legislação específica da PNCV.

O art. 8º do Decreto n. 11.453/2023 estabelece as modalidades de fomento direto à cultura, nos seguintes termos:

 

Art. 8º  Os recursos dos mecanismos de fomento direto poderão ser aplicados nas seguintes modalidades:
I - fomento à execução de ações culturais;
II - apoio a espaços culturais;
III - concessão de bolsas culturais;
IV - concessão de premiação cultural; e
V - outras modalidades previstas em ato do Ministro de Estado da Cultura.
Parágrafo único.  As modalidades de que tratam os incisos I a IV do caput poderão ser celebradas por quaisquer dos agentes culturais a que se refere o art. 4º, independentemente do seu formato de constituição jurídica.

 

No caso dos autos, a minuta de Edital ora submetida à análise desta Consultoria visa selecionar propostas para a celebração de Termos de Compromisso Cultural com Pontos e Pontões de Cultura juridicamente constituídos, bem como Organizações da Sociedade Civil sem fins lucrativos que desenvolvam e articulem atividades culturais em suas comunidades e ainda não estejam certificadas como Ponto ou Pontão de Cultura, para que desenvolvam projetos que promovam o acesso da população aos bens e aos serviços culturais nos territórios e comunidades onde atuam, nos termos da Política Nacional de Cultura Viva (item 1 do Edital - SEI 1752202).

Trata-se, portanto, da modalidade fomento à execução de ações culturais, nos termos do art. 8o, inciso I, do Decreto de Fomento à Cultura, acima transcrito.

O Decreto n. 11.453/2023 trata especificamente da modalidade de fomento à execução de ações culturais no âmbito da Política Nacional de Cultura Viva em seu art. 22, que  remete ao Termo de Compromisso Cultural, previsto na Lei nº 13.018/2014:

 

Art. 22.  A modalidade de fomento à execução de ações culturais e a modalidade de apoio a espaços culturais poderão ser implementadas por meio da celebração dos seguintes instrumentos:
(...)
II - termo de compromisso cultural, conforme os procedimentos previstos na Lei nº 13.018, de 2014, e em ato do Ministro de Estado da Cultura, nas hipóteses em que o fomento enquadrar-se no escopo da Política Nacional de Cultura Viva, conforme regulamento específico;
(...)
§ 4º  Nas hipóteses de celebração dos instrumentos a que se referem os incisos I a III do caput, não será exigível a complementação de que trata o § 2º do art. 6º da Lei nº 8.313, de 1991, tendo em vista que a destinação dos recursos está especificada na origem.
§ 5º  Nas hipóteses de celebração dos instrumentos a que se referem os incisos I, II ou IV do caput, a aplicação das regras sobre chamamento público previstas na Seção II deste Capítulo será subsidiária em relação aos procedimentos previstos na legislação específica.

 

Observo, ainda, que § 5º do dispositivo determina a aplicação das regras sobre chamamento público estabelecidas no Decreto de Fomento será subsidiária em relação aos procedimentos previstos na legislação específica, o que é o caso da Política Nacional de Cultura Viva.

O Decreto de Fomento em seu Capítulo II, Seção II (art. 9º a 21) estabelece as regras gerais para chamamentos públicos das políticas culturais de fomento direto,  exceto na hipótese de haver previsão de outro procedimento específico em regime jurídico aplicável ao instrumento escolhido (o que é o caso do Edital em tela, regido também pelas regras da PNCV). Portanto, esta Seção do Decreto aplica-se somente no que for compatível com as normas da PNCV.

De acordo com o Decreto de Fomento, o Chamamento Público é composto pelas fases de planejamento, processamento e celebração (art. 12).

A fase de planejamento (art. 13) é interna ao órgão que promoverá o procedimento de seleção e compõe-se das seguintes etapas:

 

I - preparação e prospecção;
II - proposição técnica da minuta de edital;
III - análise jurídica e verificação de adequação formal da minuta de edital; e
IV - assinatura e publicação do edital, com minuta de instrumento jurídico anexada.

 

Por sua vez, a fase de processamento é composta pelas seguintes etapas:

 

Art. 16.  Na fase de processamento do chamamento público, serão realizadas as seguintes etapas:
I - inscrição de propostas, preferencialmente por plataforma eletrônica, com abertura de prazo de, no mínimo, cinco dias úteis; (item 6) 
II - análise de propostas pela Comissão de Seleção; (item 11)
III - divulgação de resultado provisório, com abertura de prazo recursal de, no mínimo, três dias úteis e, se necessário, dois dias úteis para contrarrazões; (item 11.13)
IV - recebimento e julgamento de recursos; e  (item 11.13)
V - divulgação do resultado final. (item 11.15)

 

A minuta de Edital em análise (SEI 1752202) contempla os requisitos da fase de processamento, conforme destacado em cada um dos incisos acima transcritos.

