ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA JUNTO AO MINISTÉRIO DA CULTURA
COORDENAÇÃO-GERAL DE PARCERIAS E COOPERAÇÃO FEDERATIVA


 

PARECER n. 00178/2024/CONJUR-MINC/CGU/AGU

 

NUP: 01400.014625/2024-94

INTERESSADOS: COORDENAÇÃO-GERAL DE INSTRUMENTOS TÉCNICOS E JURÍDICOS CGITJ/DAT/SCC/GM/MINC

ASSUNTOS: MINUTA DE PORTARIA

 

 

EMENTA: Direito Administrativo. Minuta de Portaria Ministerial que visa suspender o prazo para implementação do conselho, plano e fundo de cultura no âmbito local, até a conclusão do processo de regulamentação da Lei nº 14.835, de 4 abril de 2024. Decreto n. 11.525/2023. Consolidação dos Sistemas Estaduais e Municipais de Cultura. Observância das regras do Decreto n. 12.002/2024. Parecer pela regularidade material e formal da proposta.
 
 
 

I - RELATÓRIO

 

Por meio do Ofício nº 3224/2024/GSE/GM/MinC (SEI 1792871), o  Gabinete da Secretaria-Executiva solicita a esta Consultoria Jurídica análise e manifestação sobre minuta de Portaria (1787635), proposta pela Secretaria dos Comitês de Cultura - SCC/MINC, que visa suspender "o prazo de implementação do conselho, do plano e do fundo de cultura instituído no termo de adesão firmado pelos entes federativos no âmbito da Lei Complementar nº 195, de 08 de julho de 2022 (Lei Paulo Gustavo)".

 

A fundamentação e a motivação da minuta de Portaria em questão encontram-se na Nota Técnica 16 (1787638), de lavra da Coordenação-geral de Instrumentos Técnicos e Jurídicos - CGITJ/DAT/SCC/GM/MinC.

 

É o sucinto relatório.

 

II - FUNDAMENTAÇÃO

 

A presente análise se dá com fundamento no art. 131 da Constituição Federal e no art. 11 da Lei Complementar nº 73/93, subtraindo-se do âmbito da competência institucional deste Órgão Jurídico, delimitada em lei, análises que importem em considerações de ordem técnica, financeira ou orçamentária.

 

Assim, cumpre esclarecer que não compete a esta Consultoria Jurídica a análise do mérito administrativo do ato normativo que se pretende aprovar, cabendo à autoridade administrativa competente sopesar a conveniência e/ou oportunidade na edição do mencionado ato. Às consultorias jurídicas compete apenas a aferição do aspecto jurídico-legal das minutas cuja análise lhe são submetidas.

 

Ademais, entende-se que as manifestações da CONJUR têm natureza opinativa e, portanto, não são vinculantes para o gestor público, o qual pode, de forma justificada, adotar orientação diversa daquela emanada deste órgão de assessoramento jurídico.

 

Tecidas essas considerações preliminares, adentra-se à análise jurídica da minuta de Portaria.

 

Quanto ao aspecto material, observo que a minuta de Portaria em análise tem por objetivo suspender prazo para implementação do conselho, do plano e do fundo de cultura de que trata o Termo de Adesão firmado pelos entes federativos no âmbito da Lei Complementar nº 195, de 08 de julho de 2022 até a conclusão do processo de regulamentação da Lei nº 14.835, de 04 de abril de 2024.

 

Os aspectos técnicos e de conveniência e oportunidade da minuta de Portaria foram atestados pela Nota Técnica n. 16/2024 (1787638), que expôs as premissas que levaram à elaboração e proposição da norma.

 

Segundo relata o órgão técnico, a Lei Complementar nº 195/2022 (Lei Paulo Gustavo - LPG) dispõe sobre ações emergenciais destinadas ao setor cultural a serem adotadas em decorrência dos efeitos econômicos e sociais da pandemia da covid-19. Em seu art. 1º, parágrafo único, a LPG estabelece:

 

Parágrafo único. As ações executadas por meio desta Lei Complementar serão realizadas em consonância com o Sistema Nacional de Cultura, organizado em regime de colaboração, de forma descentralizada e participativa, conforme disposto no art. 216-A da Constituição Federal, notadamente em relação à pactuação entre os entes da Federação e a sociedade civil no processo de gestão dos recursos oriundos desta Lei Complementar.

