ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CÂMARA NACIONAL DE PROCEDIMENTOS ADMINISTRATIVOS DISCIPLINARES - CNPAD/DECOR/CGU
PARECER n. 00002/2024/CNPAD/CGU/AGU
NUP: 00688.000720/2019-10.
INTERESSADO: DECOR.
ASSUNTO: Termo de Ajustamento de Conduta - TAC.
Termo de Ajustamento de Conduta - TAC. Procedimento de solução consensual de litígio de natureza disciplinar. Fatos de menor potencial ofensivo ou de menor gravidade são aqueles em que a suposta conduta irregular enquadra-se nas situações previstas nos artigos 116 ou 117, incisos I a VIII e XIX, não havendo indicação de tratar-se de casos preceituados no art. 132, da Lei nº 8.112, de 1990, hipóteses em que, uma vez observadas as condições específicas indicadas no respectivo ato normativo aplicável, devem, em regra, ser celebrados termos de ajustamento de conduta, ressalvada a possibilidade de decisão fundamentada em sentido diverso, nos termos do art. 20 da LINDB.
Sra. Diretora do DECOR,
I - RELATÓRIO:
O tema relativo à celebração de Termo de Ajustamento de Conduta - TAC foi apresentado e adotado pelos integrantes da Câmara Nacional de Procedimentos Administrativos Disciplinares (CNPAD) como questão relevante a ser enfrentada pelo Colegiado para uniformização de entendimentos no âmbito da Administração Pública Federal.
É o relatório. Passa-se a opinar.
II - FUNDAMENTAÇÃO:
II.A) TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA E RESOLUÇÃO CONSENSUAL DE CONFLITO:
A celebração de Termo de Ajustamento de Conduta – TAC por servidores públicos federais, em razão de provável cometimento de ilícitos administrativos disciplinares, previstos na Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990 e legislação federal correlata, encontra previsão na Portaria Normativa CGU nº 27, de 11 de outubro de 2022[1].
A análise aqui restringe-se ao termo de ajustamento de conduta aplicável a servidores públicos federais estatutários, regidos pela Lei nº 8.112, de 1990, integrantes de órgãos, autarquias, fundações e agências federais, ocupantes de cargo efetivo.
Conforme previsto na Portaria Normativa CGU nº 27, de 2022, o TAC consiste em procedimento administrativo para resolução consensual de conflitos (art. 61, caput), sendo que o termo de ajustamento é aplicável a casos de infração de menor potencial ofensivo (art. 62, caput), conforme transcrições abaixo:
Art. 61. O Termo de Ajustamento de Conduta - TAC consiste em procedimento administrativo voltado à resolução consensual de conflitos em casos de infração disciplinar de menor potencial ofensivo.
(...)
***
Art. 62. Considera-se infração disciplinar de menor potencial ofensivo a conduta punível com advertência ou suspensão de até 30 (trinta) dias, nos termos do inciso II do art. 145 da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, ou com penalidade similar, prevista em lei ou regulamento interno.
(...)
Para os servidores públicos efetivos estatutários, o conceito de menor potencial ofensivo engloba conduta punível com advertência ou suspensão de até 30 (trinta) dias, nos termos do inciso II do artigo 145 da Lei nº 8.112, de 1990.
De ser assinalado que no âmbito da Advocacia-Geral da União o termo de ajustamento de conduta é disciplinado pela Portaria Normativa AGU nº 92, de 17 de maio de 2023. Esse normativo prevê a celebração de ajustamento de condutas para hipóteses de menor gravidade, conforme artigos 1º e 3º, inciso II, abaixo transcritos:
Art. 1º Esta Portaria Normativa disciplina a celebração do Termo de Ajustamento de Conduta - TAC, nas hipóteses de infração disciplinar de menor gravidade, no âmbito dos órgãos da Advocacia-Geral da União.
(...)
***
Art. 3º Para efeitos desta Portaria Normativa, considera-se:
(...)
II - infração disciplinar de menor gravidade: aquela cujas circunstâncias possam resultar, em tese, na aplicação das penalidades de advertência ou de suspensão de até trinta dias;
Observe-se que o ilícito administrativo disciplinar de "menor gravidade", previsto no artigo 3º, inciso II, da Portaria Normativa AGU nº 92, de 2023, possui a mesma definição de "menor potencial ofensivo" previsto no artigo 62 da Portaria Normativa CGU nº 27, de 2022, qual seja, infrações que, caso configuradas, resultariam na aplicação de penalidades de advertência ou suspensão.