​Observo que o item 11.10/'II' da minuta está de acordo com o disposto no art. 18, § 2º, do Decreto n. 11.453/2023que trata da etapa de análise de propostas e determina:

 

§ 2º  As propostas que apresentem quaisquer formas de preconceito de origem, raça, etnia, gênero, cor, idade ou outras formas de discriminação serão desclassificadas, com fundamento no disposto ninciso IV do caput do art. 3º da Constituição, garantidos o contraditório e a ampla defesa.
 

A última fase do chamamento público é denominada, pelo Decreto n. 11.453/2023, de celebração, contendo as seguintes etapas:

 

Art. 19.  Na fase de celebração do chamamento público, serão realizadas as seguintes etapas:
I - habilitação dos agentes culturais contemplados no resultado final; (itens 12 e 14.1)
II - convocação de novos agentes culturais para habilitação, na hipótese de inabilitação de contemplados; e (item 14.4)
III - assinatura física ou eletrônica dos instrumentos jurídicos com os agentes culturais habilitados. (item 14)
§ 1º  Os documentos para habilitação poderão ser solicitados após a divulgação do resultado provisório, vedada a sua exigência na etapa de inscrição de propostas. (itens 11, 12 e 14.1)
§ 2º  Os requisitos de habilitação serão compatíveis com a natureza do instrumento jurídico respectivo e não poderão implicar restrições que prejudiquem a democratização do acesso de agentes culturais às políticas públicas de fomento.
§ 3º  A comprovação de regularidade fiscal será obrigatória para a celebração de termos de execução cultural. 
§ 4º  O cadastro prévio poderá ser utilizado como ferramenta para dar celeridade à etapa de habilitação.
§ 5º  Eventual verificação de nepotismo na etapa de habilitação impedirá a celebração de instrumento pelo agente cultural que seja cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, de servidor público do órgão responsável pelo edital, nos casos em que o referido servidor tiver atuado nas etapas a que se refere o caput do art. 20, sem prejuízo da verificação de outros impedimentos previstos na legislação específica ou no edital. (item 5)
§ 6º  A comprovação de endereço para fins de habilitação poderá ser realizada por meio da apresentação de contas relativas à residência ou de declaração assinada pelo agente cultural.  
§ 7º  A comprovação de que trata o § 6º poderá ser dispensada nas hipóteses de agentes culturais:
I - pertencentes a comunidade indígena, quilombola, cigana ou circense;
II - pertencentes a população nômade ou itinerante; ou
III - que se encontrem em situação de rua.
§ 8º  Na hipótese de instrumento com obrigações futuras, sua celebração poderá ser precedida de diálogo técnico entre a administração pública e o agente cultural para definição de plano de trabalho.
§ 9º  Na hipótese de decisão de inabilitação, poderá ser interposto recurso no prazo de três dias úteis. (item 12.9)
§ 10.  O agente cultural poderá optar por constituir sociedade de propósito específico para o gerenciamento e a execução do projeto fomentado.
 
Art. 20.  O edital preverá a vedação à celebração de instrumentos por agentes culturais diretamente envolvidos na etapa de proposição técnica da minuta de edital, na etapa de análise de propostas ou na etapa de julgamento de recursos.
Parágrafo único.  O agente cultural que integrar Conselho de Cultura poderá participar de chamamentos públicos para receber recursos do fomento cultural, exceto quando se enquadrar na vedação prevista no caput. (item 5.1)

 

A minuta em análise segue os requisitos aplicáveis ao caso, na fase de celebração, conforme destacados acima.

O art. 19, § 2º, do Decreto de Fomento, determina ainda que os requisitos de habilitação sejam compatíveis com a natureza do instrumento jurídico respectivo e não impliquem restrições que prejudiquem a democratização do acesso de agentes culturais às políticas públicas de fomento. No caso do presente Edital, a documentação complementar exigida consta dos itens 12.1 e 14.1,  além daqueles exigidos na fase de seleção, conforme item 6.2 da minuta. Assim, cabe ao órgão técnico avaliar a documentação exigida nos itens acima mencionados, confirmando que esta é compatível com a natureza do instrumento.

 

 

II.4 - DA AÇÃO AFIRMATIVA

 

O item 7 da minuta de Edital em tela estabelece as regras para a criação de cotas (ações afirmativas).