 

Dentro dessa perspectiva, o Decreto nº 11.525, de 11 de maio de 2023, que regulamenta a LPG, estabelece o que se segue quanto ao compromisso dos Entes Federativos com o Sistema Nacional de Cultura - SNC:

 

Art. 10. Os entes federativos que receberem os recursos de que trata este Decreto se comprometerão a consolidar os seus sistemas de cultura ou, se inexistentes, a implantá-los, com a instituição dos conselhos, dos planos e dos fundos estaduais, distrital e municipais de cultura, nos termos do disposto no art. 216-A da Constituição.
§ 1º O compromisso a que se refere o caput será assumido por meio de termo na plataforma Transferegov.br e os entes federativos deverão observar e cumprir os prazos e as especificações estabelecidos relacionados ao Sistema Nacional de Cultura.
§ 2º  Para fins de fortalecimento do Sistema Nacional de Cultura por meio do subsídio à construção de sistema de indicadores culturais, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, observados os prazos e as diretrizes estabelecidas pelo Ministério da Cultura, compartilharão com esse Ministério, nos formatos solicitados, as informações relativas a cadastros de projetos, concorrentes e destinatários locais utilizados na execução da Lei Complementar nº 195, de 2022, e da Lei nº 14.017, de 29 de junho de 2020.
 

Segundo informa a SCC em sua Nota Técnica n. 16/2024, com vistas à consecução do estipulado neste dispositivo, os critérios procedimentais e prazo para implementação dos Sistemas Estaduais e Municipais de Cultura foram estabelecidos no bojo de Termos de Adesão, assinados pelos Entes aderentes por meio da Plataforma Transferegov.

 

Observo que não há informações nos autos sobre a regulamentação do referido Termo de Adesão no âmbito deste Ministério, em especial sobre os prazos, especificações e diretrizes relacionados ao SNC, conforme prescreve o art. 10, §§ 1º e 2º, do Decreto n. 11.525/2023.

 

O modelo do Termo de Adesão a ser assinado via Transferegov pode ser visualizado no NUP 01400.013357/2023-11 (SEI 1345582), assim como uma minuta de Portaria que tinha por objetivo dispor sobre essa adesão (SEI 1338709). Esta minuta, no entanto, aparentemente não foi publicada. Nesses termos, a Portaria que rege a adesão ao SNC, atualmente, é a Portaria MTUR Nº 46, de 28 de setembro de 2022, que não estabelece prazo específico para implementação dos Sistemas de Cultura.

 

Não obstante, está claro que a implantação dos Sistemas Locais de Cultura é etapa do processo de recebimento dos recursos da LPG, nos termos do Decreto n. 11.525/2023.

 

Ao assinar o Termo de Adesão, o Ente federativo se comprometeu a implementar os componentes de sistema de cultura local, quais sejam: conselho de política cultural, plano de cultura e fundo de cultura até 11 de julho de 2024.

 

Ocorre que, recentemente, entrou em vigor a Lei nº 14.835, de 04 de abril de 2024, que institui o marco regulatório do Sistema Nacional de Cultura (SNC), para garantia dos direitos culturais, organizado em regime de colaboração entre os entes federativos, para gestão conjunta das políticas públicas de cultura.

 

Nesse cenário, a SCC/MINC entende indispensável aguardar a conclusão da regulamentação da Lei n. 14.835/2024, inclusive para fins de delimitação de competências dos Entes Federativos e normas procedimentais que irão orientá-los para efetiva implementação dos componentes do sistema de cultura, bem como da fiel execução da política cultural.  

 

Nota Técnica n. 16/2024 da SCC/MINC informa que houve uma porcentagem baixa de implementação dos componentes do sistema de cultura local até o momento e que a prorrogação do prazo foi solicitada por diversos municípios.

 

Por conseguinte, a SCC propõe a Minuta de Portaria em comento a fim de suspender o prazo de 11 de julho de 2024, constante do Termo de Adesão firmado pelos Entes Federativos, para implementação do conselho, plano e fundo de cultura no âmbito local, até a conclusão do processo de regulamentação da Lei nº 14.835/2024.

 

Com relação à forma do ato administrativo, de acordo com a definição encartada pelo Manual de Redação da Presidência da República, 3ª ed., Brasília: 2018, p. 147, a portaria é o "instrumento pelo qual Ministros ou outras autoridades expedem instruções sobre a organização e o funcionamento de serviço, sobre questões de pessoal e outros atos de sua competência”.

 

Nesse mesmo sentido, explica Hely Lopes Meirelles que Portarias são atos ordinatórios que visam a disciplinar o funcionamento da administração e a conduta funcional de seus agentes (Direito Administrativo Brasileiro. 32ª ed. São Paulo: Malheiros, fls. 183/184).

 

Este é o caso dos autos, onde se busca, como afirmado, suspender o prazo estabelecido nos Termos de Adesão firmados pelos demais Entes Federativos, conforme art. 10 do Decreto n. 11.525/2023, para implementação do conselho, plano e fundo de cultura no âmbito local, até a conclusão do processo de regulamentação da Lei nº 14.835 de abril de 2024.

 

Com efeito, o ato poderia ser tanto uma Portaria quanto uma Instrução Normativa, nos termos do Decreto n. 12.002, de 22 de abril de 2024:

 

Art. 9º  Os atos normativos inferiores a decreto serão editados sob a denominação de:

I - instruções normativas e portarias - atos normativos editados por uma ou mais autoridades singulares; e

II - resoluções - atos normativos editados por colegiados.