O artigo 63 da Portaria Normativa CGU nº 27, de 2022, aponta os outros requisitos para a celebração do TAC e encaminhamento de resolução consensual do conflito de natureza disciplinar existente entre a União, suas autarquias, fundações públicas e agências federais e o servidor público civil, conforme abaixo transcrito:
Art. 63. O TAC somente será celebrado quando o investigado:
I - não tenha registro vigente de penalidade disciplinar em seus assentamentos funcionais;
II - não tenha firmado TAC nos últimos 2 (dois) anos, contados a partir da publicação do instrumento; e
III - tenha ressarcido, ou se comprometido a ressarcir, eventual dano causado à Administração Pública.
Também em relação a tais requisitos adicionais, o TAC celebrado na Advocacia-Geral da União observa cumulação de requisitos similares aos adotados pela Controladoria-Geral da União, conforme artigo 4º da Portaria Normativa AGU nº 92, de 2023:
Art. 4º A celebração do TAC somente será possível se, cumulativamente:
I - os fatos envolverem, em tese, infração disciplinar de menor gravidade;
II - o interessado assumir o compromisso de ajustar sua conduta;
III - não houver penalidade disciplinar aplicada ao interessado nos últimos dois anos, contados da data da publicação do julgamento; e
IV - não houver sido celebrado TAC relacionado a fatos semelhantes nos últimos dois anos dois anos, contados da data em que o interessado for cientificado da assinatura da autoridade competente para sua aprovação.
A partir desse momento, o presente parecer passa a apontar tão somente as disposições previstas na Portaria Normativa CGU nº 27, de 2022, aplicáveis a todos os servidores regidos pela Lei nº 8.112, de 1990. Nada obstante, os aspectos que seguem apontados guardam estreita consonância com as disposições da Portaria Normativa AGU nº 92, de 2023, aplicável no âmbito da Advocacia-Geral da União e de seus órgãos vinculados.
O objetivo do TAC é pacificar o ambiente administrativo, mediante a solução consensual do conflito, de modo que o servidor interessado se comprometa a adequar a conduta, observar deveres e proibições e cumprir compromissos propostos pela Administração. A celebração do acordo depende da aceitação voluntária do servidor, havendo um ônus a ser suportado na celebração do termo de ajustamento com a Administração Pública. Atualmente essa previsão consta do artigo 64 da Portaria Normativa CGU nº 27, de 2022.
Tal método consensual de solução de conflitos engaja os envolvidos na construção de uma solução própria para determinado caso, evitando-se o ônus da apuração e a imposição de uma decisão disciplinar por parte da Administração Pública. A solução cria condições de ampliação de diálogo dentro da gestão pública, melhora a compreensão do comportamento a ser adotado pelo servidor, colabora para a saúde do ambiente de trabalho (evitando estresse emocional da relação entre servidor acusado, advogados e de membros de comissão disciplinar) e gera, consequentemente, maior probabilidade de normalização do serviço público prestado e em menor tempo.
Identificado o pressuposto de menor potencial ofensivo da irregularidade e atendidos os requisitos previstos na Portaria Normativa CGU nº 27, de 2022, a Administração Federal deve, em regra, celebrar o TAC. O artigo 61 da mesma portaria aponta os ganhos de eficiência e de efetividade, além da racionalização de recursos públicos, que são objetivados com a solução consensual do conflito, conforme transcrição abaixo:
Art. 61. (...)
Parágrafo único. Os órgãos e entidades do Poder Executivo federal deverão optar pela celebração do TAC, visando à eficiência, à efetividade e à racionalização de recursos públicos, desde que atendidos os requisitos previstos nesta Portaria Normativa.
De ser observado que os requisitos constantes no artigo 63 da Portaria Normativa CGU nº 27, de 2022, são de identificação objetiva. De outro lado, a análise da condição prevista do artigo 62 demanda uma reflexão maior. A construção de parâmetros para análise da existência de uma possível infração disciplinar de menor potencial ofensivo ou de menor gravidade (penas hipotéticas de advertência ou suspensão de até 30 dias) exige leitura sistemática da legislação federal.
Assim, este parecer pretende colaborar para responder à seguinte pergunta: como interpretar os critérios previstos no artigo 62 da Portaria Normativa CGU nº 27, de 11 de outubro de 2022, para a celebração do termo de ajustamento de conduta no âmbito do sistema disciplinar do servidor público federal, ocupante de cargo efetivo, regido pela Lei nº 8.112, de 1990, de forma a atribuir maior segurança e uniformização para a aplicação da solução consensual de conflitos disciplinar por meio de termo de ajustamento de conduta?