Vale notar, nesse sentido, que a Constituição Federal estabelece, em seu art. 3º, os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, in verbis:

 

Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;
(...)
III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

 

O princípio da igualdade que inspira os dispositivos recém-transcritos é novamente contemplado no art. 5º, não somente em seu caput, como também em diversos de seus incisos:

 

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição;
(...)
XLI - a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais;
XLII - a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei;
(...)
 

Com base nos dispositivos constitucionais transcritos, infere-se a prevalência, na Carta Magna, da concepção de igualdade material (ou substancial) em detrimento da igualdade meramente formal. Assim, é possível concluir que a Constituição não só autoriza a ação afirmativa, como determina a sua instituição, como forma de alcançar a almejada igualdade substancial. Nas palavras de Carmem Lúcia Rocha: 

 

Somente a ação afirmativa, vale dizer, atuação transformadora, igualadora pelo e segundo o Direito possibilita a verdade do princípio da igualdade, para se chegar à igualdade que a Constituição brasileira garante como direito fundamental de todos. 
(ROCHA, Carmem Lúcia Antunes. Ação Afirmativa – O Conteúdo Democrático do Princípio da Igualdade Jurídica. In Revista Trimestral de Direito Público nº 15/96)

 

Confere-se, assim, com amparo no princípio da isonomia, tratamento desigual aos desiguais, na medida de suas desigualdades. É o que nos ensina Joaquim Barbosa:

 

Essa, portanto, é a concepção moderna e dinâmica do princípio constitucional da igualdade, a que conclama o Estado a deixar de lado a passividade, a renunciar à sua suposta neutralidade e a adotar um comportamento ativo, positivo, afirmativo, quase militante na busca da concretização da igualdade substancial.
(GOMES, Joaquim B. Barbosa. A Recepção do Instituto da Ação Afirmativa pelo Direito Constitucional Brasileiro. In Revista de Informação Legislativa, ano 38, n 151, p. 129, 2001)

 

Por outro lado, os art. 3º, incisos II, VI e VIII, e art. 5º do Decreto n. 11.453/2023 reforçam os fundamentos dos aspectos afirmativos do Edital:

 

Art. 3º Os mecanismos de fomento cultural contribuirão para:
(...)
II - estimular a expressão cultural dos diferentes grupos e comunidades que compõem a sociedade brasileira;
(...)
VI - fomentar atividades culturais afirmativas para a promoção da cidadania cultural, da acessibilidade às atividades artísticas e da diversidade cultural;
(...)
VIII - fomentar o desenvolvimento de atividades artísticas e culturais pelos povos indígenas e pelas comunidades tradicionais brasileiras;
(...)
Art. 5º  As ações afirmativas e reparatórias de direitos poderão ser realizadas por meio de editais específicos, de linhas exclusivas em editais, da previsão de cotas, da definição de bônus de pontuação, da adequação de procedimentos relativos à execução de instrumento ou prestação de contas, entre outros mecanismos similares destinados especificamente a determinados territórios, povos, comunidades, grupos ou populações.

 

No âmbito específico da PNCV, o art. 24, § 1º, da IN MinC n. 08/2016 dispõe expressamente sobre a possibilidade de ações afirmativas nos seguintes termos:

 

§ 1º Os editais de chamamento público no âmbito da PNCV poderão conter cláusula ou condição relativa à participação no certame e à execução de parcerias por público determinado, com delimitação territorial, pontuação diferenciada, cotas ou quaisquer outros mecanismos que visem aos seguintes objetivos:
I - redução nas desigualdades sociais e regionais;
II - promoção da igualdade de gênero, racial, de direitos de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais - LGBT ou de direitos das pessoas com deficiência;
III - promoção de direitos de indígenas, de quilombolas e de povos e comunidades tradicionais; ou
IV - promoção de direitos de quaisquer populações em situação de vulnerabilidade social. 

 

A Lei n. 14.399/2022, em seu art, 8º, § 4º, também determina que nos editais de que trata a Lei, os entes federativos recebedores dos repasses da União estabeleçam políticas de ação afirmativa.

Nesse sentido, a Instrução Normativa MinC nº 10, de 28 de dezembro de 2023, estabelece as regras e os procedimentos para implementação das ações afirmativas e medidas de acessibilidade de que trata o Decreto nº 11.740/2023, que regulamenta a Lei nº 14.399/2022 (PNAB). A Nota Técnica SCDC n. 14/2024 não menciona a referida Instrução Normativa, mas percebe-se que a minuta de Edital em tela incorpora alguns elementos da norma, especialmente no Anexo 1, que contém a transcrição de diversos dispositivos da norma. 