 

Vale notar que, como o Termo de Adesão é um instrumento declaratório unilateral, não caberia aditivo para revisão desse prazo. 

 

Por outro lado, como aparentemente o prazo a ser suspenso não foi estabelecido em outro ato, a não ser o próprio Termo de Adesão,  a Portaria é meio legítimo para estabelecer uma regra de aplicação geral que postergue as exigências do Decreto n. 11.525/2023 para após a regulamentação da Lei n. 14.835/2024.

 

Portanto, verificada a adequabilidade do instrumento (Portaria) à finalidade que se pretende, é necessário verificar (i) a competência do agente, (ii) a existência de justificativa/fundamentação do propósito pelo administrador, (iii) além do cumprimento dos requisitos de validade e do respeito ao princípio da legalidade.

 

Sobre a competência, não há dúvida de que a Ministra de Estado da Cultura é autoridade competente para disciplinar a matéria, no âmbito desta Pasta. Isto porque as Portarias têm por fundamento o poder hierárquico, podendo ser expedidas por qualquer chefe de órgãos, repartições e serviços, desde que nos limites de sua competência.

 

Sobre a competência específica dos Ministros de Estado, dispõe o art. 87, parágrafo único, inciso II, da Constituição Federal:

 

Art. 87. Os Ministros de Estado serão escolhidos dentre brasileiros maiores de vinte e um anos e no exercício dos direitos políticos.
Parágrafo único. Compete ao Ministro de Estado, além de outras atribuições estabelecidas nesta Constituição e na lei:
(...)
II - expedir instruções para a execução das leis, decretos e regulamentos;
(...)

 

Por outro lado, o art. 10, § 2º, do Decreto n. 11.525/2023 (acima transcrito) menciona a competência do Ministério da Cultura para estabelecer prazos e as diretrizes relativos à execução da LPG.

 

No que se refere ao propósito da administração, a Nota Técnica 16/2024 (1787638), da SCC/MINC justifica e apresenta a motivação do ato, e aborda as questões mencionadas no art. 58 do Decreto n. 12.002/2024.

 

Com relação aos requisitos de validade e respeito ao princípio da legalidade, a Portaria em tela encontra fundamento no art. 10, do Decreto nº 11.525/2023, como destacado anteriormente nesta manifestação jurídica.

 

Quanto aos aspectos estritamente formais contidos na minuta, insta ponderar que a ela se aplica o Decreto n. 12.002 de 22 de abril 2024 (em vigor a partir de 1º de junho de 2024) que estabelece normas para elaboração, redação, alteração, revisão e consolidação de atos normativos.

 

Nesse sentido, passamos à análise detalhada da minuta:

 

a) Quanto à epígrafe da Portaria, é necessário que esta apresente a sigla do órgão ("Portaria MINC nº ___ de ___ de _____ de 2024"), conforme orientação disposta no art. 4º, § 1º, do Decreto n. 12.002/2024;

 

b) A numeração da Portaria deve ser estabelecida em continuidade à série anteriormente iniciada, tendo em vista o disposto no art. 22 do Decreto n. 12.002/2024;

 

c) A ementa está adequada, em consonância com o art. 5º do Decreto n. 12.002/2024;

 

d) Quanto ao disposto no preâmbulo, recomendo que seja mencionado o art. 10 do Decreto n. 11.525/2023, que constitui o verdadeiro fundamento do ato;

 

e) O art. 1º apresenta o objeto da Portaria, em consonância com o art. 6º do Decreto n. 12.002/2024;

 

f) No que tange à data de entrada em vigor (art. 2º), recomenda-se a avaliação da necessidade de postergação da produção de efeitos, nos termos do art. 17 do Decreto n. 12.002/2024. Caso não haja motivos para estabelecimento da vacatio legis, a Portaria poderá entrar em vigor na data de sua publicação. 

 

Por fim, destaco que a proposta de ato normativo em exame está potencialmente sujeita à prévia análise de impacto regulatório - AIR, nos termos do Decreto nº 10.411/2020. Assim, recomendo que o órgão técnico avalie a necessidade de produção da AIR ou dispensa desta, nos termos do art. 4º  c/c  art. 2º, inciso II, do referido Decreto. Caso a AIR seja dispensada, é necessária a avaliação de resultado regulatório, no prazo máximo de 3 anos, conforme art. 12 do Decreto nº 10.411/2020.

 

III - CONCLUSÃO

 

Face ao exposto, e sem adentrar nos valores de conveniência e oportunidade na criação de mecanismos institucionais, não sujeitos ao crivo desta Consultoria Jurídica, é de se concluir pela viabilidade jurídica da minuta de Portaria em tela, desde que observado o disposto no presente Parecer.

 

Isso posto, submeto o presente Parecer à consideração superior e recomendo o encaminhamento dos autos à SECRETARIA-EXECUTIVA, para ciência e providências cabíveis.

 

Brasília, 26 de junho de 2024.

 

 

DANIELA GUIMARÃES GOULART

Advogada da União

 

 


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