II.B) IDENTIFICAÇÃO DE FATOS DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO (MENOR GRAVIDADE):
Pode aparentar algo intuitivo ou mesmo calculável identificar quais fatos possuem menor potencial ofensivo (menor gravidade) para a aplicação da solução pacífica de conflitos. Todavia, a Lei nº 8.112, de 1990, não apresenta relação direta entre condutas irregulares e a penalidade a ser aplicada, com exceção das hipóteses de demissão e de suspensão de 15 (quinze) dias para caso de recusa a submeter-se à inspeção médica.
Assim, em atenção à necessidade da transparência imposta à Administração Pública pela Constituição Federal e da dignidade dos trabalhadores (servidores) do quadro administrativo estatal, justo e adequado estabelecer cenário jurídico de maior segurança, inclusive para os gestores que atuam no tema disciplinar.
Como afirmado, o Estatuto do Servidor Público Civil não prescreve uma categorização por gravidade de conduta, nos moldes do que fazia a revogada Lei nº 8.027, de 1990, que estabelecia a diferença entre condutas passíveis de advertência, suspensão e demissão (artigos 3º, 4º e 5º).
De outra sorte, a vigente Lei nº 4.878, de 3 de dezembro de 1965 (Estatuto dos Policiais Civis da União e do Distrito Federal), possui uma classificação própria de ilícitos disciplinares que dialoga com a Lei nº 8.112, de 1990. Essa categorização da legislação policial, integrante do corpo de legislação disciplinar federal, aplicável a servidores federais civis, serve inicialmente de fundamento para reflexão da construção do que deve ser considerado como menor potencial ofensivo (menor gravidade) para a celebração do TAC.
Para a Lei Federal nº 4.878, de 1965, o ilícito relacionado aos deveres profissionais e algumas transgressões disciplinares específicas são classificados como de natureza leve, passíveis da aplicação da penalidade mais branda, a de repreensão por escrito (artigos 42 e 46). Essa repreensão guarda relação direta de natureza com a advertência por escrito prevista na Lei nº 8.112, de 1990. Já para as transgressões disciplinares descritas como de natureza grave (e hipóteses de reincidência), a Lei nº 4.878, de 1965, prevê as penalidades de suspensão.
Aqui um dado importante: o artigo 41 da Lei nº 4.868, de 1965, aponta como deveres funcionais gerais as hipóteses previstas no artigo 194 da Lei nº 1.711, de 1952. A ausência de cumprimento de deveres é punida com repreensão escrita, nos termos do artigo 42, sendo que essa inobservância de deveres abarca o conceito de natureza leve, conforme artigo 46. Também possuem natureza leve, transgressões específicas apontadas no parágrafo único do artigo 46. Segue transcrição dos dispositivos mencionados:
Art. 41. Além do enumerado no artigo 194 da Lei nº 1.711, de 28 de outubro de 1952, é dever do funcionário policial freqüentar com assiduidade, para fins de aperfeiçoamento e atualização de conhecimentos profissionais, curso instituído periodicamente pela Academia Nacional de Polícia, em que seja compulsoriamente matriculado.
***
Art. 42. Por desobediência ou falta de cumprimento dos deveres o funcionário policial será punido com a pena de repreensão, agravada em caso de reincidência.
(...)
***
Art. 46. A pena de repreensão será sempre aplicada por escrito nos casos em que, a critério da Administração, a transgressão seja considerada de natureza leve, e deverá constar do assentamento individual do funcionário.
Parágrafo único. Serão punidas com a pena de repreensão as transgressões disciplinares previstas nos itens V, XVII, XIX, XXll, XXIII, XXIV, XXV, XLIX e LIV do artigo 43 desta Lei.
Constata-se objetivamente que os deveres previstos no artigo 116 da Lei nº 8.112, de 1990, reproduzem os mesmos valores (e em algum casos o mesmo texto) do modelo disciplinar do artigo 194 da Lei nº 1.711, de 1952. Com a revogação da Lei nº 1.711, de 1952, pela Lei nº 8.112, de 1990, os Policiais Federais da União passaram a ter que observar os deveres previstos no artigo 116 da Lei nº 8.112, de 1990, dentro de uma aplicação sistemática das regras jurídicas vigentes. Assim, as inobservâncias dos deveres pelos servidores policiais federais, previstos no artigo 116 da Lei nº 8.112, de 1990, são transgressões de natureza leve.
Para além e de forma integrada com a análise comparativa dos sistemas disciplinares federais, extrai-se da redação do artigo 63, inciso III, e 64, caput, da Portaria Normativa nº 27, de 2022, que tanto as hipóteses de inobservância de deveres, quanto a de violação de proibições, inclusive quando gerarem dano, podem ser objeto da resolução consensual. Assim, os ilícitos previstos no artigo 116 (deveres do servidor) e no artigo 117 (proibições), podem ser objeto de celebração de acordo disciplinar com a Administração Pública, desde que seja ressarcido ou assumido o compromisso de ressarcimento de eventual dano.