Conclui-se, portanto, a ação afirmativa estabelecida pelo Edital em análise está de acordo com a legislação vigente. Recomendo, no entanto, que as ações afirmativas de cada Edital sejam justificadas pelo órgão que administrará a seleção, sob o ponto de vista técnico, com base no diagnóstico da desigualdade que se pretende abordar, já que a possibilidade jurídica da ação não se confunde com a motivação do ato.

 

 

II.5 - DA MINUTA DE EDITAL

 

Uma vez abordados os requisitos previstos nas normas jurídicas que regem o processo seletivo e aspectos mais gerais deste, passo a tecer comentários pontuais sobre alguns itens do Edital, não necessariamente relacionados à legislação acima mencionada, na ordem em que aparecem na minuta.

No item 5.1, inciso VII, as alíneas 'c', 'd' e 'e' devem ser convertidas em novos incisos, posto que não tratam de Instituições privadas sem fins lucrativos (que são o objeto do inciso VII).

Observo que o item 14.10 do Edital trata da questão da incidência de impostos sobre os recursos recebidos. ​A este respeito faço algumas observações:

a) recomenda-se a especificação dos tributos mencionados na cláusula, já que a expressão "impostos próprios das contratações de serviço" é vaga e pode levar a equívocos;​

b) recomenda-se que a minuta indique que os entes públicos poderão mencionar os tributos de sua competência;

c) é possível dizer que a realização do projeto pelo agente cultural no âmbito da parceria não se caracteriza como prestação de serviço, a fim de facilitar o enquadramento tributário;

d) quanto aos tributos federais, deve ser observado o exposto no PARECER nº 244/2023/CONJUR-MINC/CGU/AGU (SEI 1450008) e no PARECER Nº 3702/2023/MF (SEI 1510966), no que couber (estes Pareceres não tratam da PNAB, mas alguns princípios neles expostos são aplicáveis). Caso haja dúvidas específicas, estas poderão ser submetidas a esta Consultoria Jurídica ou ao órgão de assessoramento jurídico dos entes que lançarão os editais.

Recomendo que seja revista a menção a "premiação" em todo o Edital, visto que este não é o objeto do certame.

Os Anexos do Edital  são os seguintes:

Quanto aos Anexos, além do que já foi mencionado nos itens anteriores deste Parecer, observo o que se segue:

 

a) Os Anexos 1, 2, 3, 4 e 5 tratam de questões técnicas/operacionais, que não cabe a esta Consultoria Jurídica avaliar.

Observo que o Plano de Trabalho é documento eminentemente técnico que deve seguir o disposto no art. 22 da IN MINC n. 8/2016. O modelo juntado ao Anexo 4 aparentemente não contém todos os requisitos do referido dispositivo, motivo pelo qual sugiro que o órgão técnico reveja o documento ou registre nos autos as justificativas para tanto.

b) Os Anexos 6, 7, 8 e 9 são documentos simples, com alguma repercussão jurídica, e não há o que se opor à redação proposta. 

c) A minuta de Termo de Compromisso Cultural - TCC (Anexo 10), deve seguir, no que couber, a minuta aprovada por esta Consultoria Jurídica no âmbito do PARECER REFERENCIAL n. 00007/2023/CONJUR-MINC/CGU/AGU (NUP: 01400.012212/2023-94).

 

Por fim, antes da publicação do Edital, recomenda-se a revisão geral das minutas de Edital e Anexos, inclusive da numeração e remissões internas.

 

 

III - CONCLUSÃO

 

Face ao exposto, e face à manifestação técnica favorável, concluo que a minuta de Edital em tela é coerente com a legislação aplicável e com os objetivos pretendidos, podendo ser divulgada para uso pelos Entes Federados, conforme estabelece o art. 23 da IN MINC n. 08/2016, desde que observado o disposto no presente Parecer.

Por fim, nos termos do Enunciado nº 05 do Manual de boas Práticas Consultivas da AGU, ressalto que não é necessário o retorno dos autos a esta Consultoria, salvo se subsistir dúvida de cunho jurídico.

Isto posto, submeto o presente processo à consideração superior, sugerindo que os autos sejam encaminhados à Secretaria da Cidadania e Diversidade Cultural, para as providências cabíveis.

Brasília, 22 de maio de 2024.

 

 

DANIELA GUIMARÃES GOULART

Advogada da União

 

 


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