Por óbvio, há casos previstos no artigo 117 da Lei nº 8.112, de 1990, que não podem ser objeto de TAC. A transgressão das proibições dos incisos IX a XVI do artigo 117 não podem ser objeto de transação, tendo em vista que tais condutas são puníveis com demissão (artigo 132, inciso XIII, da Lei nº 8112, de 1990).
Resta claro, assim, que as inobservância de deveres e violação de proibições (com exceção das hipóteses de demissão), são passíveis de solução consensual por meio de ajustamento de conduta. Todavia, ainda há uma questão a ser enfrentada: como identificar se a conduta é passível de uma penalidade de advertência ou suspensão até o limite de 30 (trinta) dias, considerando que não há expresso tal parâmetro na Lei nº 8.112, de 1990?
II.C) TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA E A ANÁLISE DA NATUREZA E GRAVIDADE DA INFRAÇÃO:
Em linhas gerais, vale salientar que o art. 66 da Portaria Normativa CGU nº 27, de 2022, projeta três momentos processuais em que a proposta do TAC poderia surgir no curso da apuração disciplinar, quais sejam: a) por ocasião do juízo de admissibilidade, apresentado pela autoridade correicional (inciso I); b) no período de até 10 (dez) dias após notificação inicial no processo disciplinar, proposto pelo acusado (inciso III c/c §1º); c) antes do relatório final, após produção de provas que indiquem o enquadramento da conduta nos limites das penalidades passíveis de resolução consensual, proposto pela comissão disciplinar (inciso II c/c §2º). Senão vejamos:
Art. 66. A proposta de TAC poderá:
I - ser oferecida de ofício pelo titular da unidade setorial de correição ou, na inexistência deste, pela autoridade competente para instauração do respectivo processo correcional de responsabilização de agentes públicos;
II - ser sugerida pela comissão responsável pela condução do processo correcional de responsabilização de agentes públicos; ou
III - ser apresentada pelo agente público interessado.
§ 1º Em processos correcionais de responsabilização de agentes públicos em curso, a proposta de TAC poderá ser apresentada pelo interessado à autoridade instauradora em até 10 (dez) dias após o recebimento da notificação de sua condição de acusado.
§ 2º A proposta de TAC poderá ser sugerida pela comissão antes da apresentação do relatório final, nos casos em que as provas produzidas durante a fase de inquérito indicarem a necessidade de reenquadramento da conduta do acusado, passando esta a ser considerada de menor potencial ofensivo, nos termos do art. 62 desta Portaria Normativa.
§ 3º A proposta de TAC sugerida por comissão responsável pela condução de processo correcional de responsabilização de agentes públicos ou apresentada pelo interessado poderá ser indeferida quando ausente alguma das condições para sua celebração.
§ 4º O prazo estabelecido no § 1º aplica-se às hipóteses de oferecimento de ofício de proposta de TAC pelo titular da unidade setorial de correição ou pela autoridade competente para instauração do respectivo processo correcional de responsabilização de agentes públicos, que fixará no mesmo ato o prazo para a manifestação do investigado.
Assim, dos três momentos previstos pela norma supracitada, apenas por ocasião de apresentação de proposta pela comissão disciplinar, antes do relatório final, a Administração Pública possui elementos mais amadurecidos, submetidos à ampla defesa constitucional no processo disciplinar, que possibilitam uma análise segura e balizada do tipo e quantidade de penalidade a ser aplicada, uma vez que os fatos do processo foram submetidos a contraditório.
Em específico, no caso de apuração no âmbito da Advocacia-Geral da União, a proposta de TAC pela comissão disciplinar deve ser apresentada até a fase de indiciamento, desde que não esteja prescrita a penalidade (artigo 6º, §4º, da Portaria AGU nº 92, de 17 de maio de 2023).
Veja-se que os elementos para aplicação da penalidade de advertência ou para a quantificação da suspensão constam dos artigos 128 e 129 da Lei nº 8.112, de 1990:
Art. 128. Na aplicação das penalidades serão consideradas a natureza e a gravidade da infração cometida, os danos que dela provierem para o serviço público, as circunstâncias agravantes ou atenuantes e os antecedentes funcionais.
(...)
***
Art. 129. A advertência será aplicada por escrito, nos casos de violação de proibição constante do art. 117, incisos I a VIII e XIX, e de inobservância de dever funcional previsto em lei, regulamentação ou norma interna, que não justifique imposição de penalidade mais grave. (destacado)
Os elementos “natureza” e “gravidade da infração” só podem ser efetivamente avaliados após a adequada instrução processual contraditória. Já os “danos”, sob o ponto de vista material econômico, podem ser identificáveis ou mesmo quantificáveis antes da instauração. Danos relativos à imagem da instituição ou eventual perturbação significativa do funcionamento da repartição só podem ser adequadamente aferidos também com a instrução submetida à ampla defesa. Por oportuno, recorde-se que existência de dano material não veda a celebração do ajuste consensual entre Administração e servidor, desde que seja adimplido ou haja o compromisso do pagamento.
Ainda, embora os antecedentes funcionais possam deter presunção de veracidade, as circunstâncias agravantes e atenuantes demandam discussão em âmbito processual para serem processualmente avaliadas quanto ao impacto na quantificação da penalidade. Mesmo porque a instrução possibilita que o acusado, investigado em processo disciplinar, também destaque elementos constantes dos antecedentes e mesmo se oponha a circunstâncias constantes dos assentamentos.
Nota-se, portanto, que elementos centrais para a definição e quantificação da penalidade a ser potencialmente aplicada só podem ser efetivamente valorados a partir da efetiva realização da instrução no processo com garantia de ampla defesa, conforme apontamento constitucional.
Não se nega que a Investigação Preliminar Sumária – IPS pode trazer elementos de informação para circunstanciar autoria e materialidade, em âmbito de juízo de admissibilidade disciplinar. Nada obstante, não se afasta a precariedade processual de tais elementos, vez que o procedimento é não contraditório e de acesso restrito, conforme previsto no artigo 40 da Portaria Normativa CGU nº 27, de 2022. Assim, embora orientem, não podem ser adotados exclusivamente para decisão acerca da celebração do ajustamento de conduta.
Então, quais diretrizes legais devem ser observadas para a apresentação do termo de ajustamento pela autoridade indicada no artigo 66, inciso I, da Portaria Normativa CGU nº 27, de 2022?
Inicialmente, a autoridade responsável pela instauração disciplinar deve observar a diretriz geral aplicada ao Estado para a resolução de conflitos, qual seja: sempre que possível a solução deverá ser consensual. Tal diretriz, externada no Código de Processo Civil, consiste em norma geral de solução de controvérsias, dirigida ao Estado Brasileiro, não se limitando apenas ao processo civil. Abaixo a transcrição do §2º, do artigo 3º, do CPC:
Art. 3º. (...)
§ 2º O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos.
Embora seja claro o direcionamento do texto da norma acima apresentado, em caráter de reforço, recorde-se que as disposições do CPC aplicam-se de forma supletiva e subsidiária ao processo administrativo (artigo 15 do CPC). Assim, sendo possível a solução consensual de conflitos, o termo de ajustamento de conduta disciplinar deve ser adotado.
Afastam-se, assim, da celebração de TAC, as hipóteses nas quais não é possível à discricionariedade administrativa aplicar uma penalidade de advertência ou suspensão. Isso porque a Advocacia-Geral da União firmou compreensão, em pareceres vinculantes (PARECER AGU Nº GQ-167, PARECER AGU Nº GQ-177, PARECER AGU Nº GQ-183), que nas hipóteses de demissão previstas na Lei nº 8.112, de 1990, a autoridade administrativa não dispõe de discricionariedade para aplicar penalidade distinta. No mesmo sentido de tais pareceres, o teor do enunciado da Súmula nº 650 do Superior Tribunal de Justiça: "A autoridade administrativa não dispõe de discricionariedade para aplicar ao servidor pena diversa de demissão quando caracterizadas as hipóteses previstas no artigo 132 da Lei 8.112/1990”. Dessa forma, na prática, na fase anterior ao processo disciplinar, havendo discussões de enquadramento dos fatos em hipóteses de demissão disciplinar, não há espaço para solução consensual do conflito. Nas demais hipóteses, a autoridade pública promoverá a celebração do ajustamento de conduta.
Adicione-se a isso outras limitações fixadas pelo Órgão Central do Sistema de Correição do Poder Executivo Federal que vedam celebração de ajustamento consensual. Não se aplica solução consensual nas hipóteses em que o servidor possua penalidade vigente em seus assentos funcionais, que tenha firmado TAC nos últimos dois anos e que não ressarça ou assuma o compromisso de ressarcir dano causado à Administração, conforme previsão do artigo 63 da Portaria Normativa CGU nº 27, de 2022.
Apresenta-se razoável essa diretriz apresentada pela Controladoria-Geral da União no mencionado artigo 63 da Portaria Normativa CGU nº 27, de 2022. Há que se avaliar o histórico funcional do profissional antes da decisão de instalação de processo disciplinar. Não havendo registros vigentes que desabonem a conduta profissional, apresenta-se viável a solução consensuada. Mesmo havendo prejuízo ao erário, caso o servidor não possua história laboral envolvendo problemas disciplinares, e pague ou assuma a responsabilidade do pagamento do dano, é viável a celebração do TAC.
De ser reiterado que a previsão trazida pelo Código de Processo Civil de 2015, apontando para a consensualidade como regra na solução de conflitos nos processos estatais, destaca o reforço de aspectos constitucionais como a solução pacífica de conflitos, o incremento do diálogo e da solidariedade, a valorização da democracia, com ênfase para autonomia do cidadão (inclusive o servidor) em dialogar e construir soluções mais efetivas com a Administração Pública.
O instrumento do TAC enfoca a conciliação e a solução adequada para eventual desalinhamento da relação jurídica de subordinação disciplinar. Há uma imediata composição e um ônus imposto ao servidor em moldar seu comportamento aos aspectos legais, normativos e culturais da instituição, necessários ao cumprimento das atribuições do cargo ocupado. Há, de fato, uma preocupação maior com a equalização dos problemas de funcionamento da Administração Pública e uma ênfase menor na obrigatoriedade de instauração do processo e na apenação disciplinar.
Como visto, há clara diretriz legal cogente no país a apontar a solução de conflitos de forma consensual, sempre que possível. Ademais, a construção dos parâmetros para interpretação da possibilidade de celebração do termo de ajustamento de conduta deve observar os contornos estabelecidos pelo Decreto-Lei nº 4.657, de 1942 (Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro – LINDB), em especial alterações trazidas pela Lei nº 13.665, de 2018 que tratam da interpretação e tomada de decisão nas esferas administrativas (artigos 20 a 30).
As consequências práticas da decisão, na avaliação da construção hermenêutica, devem ser consideradas. O TAC é no sistema disciplinar alternativa à regra da instauração disciplinar (nas hipóteses de possível penalidade de advertência ou suspensão). Na prática, o sistema disciplinar federal não oferta de forma clara as hipóteses de advertência e de suspensão até 30 dias. Dessa forma, a análise de suposto ilícito disciplinar tende a enviesar-se para a regra geral, a instauração de processo disciplinar, sem considerar efetivamente a construção de uma solução pacificadora, na forma do §2º, do artigo 3º, do CPC.
Nessa linha, para que se efetive a regra da solução consensual como instrumento de atuação do Estado, adequado deixar claramente sinalizado no sistema disciplinar, tanto para o analista do processo, a autoridade competente, o servidor público e a sociedade, os parâmetros mais precisos para a tomada de decisão pela consensualidade. Dessa forma, antes da instauração do processo disciplinar, não é eficiente deixar espaço de dúvida na construção hermenêutica.
Isso, também, porque há necessidade de incrementar um melhoria regulatória e de transparência de modo que a Administração Pública possa cumprir com seus compromissos de boa governança (Decreto nº 9.203, de 22 de novembro de 2017, artigo 3º, IV). Para o presente caso, dentro do conceito de governança, devem ser observadas diretrizes de simplificação administrativa, estabilização e coerência na aplicação do direito administrativo disciplinar. Em reforço ao apresentado, a própria LINDB impõe como dever ao gestor público a atuação para o aumento da segurança jurídica na aplicação das normas:
Art. 30. As autoridades públicas devem atuar para aumentar a segurança jurídica na aplicação das normas, inclusive por meio de regulamentos, súmulas administrativas e respostas a consultas.
A solução apresentada neste Parecer garante razoável previsibilidade e uniformização na tomada de decisões. Entregar ao analista processual e à autoridade competente apenas os elementos colhidos na Investigação Preliminar Sumária para que construam, a partir de valores jurídicos abstratos, a solução de enquadramento ou não na hipótese de penalidade de advertência ou suspensão de até 30 dias, considerando que a Lei nº 8.112, de 1990, não contribui para a estabilização, racionalização e razoável uniformização do sistema disciplinar. A regra deve ser a celebração de termo de ajustamento de conduta nos casos de inexistência de circunstâncias que indiquem hipóteses legais de penalidade de demissão.
Com isso, para a solução consensual de conflitos disciplinares, no âmbito da Administração Pública Federal, envolvendo servidores públicos, ocupantes de cargos efetivos regidos pela Lei nº 8.112, de 1990, a autoridade responsável, em regra, deve celebrar o termo de ajustamento de conduta, antes da instauração do processo administrativo disciplinar ou, durante a tramitação do PAD, por proposta do acusado ou sugestão da comissão disciplinar, caso atendidos os seguintes requisitos cumulativos:
(i) a suposta conduta irregular enquadrar-se nas hipóteses dos artigos 116 ou 117, incisos I a VIII, XVII, XVIII e XIX, da Lei nº 8.112, de 1990;
(ii) não haver indicação de tratar-se das situações previstas no art. 132, da Lei nº 8.112, de 1990; e
(iii) estarem presentes as condições específicas indicadas no respectivo ato normativo aplicável, destacando-se, nesse aspecto, atualmente, a Portaria Normativa CGU nº 27, de 2022, a qual preconiza, em seu art. 63, que o TAC somente será celebrado quando o investigado: (iii.a) não tenha registro vigente de penalidade disciplinar em seus assentamentos funcionais; (iii.b) não tenha firmado TAC nos últimos 2 (dois) anos, contados a partir da publicação do instrumento; e (iii.c) tenha ressarcido, ou se comprometido a ressarcir, eventual dano causado à Administração Pública.
Cumpre expor que, em linhas gerais, aplicam-se as mesmas conclusões para o âmbito da Advocacia-Geral da União e seus órgãos vinculados. Em relação ao requisito insculpido no item "iii" do parágrafo acima, convém esclarecer que devem estar presentes as condições específicas previstas nos artigos 4º, incisos III e IV e 12, §5º, inciso I, da Portaria AGU nº 92, de 17 de maio de 2023, quais sejam: (a) não haver penalidade administrativa aplicada ao interessado nos últimos dois anos; (b) não haver sido celebrado TAC por fatos semelhantes nos últimos dois anos; e (c) inexistir descumprimento de TAC nos últimos três anos.
No mais, vale externar que, caso a proposta de termo de ajustamento de conduta seja sugerida pela comissão disciplinar, antes da apresentação do relatório (artigo 66, inciso II, da Portaria Normativa CGU nº 27, de 2022), a autoridade instauradora deve avaliar todos os elementos probatórios produzidos e verificar se a provável conclusão do processo disciplinar será o arquivamento, a aplicação de penalidade de advertência ou de suspensão, hipóteses em que, em regra, deverá acatar a sugestão da comissão disciplinar de celebração de ajustamento de conduta, frisando-se que não será hipótese de TAC se tiver ocorrido a prescrição disciplinar.
Por outro lado, em qualquer caso, mesmo se atendidos todos os requisitos para a celebração do termo de ajustamento de conduta, ressalva-se, de forma excepcional, a possibilidade de instauração ou continuidade da apuração disciplinar, a partir de decisão da autoridade competente, fundamentada em elementos concretos presentes nos autos, que aponte a utilidade do processo administrativo disciplinar ou a inadequação da medida de solução consensual, nos termos do art. 20 da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro (Decreto-Lei nº 4.657, de 4 de setembro de 1942, com redação dada pela Lei nº 12.376, de 2010), o qual prevê, em seu caput, que "nas esferas administrativa [...] não se decidirá com base em valores jurídicos abstratos sem que sejam consideradas as consequências práticas da decisão", bem como, em seu parágrafo único, que "a motivação demonstrará a necessidade e a adequação da medida imposta [...] inclusive em face das possíveis alternativas".
III - CONCLUSÃO:
Ante o exposto, concluiu-se que:
a) para a solução consensual de conflitos disciplinares, no âmbito da Administração Pública Federal, envolvendo servidores públicos, ocupantes de cargos efetivos regidos pela Lei nº 8.112, de 1990, em regra, a autoridade responsável deve celebrar o termo de ajustamento de conduta, de ofício ou a requerimento do acusado, antes da instauração do processo administrativo disciplinar ou, após iniciado do PAD, mediante proposta do acusado ou sugestão da comissão disciplinar, caso presente o pressuposto de menor potencial ofensivo da irregularidade, ou seja: a.1) a suposta conduta irregular enquadrar-se nas hipóteses dos artigos 116 ou 117, incisos I a VIII, XVII, XVIII e XIX, da Lei nº 8.112, de 1990; e a.2) não haver indicação de tratar-se das situações previstas no art. 132, da Lei nº 8.112, de 1990. Também, devem estar presentes condições específicas indicadas em ato normativo aplicável, destacando-se, atualmente a Portaria Normativa CGU nº 27, de 2022, a qual preconiza, em seu art. 63, que o TAC somente será celebrado quando o investigado, cumulativamente: a.3) não tenha registro vigente de penalidade disciplinar em seus assentamentos funcionais; a.4) não tenha firmado TAC nos últimos 2 (dois) anos, contados a partir da publicação do instrumento; e a.5) tenha ressarcido, ou se comprometido a ressarcir, eventual dano causado à Administração Pública; e
b) excepcionalmente, mesmo se atendidos todos os requisitos para a celebração do termo de ajustamento de conduta, ressalva-se a possibilidade de instauração ou continuidade da apuração disciplinar, a partir de decisão da autoridade competente, fundamentada em elementos concretos presentes nos autos, que aponte a utilidade do processo administrativo disciplinar ou a inadequação da medida de solução consensual, nos termos do art. 20 da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro (Decreto-Lei nº 4.657, de 4 de setembro de 1942, com redação dada pela Lei nº 12.376, de 2010).
Considerando a importância da uniformização do tema e do reforço da diretriz legal para adoção de soluções consensuadas no âmbito da Administração Pública Federal, propõe-se remessa ao Advogado-Geral da União e, em seguida, ao Presidente da República Federativa do Brasil com o propósito de adoção vinculante do presente entendimento, nos termos do artigo 40, §1º, da Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993.
IV - PROPOSTA DE ENUNCIADO:
Por fim, adequado a adoção de enunciado a seguir de modo a facilitar a aplicação das conclusões existentes no presente parecer, nos seguintes termos:
ENUNCIADO Nº XX/CNPAD/CGU/AGU:
I - Para a solução consensual de conflitos disciplinares, no âmbito da Administração Pública Federal, envolvendo servidores públicos, ocupantes de cargos efetivos regidos pela Lei nº 8.112, de 1990, a autoridade responsável, em regra, deve celebrar o termo de ajustamento de conduta, antes da instauração do processo administrativo disciplinar, de ofício ou por requerimento do acusado, ou após a instauração do PAD, mediante proposta do acusado ou sugestão da comissão disciplinar, caso presente o pressuposto de menor potencial ofensivo da irregularidade, ou seja: i) a suposta conduta irregular enquadrar-se nas hipóteses dos artigos 116 ou 117, incisos I a VIII, XVII, XVIII e XIX, da Lei nº 8.112, de 1990; e ii) não haver indicação de tratar-se das situações previstas no art. 132, da Lei nº 8.112, de 1990. Também, devem estar presentes condições específicas indicadas em ato normativo aplicável, destacando-se, atualmente, a Portaria Normativa CGU nº 27, de 2022, a qual preconiza, em seu art. 63, que o TAC somente será celebrado quando o investigado, cumulativamente: iii) não tenha registro vigente de penalidade disciplinar em seus assentamentos funcionais; iv) não tenha firmado TAC nos últimos 2 (dois) anos, contados a partir da publicação do instrumento; e v) tenha ressarcido, ou se comprometido a ressarcir, eventual dano causado à Administração Pública; e
II - Excepcionalmente, mesmo se atendidos todos os requisitos para a celebração do termo de ajustamento de conduta, ressalva-se a possibilidade de instauração ou continuidade da apuração disciplinar, a partir de decisão da autoridade competente, fundamentada em elementos concretos presentes nos autos, que aponte a utilidade do processo administrativo disciplinar ou a inadequação da medida de solução consensual, nos termos do art. 20 da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro (Decreto-Lei nº 4.657, de 4 de setembro de 1942, com redação dada pela Lei nº 12.376, de 2010).
À consideração superior.
Brasília, 16 de julho de 2024.
KLEBER ALEXANDRE BALSANELLI
Advogado da União
Relator
De acordo com o Relator:
ABRAÃO SOARES DIAS DOS SANTOS GRACCO
Advogado da União
ANA LUIZA DE CARVALHO MONTENEGRO MAGALHÃES
Advogada da União
BRUNO MEDEIROS BASTOS
Procurador Federal
DEBORA VASTI DA SILVA DO BONFIM DENYS
Procuradora Federal
GUILHERME RASO MARQUES
Procurador da Fazenda Nacional
JAILOR CAPELOSSI CARNEIRO
Advogado da União
JULIANA DE MELO SANT’ANA
Procuradora Federal
LUZIA FONSECA AZEVEDO
Procuradora da Fazenda Nacional
MILA KOTHE
Procuradora da Fazenda Nacional
NEIDE MARCOS DA SILVA
Advogada da União
RAFAEL MONTEIRO DE CASTRO NASCIMENTO
Advogado da União
RENATO DO REGO VALENÇA
Advogado da União
VINICIUS DE CARVALHO MADEIRA
Procurador Federal
Atenção, a consulta ao processo eletrônico está disponível em https://supersapiens.agu.gov.br mediante o fornecimento do Número Único de Protocolo (NUP) 00688000720201910 e da chave de acesso 743535a6
Notas